Nem Todo Mundo Odeia o Chris - 3ª Temporada escrita por LivyBennet


Capítulo 19
Todo Mundo Odeia Ex-presidiário


Notas iniciais do capítulo

Ei, gente 0/ #seescondendo #caradepau
Agora que vim postar esse cap., olhei para a página de atualizações e pensei: "Que droga, faz dois meses que não dou as caras. Vergonha de mim."
Sorry, guys, mas minha vida estava wild esses dois meses e agora consegui tempo para terminar o cap. e postar.
Para vocês terem noção do quão wild minha vida estava, eu estava escrevendo o cap. dentro do ônibus. Observem o nível...
Mas deu certo, e aqui está ele para deixar seu feriado mais feliz.. ^^
Enjoy...

P.S.: Ironicamente o capítulo tem algo a ver com independência... Não foi de propósito, juro... #euacho



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POV. LIZZY (Brooklyn - 1986)
       Eu estava frustrada. Imaginei que depois da semana que passei na casa do Chris, do que quase aconteceu lá e do show incrível que fomos, eu deveria estar mais feliz. E eu estava! Tudo estava ótimo com o Chris - incrível até -, nunca mais havia visto nem a sombra da Tasha, Daniel e Chris não tinham brigado - já que o Dan está me evitando um pouco desde que soube que eu estava dormindo na casa do Chris— e eu tinha todo o tempo do mundo para fazer o que eu quisesse. Era um sonho para qualquer um, não? Sim, menos para mim. Todo o resto estava perfeito, menos a parte do excessivo tempo livre. Agora minhas atividades da escola estavam sempre em dia. Mas quando eu terminava tudo, arrumava a casa, fazia a comida e lavava a louça, nada mais sobrava para fazer além de assistir TV e ler. Eu amava ler e escutar música, e nas primeiras semanas foi até legal ter todo aquele tempo para mim, mas depois de três meses morando sozinha, eu precisava desesperadamente me ocupar.
       Quando percebi isso, comecei a procurar emprego, estágio, qualquer coisa, mas eu havia procurado por dias e não tinha encontrado nada. Para piorar isso, Greg chegou na escola dias depois dizendo que havia arranjado um emprego de auxiliar na Biblioteca de Nova York. Não que eu não esteja feliz por ele - afinal, o Greg trabalhando é uma evolução e tanto -, mas ele nem estava procurando. Não era exatamente justo. Foi nesse ponto de frustração, meio desespero e quase inveja de um dos meus melhores amigos que vi algo que me animou.
       Na ponta oposta de onde ficava o Doc’s na rua tinha um ponto de esquina que sempre esteve fechado desde que me mudei para Bed-Stuy. Em um dos dias que eu voltava para casa depois de procurar emprego, vi que tinha vários materiais de construção do lado de fora, a porta estava aberta e alguns homens trabalhavam lá dentro. Fiquei curiosa sobre o que seria lá. Continuei andando devagar, mas ainda olhando para o lugar. Então notei que uma garota negra, mais ou menos da minha idade, com uma sacola de compras nas mãos, ia entrar lá. Me adiantei e consegui alcançá-la na calçada antes que entrasse.
       “Oi?” Ela me olhou e logo um ar de surpresa tomou seu rosto, provavelmente devido à minha cor.
       “Oi.”
       “Desculpa te abordar assim sem nos conhecermos, mas é que eu estou curiosa. O que vai ser aqui? Moro nessa rua há anos, e o ponto sempre esteve fechado.” Um leve sorriso apareceu em seu rosto.
       “Ah. Minha tia alugou e agora está reformando. Vai ser uma lanchonete.”
       “Nossa, que legal! Vai ficar ótimo. Todo mundo que mora para cá tem que andar umas quatro quadras até achar uma lanchonete.” Ela assentiu e logo me olhou interessada.
       “Ei, você mora por aqui, não é?” Assenti, ainda que um pouco confusa. “É que minha tia idealizou uma lanchonete para garotas, então todas as garçonetes têm que ser garotas. Imaginei se você não estaria interessada.”       Devo ter ficado com cara de muito chocada porque ela me olhou preocupada.           “Oi? Está bem?” Sacudi a cabeça, me alertando, e assenti.
       “Sim. É que fiquei muito surpresa. Na verdade, eu estava mesmo procurando emprego.”
