Decididamente, não! escrita por AnaBonagamba


Capítulo 9
Contos de Bard, o Bardo.


Notas iniciais do capítulo

Nada de caldeirões saltitantes ou corações peludos. Só pés, mesmo.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/597822/chapter/9

A pele dele ardia sob o meu toque.

Se alguém podia ficar extremamente estático, esse alguém era Thorin. Eu só sabia que ele estava vivo pelo movimento profundo de seu peito no ritmo respiratório. Ele não me olhava enquanto eu tentava aplicar o remédio em seus hematomas de modo que não lhe causasse dor.

– Sinto que está acanhada, Srta. Perdida. - disse ele. - Estou lhe provendo algum incômodo?

Virei o corpo para o lado e passei a pomada em suas costas, escondendo-me.

– Não. - disse corada. - Sem problemas em colaborar.

– Ótimo.

Ficamos em silêncio, eu percorrendo as mãos naquele corpo masculino mega definido, apesar de pequeno. Não dava pra reparar em muita coisa, com a quantidade de roupa que ele utilizava, agora reduzida a uma simples túnica de linho azul, a calça e um par de botas ensopado. Não que eu estivesse em melhores condições, a blusa do uniforme aparentemente colada por baixo do casaco, a calça a pingar por onde eu andava e os sapatos em estado calamitoso de inundação. Pelo menos eu os tenho, graças a Merlin. Isso sim seria uma catástrofe, ter que andar descalça no meio dessa lama.

– Ahh... - protestou ele quando passei os dedos numa ferida recém descoberta.

– Desculpe! - pedi prontamente, já esperando uma leva de xingamentos. - Serei mais cuidadosa.

– Não se preocupe, é de nosso costume sentir dor. - comentou, observando meus dedos caminharem em seu pescoço até onde ia o diâmetro do corte. - Talvez eu seja um problema.

– Por que?

– O que sinto quando me toca não é dor, exatamente. - sorriu.

Oi, sou Nelly, e acabo de virar um pimentão.

– Ah, na verdade, eu não tenho muita prática com cuidados diversos. - desviei o assunto sabiamente. - Mas carregar um medicamento na mochila é sempre uma boa opção.

Obrigada, Madame Pomfrey!

– Tem sido bem útil para mim, e é claro, para Kíli. - Thorin intensificou seu olhar azul escuro em mim, segurando uma das mãos que jazia sobre mordida de warg(?) em seu ombro. - Obrigado.

– Disponha. - respondi sorridente, tentando me desvencilhar. Não tinha notado o formato de seus dedos. Gordinhos e pequenos, a mão calejada e machucada. - Você é muito branco!

Nelly, você não pode sair por aí dizendo como as pessoas são brancas. Isso é racista.

– Parece surpresa. - ele não acompanhou meu raciocínio.

– Ah, é que, bem, hum... Só estando bem perto pra perceber.

– Se refere ao fato de eu ter uma quantidade significativa de cabelos escuros que impedem que minha pele pareça branca?

Que inteligente, dessa vez não vou dizer nada.

– Você é diferente, Nelly, a Perdida. - continuou ele, liberando o aperto da mão para que eu prosseguisse. - Esperta demais para tamanha jovialidade.

– Mesmo?

– Não concorda? - indagou, vestindo a camisa.

– Em absoluto que não. - levantei-me, contente pelo trabalho feito. - Ninguém concordaria, pelo menos não aqueles que me conhecem bem.

Thorin se aproximou de mim.

– É uma pena que eu não a conheça bem. - declarou gravemente, me deixando sem ar.

– Melhor assim. - contrapus. - Prefiro que pense em mim como esperta, invés de negligente.

– Só espere que eu pense em você.

Bloody Hell, o que ele está fazendo?

– Thorin! - chamou Dwálin com urgência.

Meu estado de confusão pelo suposto cortejo impediu que visse de imediato o homem que segurava um arco apontado diretamente para Ori. Thorin entrou na minha frente como se pudesse me proteger, e não nego que achei a atitude de uma fofura inédita. Vem cá, anãozinho, eu vou esmagar você!

Estavam todos aflitos e desarmados. Se o cara tinha vindo pra nos matar, a hora era essa. Contudo, ele não parecia ameaçador, ao contrário, sua situação podia ser considerada pior que a nossa, pela fisionomia cansada e desolada. Ah, não, ele tem um barco. Vencemos!

Nossa sorte foi ter com Bálin uma conversa extremamente afetuosa, para o desgosto de Dwálin, já impaciente. Aos poucos toda a afabilidade dava lugar a um contrato de transporte, já que o homem em questão era um barqueiro. Não achei ruim, de fato, mas depois de navegar dentro do barril meu estômago revirou furiosamente ao ver que ele, além de levar a mim, Bilbo, e todos os anões, também tomara posse dos barris de Mirkwood. Isso não tá me cheirando bem.

