A Esperança - Peeta Mellark escrita por Nicoly Faustino


Capítulo 42
Capítulo 42




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Suor brota de minha testa. Johanna aperta firme minha mão. Tão firme que chega até a doer, mas eu não falo nada. Annie que recebeu alta do hospital, segura minha outra mão. Sua barriga está ainda maior, e eu não canso de olhar para ela, contente, sabendo que ali dentro, há uma pequena vida, há um pouco de Finnick. O júri permanece impassível, parecendo não notar o aglomerado de pessoas ali comigo. A juíza entra com uma expressão cansada, captando a atenção de nós todos. Johanna aperta ainda mais minha mão, deixo escapar um gemido de dor, mas ela não percebe.

– Estamos aqui, para anunciar o destino da réu Katniss Everdeen acusada do assassinato de Alma Coin. O júri decidiu, e numa decisão acirrada, com apenas dois votos de diferença, Katniss Everdeen é condenada culpada – a juíza diz, severamente.

– Não – Annie murmura.

Levo as mãos a cabeça, e sinto as lágrimas aflorando. O ódio que sentia o tempo todo quando o veneno agia livremente sobre mim, faz menção em voltar, mas eu tenho que me controlar, tenho que me livrar disso. Sinto alguém me abraçando pela cintura, e seu cabelo faz cócegas em meu braço. Só pode ser Carolynn. Eu a abraço e agora não consigo mais impedir as lagrimas. Eu falhei com Katniss... Eu a perderei... para sempre....

– Sua sentença será... – a juíza recomeça, ignorando nossa desolação, e os protestos raivosos de Johanna e Haymitch. – Reclusão.

Levanto minha cabeça, Carolynn me solta, e as lágrimas em meus olhos ao invés de diminuírem, aumentam.

– Katniss Everdeen, apresenta riscos para os civis em geral, e traços de insanidade, portanto determino sua reclusão no inabitado distrito 12, enquanto durar sua vida. Podendo haver revogações apenas se seu tratamento médico, que deverá ser contínuo, apresentar resultados, ou total cura. Este julgamento está encerrado – ela diz, e bate o martelo. Quando ela se levanta e se encaminha em direção a saída, posso ver um breve sorriso em seus lábios. Sorrio de volta e balbucio um obrigado, que não sei se ela consegue ver, pois sou surpreendido por uma muralha de abraços.

– Você conseguiu – Cressida grita, enquanto me abraça.

– Nós conseguimos - eu digo e enquanto olho para todos ao meu redor, não consigo me controlar e choro, como uma criança, sem nenhum pudor. Katniss afinal, irá ficar viva.

– Haymitch – eu chamo... – Ela não pode ir para lá sozinha... Alguém, que ela conheça e confie, tem que ir com ela.

– Boa sorte na disputa entre você e Gale – ele diz, brincando, mas seu sorriso murcha quando ele entende que eu não irei. Preciso ficar junto de Annie, ainda mais agora que sua gravidez é provavelmente de risco. E além disso, não sei se serei capaz de exercer controle sobre mim, estando isolado num distrito apenas eu e ela. Mas é doloroso demais, imaginá-la vivendo sozinha. E pode ser puro egoísmo, mas é ainda mais doloroso imaginá-la apenas com Gale.

– Você deve ir – a voz grave de Gale irrompe meus pensamentos. Estou prestes a protestar, quando percebo que ele não está se dirigindo a mim, e sim a Haymitch. E mais uma vez, nós concordamos em algo.

– Eu? – Haymitch pergunta, assustado. – E a mãe dela?

– Não achamos que ela queira voltar para o doze e lidar com tudo isso – Delly opina.

– Bom, falem com ela. Se ela não for, então eu vou – ele diz, por fim.

No dia seguinte, eu estou me despedindo de Haymitch, que irá partir com Katniss para o distrito 12. Sua mãe, definitivamente, não quis partilhar sua dor, com a filha.

– Eu não sei como lidarei com ela – ele murmura enquanto me dá um rápido abraço.

– Apenas cuide bem dela, ok? – digo, torcendo para que ele não se entregue ao álcool mais uma vez. – E Haymitch...

– Eu já sei, já sei... Não direi á ela, que você a salvou pela milésima vez.

– Obrigado – digo, e dou um sorriso encorajador para ele.

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A vista para o mar é linda. Eu já deveria estar acostumado a isso, mas não é algo que dá para se acostumar. Sempre te surpreende. Annie ao meu lado parece hipnotizada e eu sei por que. Certa vez ela me confessou que a cor do mar lhe lembra os olhos de Finnick. Olhando direito percebo que ela tinha certa razão nisso. Sua barriga está tão grande que as vezes tenho medo que exploda. Sua gravidez está no estágio final, e ela mal consegue andar mas insiste em vir em nosso lugar preferido, pelo menos uma vez por semana, ficar olhando o mar.