       “Que coincidência! Tenho certeza que minha tia vai adorar te conhecer. Ela está aqui. Quer entrar?”, ela perguntou, indicando a porta.
       Assenti e a acompanhei enquanto ela continuava falando.
       “Está até organizado hoje; em geral os rapazes são muito bagunceiros…”
       Era um espaço grande. Pelo que dava para supor da reforma, a cozinha seria semiaberta e haveria uma porta baixa ligando-a à área da frente. Essa área seria separada da área dos clientes por um balcão comprido, que tinha uma falha no final para acesso à parte de trás do balcão e onde ficava outra porta - provavelmente para a entrada e saída de funcionários.
       “Vai ficar bem bonito.” Ela assentiu.
       “Sim. Minha tia tem ótimas ideias para essas coisas. Ela era sempre a melhor quando esteve na p-” Ela se interrompeu bruscamente - sua expressão me dizendo que ela quase falara algo que não deveria -, mas logo se recompôs e sorriu de novo. “Ela está aqui dentro”, mas ao invés de passar para o outro cômodo, ela me olhou de forma interrogativa. “Desculpe, acho que não perguntei seu nome. Que falta de educação.”
       “Lizzy. E o seu?”
       “Rachel. É um prazer.” Ela estendeu a mão livre da sacola, sorrindo, e eu a apertei.
       “Igualmente.”
       Dessa vez entramos e vi um espaço pequeno com uma cozinha improvisada, onde três homens negros vestidos com uniformes azuis conversavam e uma mulher negra e jovem cozinhava. Eles viraram para olhar a porta quando entramos. A mulher adiantou-se e falou:
       “Trouxe o que pedi, Rachel?”
       “Sim, tia.”
       A mulher pegou a sacola nas mãos da sobrinha e colocou-a em uma pequena mesa. Depois virou-se para mim, sorrindo.
       “E você, flor? Como se chama?”
       “Lizzy.”
       “Eu me chamo Donna”, ela disse e estendeu a mão, que eu apertei.
       “É um prazer.” Assenti e sorri em retorno.
       “Tia, ela disse que está interessada no emprego.”
       Observei o sorriso da mulher aumentar.
       “Ah é? Que ótimo. Rachel, pode terminar o almoço dos meninos para mim? Quero ter uma palavrinha com a Lizzy.”
       “Claro, tia.”
       Donna saiu pela porta por onde eu e Rachel tínhamos entrado, voltando para o espaço que seria dos clientes. Ela puxou uma das mesas e duas cadeiras que estavam meio empilhadas e as limpou, me convidando a sentar de frente para ela.
       “Então, Lizzy, não é? Se interessou em trabalhar aqui?”
       “Sim. Eu já estava procurando emprego, então falei com a Rachel por acaso. Fiquei muito feliz em ser tão perto da minha casa.”
       “Mora nessa rua?”
       “Sim. Tem uns quatro anos.” Ela assentiu, mas logo em seguida me olhou seriamente.
       “Bom. Sou muito correta com as coisas que faço, por isso acredito que ser honesta é a melhor coisa. Contarei a você algo que pode fazê-la mudar de ideia sobre trabalhar aqui.” Franzi o cenho, confusa.
       “Não consigo imaginar o que seria.”
       “Sou ex-presidiária. Passei 6 anos na cadeia por roubo.”
       “O-o quê? M-mas como assim?” Eu jamais diria isso sobre ela se fosse julgar pela aparência. Ela parecia tão correta. “Imagino que tenha acontecido algo que fizesse sua ação necessária.” Ela me deu um leve sorriso.
       “Vejo que você vê o melhor nas pessoas, mas não, eu não tive nenhuma justificativa para o que fiz. Errei, paguei pelo meu erro e agora estou tentando me redimir. Ser alguém melhor.”
       Assenti levemente, gostando da pessoa que via a minha frente. Era muito difícil dar a volta por cima daquela maneira, principalmente porque ela nunca deixaria de ser discriminada pelo seu erro. Admirei a mulher, e por essa admiração não a discriminaria.
       “Então”, disse com um sorriso, “se a senhora quiser posso começar assim que terminar a reforma.”
       Ela me olhou; sua expressão bastante surpresa. Obviamente não esperava que eu não ligasse para o seu passado. Imaginei quantas garotas já haviam desistido do emprego por esse motivo fútil. Mas logo sua surpresa se transformou em uma expressão leve de alívio.
