A Segunda Lua escrita por Karol Mezzomo


Capítulo 4
Uma caçada especial


Notas iniciais do capítulo

Esse é o último capítulo, espero que gostem. :)



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Enquanto a pira em homenagem à Gabrielle, era queimada no Acampamento Meio-Sangue, algo surpreendente aconteceu...

Nova York, Andaz Wall Street Hotel, Manhattan,

Rachel Elizabeth Dare.

Rachel encontrava-se sentada em sua cama no quarto de um hotel, esperando impacientemente que seu pai viesse buscá-la. Ela havia terminado seu último semestre insuportável naquela escola só para meninas, que seu pai a havia mandado.

Finalmente ela estava de férias, pronta para partir em direção ao Acampamento Meio-Sangue e rever seus amigos.

– É melhor se prepararem semideuses. – sussurrou ela, para si mesmo no quarto vazio. – O Oráculo de Delfos está chegando.

Ela sorriu enquanto olhava para o seu relógio de pulso. Mais uma hora e seu pais estaria chegando para buscá-la.

Ela suspirou e olhou ao redor do quarto em busca de algo para se distrair enquanto esperava. Seus olhos caíram sobre uma pulha de livros na cabeceira da cama, e ela escolheu o primeiro.

Começou a folheá-lo sem muito interesse, reparando apenas nas figuras, então de repente ela ficou tensa. Sentou-se na cama rigidamente, o livro caiu de suas mãos e atingiu o chão com um som abafado.

Os olhos de Rachel fitavam a porta do quarto sem realmente vê-la, vidrados no espaço. Ela começou a tremer enquanto uma fumaça verde rodeava seu corpo.

Ela abriu a boca, e o Oráculo de Delfos se pronunciou:

Em um novo corpo a Filha da Lua retornará,

Suas memórias passadas não mais existirão,

Pelo nome de Sophie atenderá,

E juntas, mãe e filha, por toda a eternidade caçarão.

Sua voz ecoava e ribombava nos móveis do quarto de hotel. Uma voz reptiliana de causar calafrios na espinha, ao qual muitos semideuses já estavam habituados.

Então seus olhos se fecharam com força, ela parou de tremer, a fumaça verde desapareceu e Rachel voltou a si, quase caindo da cama devido à tontura.

Ela sentia-se fraca.

Levou uma das mãos à têmpora e abriu os olhos devagar. Sua cabeça doía.

– Ha! Que ótimo! Mais uma profecia. – suspirou ela.

Tentou se lembrar do que havia dito, mas não conseguia. Pensou em começar a carregar um gravador por todo canto que ia.

– Tomara que não tenha sido de muita importância. – falou ela enquanto abaixava-se para pegar o livro caído.

Ela sentia uma tensão no ar. Desejou que móveis pudessem falar, para lhe contar o que ela havia dito.

– Bom. – continuou ela, enquanto voltava a folhear seu livro. – Seja lá o que for que eu disse, de qualquer modo logo descobriremos.

O quarto parecia mais frio e calado do que antes, como se soubesse de algo que ninguém mais partilhava.

Enquanto isso, no Acampamento, a pira de Gabrielle encontrava-se totalmente queimada. Devagar os campistas deram as costas às chamas restantes e dirigiram-se, arrastando os pés e de ombros caídos, aos seus chalés sem trocarem uma palavra.

A profecia de Rachel totalmente desconhecida aos ouvidos de todos.

TREZE ANOS DEPOIS

Ártemis caminhava lentamente entre as ruínas de seu templo em Éfeso. A deusa adorava aquele lugar, a fazia lembrar bons tempos, quando era diariamente adorada pelos gregos antigos que lá viviam.

A grama estava alta, na altura de seus joelhos, mas ela não se importava. Sua túnica prateada esvoaçava pelo vento enquanto ela caminhava em direção a única coluna que ainda estava de pé, desafiando os milhares de anos que haviam se passado desde que aquele maravilhoso templo (considerado uma das sete maravilhas do mundo antigo, pelos mortais) estivera inteiro.

Fazia um lindo dia em Éfeso, o sol brilhava fortemente, banhando de luz as ruínas de seu templo.

Finalmente a deusa chegou à coluna a qual pretendia. Lentamente ela ergueu a mão e a tocou, fechou os olhos e respirou fundo. Além das antigas memórias do templo, aquela coluna a fazia lembrar uma pessoa em especial.

– Gabrielle. – sussurrou a deusa, ainda de olhos fechados.

