Another life escrita por Aislyn


Capítulo 1
...e, então, fechou seus olhos e sorriu...


Notas iniciais do capítulo

Fanfic escrita para o desafio 15 x 30 de fevereiro. E estou atrasada com a postagem, pois era pra ter terminado ontem, mas demorei muito pra conseguir desenvolver e passar pro note.

Espero que agrade... >.



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Não importava o quanto estivessem preparados para uma guerra, não importava que soubessem que muitas vidas seriam perdidas dos dois lados da batalha, porque no final das contas, uma morte era sempre triste, era sempre sinal de perda. E a morte de alguém querido era extremamente mais dolorosa que de um simples conhecido.

O amigo morreu em seus braços, um corte profundo demais em seu abdômen para lhe dar qualquer esperança de que fosse sobreviver. Chorou sobre seu corpo, abraçando-o e lamentando tê-lo perdido sem dizer o que sentia. Guardou aquele sentimento por tantos anos, esperando que bons tempos de paz chegassem naquelas terras para que pudessem ter um futuro, e agora se arrependia por ter guardado tudo para si.

Quando a sua vez de morrer chegou, alguns anos mais tarde, devido à idade avançada e não à guerra, ainda carregava consigo o arrependimento e aquele sentimento único. Pensou que com o passar do tempo iria esquecer ou amenizar, mas não foi o que aconteceu, pois a cada dia, a cada mês, a cada ano, se sentia mais solitário e vazio, mais arrependido por nunca ter se confessado.

* * *

Aquele era seu protegido, não tinha dúvidas. As descrições físicas batiam perfeitamente: estatura baixa, muito magrinho, olhos de um castanho extremamente claro, quase pendendo para o mel e cabelos também castanhos e curtos. Talvez tivesse algum parente estrangeiro. Também tinha a expressão perdida e solitária, olhando ao redor como se esperasse alguma coisa, ou alguém. Não devia ter mais do que 7 ou 8 anos.

Seu olhar carregava sofrimento demais para alguém tão jovem.

O anjo se aproximou devagar, notando que o olhar do garoto agora acompanhava algumas crianças que brincavam no pátio da escola, correndo para lá e para cá atrás de uma bola. Conseguia sentir sua vontade em participar, um brilho em seus olhos, esperando que alguém o convidasse a brincar, mas no fundo, ele sabia que isso não aconteceria. Ele era o garoto novato e estranho, que ficava andando pelos cantos, tímido demais para falar o próprio nome, que sentava no fundo da sala e não participava de nenhuma atividade em grupo.

Ele não pedira para ser assim, mas não conseguia mudar ou se aproximar das outras crianças. Passava tempo demais viajando, tempo demais apenas na companhia dos pais e quando estava cercado por tantas pessoas diferentes, era normal se sentir acuado.

O garotinho olhou de repente para o lado, encarando o ponto exatamente onde o anjo estava, uma expressão confusa surgindo em sua face. O anjo sorriu, entendendo sua confusão. Ele podia sentir sua presença, mesmo que não o visse.

Alguns segundos depois, tendo a certeza que era culpa de sua imaginação sentir uma presença estranha que não existia, o pequeno Mikaru voltou a prestar atenção nas outras crianças, suspirando derrotado. Não adiantava ficar ali, não seria notado. Levantou-se do banco de pedra com desânimo, voltando para a sala de aula, onde a professora iria lhe fazer companhia até o fim do almoço.

* * *

Num certo dia, foi permitido que Mikaru faltasse às aulas, mesmo sem pedir. Não estava doente, não se sentia mal e nem estava machucado. Porém, enquanto brincava sozinho no quarto já vazio, seus pais encaixotavam os móveis pela casa.

Ele sabia o que viria a seguir: iam se mudar novamente. Nova cidade, nova casa, nova escola e nenhum amigo. Não havia tempo para isso. Quando começava a decorar o nome de algum coleguinha, ele tinha que sair da escola e se mudar para outra. Olhavam pra ele com curiosidade quando chegava e isso o intimidava, então demorava a se enturmar, e quando conseguia um ‘oi’, sabia que devia dizer um adeus a seguir.

– Oi… posso brincar com você? – Mikaru olhou para a porta, encontrando um menino parado no batente, um pouco mais velho que ele, talvez com seus 12 anos, com cabelos de fios negros e lisos, quase chegando aos ombros.

Ele não conhecia o outro garoto, nunca o vira na vizinhança ou na escola, mas se os pais o deixaram entrar em casa é porque não era um estranho. Ou talvez tivesse entrado ao encontrar a porta aberta enquanto os mais velhos tiravam os móveis para colocar no caminhão.

– Eu estou me mudando… – avisou para o visitante, dando de ombros e continuando a brincar com seus blocos de lego.

O anjo, agora na forma de uma criança, se perguntava como alguém tão jovem podia ser tão desconfiado e tão pessimista. Os pais até que tentavam, mas pelo visto, não o estavam criando muito bem. E era por isso que estava ali, precisava concertar as coisas, antes que fosse tarde demais.

Havia escolhido aparecer para a criança como um igual ao invés de um adulto por pensar que assim seria mais fácil de conversarem e se entenderem.

– Eu vi… seus pais estão tirando tudo da casa. – e sem esperar convite, o anjo sentou ao seu lado, pegando alguns blocos para empilhar – Você... queria ficar aqui?

– Tanto faz… – Mikaru respondeu sem rodeios e com total desinteresse, continuando a brincar, alheio ao outro garoto.

– Pra onde vocês vão?

– Não sei.