       “Obrigada. Vou gostar de ter você trabalhando aqui. Mas não me chame de senhora. Não sou tão velha assim. Apenas Donna.” sorri, assentindo.
       “Também acho que vou gostar daqui, Donna.”
       Conversamos por mais alguns minutos: ela me explicou os horários que iria estabelecer, falou sobre o uniforme e do pagamento. Logo depois, apertamos nossas mãos e nos despedimos. Saí de lá feliz e com uma grande ansiedade de contar tudo ao Chris.

POV. CHRIS
       Pude ver o Doc me olhando pelo canto dos olhos, mas ignorei. Por mim ele podia até me interrogar, eu estava feliz demais para me incomodar com qualquer coisa. Eu e a Lizzy estávamos bem de novo, e por mais que eu tivesse ficado um pouco triste quando ela voltou para a casa, reconheci o progresso que fizemos. Estávamos mais unidos, e aquilo que quase aconteceu na primeira noite dela na minha casa ainda me deixava tonto. A lembrança era suficiente para me fazer sorrir como um idiota. Por birra minha, eu ainda não estava falando direito com o Drew. Não que ele tenha feito de propósito, mas ele havia atrapalhado algo que eu queria muito e, obviamente, eu não deixaria barato. Algumas vezes tive pena porque ele não fazia a mínima ideia do porquê de agora eu ficar mudo perto dele.
       Me tirando dos meus pensamentos, a voz do Doc se fez ouvir:
       “Está bem feliz, não é?” Assenti, de costas para ele, para esconder meu sorriso. “Que bom. Imagino que o problema que estava fazendo você surrar minhas caixas de leite tenha se resolvido.”
       “Não completamente, mas está quase lá.” Ouvi a risada dele por trás do jornal.
       “Você conversou com ela?”
       “Sim”, respondi, sem nem ligar se estava me entregando ou não. Ele já sabia de quase tudo mesmo, e eu já estava cansado de esconder.
       “Te disse que daria resultado.”
       “Eu sabia que daria, mas não na hora que você falou. Esperei o momento certo.”
       “Claramente funcionou. Você sorri até para o vento agora.”
       Cocei o nariz para disfarçar o sorriso; a campainha da porta tocou, me poupando a resposta.
       “Beleza, Doc? Carinha que mora logo ali! Deixa eu segurar um dólar.”
       Antes que eu pudesse responder, Doc interveio.
       “Na minha loja não. O garoto está trabalhando. Coisa que você também devia fazer.” Jerome fez uma careta com a sugestão.
       “Isso não rola comigo não. Vim aqui perguntar se estão sabendo da novidade?” Continuei trabalhando, mas com a atenção na conversa dos dois.
       “Que novidade?”
       “Vai abrir uma lanchonete no outro fim da rua. Estão dizendo que vai ser só de garçonetes e que a dona é uma ex-presidiária.” Nossa. Que tipo de garota vai trabalhar naquele lugar…
       “Interessante… Parece que vai ficar movimentado por aqui…”
       Depois disso eles começaram a especular sobre a dona da lanchonete e eu desisti de ouvir. Por um lado achei bom a ideia da lanchonete; a mais próxima ficava a n quadras de distância. Por outro, achei suspeito demais… Como um ex-presidiário tem grana para colocar uma lanchonete? Não costumo julgar ninguém, mas é suspeito…
       O tempo acabou passando rápido e logo eram 18h. Me despedi do Doc, e ele ficou para fechar a loja. Como já havia se tornado um hábito, antes de ir para casa, passei na casa da Liz para saber como ela estava. Subi as escadas, e meu nariz me levou até a cozinha. Abri a porta do corredor que dava para a cozinha bem devagar e lá estava ela com as panelas.
       “Oi?”, cumprimentei, vendo-a erguer a cabeça enquanto eu entrava e fechava a porta.
       “Oi. Tava só esperando você chegar.” Fui até ela e a abracei. Ela tentou me afastar, alegando que estava com cheiro de cozinha.
       “Eu não ligo”, e a mantive no abraço.
       “Tenho algo bom para te contar.”
       “O quê?”, perguntei, soltando-a com um olhar curioso.
       “Consegui um emprego.”
       Por um segundo fiquei feliz, mas logo notei a situação se encaixando.
       “Por favor, me diz que não é naquela lanchonete.”