Haviam se passado treze anos desde a trágica morte de Gabrielle, mas não se passava um dia desde aquele acontecimento, sem que Ártemis não se lembrasse de sua filha.

Há dezesseis anos, naquela coluna, Gabrielle havia retirado a arma com a qual havia derrotado Nêmesis. O próprio Arco de Ártemis. A deusa ainda podia sentir o calor da mão de sua filha contra o mármore frio da coluna. Uma lágrima escapou por seus olhos fechados.

Ela ainda não havia superado por completo a morte de Gabrielle. Não conseguia expressar em palavras o quanto sentia sua falta.

– Mamãe? – sussurrou uma voz ao seu lado.

Imediatamente a deusa abriu os olhos e, para sua surpresa, Gabrielle estava ao seu lado.

A semideusa sorriu. Ela estava diferente, aparentando uns treze anos de idade, usava um lindo vestido branco sem mangas, que terminava um pouco a cima dos joelhos, e sandálias se transavam até a metade de sua coxa, no melhor estilo grego antigo. Não havia nenhuma ferida em seu peito. Seus cabelos estavam soltos, caindo delicadamente sobre seus ombros. Ela estava radiante, nenhuma gota de sangue manchava sua pele macia.

Ela continuava a sorrir para Ártemis, como se tudo estivesse bem, como se ela nunca houvesse partido.

Ártemis deu um passo em sua direção e tentou tocar-lhe o rosto, mas sua mão atravessou a face de Gabrielle, como se sua filha fosse apenas um holograma.

A expressão de Gabrielle não se alterou. Ela continuava sorrindo para a deusa, poderia permanecer daquele jeito para sempre.

– Eu não posso tocá-la. – lamentou-se Ártemis, baixando a mão devagar.

Aquela não era Gabrielle, era apenas uma lembrança de sua filha, uma parte de seu espírito. O sol já ia se pondo no horizonte de Éfeso, os últimos raios batiam nas costas de Gabrielle, fazendo parecer que ela brilhava em meio às ruínas do templo de Ártemis.

– Você está mais jovem do que da última vez que a vi, Gabrielle. – lembrou-se a deusa. Seus olhos cinzentos contemplavam maravilhados a visão de sua filha. – Senti sua falta.

Gabrielle franziu as sobrancelhas, mas continuou sorrindo para Ártemis. Ela não entendia porque a deusa a havia chamado daquele jeito. Seu nome não era Gabrielle.

Uma música começou a tocar ao longe. Estranhamente Ártemis não sabia dizer de onde vinha, ela parecia espalhar-se pelo lugar, fazendo-se ouvir de todos os cantos.

Back in the day, when I was younger. (Voltar no dia, quando eu era mais jovem)

A imagem de Gabrielle começou a dissolver-se. Ártemis olhou ao redor à procura da origem da música, quando ouviu uma voz chamando por alguém.

– Sophie!

A voz ecoou por todos os lados. Gabrielle parou de sorrir para Ártemis e virou a cabeça em direção à origem do som.

– Sophie! – a voz chamou novamente.

– Eu preciso ir. – disse Gabrielle, voltando-se para Ártemis com um novo sorriso. Sua voz soava distante, como se ela falasse embaixo da água.

A deusa franziu o cenho, sem entender. Quem era Sophie?

– Espere! – pediu Ártemis. Ela não queria perder sua filha novamente.

Gabrielle fitou o olhar da deusa.

– Mas eu estou esperando mamãe. Estou esperando você me encontrar. – respondeu ela.

Ártemis balançou a cabeça.

– Então me diga onde você está, minha filha. Eu vou buscá-la.

O sorriso de Gabrielle alargou-se. Sua imagem começou a tremeluzir.

– Sophie! – chamou a voz, pela última vez.

– Até logo. – despediu-se Gabrielle, antes de sumir por completo.

Uma luz branca tomou conta do lugar. A música continuava ao fundo...

I’m coming home (Eu estou indo para casa)

To breathe again, to start again. (Para respirar novamente, para começar novamente)

I’m coming home… (Eu estou indo para casa...)

– Espere! – gritou Ártemis sentando-se na cama com um salto.

A última frase da música ainda ressoava em sua cabeça.

“Eu estou indo para casa...”

Um sonho. Tudo não havia passado de um sonho.

Era a quarta vez, um menos de uma semana, que a deusa sonhava com Gabrielle.

Sempre o mesmo sonho.