Fazem alguns meses que vim para o distrito 4. Cada um acabou seguindo seu rumo, e eu resolvi fazer a única coisa que podia: cumprir minha promessa para Finnick, e cuidar de Annie. Ela, como a maioria dos vitoriosos dos jogos, por algum motivo, ou mera coincidência, perdeu sua família. Finnick e Maggs eram as únicas pessoas que ela ainda tinha, e agora, indiretamente por minha culpa, eles estão mortos. Ela devia me odiar, mas Annie é uma daquelas pessoas incapazes de sentir algo ruim, todo tempo que passo com ela, é como se aquela ponta de veneno dentro de mim, fosse se extinguindo ainda mais, só que eu sei que ela sempre estará dentro de mim. Beetee voltou para o seu distrito, para tratar do que ele sabe fazer de melhor: tecnologia. Mas agora, ele faz invenções para melhorar a vida das pessoas, não para contribuir com os jogos. Ah, os jogos. Neste exato momento, deve estar acontecendo a ultima edição dos jogos, onde as crianças restantes da Capital estão participando. Sunny, neta de Snow é uma delas. Afasto esse pensamento. Johanna também foi para o seu distrito. Porém ela sempre me ligava, reclamando de como se sentia uma inútil. Por fim, certo dia, ela teve a brilhante ideia de usar seu talento com machados e facas para algo útil. Esculturas. Acho que na casa de qualquer pessoa deve ter uma das esculturas de Johanna. São riquíssimas em detalhes, talhadas em madeira, e verdadeiramente belas. Ela diz que é uma espécie de terapia para ela, mas que rende dinheiro. E é claro, que quem conhece bem Johanna Mason, iria duvidar da seriedade de seu trabalho. E com razão. Suas esculturas são um tanto... ousadas. Ou melhor... Inapropriadas. Carolynn certa vez me ligou chorosa, dizendo que tinha encomendado uma escultura com Johanna e que ela queria algo que remetesse á Panem liberta da tirania de Snow. E então ela recebeu a cabeça de Snow, talhada em madeira, simbolizando ele morto, segundo Carolynn, de uma forma muito horrível. Eu apenas ri, e disse que se tratando de Johanna, aquilo não deveria a deixar surpresa.

Annie teve a ideia de pedir uma escultura de Finnick. Eu fiquei com medo de que Johanna fizesse algo inadequado, mas para minha surpresa, na sala de Annie, agora a decoração principal é uma linda escultura de Finnick, sorrindo.

Cada um tomou seu rumo, no fim das contas. Quando Annie não precisar mais de mim, não sei bem o que farei. Delly decidiu voltar para o distrito 13, onde algumas pessoas de sua família ainda estão abrigadas. Eles irão reerguer o distrito sobre o solo, e abandonar de vez a vida subterrânea. Cressida e Pollux viajam por todos os distritos gravando matérias, que são exibidas na televisão, agora que nos canais não passam só baboseiras da Capital. Segundo Cressida o povo da Capital parece meio desorientado, agora que não há aquele exagero em comida, e em roupas e acessórios, mas eles terão que se acostumar um dia. Payllor, comandante do distrito 8 que assumiu a presidência de Panem, tem uma palavra de ordem. Igualdade. E ela está fazendo seu trabalho muito bem. Carolynn continuou na Capital, ela gasta seu tempo, preservando a memória de Cinna, vendendo e confeccionando as roupas que ele havia desenhado. Porém, só há uma coisa que tira meu sono a noite, me faz sofrer, e me deixa perturbado a maior parte do dia. Katniss.

Haymitch partiu com ela para o distrito 12. No começo, ele me mandava informações e fiquei muito aliviado em saber que a velha cozinheira do prego, estava incumbida de cozinhar para Katniss. Mas com o passar dos dias, ele foi parando de ligar, não atendia minhas ligações e eu comecei a ficar preocupado. Liguei para outra pessoa que poderia saber de Katniss, o médico que ficara responsável de continuar o tratamento psicológico dela, mas ele me disse que desde que ela foi para o 12, não conseguiu mais falar com ela. Delly certo dia me ligou, dizendo que Gale tinha partido do 13. Eu sofri em silencio, mas só pude torcer para que ele tivesse ido para junto de Katniss.

– Peeta – a voz de Annie me traz de volta, e com uma certa urgência. Perco as contas de quantas vezes por dia, eu me alheio totalmente a realidade, pensando em Katniss. Olho para o lado, e levanto abruptamente quando percebo que o vestido azul de Annie, está claramente molhado.

– Annie, o que aconteceu? Seu vestido... – meu coração palpita, ela faz caretas de dor. – Annie....

– Está na hora Peeta – ela grita, e leva a mão a barriga. – Vai nascer. Chame alguém... Ai... Chame um médico... Ai... Rápido!

Então eu corro, como nunca havia corrido antes. Trôpego, com meus batimentos ecoando em minha cabeça, consigo de alguma forma chamar uma equipe médica para resgatar Annie. Tudo ocorre tão rápido, que eu nem me dou conta, quando chego de volta aonde Annie está. Sento na areia, tossindo, e ofegante, pela corrida que dei. Os médicos começam a montar uma maca, para leva-la para a ambulância, mas então começo escutar palavras estranhas entremeadas aos gritos de Annie.

