Fear... escrita por Aislyn


Capítulo 1
Capítulo único




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A jovem senhora acomodou-se na cadeira em frente à mesa do psicólogo, colocando o garotinho em seu colo enquanto o homem organizava seus papéis, vez ou outra olhando de soslaio para os dois. O menino balançava as perninhas despreocupado, olhando para todos os lados e perguntando o que eram alguns dos objetos dispostos sobre a mesa, mas a mãe segurava sua mãozinha, afastando-a de qualquer coisa que pudesse quebrar.

Ela se sentia tão nervosa, que parecia que a consulta era para si e não para o filho, por outro lado, às vezes se sentia culpada por ele precisar da ajuda de um profissional. Se não fosse a sugestão da professora do garoto durante a última reunião da escola, ela nunca imaginaria que o filho tivesse piorado.

– Muito bem, senhora Shiroyama… pelo que conversamos por telefone, você já sabia da fobia de seu filho, mas ainda não havia procurado ajuda. Por quê?

– S-sim… eu não imaginei que Takeo precisasse de ajuda… Pensei que isso passaria com o tempo… – ela fez um carinho involuntário nos cabelos da criança, querendo protegê-la das coisas ruins do mundo.

– E há quanto tempo ele tem medo de cachorros? – ao mencionar o nome do animal, Takeo encarou o homem com olhos arregalados, como se tivesse dito algo muito feio.

– Quase dois anos… – confessou num sussurro tímido – Meu marido não queria que viéssemos, disse que meu filho só queria chamar atenção.

– E a senhora, acha que ele quer atenção?

– Bom… talvez um pouco… O pai claramente tem preferência pela irmã dele e tem muito orgulho do nosso filho mais velho. Como ele é o mais novo, sinto que se sente excluído, apesar dos irmãos gostarem muito dele.

– Entendo… se importa que eu converse um pouco com ele a sós?

– Não posso ficar? E-eu… não sei… – olhou para o filho com medo do que poderia acontecer. Não queria que seu bebê ficasse sozinho.

– Ele pode ficar mais a vontade sem a senhora por perto, mas se achar melhor, pode ficar. – apontou um sofá a um canto da sala, pedindo que ficasse por lá – Se achar que precisa interferir, tem total liberdade.

– Certo, obrigada.

A contragosto, a mulher deixou o garoto sozinho na cadeira e se encaminhou para o sofá, sendo atentamente observada pelo filho. O psicólogo terminou algumas anotações, dando a volta na mesa e se sentando no chão, de modo a ficar com o olhar na mesma linha de visão do garoto.

– Podemos conversar um pouquinho, Takeo? – recebeu um aceno afirmativo, junto com um resmungo em concordância – Quantos anos você tem?

– Sete e meio! – contou orgulhoso, com um pequeno sorriso.

– Muito bom, já é um rapazinho. – sorriu em resposta, pensando que não seria tão difícil conversar – Sabe por que está aqui?

Takeo olhou rapidamente para a mãe, antes de olhar novamente para o homem, encarando enfim as próprias mãos que brincavam com a barra da bermuda.

– Por causa dos monstrinhos…

– Monstrinhos? – o psicólogo olhou para a mãe curioso, mas a mulher devolveu um olhar envergonhado, desviando a seguir – Certo… E por que você tem medo deles?

– Não sei… – disse baixinho, dando de ombros e brincando de fazer círculos com o dedo no tampo da mesa.

– Algum cachorro já te machucou ou assustou?

Takeo negou com um aceno firme, abaixando a cabeça para esconder os olhos que começavam a lacrimejar.

– Já teve pesadelos com eles? – outro aceno negativo, e a mão antes pousada na mesa foi parar no rosto, esfregando os olhos com força.

Vendo que não chegaria a lugar nenhum, o psicólogo voltou ao seu lado da mesa, abrindo uma das gavetas e pegando um chocolate, algumas folhas de papel e giz de cera, sentando mais uma vez ao lado do garoto e lhe estendendo o doce.

– Gosta de chocolate? – recebeu um aceno positivo, mas não conseguiu que ele o encarasse de novo – Eu gostaria que você desenhasse o que aconteceu… Acha que consegue?

As folhas foram apoiadas na mesa e o giz de cera colocado ao seu lado. Takeo ficou quieto um instante, mas dessa vez não procurou o olhar da mãe. Não queria que ela pensasse que ele chorava por tudo, como o pai já dissera tantas vezes. Queria que pelo menos ela tivesse orgulho dele.