Ela andava pela campina rodeada pelas ruínas de seu antigo templo, quando escutava alguém chamá-la de mamãe. A deusa então abria os olhos e deparava-se com Gabrielle, quando sua filha possuía treze anos, antes mesmo de saber que era uma meio-sangue.

Ártemis tentava abraçá-la, mas uma voz chamava sua filha, não pelo nome de Gabrielle, mas sim por Sophie. A deusa não entendia, não conseguia interpretar o sonho, e isso a aborrecia. Odiaria ter que perguntar ao seu irmão o significado.

Além do mais, sentia que devia guardar esse sonho apenas para si.

Ártemis levou uma mão ao peito e tocou o colar prateado ao qual havia retirado do pescoço de Gabrielle, antes de sua filha morrer em seus braços. A própria deusa o usava agora, como uma lembrança de sua filha. Ela olhou para o desenho gravado no pingente. Um lobo com uma lua ao fundo.

“Eu estou esperando você me encontrar.” Gabrielle dissera.

Ártemis suspirou.

– É tudo o que eu mais quero, minha filha.

A deusa levantou-se e olhou ao redor. Estava em uma das cabanas que suas Caçadoras usavam. Haviam parado para acampar naquela clareira noite passada, após passarem a tarde inteira no encalço de um javali selvagem.

Elas ainda não o haviam pegado, mas estavam prontas para continuar a caçada naquela manhã. Ártemis sorriu ao pegar seu arco. Uma caçada, era disso que ela precisava. E aquela presa estava se mostrando um alvo difícil, exatamente do jeito que ela gostava.

Empurrou as cortinas da entrada da cabana para o lado, e saiu para a manhã ensolarada que banhava a clareira. Algumas Caçadoras já estavam em pé, arrumando os últimos preparativos para a caçada.

Thalia, a comandante das Caçadoras, estava parada junto à fogueira que haviam acendido à noite, e quando seus olhos encontraram os da deusa, a Caçadora sorriu e correu até ela.

– Tudo pronto minha Senhora. Hoje aquele javali não escapa. – anunciou Thalia.

Ártemis concordou.

– Prepare as Caçadoras, comandante. Tenho a sensação de que essa caçada será especial.

Thalia fez uma rápida reverência e correu de volta ao centro da clareira para reunir as Caçadoras.

Minutos depois, vinte meninas carregando arcos e flechas, cortavam a floresta, guiadas por Ártemis. A deusa abaixou-se ao deparar-se com uma forma esquisita marcada no chão batido da floresta.

– O que é? – perguntou Thalia, aproximando-se.

Ártemis havia identificado a pegada no momento em que seus olhos bateram nela, mas a deusa resolveu não responder à pergunta de sua Caçadora. Ela sempre procurava ensinar ao máximo suas meninas, e aquela era uma boa oportunidade para isso.

– Diga-me você. – pediu a deusa, com um sorriso para Thalia.

Thalia mordeu o lábio, pensativa, e abaixou os olhos para a pegada. As Caçadoras fizeram um círculo ao redor de Ártemis e sua comandante, tentando visualizar a pegada, por cima dos ombros das duas.

Era uma marca grande, um tanto disforme. A terra da floresta estaca seca, e em alguns pontos da pegada, ela havia caído um pouco, tornando difícil a interpretação.

Ártemis ainda olhava para Thalia, esperando a resposta.

Thalia respirou fundo, ela tinha uma resposta em mente, mas era um tanto absurda. Não havia razão para um monstro daqueles estar por perto.

– Arrisque. – pediu Ártemis com a voz calma, percebendo a dúvida nos olhos de sua Caçadora.

Thalia fez um biquinho.

– Um ciclope? – perguntou ela.

– Você está perguntando ou respondendo? – brincou a deusa.

Thalia xingou a si mesma, mentalmente. Ártemis gostava que suas Caçadoras tivessem confiança em si mesmas.

– Um ciclope. – repetiu ela.

Houve alguns murmúrios vindos do grupo de Caçadoras ao redor.

Ártemis sorriu para Thalia enquanto levantavam-se do chão.

– Isso mesmo, irmã. – confirmou a deusa.

Thalia, assim como Ártemis, também era filha de Zeus.

A Caçadora respirou aliviada.

– Teremos que deixar a caçada ao javali para outra hora. – anunciou Ártemis. – Temos uma presa maior nas redondezas.

As Caçadoras mexeram-se agitadas. A adrenalina de uma grande caçada, tomando conta do grupo.

