Me olho no espelho, coloco os brincos dourados que, segundo minha mãe, eram da minha avó que já foi uma bruxa também. Sinto eles queimarem um pouco, mas nada comparado ao que era antes. Minhas luvas estão em cima da minha cama, uma acima da outra. De algumas semanas para cá, tenho evitado usa-las, para praticar mais o que tenho aprendido nesses últimos meses. Mas ainda tenho uns deslizes, e por isso hoje, no baile de Halloween, eu vou coloca-las, para evitar qualquer imprevisto. Estou usando um vestido que minha mãe também disse ser da minha avó. É todo preto, bem simples, com alças que prendem nos braços. Na altura do joelho, ele deixa a mostra minhas pernas pálidas e sem vida, por trás de uma meia de renda, que deveria me deixar sexy, mas só me deixa mais esquelética. Estou calçando sapatos de salto alto, segundo Cordelia, uma das poucas dicas que serviram de sua mãe ex-suprema Fiona Goode, seriam de como se vestir bem, e sinceramente ela ficava perfeita com saltos altos pretos e meias coladas.
– Serena - ouço a voz de Abby, e a olho pelo reflexo do espelho, com a cabeça para dentro do quarto e o resto do corpo para fora.
– Sim? - pergunto.
– Já vai começar - diz ela.
– Já estou descendo - digo.
– Agora, Serena. - diz ela, entrando no quarto e se aproximando de mim.
– Tá bom. - digo, e me aproximo da minha cama, pegando minhas luvas e vestindo minhas mãos. - Vamos.
Saímos do quarto, passamos pelas inúmeras portas do corredor e descemos as escadas. Antes de chegarmos ao final, Misty olha para mim, com seu vestido hippie preto, rindo e diz:
– Você está linda, Serena.
Olho para ela, dou um sorriso leve e desço mais ainda as escadas, parando no grande salão, onde vejo Cordelia, Queenie e Zoe paradas com drinks nas suas mãos.
Olho para os lados, e vejo Kyle servindo os drinks nas bandejas de prata, usando seu terno que lhe cai muito bem. Todas as meninas estão aqui para o baile de Halloween, todas vestidas com vestidos pretos maravilhosos.
– Finalmente, esquentadinha! - ouço a voz de Angie se aproximando de mim, enquanto ela está com os olhos arregalados e sorriso infantil e bobo.
– Angie! - ouço a voz de Kathy, que se aproxima de nós e segura Angie para ela não cair. - Você já bebeu demais.
– Que é isso! - fala Angie, alto. - Eu só tomei isso aqui. - e mostra um sinal com o indicador e o polegar, que mostra mais ou menos cinco centímetros.
– Claro que tomou - diz Kathy, irônica.
– Kathy! - fala Maggie, se aproximando de nós. - Ela está bem?
– Agora sim. - diz Kathy.
– Eu estou bem até quando estou mal! - fala Angie, alto, cuspindo whisky na cara de Maggie.
– Eu entendi, não precisa cuspir. - diz Maggie, limpando o whisky da sua cara.
– Atenção, meninas! - fala Cordelia, em alto e bom tom, para que todas possamos ouvir. - Agora, eu proponho um brinde.
Cordelia levanta a taça de whisky. E vejo Kyle se aproximando de mim com a bandeja, com várias taças de whisky. Eu, Abby, Kathy e Maggie pegamos as nossas. Kathy não deixa Angie pegar outra.
– A Serena! - diz Cordelia. - Que salvou este clã do que poderia ser o seu maior colapso.
– E que salvou minha vida. - diz Misty, rindo e levantando o copo.
Um brinde para mim? Nunca me senti tão honrada. E não, não estou sendo irônica. Realmente é uma honra receber um brinde de pessoas superiores a você. Do mesmo jeito que o Harry Potter recebeu o brinde por ter salvado Arthur Weasley no quinto filme. E sim, eu li todos os livros e vi todos os filmes de Harry Potter. E minha concepção de bruxos e bruxas era bem diferente até eu descobrir que era uma.
– Serena. - dizem todas as meninas em coro, levantando os copos, e bebendo.
– Uhu, Serena! - grita Angie, rindo e pulando, com o copo no alto. - Kyle, coloca mais!
– Não, Kyle. - diz Kathy.
Ouço um barulho de vidro se quebrando. Em seguida, vejo um dardo atingindo o ombro de Angie, fazendo-a cair no chão.
– Meu Deus! - grita Kathy, se abaixando para ver Angie.
Me abaixo também, apavorada. Deixo meu copo com whisky cair, e olho nos arredores, vejo Misty, Cordelia e Zoe se aproximando. E uma janela quebrada. Acho que o dardo veio de fora da casa.
Examino direito o dardo, com cuidado e minhas mãos com minhas luvas tremendo. Solto-o do ombro de Angie, e olho para ele. Parece um dardo convencional, a não ser por um pequeno papel preso nele por um barbante. Solto o barbante, e abro o papel dobrado, lendo o que tem escrito:

Queimem a bruxa.