       Ela me olhou estranho.
       “Por quê? Qual o problema?”
       “Qual o problema? Vai mesmo trabalhar para uma ex-presidiária? Você nem conhece ela!” Pude notar sua raiva pelo meu comentário.
       “E você também não! Por que está julgando ela desse jeito?”
       “Porque é o que todo mundo faz. Você me ensinou a desconfiar das pessoas, por que está confiando nela do nada?”
       “Porque eu vi que ela é uma boa pessoa.” Fiz meu melhor, mas não consegui reprimir meu riso debochado.
       “E percebeu isso como? Em uma conversa de cinco minutos? Pelo amor de Deus, você é mais crítica que isso, Lizzy.”
       “Sim, eu sou, mas no presente momento não estou a fim de julgar alguém pelo que aconteceu no passado. As pessoas podem mudar, Chris!”
       “Podem, mas que prova você tem?”
       Ela não respondeu, apenas cruzou os braços na frente do corpo e desviou os olhos para o chão. Eu sabia que aquilo não significava que eu havia ganho a discussão. Ela não desistiria tão fácil. Então optei pela bandeira branca.
       “Olha,” comecei com um tom de voz mais suave, “a gente tem estado bem ultimamente, e eu não quero estragar isso. Podemos conversar de cabeça fria depois.”
       Ainda sem me olhar, ela assentiu. Mesmo com receio de ser rejeitado, me aproximei e a abracei. Após alguns segundos de resistência, ela me abraçou de volta. Beijei o alto da sua cabeça e murmurei, mais para mim que para ela:
       “Só estou preocupado com você.”
       Sua cabeça balançou em sinal de concordância, e sua voz veio abafada pelo abraço:
       “Eu sei. Eu vou ficar bem.”
       Não respondi, mas me afastei para que ela pudesse ver pelo meu rosto que eu não tinha certeza daquilo.
       “Boa noite.”
       “Boa noite.”
       Saí de lá com o peito meio pesado, mas um pouco aliviado por não termos brigado a sério.

No fim das contas, a conversa de cabeça fria nunca aconteceu porque, aparentemente, nenhum dos dois queria tocar no assunto. A paz que ainda estávamos construindo era frágil e não queríamos destruir o pouco que tínhamos erguido por um motivo daqueles. Nisso a semana passou. Nos falávamos normal, e o emprego dela na lanchonete não veio à tona. Juro que lá pelo fim da semana eu já estava esquecendo sobre o assunto quando ela apareceu no Doc à tarde com outras duas garotas.
       Uma era negra e me lembrava levemente a Tasha, e a outra era branca e loira. Não reconheci nenhuma das duas como sendo da vizinhança. Lizzy cumprimentou o Doc e veio na minha direção com as outras duas.
       “Oi, Chris.”
       “Oi. Quem são?”
       “São as meninas da lanchonete. Essa é Sarah”, ela disse, apontando para a garota negra, “e essa é Emily. Meninas, esse é o Chris, meu vizinho.” Cumprimentei as duas com um sorriso e ela sorriram de volta.
       Mesmo ainda não gostando da ideia de ela trabalhar na lanchonete, era bom vê-la fazer novas amigas. Normalmente ela não se enturmava. Por isso, guardei minha opinião para mim e falei normalmente.
       “Está dando um tour para elas?”
       “Não. Viemos buscar os mantimentos da lanchonete. Donna vai inaugurar amanhã.” Tentei não demonstrar emoção e só assenti.
       “Você devia ajudar as meninas a levar os mantimentos, Chris. É bastante coisa”, o Doc sugeriu, e eu o fuzilei com os olhos.
       Durante a semana, ele tinha conseguido arrancar de mim (ou eu é que estou ficando com a boca frouxa) o motivo da minha cara amarrada. Acabei contando sobre a quase briga com a Lizzy. Para piorar ele ficou do lado dela, então encerrei a conversa por ali.
       “Não precisa, Doc”, Lizzy interviu. Ela pareceu receosa de outra briga e queria evitar. “A gente dá conta.”
       Não me manifestei e elas foram até o balcão pegar as sacolas que o Doc tinha separado mais cedo e eu não soube para quê. Acabei por ver que eram sacolas demais para elas levarem sozinhas, mas ainda assim não me mexi. Eu não queria ir naquele lugar. Mas um olhar de advertência do Doc foi a gota. Bufei, contrariado, mas desamarrei o avental e fui até o balcão. Sem dizer nada, peguei uma sacola de cada uma delas e fui em direção a porta.