A deusa voltou-se para Thalia.

– Chame Febe, nossa melhor rastreadora. Essa é uma boa oportunidade para ela aprender um pouco mais. Mande-a na frente para nos guiar.

Thalia concordou, e estava virando-se para ir atrás de Febe, quando um grito de medo cortou a floresta até o grupo.

– O que foi isso? – perguntou Thalia.

As Caçadoras calaram-se, os ouvidos atentos. Ártemis mantinha os olhos fixos na direção do grito, e lá estava ele novamente. Seja quem fosse, estava com problemas.

– Me deixe em paz!

Ártemis olhou para Thalia.

– Algo me diz que não precisaremos mais da ajuda de Febe.

Juntas, Ártemis e as Caçadoras correram em direção aos gritos.

Thalia estava certa.

As Caçadoras esconderam-se atrás de alguns arbustos. Há alguns metros de onde se encontravam, um ciclope adulto erguia-se, como uma montanha, sobre uma menina indefesa.

Ele ergueu o punho para golpeá-la, mas a menina desviou rolando para longe, enquanto a árvore atrás de si partia-se ao meio com o golpe do ciclope.

O monstro urrou de frustração.

Aproveitando o momento de distração do ciclope, a menina correu até uma pedra, que se sobressaia um pouco do chão, e a usou como impulso para pular nas costas do monstro.

Pego de surpresa o ciclope tentou golpeá-la, mas ela desviava dos golpes sem rumo dele, e tudo o que o ciclope conseguia era bater na própria cabeça.

Thalia sorriu.

– Mais uma meio-sangue.

– Não é uma meio-sangue. É uma mortal. – respondeu Ártemis, com os olhos cravados na cena. Algo naquela menina chamava-lhe a atenção.

Thalia surpreendeu-se. Era muito raro encontrar mortais que pudessem ver através da névoa, ela conhecia apenas dois mortais com esse dom: Rachel Elizabeth Dare, e a mãe de Percy, Sally Jackson.

A filha de Zeus observou a menina enfiar um graveto na orelha direita do ciclope. O monstro urrou de dor e a menina caiu de suas costas. Ela rolou para longe e acabou batendo a cabeça em uma pedra.

O ciclope arrancou o graveto da orelha e, furioso, dirigiu-se à menina caída. Ela levantou-se com dificuldade, um pouco tonta, mas não deu sinal de correr para longe. Ao contrário, fixou o olhar no monstro e cerrou os punhos. Mas ela estava desarmada, não tinha como ganhar aquela luta.

– Mortal corajosa. – observou Thalia com um sorriso de aprovação.

Olhando mais atentamente, ela podia sentir a aura da menina. Um meio-sangue sempre reconhecia outro, de um modo ou de outro. E a Caçadora constatou que o que sua Senhora falara era verdade, a menina não possuía a aura de um semideus, era uma mortal comum, mas mesmo assim...

Havia algo estranho nela, mas Thalia não teve tempo de pensar a respeito, pois nesse momento o ciclope investiu contra a menina, jogando-a contra uma árvore. Ela caiu e lá ficou. Sentada, sem conseguir se levantar, mas consciente.

– Agora! – mandou Ártemis.

Sem esperar uma segunda ordem, Thalia preparou o arco e atirou nas costas do ciclope.

A menina encolheu-se e fechou os olhos com força, esperando o ciclope esmagá-la contra a árvore, mas tudo o que a atingiu foi uma chuva de pó dourado.

Ao abrir novamente os olhos a menina deparou-se com um bando de garotas que a olhavam atentamente. Entre elas uma mulher de vestido prateado.

Uma das meninas, a que possuía um cabelo preto repicado na altura dos ombros e olhos azuis elétricos, aproximou-se e lhe estendeu a mão.

– Você está bem? – perguntou ela, olhando-a atentamente.

A menina caída usava jeans batidos e um All Star preto, uma camisa clara e um casaco de tecido também preto. Seus cabelos castanhos estavam presos em um rabo de cavalo, mas alguns fios rebeldes lhe caiam a cima dos olhos, esses, por sua vez, também castanhos fitavam Thalia com igual interesse.

A menina hesitou um pouco, mas por fim deu a mão à Thalia, e a Caçadora a ajudou a levantar. Seus olhos castanhos encontraram os de Thalia e a Caçadora sorriu encorajadoramente. A menina não sabia explicar, mas havia algo de familiar naquela garota com um estilo punk, algo que ela sentia que deveria se lembrar, mas quando vasculhava a memória à procura de sua imagem, encontrava apenas o vazio.

