Juntos pelo acaso escrita por MsNise


Capítulo 29
Reencontrando


Notas iniciais do capítulo

Olá! Tudo bem com vocês?
Hoje eu não atrasei e ainda trouxe o que eu considero o capítulo mais importante da trama. Planejei ele faz tanto tempo e nem consegui acreditar quando digitei as palavras desse capítulo! Sério. É uma parte que eu considero extremamente importante.
Portanto, espero que gostem desse capítulo tanto quanto eu!
Boa leitura ♥



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No outro dia, encontrei um papel na caixinha do correio com somente uma palavra. E uma palavra nunca tinha me feito tão realizado até então. “Sim”, Sali tinha escrito somente. Com letras maiúsculas para destacar. Desconfiei que ela não tivesse mais o que falar além daquilo. E eu também não. Era o suficiente.

Mal pude esperar para sexta-feira, quando nos encontraríamos novamente. O resto da semana fiquei agitado em busca de algo que pudesse nos representar. Achei que o mais discreto seria um colar porque Sali poderia escondê-lo por dentro da blusa sempre que achasse necessário, assim sua mãe não desconfiaria.

Demorei para achar o pingente perfeito, mas quando achei não pensei duas vezes. Era exatamente do que precisávamos. E, mesmo que não tivesse mais espaço dentro de mim, me senti mais ansioso ainda. Impossivelmente, meu sorriso aumentou até rasgar o meu rosto ao meio.

Estávamos nos saindo no proibido melhor do que eu poderia imaginar.

.

— Olá, meu primeiro namorado — Sali falou animada assim que subiu no muro. Imediatamente ajudei-a a descer. Ela descansou suas mãos nos meus antebraços e deixou que eu segurasse sua cintura por mais tempo.

— Olá, minha… — fingi que estava fazendo as contas de quantas namoradas já tinha tido. Ela riu e me deu um tapa fraco. — Primeira namorada que eu amo — completei com um sorriso conquistador.

Ela revirou seus olhos.

— Que galanteador…

— Tenho que ser! Como poderia conquistar a menina que amo sem todo esse meu charme único?

— E convencido, ainda por cima — ela exclamou. — Poxa, Guto, pensei que você não ficaria tão convencido depois de me conquistar.

— Como poderia não ficar?! — fingi-me de indignado. — Foi a minha conquista mais confusa, difícil, incrível e avassaladora.

— Avassaladora?

— Sim.

— Por quê?

Sorri suavemente e colei meus lábios nos seus ouvidos. Naquele dia, ela tinha feito uma trança na lateral de sua cabeça.

— Porque eu ainda sinto frio na barriga a cada toque seu — sussurrei. Ela estremeceu. Meu sorriso se ampliou. — Porque meu coração ainda acelera sempre que te vejo e, quando não te vejo… penso que não vou aguentar a dor que sinto nele. Porque ainda me surpreendo com o seu sorriso todas as vezes que o vejo como se fosse a primeira vez. Porque ainda tenho medo de te tocar e te machucar; física e emocionalmente. E porque eu até me vestiria Homem-Aranha mais uma vez na frente de todos se fosse necessário para continuar com você.

Afastei-me um pouquinho e peguei seu rosto entre minhas mãos, acariciando suas bochechas. Ela sorria. Muito. E seus olhos brilhavam como duas estrelas; ela parecia infinitamente realizada.

— E esses são alguns motivos pelos quais eu não consigo mais suportar a ideia de não ter algo para chamar de nosso — murmurei, tentando desvendar cada nuance de seu olhar. — Esses são alguns dos motivos que me fazem ter certeza do amor que sinto por você; o qual tenho certeza que vai se ampliar ainda mais. Eu sinto isso, Sali. Eu sei disso. Como nunca soube de nada antes — ela deixou que lágrimas escorressem em seu rosto. Lágrimas de felicidade, porque o sorriso não fugia de seu rosto. Sorri também. — E é por isso que hoje, aqui, eu te peço para ser minha namorada. Para aceitar dar um nome a isso que nos conecta. O que você me diz, Sabrina? Você aceita?