       “Volto logo, Doc.” Ele resmungou ok e eu sai, vendo pelo canto dos olhos as três me seguirem.
       Ficamos em silêncio por alguns segundos, mas a garota chamada Sarah puxou conversa comigo.
       “Então, Chris, você e a Lizzy se conhecem há muito tempo?”
       Encarei brevemente a garota e troquei um breve olhar com a Lizzy; ela não parecia incomodada, então tomei aquilo como um sinal de que podia falar.
       “Tem quase quatro anos. Estudamos juntos desde a sexta série.”
       “Ai, que legal! Melhores amigos, vizinhos e colegas de classe. Meu namorado e eu também somos assim. Fora a parte de estudarmos juntos.”
       Usei todo o controle que tinha sobre o meu corpo para não tropeçar e derrubar as sacolas no chão. Ao invés disso, não respondi e desviei os olhos para o outro lado, tentando acalmar meu coração acelerado. Ouvi o riso sem graça da Lizzy e imaginei que tom de vermelho ela estaria.
       “Nós não somos namorados, Sarah. Só melhores amigos.”
       A voz da outra garota, Emily, se fez ouvir:
       “Ah, que pena. Vocês ficam tão fofos juntos. Rachel viu vocês voltando para casa na semana e jurou que eram namorados.” Eu odiei admitir para mim mesmo, mas nessa hora tive certeza que meu rosto esquentou. Não é a primeira vez que pensam isso de nós…
       Nenhum de nós respondeu e logo chegamos à lanchonete. A parte de fora estava pintada com um leve tom de roxo com algumas bolinhas azuis espalhadas. Algumas janelas de vidro e um letreiro grande Donna’s completavam a imagem. Na porta da lanchonete, elas pegaram as sacolas de volta e agradeceram.
       “Obrigada pela a ajuda, Chris”, Sarah agradeceu. “Aparece amanhã para a inauguração.” Só que não...
       “Vou ver se dá para vir.”
       Sarah e Emily entraram e Lizzy ficou para falar comigo.
       “Obrigada. Não achei que você viria.”
       “E eu não vinha. Mas seria muito sacana da minha parte deixar vocês trazerem aquilo tudo sozinhas.” Ela sorriu, concordando.
       “Vou entrar. A gente tem muita coisa para organizar. Até mais tarde.”
       “Até mais.”
       Ela entrou, e eu dei uma última olhada na lanchonete antes de descer para o Doc’s.
       Quando voltei para casa à noite, vi todas as luzes da casa dela apagadas. Olhei para o começo da rua; dava para ver de longe as luzes da lanchonete. Suspirei e entrei em casa.
       Depois da aula no dia seguinte, ela mal me deu tchau quando desceu do ônibus; foi correndo para lá. Apesar da minha opinião sobre o assunto, vi que ela estava feliz com aquilo, e então talvez, apenas talvez, eu pudesse me acostumar com ela trabalhando lá. Afinal, era melhor do que um emprego longe de casa.
       Balancei a cabeça para evitar ficar pensando nisso e comecei a descer a rua para o trabalho.

POV. LIZZY
       No dia da inauguração, eu cheguei na lanchonete eufórica. Donna havia me colocado no turno da tarde porque eu estudava pela manhã, então eu entrava no mesmo horário que o Chris entrava no Doc’s. Entrei, cumprimentei algumas meninas do turno da manhã que ainda estavam lá e fui para a sala dos fundos me trocar. Já tinha alguns clientes, a maioria homens, mas já esperávamos isso.
       Na sala dos fundos, encontrei Sarah, Emily e mais duas outras garotas se trocando perto dos nossos armários.
       “Boa tarde, meninas”, cumprimentei.
       “Boa tarde, Lizzy.”
       Donna tinha nos entregado os uniformes no dia anterior, e nós tínhamos adorado. Era um conjunto blusa-saia azul claro com alguns detalhes lilases. A blusa era de botão com o logo da lanchonete nas costas; as mangas iam até metade do braço. A saia era xadrez azul e lilás, meio rodada, tinha dois bolsos laterais e era curta para os meus padrões, então preferi levar um short para colocar por baixo. Mas a parte mais legal do uniforme eram os patins. Eles eram lilases com detalhes azuis para equilibrar as cores da roupa.