– 8 cm de dilatação – um dos médicos grita, enquanto a examina na maca, ainda sob a areia.

– Impossibilidade de transporte – outro grita, e eu já começo a me sentir nauseado, por saber onde isso vai dar.

– Faremos o parto aqui – o médico grita, enquanto o restante da equipe começa a se movimentar com aparelhos em torno de Annie.

– Escute, faremos o parto aqui mesmo – um médico me puxa para o lado, e começa a falar, enquanto seus olhos examinam minhas cicatrizes e ele reconhece quem eu sou. – Há muitos riscos transportá-la nessas condições. Mas não trouxemos anestesia. Ela terá que ser... forte.

– Ela é forte – eu digo, e cerro os punhos, para disfarçar meu tremor.

– Vamos começar – ele diz e volta para perto de Annie.

Eu me aproximo, e fico ao lado dela. Apoio sua cabeça em meu colo, e tiro os fios de cabelos que grudaram em seu rosto pelo suor.

– Aguente firme Annie – eu grito, para sobrepor seus gritos de dor. Não olho para o que os médicos estão fazendo, pois senão eu perderei minhas forças e não terei como apoiá-la. – Eu estou aqui com você.

Ela busca minha mão, e quando eu seguro a dela, ela aperta, com muita força.

– Finn está aqui também? – ela diz, sua voz tremula.

– Está, bem aqui, com a gente. Ou você acha que ele perderia o nascimento dessa criança?

Ela começa a rir, mas logo sua risada se transforma em choro.

– Eu não vou aguentar Peeta – ela diz, e chora. Eu enxugo suas lágrimas, e enxugo as minhas também, desesperado pela possibilidade de perde-la.

– Você é forte Annie...Você... Você é a pessoa mais forte que eu já conheci... Essa criança precisa de você... Vai dar tudo certo...

– Está saindo – o médico grita, enquanto um grito de Annie corta o ar, e meu coração.

– Aguente Annie.... Por favor... – eu sussurro.

Seus gritos se tornam agonizantes, e eu tenho que controlar meus soluços. É então, que eu escuto o fraco choro de uma criança. E tudo ao meu redor parece se extinguir, e só o choro dessa criança se expande em meus ouvidos. Depois de tantas mortes, o milagre da vida.

– Você quer cortar? – o médico pergunta. – O cordão?

Trêmulo, assinto que sim.

Repouso a cabeça de Annie na areia, uma tesoura grande é posta em minhas mãos, o médico mostra onde devo cortar, e com a visão embaçada pelas lágrimas eu corto o cordão umbilical, a última coisa que ligava o pequeno bebê á sua vida gestacional.

– Bem-vindo ao mundo – sussurro.

– É um menino – o médico anuncia.

Tiro minha camiseta, e passo para o médico, que enrola o bebê com ela. Seu corpinho é tão pequeno, ele chora estridentemente. O médico me oferece a criança, e eu a tomo em meu colo, levando-o até Annie. Ela está vermelha pelo esforço, lágrimas rolam por sua face e morrem em seu sorriso radiante.

– Seu filho Finnick – eu digo, minha voz falhando. – Seu filho veio ao mundo, ele é tão pequeno, tão frágil, tão belo.

As ondas calmas do mar, começam a se agitar, como se fosse uma resposta de Finnick, a um momento tão lindo, tão único. O pequeno menino, tem cabelos fartos, e dourados, da mesma cor do sol que se põe atrás de nós. Dou um beijo na testa de Annie. Ela me olha transbordante de amor á essa criança.

– Agora você pode ir – ela diz, e mais lágrimas, dessa vez de felicidade rolam por seu rosto.

– Do que você está falando? – murmuro, o bebê para de chorar e parece prestar atenção á nossa conversa.

– Você pode ir, até Katniss – ela diz, e então eu compreendo que de alguma forma, ela sempre soube, que eu estava ao seu lado, para garantir que ela ficasse bem, e segura.

– Mas....

– Mas nada, Peeta. Eu sou eternamente grata por você ter ficado comigo nesses meses. Mas agora eu estou bem. Meu filho e de Finnick está bem, em seus braços. Você tem que seguir sua vida. Ao lado dela.

Olho para a criança, seu rostinho pequeno ainda sujo de sangue. Suas mãozinhas se agitam no ar. Essa criança, nunca vai sentir a pressão de uma colheita. Nunca vai sentir o medo de ser sorteado. Nunca vai ter que participar de Jogos nenhum. Nunca passará fome, frio... Nunca sofrerá. Graças ao seu pai, que infelizmente ele nunca irá conhecer. Entrego a criança aos braços de Annie, ele parece se encaixar perfeitamente ali. Sorrio, verdadeiramente feliz, depois de muito tempo. Eu estou indo Katniss.


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