Com os dedos trêmulos, ela tocou a minha face hesitantemente. E, assim como tinha dito antes, senti meu corpo todo se arrepiar. Seu toque era quente e gentil. E sempre me deixava com vontade de que ela não parasse nunca mais porque eu me sentia perfeitamente seguro. Sua pele em contato com a minha me dava um conforto indescritível.

— Como eu poderia dizer não, Guto? — ela sussurrou com a voz embargada. — Como eu poderia me atrever a isso? Você me deu… os meus melhores dias. Você me tirou o sono, mas nunca antes tinha me sentido tão bem com as minhas olheiras — ela riu um pouquinho. — Você me deu preocupações, medos e me fez agir contra as regras. E eu odiaria qualquer pessoa que fizesse isso comigo. Mas, por outro lado, você me deu sorrisos, realizações de sonhos, intensidade, lágrimas de alegria e coragem. Muita coragem. Para enfrentar o que eu acreditava e o que queria acreditar. Você me deu o mundo real e o mundo da fantasia. Tudo, Guto! Você me deu tudo! E como é que eu poderia não querer ser sua namorada depois disso?

Firmei minha mão em sua nuca e colei meus lábios aos dela. Ali mesmo, na frente de sua casa, como se aquilo confirmasse de que poderíamos amar um ao outro em qualquer lugar. Até sob o nariz de sua mãe obtusa. Porque nosso amor venceria a tudo e a todos.

O mundo poderia acabar. Sua mãe poderia aparecer. Um acidente poderia acontecer. Uma tempestade, tornado, furacão, terremoto, tsunami. Qualquer coisa. Mas eu nunca amaria Sali como a amei naquele momento. E nunca interromperia aquele beijo quase sagrado, que libertava todas as nossas amarras. Éramos invencíveis. Enquanto nossos corpos estivessem colados e os nossos lábios em movimento, eu poderia derrotar até Lord Voldemort sem a ajuda de poderes mágicos.

— Sim, Guto — ela exclamou, separando o beijo. — Mil vezes sim! — e então depositou vários selinhos animados em meus lábios.

Ri com sua empolgação e peguei a caixinha no bolso de minha calça.

— Olha, eu queria te dar algo que simbolizasse nós dois. Algo que pudéssemos ter em comum — comecei, subitamente nervoso. E se ela não gostasse? — Um anel de compromisso não poderia ser porque sua mãe perceberia. Uma pulseira também seria muito exposta. Já um colar… achei que pudesse ser perfeito porque é fácil de esconder sob sua blusa. Assim sua mãe não vê e…

— Calma, Guto — ela riu um pouquinho e me beijou suavemente. — Eu vou adorar, o que quer que seja. Não precisa ficar tão ansioso.

Soltei o ar lentamente, me achando tolo por tamanho nervosismo. Minhas mãos ainda tremiam. Essas eu, infelizmente, não consegui controlar. Penei para conseguir abrir a caixinha e, daquela vez, foi Sali quem ajudou a me firmar. Ela colocou suas mãos sobre as minhas para controlá-las.

Quando o conteúdo foi revelado, Sali sorriu confusa.

— Eu escolhi uma pena por causa da escrita, que nos uniu desde o princípio — murmurei. — Porque antes molhavam a pena na tinta e escreviam com ela. Achei mais elegante que uma caneta. E um pouco menor também — Sali riu com o meu comentário. — A dourada é sua, porque é mais feminina e delicada, assim como você. E também porque o dourado me lembra um pouco do amarelo. E você é uma espécie de sol que ilumina meus dias — finalmente olhei-a nos olhos. Seus olhos espelhavam o sorriso de sua boca.

— E posso falar por que você fica com o pingente azul? — sussurrou.

— Pode.

— Porque todo sol precisa de um céu — e então se esticou o suficiente para que nossos lábios roçassem. Foi delicado. Assim como tinham sido suas palavras. Ela se afastou um pouco e sorriu, pegando o seu colar na mão. — Aceita me dar uma ajudinha aqui, Guto?

Segurei minha respiração quando ela se virou de costas para mim e me entregou o colar. Delicadamente, envolvi-o em seu pescoço. Meus dedos roçaram a sua nuca levemente e ela estremeceu com o toque. Por alguns segundos, me detive em uma pinta que ela tinha no meio de sua nuca.

