José e o Quarto escrita por naninhachan


Capítulo 1
O quarto branco


Notas iniciais do capítulo

Deve ser lido antes de "José e os homenzinhos verdes"



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José no quarto.

 

Por naninhachan

 

Novamente um quarto branco. Malditos sejam todos os quartos brancos do mundo. Tereza aparece sentada em minha cama, me encara aturdida.

 

- José, o que está fazendo? – ela pergunta preocupada.

 

 

- Não é óbvio?

 

 

- Eu vejo o que está fazendo, quero saber o motivo! – ela pareceu irritada.

 

 

- Estou me cortando, acho que isso é evidente. – o sangue pingou no lençol branco e foi tragado pela maldita cor que me persegue.

 

 

- Não gosto do seu tom. – ela me fez mirar seus olhos vazios.

 

 

- Nem eu do seu e não reclamo. – puxei de volta o braço que ela havia tomado. O membro que eu mais gostava de machucar.

 

 

- Pare com isso, José. – ela me disse.

 

 

- Não. Me deixe em paz, Tereza.

 

 

- Se machucar não ajuda em nada.

 

 

- Nada me ajuda.

 

 

- Como assim? – ela pareceu confusa. Ótimo.

 

 

- Eu tomo os remédios e não melhoro. Eu faço terapia e não melhoro. Eu sou internado e adivinha, não melhoro. – disse próximo demais do rosto dela. Ela me deu um tapa ou eu me dei um tapa pensando ser ela.

 

 

- Você já pensou em ser mais forte? – me chacoalhou com força. Ou eu o fiz, pensando novamente ser ela.

 

 

- Já e não dá certo. Eu luto todos os dias contra essa maldita “coisa” e não ganho uma batalha sequer! Estou farto, cansado de tudo isso, só queria sentar e desistir.

 

 

Ela se levanta num rompante.

 

 

- Sentar e desistir? Inacreditável, José! A piada do ano! Sentar e desistir não são opções! Você tem de lutar.

 

 

- Por quê? – eu me levantei com raiva. – Todos me dizem para seguir em frente, pra quê? Minha vida não tem sentido, eu não tenho sentido, eu já não sinto mais nada! Estou cansado dessa merda e dessa maldita mania que vocês têm de mandar seguir em frente! A finalidade da vida é a morte. Está determinada desde o Paraíso. Eva fudeu com tudo e Adão se deixou levar, a culpa é sempre das mulheres, afinal. Deus só nos quer mortos, Tereza! Mortos!

 

 

- Não comece com esse papo teológico, José.

 

 

- Não? Por que não? Falta-te capacidade de argumentar.

 

 

Ela se tornou um leão e rugiu diante de mim. Ou eu a vi como um leão que rugia.

 

 

- Eu não me importo com deuses. Estou às voltas dos que acreditam e os que não e muitas vezes sou eu falando e as pessoas pensam que é Ele. Grande ingratidão. Eu só sou culpada quando as vozes dizem pra matar. – ela se encolheu, voltou a ser a mulher que imagino.

 

 

- Deus é um filho da puta! – eu disse com raiva.

 

 

- O que? – ela perguntou incrédula.

 

 

- Deus é um filho da puta. Que tipo de pai fode os próprios filhos? Só os sádicos, os dementes, os pedófilos, os psicopatas, ou seja, a escória. Nenhum pai que se preze maltrata os filhos ou os abandona quando mais precisam. – eu salivava muito por causa do remédio. – Mas Ele, o Todo Poderoso, o Fodão, fode todos os dias com a vida de cada um. E não se importa com isso.

 

 

- José... – Tereza tentou me chamar à razão. Não adiantou eu continuei falando.

 

 

- José ô caralho! Estou farto. Só filhos de puta, que são a maldição do mundo é que fazem esse tipo de coisa. Tudo bem , eu posso estar sendo injusto tem muito filho de puta que vale alguma coisa.

 

 

- Por favor, José...

 

 

- Por favor o quê? Sai daqui, Tereza. Vá embora. Senão me ajuda com nada, não a quero por perto.

 

 

- Tem certeza?

 

 

- Não! É claro que não tenho certeza. Estou delirando! Estou delirando, Tereza! – me joguei no chão e o corpo começou a se debater como se tivesse vida para além da que eu pensava controlar. Efeitos do remédio.

 

 

Ou praga divina.

 

 

.---.

 

10 de fevereiro de 2010.


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