A montanha se aproximava a medida que adentrávamos o lago. Nítida era a animação de Thorin, apesar de se conter no problema financeiro que estavam discutindo a bordo.

– O que está fazendo? - inferiu Bilbo, vendo-me bater o relógio velho insistentemente na proa do barco, tentando abri-lo sem sucesso.

– Ah, estou tentando arrumar essa quinquilharia. - Ok, eu não podia ser mais sincera que isso.

Um dos anões, que continha um machado enfiado dentro da testa, bateu com força em seu próprio peito pedindo com a mão estendida que eu lhe entregasse o relógio.

– Bifur se tornou fabricante de brinquedos no exílio. - disse Bálin, notando minha expressão perturbada. - Infelizmente devido a um desagradável acidente pouco pode falar, o que desconta em sensibilidade nas coisas que manufatura.

Pensei duas vezes antes de entregar as páginas rasgadas do livro de feitiços e o respectivo artefato nas mãos de Bifur, ainda que estivéssemos seguradamente sozinhos num canto do barco. Já que ele não podia falar, me senti menos aflita em deixar que soubesse um pouco mais dos meus segredos. O olhar que destinou a mim depois de ler alguns parágrafos foi de total compreensão.

Podem julgar mal o meu receio, eu deixo. Afinal, assim que começou o trabalho de construir de um pedaço de metal partido um vira-tempo caseiro, Bifur teve mais progresso em minutos do que eu teria em horas. Possivelmente eu terminaria seu serviço, já que ele não possuía a magia adequada para fazê-lo funcionar como devia. Ufa, estamos mais um passo de voltar pra casa, Nelly. Deixei-o, com uma grave reverência, e voltei para o lado de Bilbo juntamente com os outros anões da companhia. Thorin me observou chegar e sustentou meu olhar por poucos minutos, até que o hobbit fez a gentileza de jogar por cima de meus ombros seu próprio casaquinho de veludo vermelho.

– Não precisa. - devolvi a roupa, vestindo-a no dono. Bilbo era muito pequeno, aos meus olhos, uma criança com traços de adulto. Traços sutis e delicados, completamente diferente de tudo o que já tinha visto na vida, de todas as criaturas mágicas que Hagrid possa ter mencionado em suas aulas - e eu possa ter tido a audácia de não dar a mínima importância.

Carregaria sua infinita cordialidade para sempre em minha memória.

– Todas as suas roupas estão encharcadas. - protestou Thorin. - Não teve tempo para torcê-las, visto que ficara ocupada tratando de mim e Kíli.

Ousei fitar o mais novo dos rapazes encolhido num canto, sob os cuidados do irmão.

– Não sinto frio. - mentira. Dentro do casaco, minha mão já tinha congelado em volta da varinha.

– Bard diz que chegaremos logo na Cidade do Lago.

– Quem é Bard? - indagou Dwálin.

– Oras, o barqueiro. - Bilbo respondeu descontente.

– Como sabe o nome dele, a propósito?

– Eu perguntei, pois. - o hobbit franziu o nariz e se afastou.

Bard, poxa, que nome esquisito. Combina bastante com tudo por aqui. Me sinto dentro de uma daquelas histórias que as tias infelizmente nos contam antes de dormir, que nos deixam com tanto receio que fechar os olhos seria uma benção. Afinal, pode até ser. "Contos de Bard, o Bardo". Soa um tanto melhor. Mas nada de caldeirões saltitantes e corações peludos, por favor.

Só pés, mesmo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Nem tão finalmente assim, né?

Bom, chegamos ao final da nossa jornada maluca. Amanhã, dia 30 de março, é aniversário da protagonista da fanfic, e creio que ela ficará muito alarmada com o quanto nosso trabalho foi proveitoso. Eu nunca estive tão satisfeita com uma fic de humor como estou com essa.

Sério, eu tenho uma barreira que me impede de ser sarcástica.

Enfim, o décimo está a cargo da Naty e provavelmente será postado ainda hoje, mais para o começo da noite - ela não faz nada da vida, mesmo :x (não me bata).

Espero que junto dos comentários vocês enviem os votos de "muitas felicidades" a Niele, acho que ela ficaria ainda mais desconcertada se recebesse isso. Sério, rs.

Livre da dengue mas não livre das provas que se acercam, vejo vocês no epílogo! (que eu fui forçada a escrever, mas...) Um beijo!

Ana.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Decididamente, não!" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.