— O que foi? — perguntou.

— Você tem uma pinta aqui — sussurrei, acariciando o lugar. Achei bonita. Um traço único dela.

— Ah, sim — pude ouvir o sorriso em sua voz. — Eu gosto dela.

— Eu também — assenti e me inclinei o suficiente para que meus lábios tocassem o lugar suavemente. Senti o corpo todo de Sali ficar rígido e me afastei rapidamente. — Desculpa, eu não queria…

— Eu gostei — ela me interrompeu e virou um pouco para me olhar. — De verdade. Ninguém nunca tinha ficado tão impressionado só por causa de um pontinho marrom na minha pele.

— É exatamente isso. Na sua pele. na sua pele. Nunca tinha visto igual — suspirei. — E fiquei com tanta vontade de beijar aquele pontinho ali…

Ela sorriu.

— E eu gostei que você fez o que era de sua vontade — em seguida, fechou os olhos e envolveu o pingente com os dedos. — É como se eu pudesse te sentir vibrando no meu peito…

— Agora você vai poder sentir a minha vibração sempre — confirmei e a puxei pela cintura. — Agora poderá estar comigo sempre.

Ela suspirou e acariciou o meu rosto.

— E você? Quer ajuda com o seu colar?

Sem titubear, virei-me de costas para ela e senti os seus dedos frios em contato com a minha nuca exposta. Também não pude controlar um leve tremor. E, assim como eu tinha feito, ela acariciou um pouco local e depois se ergueu na ponta dos pés e depositou um beijo delicado, fazendo meus pelos se eriçarem.

— Agora estamos quites — sussurrou contra a minha pele.

Senti o pingente pesar em meu pescoço e vibrar, assim como ela tinha descrito. Nossa ligação. Nosso elo. Envolvi o meu pingente com os dedos também e me virei, ficando frente a frente com ela. Olhei-a no fundo de seus olhos.

— Eu te amo, Sabrina — sussurrei com a voz intensa. Intensa tal qual meus sentimentos que estavam me tirando do eixo naquela noite. — Mais do que posso suportar.

— Eu te amo, Gustavo — ela me imitou. Mas a intensidade de seu olhar não deixava espaço para questionamentos. — E acho que posso amar ainda mais. Muito mais. Cada dia…

Calei-a com um beijo. Não precisava ouvir aquilo. Precisava sentir aquilo. E no seu beijo eu sentia. No seu beijo eu me sentia o ser mais amado e abençoado do universo. E era aquilo que eu queria sentir.

.

— Eu estou me sentindo meio mal — Sali franziu o cenho ao me olhar. — Minha mãe disse que só estava me deixando vir porque confiava em mim, Guto — ela parecia angustiada ao entrelaçar sua mão à minha. — E estou quebrando a confiança dela.

Em julho, quase um mês depois de termos firmado o nosso relacionamento, havia uma festa de São João na cidade. Uma amiga da escola de Sali a tinha convidado para ir e sua mãe, achando falta de educação recusar, permitiu que a filha aceitasse o convite. O problema era que ela não poderia acompanhá-la porque tinha uma viagem a trabalho, portanto disse que confiava na Sali o suficiente para saber que ela não faria nada de errado.

— Você não está fazendo nada de errado — consolei-a, passando a mão em seus cabelos soltos naquele dia. — Só está… vivendo.

Ela fechou seus olhos e encostou sua cabeça em meu peito.

— Eu sei — ela choramingou. — Mas é bem mais fácil quando ela não diz esse tipo de coisa. É bem mais fácil quando eu sei que ela não confia em mim.

Passei meus braços por seus ombros e a apertei firmemente contra meu peito.

— Você só está fazendo aquilo que…

— Acho certo — ela completou. — Aquilo que gosto. Eu apenas queria que ela entendesse isso, sabe? Apenas queria que ela também aceitasse aquilo que eu gosto. Você.

Senti um nó se formando em minha garganta.

— Espero ansiosamente pelo dia em que eu possa contar a ela que você é minha namorada e que eu posso te fazer bem — peguei seu rosto em minhas mãos e consegui roubar um pequeno sorriso seu. — Que eu posso te fazer feliz.