       “Sarah, você ficou tão bem no uniforme”, comentei, vendo-a se olhar no espelho.
       “Eu adorei. Fiquei um pouco tensa com a parte dos patins, mas quando vi que eles têm duas fileiras de rodas me tranquilizei. É bem mais fácil de se equilibrar.” Eu e as outras meninas concordamos.
       Me troquei, guardei minhas coisas no armário e fui para o salão da lanchonete. Passei para trás do balcão onde Rachel estava e a cumprimentei. Donna estava na cozinha semiaberta já cozinhando.
       “Oi, Donna.” Ela virou para me olhar e sorriu.
       “Oi, querida. Ficou linda no uniforme”, ela elogiou depois de me olhar. Sorri em agradecimento.
       “Já posso começar?”
       “Claro. Pergunte a Rachel como estão os pedidos. Ela está responsável pelo caixa e pelas mesas.” Assenti e me aproximei da Rachel.
       “Pronta para começar?” Assenti.
       O barulho da porta se fez ouvir e erguemos os olhos para ver um casal entrando. Rachel me olhou e indicou os dois com a cabeça.
       “São todos seus.” Assenti.
       Amarrei o cabelo em um rabo de cavalo, peguei um bloquinho de notas, uma caneta, o cardápio, e respirei fundo. Observei-os escolher uma mesa e se sentarem, então fui até eles com meu melhor sorriso.
       “Boa tarde. Posso pegar o seu pedido?”

No fim, eu acabei me adaptando bem rápido, só tive de me entender com os patins. Mas a Donna tinha razão: era muito mais fácil de se mover depois que você se acostuma. Quase ia derrubando um milkshake quando, sem querer, tropecei na perna de uma cadeira que um cliente havia deixado fora do lugar; sorte que o próprio dono do milkshake me salvou, equilibrando a bandeja nas minhas mãos. Além disso, nada de ruim aconteceu.
       Nisso a semana passou, rápido agora que eu estava ocupada. Me surpreendi ao realmente gostar do trabalho. Era simples: se eu anotasse os pedidos direito, minha mente ficava livre para pensar. Mas como era minha primeira semana, preferi focar em aprender o que tinha de fazer. Fiquei tão concentrada que Rachel quase sempre precisou me lembrar que meu turno tinha acabado, às 18h. Na sexta, depois do fim do turno, as meninas já estavam na sala dos armários se trocando e conversando. Aproveitei o falatório e fui pegar minhas coisas, mas elas não me deixaram de fora.
       “E aí, Lizzy? Estamos combinando de sair para comer comida chinesa. Quer vir?” Fiz uma leve careta de indecisão.
       Eu adorava comida chinesa. Era como minha paixão culinária depois da cozinha italiana, mas eu estava muito cansada. Era a primeira vez que eu trabalhava na vida, então meu corpo não estava acostumado. Acabei deixando para a próxima, e todas continuaram a conversar. Me despedi delas e da Donna, já desejando minha cama. Saí da lanchonete sem prestar muita atenção ao meu redor, sendo surpreendida por uma voz familiar:
       “Vai me ignorar mesmo?” Virei na direção da voz, assustada, mas suspirei aliviada ao ver Daniel encostado calmamente na parede da lanchonete.
       “Desculpe, não vi você.”
       Ele sorriu, e eu me aproximei ainda cautelosa. Ele havia sumido por várias semanas, então eu não sabia como seria o seu comportamento.
       “Meggie me contou que você começou a trabalhar aqui. Fiquei curioso em conhecer. Parece bem legal.”
       “Sim, é. As meninas e a Donna são ótimas. Estou gostando muito.”
       “Fico feliz por você. Imaginei o quanto iria demorar para você se entediar de ficar o dia todo sozinha em casa.” Sorri levemente e olhei meus pés, um pouco envergonhada.
       “Você me conhece bem.”
       “Sim.” Após um segundo, me liguei em um detalhe.
       “Onde está o seu carro?”
       “Estacionei em frente à sua casa e vim andando”, ele respondeu, indicando para descermos a rua na direção da minha casa. Assenti e seguimos.
       Ele manteve o silêncio até quebrá-lo com um tom provocativo.
       “Gostei do uniforme. Ficou linda.”