Ela correu os olhos pelo grupo de meninas, todas usavam jeans pretos, casacos prateados e carregavam arcos. Isso era, no mínimo, estranho. A não ser pela mulher que as acompanhava, essa usava um vestido prateado até acima dos joelhos, e tinha uma aura de poder que irradiava o local. Quando seus olhos se encontraram, a menina estremeceu.

– Está tudo bem? – repetiu Thalia.

A menina sacudiu a cabeça com força. O que fora aquilo? Aquela mulher... Quem era ela? Sentia que era alguém importante, mas ela simplesmente não conseguia se lembrar. Por fim voltou-se à Caçadora que falara com ela por primeiro.

– O que foi aquilo? – perguntou.

Thalia abriu a boca para responder, mas Ártemis antecipou-se.

– Era um ciclope. Um ser da mitologia grega. – ela pronunciou “mitologia” como se fosse uma doença terrível. – Faz ideia do porque ele estava atrás de você?

A menina virou-se para ela. Ártemis fitou seus olhos mais uma vez, e percebeu que a garota não parecia surpresa, como se a ideia de seres mitológicos existirem, fosse algo tão normal quanto respirar. Quando seus olhos encontraram-se novamente, o coração da deusa bateu mais rápido. Aquela menina a intrigava.

Ela percebeu quando seus olhos castanhos desceram para o colar de Gabrielle, em seu peito. Sua expressão tornou-se vaga por um momento, tentando lembrar-se de algo, então por fim ela respondeu.

– Não. Nessas últimas semanas isso vem acontecendo com mais frequencia. Vejo esses tipos de monstros por toda parte. Eles me encontram, não tenho onde me esconder.

Thalia franziu as sobrancelhas.

– Sério? Mas, tipo... Você é mortal, não há razão para eles irem atrás de você.

Ela olhou para sua Senhora em busca de respostas, mas Ártemis apenas balançou a cabeça, mostrando que não queria falar sobre aquilo no momento. Uma ideia começava a formar-se em sua mente.

Mortal. Repetiu a garota, mentalmente. Aquela menina punk havia chamado-a de mortal, como se... Como se ela não fosse.

– O que você faz sozinha aqui na floresta? – perguntou a deusa.

A menina mudou o peso do corpo de um pé para o outro, desconfortavelmente. Aquele era um assunto delicado. Ela não tinha certeza se deveria contar àquele estranho grupo de garotas, mas algo dentro de si lhe dizia que podia confiar nelas.

– Eu fugi de casa. – contou ela. – Percebi que esses monstros estavam atrás de mim, e não queria envolver meus pais nisso.

Thalia a olhou solidariamente. Ela entendia um pouco desses assuntos.

– Quantos anos você tem? – perguntou a Caçadora.

Agora que estava perto dela, Thalia podia sentir uma aura diferente ao redor da menina. Nem semideusa, nem mortal, mas sim algum tipo de transição ou mistura entre as duas coisas.

– Treze. – respondeu a menina.

Ártemis respirou fundo. Não podia ser.

– Você pretende voltar para casa? – perguntou a deusa.

Antes mesmo que ela terminasse a pergunta, a menina já balançava a cabeça negativamente.

– Não. – confirmou. – Eles não me deixarão em paz.

Thalia refletiu sobre o que a menina havia dito. Não poderia levá-la ao Acampamento, ela não se encaixaria em nenhum chalé de lá. A Caçadora olhou para Ártemis, as duas pensavam a mesma coisa. A deusa fez um leve aceno com a cabeça, instigando Thalia para que seguisse em frente.

Thalia virou-se para a menina, com um sorriso no rosto.

– Então, nesse caso, o que acha de ficar com a gente?

A menina calou-se por um tempo. Algo dentro dela gritava para que ela aceitasse, era como se em sua vida toda, ela tivesse esperado por aquele momento, e agora ele havia finalmente chegado. Mas tinha um problema, ela nem sequer sabia quem eram aquelas pessoas.

– Quem são vocês? – perguntou ela.

Ártemis sorriu, tranqüilizadora.

– Essas são as Caçadoras, minha querida. E eu sou Ártemis, deusa da caça e da lua.

A menina foi invadida por uma tontura momentânea.

Ártemis. Lua. Caça. Caçadoras.

Uma dor de cabeça insuportável a atingiu e ela levou as mãos à cabeça.