— Eu também — ela sussurrou. — Embora eu ache que ela não vá acreditar tanto nisso pelas coisas que eu fiz por você. Você sabe. Ir em cemitérios. Gazear aula.

Ri sonoramente e Sali me acompanhou timidamente.

— Mas somente assim ela vai descobrir que fazíamos tudo um pelo outro. E que nos amamos verdadeiramente. No começo até vai estranhar, mas quem sabe um dia ela se orgulhe de ter uma filha que lutou pelo amor verdadeiro. Quem sabe um dia ela diga: “ainda bem que você foi contra mim e viveu”.

— Isso é meio difícil, Guto…

— Mas não é impossível. Como pode saber o que ela pensa disso tudo? Talvez esteja te testando e querendo saber se eu realmente valho a pena.

— Ou talvez ela esteja me testando para saber se eu sou confiável.

Suspirei e acariciei suas bochechas.

— Será que eu vou conseguir te fazer sorrir verdadeiramente essa noite, Sali? — murmurei.

Ela franziu a boca e olhou para o lado.

— Bom, já que eu estou aqui… não vejo problema em aproveitar um pouco da festa. Talvez sorrir não seja uma missão impossível.

— Apenas… esqueça tudo.

— Prometo que vou tentar, mas preciso da sua ajuda — e então deslizou sua mão para dentro da minha novamente e sorriu de modo conspiratório. — O que acha que poderia ser útil para eu esquecer de tudo por algumas horas?

— Um beijo? — sugeri.

— Um pastel — me corrigiu, puxando-me pela mão. — Um pastel pode ser bem útil.

Ri ao acompanhá-la para comprar um pastel e um refrigerante. Depois daquilo era me arrastou para a “Pescaria”, onde conseguiu um potinho de bolhas de sabão, com o qual brincou animadamente por um bom tempo. Cansada da brincadeira, pediu uma maçã do amor para dividir comigo. Segundo ela, não suportaria algo tão doce para comer sozinha.

— Você é muito enjoada — reclamei.

— Eu já disse uma vez e posso repetir: sou seletiva.

A quadrilha foi, de longe, a parte mais empolgante da festa. Eu não planejava participar, mas Sali me arrastou para a dança animadamente. O seu sorriso era sincero; e eu não pude recusar.

— Não existe Festa de São João sem dançar quadrilha, Guto. Deixa de ser chato — argumentou.

— É cansativo e…

— Muito divertido. Vamos lá!

E eu fui. Sempre tinha achado cansativo, no entanto, vendo Sali com um sorriso tão empolgado no rosto, não pude me cansar daquela brincadeira infantil. De repente, quadrilha se tornou uma dança divertida e animada, a qual me tirou de um leve torpor ocasionado pela culpa.

A culpa que eu sentia tinha muito a ver com o fato de eu ter mostrado para Sali diversas opções de proibido. Não que eu achasse que ela fosse influenciada por mim. Sali era independente; se não quisesse, não iria. No entanto, isso não me livrava de minha culpa. Se eu nunca tivesse me aproximado dela, ela não estaria encrencada e infeliz. Mas ela mesma não tinha me dito que eu tinha dado tudo o que ela queria?

E se eu nunca tivesse me aproximado dela, talvez ainda lamentasse a separação com Laura. Poderiam parecer ridiculamente erradas as nossas atitudes, mas elas se tornavam certas quando vistas de uma perspectiva mais ampla. As nossas atitudes nos levavam de encontro um ao outro. E aquela era a coisa mais certa da minha vida até então.

Quando a dança terminou, Sali abraçou forte os meus ombros e sussurrou um “obrigada” empolgado no meu ouvido. Respondi apertando sua cintura e mantendo um sorriso gigante no rosto.

Mas então tudo virou uma imensa confusão.

Aparentemente, um casal brigava no meio da festa. Não parecia uma briga qualquer, no entanto. O rapaz estava fora de si e gritava com a garota. Uma pequena roda se reuniu ao redor deles e eu não teria me aproximado caso não tivesse visto o cabelo colorido. E só poderia ser uma pessoa.