O anjo começou a se preocupar com o tom do garoto, desprovido de ânimo, sem nenhuma vida ou vontade. Queria ver novamente aquele brilho no olhar, quando ele estava com vontade de brincar com as outras crianças!

– Vamos aproveitar enquanto eles não terminam e dar uma volta? Ou brincar nos fundos da casa?

– Não.

– Por que?

E recebendo um levantar de ombros como resposta, Mikaru começou a recolher as peças, guardando-as dentro de uma caixa, depois levantando e levando-a consigo enquanto saía do quarto.

– Espera! Posso ir com você? – o anjo seguiu-o rapidamente, puxando-o pela manga da camisa. Não ia desistir tão fácil. Não ia desistir do seu protegido.

– Eu vou me mudar. – repetiu o que dissera antes, como se isso explicasse todo o resto. E, para Mikaru, realmente explicava.

– Posso ir com você? – repetiu o pedido em tom urgente, os olhos brilhando com lágrimas que se formavam. Ele precisava que o garoto o aceitasse também, ou tudo seria em vão.

– Meus pais não vão deixar você ir. – Mikaru se soltou do garoto, mais uma vez tentando sair do quarto e novamente sendo impedido.

– Eles não precisam saber, não vou deixar eles me verem. – parou a sua frente, obrigando o pequeno a encará-lo – Eu não tenho pais… nem amigos… Por favor?

O que o anjo dissera não era exatamente verdade, afinal tinha seus companheiros, outros iguais a ele, e podia considerá-los uma família, mas não eram parentes de sangue.

A última afirmação parecia ter afetado o garoto, que pela primeira vez o encarou com atenção. Eles eram iguais.

– Prometo que não vou estragar seus brinquedos, nem mexer nas suas coisas, nem comer sua sobremesa. – e antes que terminasse de falar, o pequeno acenou, concordando que ele viesse junto, ganhando um sorriso enorme de volta.

* * *

Com o passar do tempo, Mikaru notou que o amigo não mentira quando dissera que seus pais não precisavam saber que ele iria junto. Ou seus pais ignoravam o garoto ou realmente não o viam.

E aos poucos comprovou que era a segunda opção.

Quando pediu dois pedaços de torta de sobremesa no jantar, a mãe disse que não podia, pois ele mal conseguia comer um, mas quando afirmou que o outro pedaço era para o amigo e apontou para o lugar ao seu lado na mesa, os pais trocaram olhares preocupados.

Numa outra ocasião, a professora passou um trabalho em dupla e quando os pais perguntaram porque nenhum amigo viera fazer com ele, Mikaru disse que um amigo veio sim, o mesmo que o acompanhava ultimamente.

O último fio de sanidade dos pais foi testado quando ouviram o filho rir alto no quarto e quando se aproximaram, ouviram ele conversando e fazendo pausas, como se alguém estivesse respondendo. Ao abrir a porta e encontrá-lo sozinho, como era óbvio que aconteceria, começaram a temer que o garoto estivesse ficando louco, ou pior… que o lugar fosse assombrado.

Não demorou muito e estavam fazendo as malas novamente. Aquele lugar não era bom. O filho não estava se adaptando e agora via e ouvia fantasmas. Procuraram a ajuda de uma psicóloga que avisou que era normal ter um amigo imaginário naquela idade, que era um reflexo por ele ser tão tímido e solitário, mas os pais foram céticos, dizendo que não existia essa história de amigo imaginário.

Precisavam ir para alguma cidade grande ou capital, ali sim encontrariam um bom especialista que ajudaria o filho com aquele problema. Mikaru apenas observava aquela comoção, não entendendo pra que tanto alarde.

Naquela noite, o anjo avisou que precisaria ir embora, caso contrário os pais não o deixariam em paz. Mikaru não gostou muito daquela ideia, seu lado egoísta não queria perder o amigo, disse que ele só precisava deixar que os pais o vissem, mas sabia que não seria possível, afinal seu amigo era especial.

O amigo disse também que, se Mikaru quisesse, ele voltaria um dia e voltariam a ser amigos como eram agora, mesmo que não se lembrasse dele. Mikaru aceitou na mesma hora, dizendo que seria impossível esquecer dele, mas o anjo sabia que isso aconteceria um dia, pois era assim que devia acontecer.

– Vai ficar aqui essa noite? – queria aproveitar a companhia do outro garoto, mesmo que fosse só mais um pouco. Ficaria acordado a noite toda se fosse preciso.

– Vou sim, pequeno. Vou ficar velando seu sono. – esperou que o garotinho se ajeitasse na cama, deitando ao seu lado.

O anjo havia conversado com seu superior na noite passada e ele o parabenizou, dizendo que tudo estava saindo como deveria, o garoto havia se desenvolvido bastante, mas aquela abordagem não teria o mesmo efeito a partir daquele instante. O garoto precisava crescer com o próprio esforço, sendo observado apenas de longe e, a seguir, receber um outro tipo de acompanhamento.

Ele mesmo continuaria a protegê-lo, mas de outra forma. Seu pedido para voltar a ser um humano havia sido atendido. E, claro, ele também não se lembraria de tudo que havia acontecido, nem de tudo que passaram juntos, mas isso não importava, pois ele estava feliz com o presente.

Ajeitou o garoto em seus braços, novamente em sua forma adulta, pela última vez como anjo e, então, fechou seus olhos e sorriu. Sua missão estava completa.


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Notas finais do capítulo

Achei essa cena final um pouco corrida... sem falar que terminar exatamente com essa frase, como pedia o desafio, me deixou com poucas opções, ou não soube trabalhar bem com o que tinha.

Bom, num geral, eu gostei. Gosto de histórias com anjos ^-^

Até a próxima!



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