– Ai!

Ártemis a observou com interesse e aproximou-se, pegando suas mãos com cautela. Fazendo a menina olhar em seus olhos.

– Eu sei. – falou a deusa, como se soubesse pelo que ela estava passando. – Junta-se a mim, minha pequena.

Parecia loucura. Era isso, só podia ser. Ela devia estar louca, como era possível que esses seres fossem reais? Deuses, ciclopes... O que mais viria depois? Cavalos alados? Quem sabe, talvez o próprio Olimpo?

Loucura!

Ela pensou em correr, mas quando os seus olhos encontraram os da deusa novamente, ela simplesmente não pode recusar o pedido, era mais forte do que ela. Era uma obrigação que ela fizesse parte daquele mundo. Antes que ela percebesse, a resposta saiu de sua boca.

– Sim.

Ártemis sorriu e largou suas mãos. A deusa sentiu seus olhos marejados. Por um momento pensou ter visto outra pessoas naqueles olhos castanhos.

– Thalia. – chamou Ártemis.

Com um sorriso a Caçadora aproximou-se mais da menina. Ela ficou feliz em ouvir sua resposta, aquela garota parecia ser legal, ela tinha um pressentimento de que seriam grandes amigas.

– Repita comigo. – pediu Thalia. – “Eu me comprometo com a deusa Ártemis.”

– Eu me comprometo com a deusa Ártemis.

– “Dou as costas para a companhia dos homens, aceito a virgindade eterna e me junto à Caçada.”

A menina repetiu.

Thalia olhou para Ártemis, e seguindo o procedimento padrão, perguntou (apesar de já saber a resposta):

– A minha Senhora aceita?

Ártemis abriu um largo sorriso.

– Sim, eu aceito.

Nesse momento um vento mais forte soprou pela floresta, balançando os galhos dos pinheiros violentamente. As Caçadoras deram um viva de comemoração para os céus, e depois uma por uma, cumprimentaram a nova Caçadora, dando-lhe tapinhas nas costas e contando sobre as vantagens de ser uma Caçadora de Ártemis.

A menina sorriu. Era como se tivesse nascido para aquilo, para aquele momento. Era seu destino.

– Eu me sinto mais forte. – contou ela à Thalia, em meio aos cumprimentos das Caçadoras.

Thalia sorriu também.

– Eu sei. É incrível, não é? Bem vinda à imortalidade, irmã!

Ártemis a cumprimentou.

– Lembre-se do seu compromisso. – avisou a deusa. – Ele agora é sua vida.

Então se dirigiu às Caçadoras.

– Nossa caçada ainda não terminou. Vamos atrás do javali.

As Caçadoras ergueram seus arcos em triunfo, e puseram-se a caminhar pela floresta à procura de rastros que as levassem até o animal.

A nova Caçadora andava ao lado de Thalia, e esta se virou para ela com uma expressão curiosa no rosto.

– Me desculpe, mas eu nem sei seu nome.

As duas aproximavam-se de Ártemis agora.

– Sophie. – respondeu a menina. – Meu nome é Sophie.

Ártemis sorriu. Não se sentia tão feliz há anos. Lembrou-se o que Gabrielle havia dito em seu leito de morte. Que tentaria voltar, renascer novamente para buscar conquistar a Ilha dos Abençoados, no Elíseo.

O refrão da música que tocará em seu sonho, invadiu seus pensamentos.

I’m coming home, (Eu estou indo para casa,)

To breathe again, (Para respirar novamente,)

To start again, (Para começar novamente,)

Agora, um pouco mais afastada das duas, Ártemis olhou para Sophie, concentrando-se mais, a deusa visualizou a alma da menina.

I’m coming home. (Eu estou indo para casa.)

Uma lágrima escorreu livremente por sua bochecha. Mas diferente do que havia sido da última vez, essa lágrima representava felicidade.

– Você já está em casa agora. – disse a deusa, em um tom que apenas ela poderia ouvir. – Bem vinda de volta, minha filha.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado do final que escolhi para Gabrielle. Não pretendo mais postar histórias por um tempo, pelo menos não mais sobre a Filha de Ártemis, a aventura dela termina por aqui.
Quem sabe, uma outra história, sobre um mundo diferente... Talvez.
Quero deixar aqui meu MUITO obrigada a todos que acompanharam a história, a todas as visualizações, a todos que comentaram, a todos que favoritaram, enfim... OBRIGADA. Beijos.



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