— Guto, não é seguro nos aproximarmos — Sali tentou me conter de forma angustiada segurando em meu pulso.

Virei-me e enxerguei seu olhar suplicante. Eu poderia ficar seguro com ela pelo resto da noite e nunca mais me lembrar daquele acontecimento, mas sentia em meu íntimo que não era correto.

— É a Laura, Sali — expliquei apressadamente. — E o Edgar está fora de si. Mesmo depois de tudo… eu preciso livrar ela dele. Ela merece uma nova chance.

Pensei que Sali fosse brigar comigo. E talvez devesse. Na sua cabeça ela deveria pensar que eu ainda nutria sentimentos por Laura e que esse era o motivo pelo qual eu queria tirá-la daquele lugar. No entanto, ela me lançou um sorriso pequeno e compreensivo.

— Você a perdoou — concluiu. — E acha que, mesmo com o seu erro, ela não precise pagar dessa forma tão cruel.

— Existem outras formas de pagar por um erro — concordei. — E eu gostei dela a minha vida toda. Seria meio injusto que por causa de um ressentimento a deixasse sofrer tanto.

Sali assentiu.

— Então vamos. Eu vou com você.

Estava prestes a falar que ela poderia se machucar, mas percebi que precisava dela ao meu lado. Para que, quando a olhasse, pudesse saber se estava fazendo o que era certo. Com um suspiro, comecei a abrir espaço entre a multidão, sem soltar da mão de Sali por nenhum segundo. Demorei para chegar perto do centro da roda.

Mas quando cheguei até senti náuseas.

Edgar deu um soco no rosto de Laura exatamente quando consegui observar os dois. Um soco forte. Um soco que não deveria ser destinado a ninguém.

— Eu cuido dela — Sali sussurrou no meu ouvido, se ajoelhando ao lado de Laura.

Respirei fundo e me aproximei de Edgar, encarando-o com o olhar firme.

— Olha só, chegou o corno! — ele exclamou. Estava bêbado. — Essa vadia que estava comigo corneou esse aí! E a namoradinha dele tá ajudando ela. Que pena! Sendo traída e humilhada na frente de toda essa gente.

Senti meu sangue ferver e o agarrei pela gola de sua blusa. Um forte cheiro de álcool alcançou minhas narinas.

— Eu realmente sinto muito que Laura gostasse de você — rosnei. — Ela merecia gostar de alguém que fosse melhor. Ninguém merece gostar de você. Ninguém merece um porco nojento que sente prazer em humilhar as pessoas.

— Essa vadiazinha gosta…

— Ela suporta — corrigi. — Suporta porque ainda tem esperanças em te tornar alguém melhor. Pena que ninguém mais tem. Você deveria valorizar ela, sabe? Porque nunca mais vai achar alguém que goste de você.

— Tá com ciúme, é? Porque ela não gostava de você. Nunca gostou.

— Eu não estou com ciúme, Edgar — falei tranquilamente. — Apenas acho que nenhuma mulher deve sentir o que ela sentiu ao ser humilhada. Acho que nenhuma mulher deve sentir o gosto de sangue na boca porque um covarde bêbado bateu nela. Eu sinto muito que você seja assim — empurrei-o. — Tente melhorar. Talvez o mundo não esteja perdido.

Ele tentou vir atrás de mim, mas alguns homens o seguraram no lugar. Ajoelhei-me ao lado de Sali e vi que Laura chorava no colo de minha namorada. Tão vulnerável… Senti apenas dó ao vê-la. Dó por ela finalmente ter sido destruída ao ponto de derrubar sua máscara tão firme. Apesar de tudo, ela não merecia aquilo.

— Pegue-a no colo, Guto. Não sei se ela vai conseguir andar — Sali disse baixinho.

Sem pensar muito sobre o assunto, passei meus braços por baixo do seu corpo e abri caminho por entre a multidão, que nos olhava de forma apiedada. Levei-a até um banco em um lugar menos movimentado.

— Eu vou pegar um pouco de água para ela — Sali disse ao se retirar.

E então eu estava a sós com Laura.