– Takeo? – o homem estendeu o chocolate a sua frente, tentando obter alguma reação, mas o pequeno ainda levou um instante antes de pegar o doce e o giz, começando a rabiscar coisas aleatórias.

– Ele mordeu meu irmão… – confessou baixinho, o giz vermelho sendo esfregado com força na folha branca.

– E você estava por perto? – pegou discretamente sua prancheta, voltando a fazer anotações.

– Foi culpa minha… – contou com um soluço, a força impressa no giz fazendo a folha começar a se rasgar. Os olhos cheios de lágrimas não prestavam atenção no que desenhava.

– Sua? Você não mandou o cachorro atacar seu irmão, mandou?

Outro aceno negativo e o giz vermelho foi trocado pelo preto, rabiscando com mais força do que antes.

– Papai disse que foi culpa minha. O nii-san quase perdeu a perna por culpa minha. E ele quase morreu… Mas o nii-san disse que foi acidente…

O psicólogo olhou indignado para o garoto, evitando encarar a mãe, apenas imaginando sua expressão. Não era possível que o pai estivesse colocando essas coisas na cabeça da criança! Fazê-lo acreditar que a culpa era dele e ainda aumentar a gravidade do que aconteceu? Será que não sabiam que ele entendia tudo que se passava ao redor? O garoto não esqueceria aquilo tão fácil…

– Eu concordo com seu irmão. Ele parece ser legal. – comentou ao acaso, notando o garoto relaxar minimamente.

– Ele é… me leva pra passear e compra sorvete pra mim. – suspirou audivelmente, deixando o desenho de lado e se concentrando no doce.

– Vamos parar por hoje.

Acenou para a mulher, pedindo que voltasse a se aproximar, retomando seu lugar em sua cadeira, enquanto a senhora colocava o garoto no colo, secando seu rosto e lhe beijando a bochecha, ganhando um sorriso de volta.

O psicólogo explicou que a fobia só tendia a piorar se não fosse devidamente tratada e o trauma poderia acompanhá-lo até a vida adulta. Seria bom se o pai comparecesse em uma das consultas, mas a senhora Shiroyama disse que seria impossível. Ela sabia que ele não iria, mesmo se pudesse.

– O primeiro passo seria conversar com seu marido sobre a situação. Ele precisa parar de acusar o garoto pelo acidente. Posso sugerir uma sessão com hipnose para o Takeo, mas se a senhora achar que ele ainda é muito novo, podemos tentar outros métodos.

– O que o senhor sugere? – qualquer coisa para ajudar seu menino seria bem-vinda. Ela não queria que ele temesse um animal pelo resto da vida por culpa de um acidente. Ainda mais um animal tão comum que ele encontraria em qualquer esquina.

– Vocês poderiam adotar um filhote para que ele cuidasse. Ver um cãozinho nascendo e crescendo, juntamente com ele, poderia criar um laço de amizade entre os dois que amenizaria a fobia. É apenas uma hipótese, pois tudo vai depender da aceitação de Takeo e do tratamento contínuo, que seria analisado e…

– Não! – o garoto gritou, encarando o médico com horror.

– Takeo… – a mãe tentou abraçá-lo, mas ele pulou de seu colo, encarando o homem com raiva.

– Eu não quero! Não vamos adotar nada! – olhou para a mãe com medo, os olhos vermelhos mostrando que novamente segurava o choro – Não vamos, não é? Por favor…

– Calma, Take-chan… se você não quer, podemos procurar outro meio…

– Eu não quero! – gritou mais alto, pegando um dos enfeites da mesa e fazendo-o voar na direção da cabeça do psicólogo, que desviou por muito pouco – Quero ir embora!

– Takeo, não faça isso! – a senhora Shiroyama levantou-se no mesmo instante, pegando-o no colo e só então notando o quanto ele tremia – Nós já vamos. Desculpe por isso…

– Tudo bem, senhora Shiroyama. Como disse, ele já está bastante assustado, mas com o tempo e outras sessões isso será amenizado.

– Eu não quero voltar aqui! – abraçou o pescoço da mãe com força, escondendo ali seu rosto e só então chorando baixinho, pedindo que o levasse para casa. Ele não queria adotar nenhum monstrinho, não queria nenhum deles em sua casa, não queria ser amigo deles, nunca!

Afagando as costas do garoto, a mãe se despediu do homem e saiu do consultório, um pouco envergonhada pela atitude do garoto, mas decidida a não levá-lo, se ele não queria. Ele não precisava de outro trauma. Tentaria resolver aquele problema de outro jeito, mas por hora, só queria proteger seu menino.


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Notas finais do capítulo

Agradecimentos à doutora Nair #piadainterna



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