Por meses tinha temido aquela situação, pensando em quantas coisas eu queria ouvir e quantas palavras ainda precisava dizer. Mesmo assim nunca tinha me passado pela cabeça que realmente ficaria a sós com Laura, tendo todas as nossas lembranças pairando entre nós como um fantasma. Lembranças que nem mesmo me afetavam mais. Eram apenas parte do passado.

— Você está bem? — perguntei, sentando-me ao seu lado.

Ela assentiu, ainda trêmula. Parecia me temer.

— Obrigada, Guto — sussurrou depois de um tempo. — Não precisava ter feito isso por mim.

Desviei o olhar.

— Eu teria feito o mesmo por qualquer um — ou simplesmente não teria me aproximado da briga se fosse qualquer outra pessoa. Aquilo não significava, no entanto, que eu gostava de Laura. Significava que queria sentir o gosto do perdão em minha boca e provar a todos que eu era capaz de ainda proteger aquela que tinha me magoado.

Talvez eu estivesse tentando apenas provar para os outros que não era mais um cão ferido.

— Eu sei — e em sua voz havia sinceridade. — Você é corajoso. Sempre foi. Sempre foi capaz de enfrentar qualquer um por justiça.

Ela realmente falava sério? Virei-me e a olhei nos olhos. Não havia indício de falsidade em sua voz ou em seu olhar.

— Aquele dia que o Edgar te contou tudo — ela desviou o olhar envergonhada. — Você foi tão corajoso. Não abaixou os ombros. Não desviou o olhar. Provou que você era muito superior e de que eu tinha cometido um erro imenso.

Respirei fundo.

— Laura…

— Está tudo bem — ela sorriu um pouquinho quando me olhou de novo. — Eu não te merecia se tive coragem de fazer o que fiz. Já a sua atual namorada… ela sim. Ela te ama muito e provou isso somente te acompanhando lá no meio da briga. É possível ver no olhar dela o amor que ela sente por você. E eu fico feliz, de verdade, que você tenha encontrado alguém assim — seus olhos se encheram de lágrimas. — Droga, não era para eu chorar — ela virou o rosto para o outro lado e tentou limpá-lo.

— Não tem nada de errado em chorar — repliquei carinhosamente. Ela não me respondeu e aproveitei o momento para refletir um pouco sobre suas palavras. “Eu não te merecia se tive coragem de fazer o que fiz”. — Sabe, Laura, eu te perdoo — sussurrei, sentindo um peso sair de cima de mim. — Eu já te perdoei faz algum tempo, mas poder falar isso em voz alta é libertador. Eu te perdoo, Laura. De verdade.

Quando ela me olhou, pude ver novamente toda a sua vulnerabilidade. Ela começou a chorar copiosa e abertamente. Soluços escapavam de sua boca. Era o choro de uma criança que tinha perdido os pais; um som de partir o coração.

— Foi por isso que… não deixou que eu… sofresse um castigo… por ter te traído? — ela falou entre soluços.

— O que quer dizer?

— Aquele era o meu castigo — ela se referia à briga. — Por que não me deixou continuar lá? Por que foi me salvar? Foi porque você me perdoou?

Sorri comovido. Ela parecia tão real e alcançável naquela noite.

— Existem outras formas de pagar por um erro — disse o mesmo que tinha dito a Sali. — E aquela não era uma boa forma. Era demasiadamente cruel. Eu não podia deixar aquilo acontecer.

Ela soluçou mais alto.

— Me diga se você não podia deixar aquilo acontecer porque me perdoou. Eu preciso saber disso, Guto. Preciso.

Suspirei.

— Sim, Laura — sussurrei. — Eu não podia deixar aquilo acontecer porque te perdoei. Porque achei que não era uma forma de você pagar pelo erro que cometeu, erro que me trouxe… perdão por ter que te falar isso, mas foi um erro que me trouxe a melhor coisa da minha vida.

Ela abraçava seus joelhos.

— A sua namorada?

Assenti fracamente.

— Como alguém poderia pagar de forma tão cruel por um erro que fez tudo dar certo?

Laura simplesmente me encarou. Seus soluços cessaram aos poucos e suas lágrimas pararam de escorrer. Ela simplesmente me olhou com curiosidade e… devoção.

— Algum dia eu quero olhar para alguém da mesma forma que a sua namorada te olha — confessou. — Assim como quero que alguém me olhe da forma que você olha para ela.

— Você ainda vai achar alguém.

— Alguém que me ame de cabelo molhado e sem maquiagem? — ela inclinou um pouco a cabeça e sorriu.

— Alguém que te ame principalmente assim.

Ela suspirou e fechou seus olhos.

— Obrigada, Guto. Por mais do que ter me tirado daquele lugar. Por ter me perdoado. E também… por ter me mostrado como eu posso valer mais do que apenas um beijo em uma festa.

Não sabia o que responder. Por isso achei extremamente conveniente Sali chegar com uma garrafinha de água justamente naquele momento. Ela se desculpou pela demora justificando que a fila estava muito grande.

— Tudo bem — Laura sorriu gentilmente quando pegou a garrafa. — Posso saber o seu nome?

— Sabrina — Sali murmurou. Levantei-me e fiquei ao seu lado, entrelaçando minha mão na sua. Não pude deixar de notar o olhar triste que Laura lançou a aquele gesto.

— Você tem muita sorte, Sabrina, de ter o Guto ao seu lado. Eu não aproveitei isso e errei feio com ele. Mas, como ele mesmo disse, o meu erro resultou no melhor acerto da vida dele — ela sorriu. — E eu fico realmente feliz ao ver nos seus olhos que ele também foi o melhor acerto da sua vida. Vocês formam um casal lindo.

— Obrigada — ela respondeu, apertando mais minha mão. — Eu espero que você ache o melhor acerto da sua vida. Ele pode estar em qualquer lugar.

— Eu vou achar — ela assentiu. — E vou olhar ele com a mesma devoção que vocês se olham — desviou então o olhar para a garrafinha de água em sua mão e a levantou minimamente. — Obrigada. Não só pela garrafinha, mas por ter estado lá comigo.

— Tudo bem — Sali dispensou o agradecimento. — Espero que você fique bem, Laura.

— Vou ficar.

Quando um silêncio constrangedor pairou entre nós, resolvi sair daquele lugar o mais rápido possível.

— Tchau, Laura. E, se quer um conselho, se descomplique. Livre o caminho de tudo o que for ruim e limpe sua mente. Deixe as portas abertas e transforme o seu coração em uma grande campina, limpa e livre de qualquer coisa negativa. Acho que é a melhor coisa que você pode fazer.

Ela assentiu e, quando estava quase saindo de lá de mãos dadas com Sali, suas palavras me paralisaram.

— Você está fazendo isso desde que foi na minha casa pela última vez, não é, Guto? Você está se descomplicando.

— Quando deixamos o caminho cheio de entulhos, não conseguimos enxergar claramente — murmurei. — Quando limpei tudo, pude enxergar Sali. Talvez o mesmo ocorra com você.

— Eu realmente espero que sim. Adeus, Gustavo.

— Adeus, Laura.

E então eu parti, sentindo-me liberto e livre. Descomplicado. Sali segurava a minha mão fortemente e estava em silêncio, deixando-me em paz para considerar tudo o que tinha acontecido. Não tinha muito a considerar. Apenas o fato de que Laura tinha ganhado uma chance naquele dia. Chance de recomeçar. E se antes aquilo poderia ter me irritado porque eu achava que seu erro merecia um castigo, naquele dia apenas tinha me feito bem.

Afinal, todos erramos. E todos merecemos uma segunda chance baseada no verdadeiro amor. Talvez fosse a única forma de nos redimirmos, quando conseguíssemos amar alguém com corpo e alma. Imaginei de qual erro eu me redimia ao ter a companhia de Sali, mas aquilo não tinha tanta importância; eu tinha um amor de corpo e alma.

E aquilo era o suficiente para me transformar em uma pessoa melhor.


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Notas finais do capítulo

Geeeeeente ♥ É sério, eu tô muito in love com esse capítulo HSIAUDA
O que acharam do pedido de namoro do Guto? E da festa? E da briga? E do que o Guto disse pro Edgar? E da Laura? E da conversa? Me digaaaam ♥
Até a próxima sexta! Amo vocês ♥



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