       Com os olhos arregalados, olhei para a minha roupa, lembrando um segundo depois porque eu estava voltando para casa com o uniforme: era sexta e eu teria que lavá-lo. Meu rosto esquentou um pouco. Eu sabia que a roupa era para chamar a atenção dos garotos e aumentar o movimento na lanchonete, mas me deixou constrangida perto do Daniel porque eu sabia dos sentimentos dele.
       “O-obrigada.”
       Chegamos onde o carro dele estava, em frente à minha casa.
       “Imagino que esteja cansada.” Apenas assenti, congelando um pouco quando a mão dele deslizou na minha.
       Olhei para ele, incerta. Por que isso agora?
       “Preciso entrar, Dan. Estou muito cansada mesmo; a semana foi bem puxada.”
       “Eu sei.” Ele pareceu um pouco magoado com a minha dispensa, mas eu não podia evitar. Estava realmente cansada, e ficar perto dele com aquela roupa era desconcertante.
       “Mas… obrigada por ter vindo me ver. Fazia tempo.”
       Como minha resposta, o rosto dele se iluminou, e ele assentiu, sorrindo.
       “Sim, fazia. Sinto muito ter me afastado. Eu estava confuso.” Assenti.
       “Eu entendo. Boa noite.”
       “Boa noite”, ele respondeu, levando minha mão à boca e beijando-a.
       O calor no meu rosto voltou mais forte, e eu desviei os olhos, mas fui poupada de responder por outra voz familiar:
       “Interrompo alguma coisa?”

POV. CHRIS
       Lentamente, eu sentia meu sangue ferver dentro de mim. Meu dia tinha sido ótimo; nada de desagradável tinha acontecido. Aí na hora que estou voltando para casa, me deparo com aquela cena: o miserável beijando a mão da minha Lizzy. O idiota tinha ficado tanto tempo sumido que eu até achei que ele havia sido abduzido. O que não seria uma má ideia… Então ele volta de novo para me atormentar. Maldição… Reuni toda a minha cara de pau e minha calma e me aproximei deles, tentando não olhar para a Lizzy vestida naquele uniforme ou eu não conseguiria falar nada.
       “Interrompo alguma coisa?”
       Tive um prazer sádico ao ver a raiva estampada em seu rosto e evidente em sua voz.
       “Claramente interrompe.”
       “Que bom”, comentei com o tom mais cínico que encontrei. “Adoro interromper.”
       O suspiro alto da Lizzy se fez ouvir.
       “Olha, eu estou cansada, a semana foi bem puxada para mim, e eu não estou com a mínima paciência para aguentar as briguinhas de vocês dois. Então, boa noite, e falem comigo quando forem civilizados.”
       Dito isso, ela nos deu um sorriso duro e subiu as escadas, entrando e fechando a porta logo depois. Ficamos só os dois, nos odiando mutuamente no silêncio, até que ele falou em um tom debochado.
       “Então? Já não cansou de brincar com os sentimentos dela?”
       Meu primeiro instinto foi socar aquele sorriso idiota da cara dele, mas eu mantive a calma mesmo que estivesse rugindo por dentro. Minha melhor opção era irritá-lo tanto quanto ele me irritava, e eu era ótimo em irritar os outros.
       “Sim, cansei, e por isso você devia se preocupar. Porque ela vai ser minha, e não é alguém como você que vai me impedir de ficar com ela.”
       As linhas do seu rosto ficaram mais duras devido à irritação, mas ele não mudou o tom de deboche.
       “Diga o que quiser. No final, a decisão será dela. Lizzy vai se lembrar de quem sempre esteve ao lado dela”, ele disse com um sorriso de triunfo.
       “Sim, ela vai lembrar. Por isso você já perdeu.”
       Só fiquei a tempo de ver o sorriso sumir do seu rosto; virei, subi as escadas e entrei na casa da Lizzy. Não tenho tempo para perder com você, idiota. Ela é mais importante…
       Mais calmo, subi as escadas até o quarto dela. Bati levemente na porta e entrei. Ela estava em pé perto da cama, separando algumas roupas. Já não vestia mais o uniforme da lanchonete. Quando eu entrei, ela virou para me olhar e me deu um suspiro cansado.
       “Lizzy-”
       “Chris, por favor. Eu não quero brigar-”
       “Nem eu”, interrompi. Percebi seu corpo relaxar um pouco com meu pedido de trégua. “Nós estamos bem, e eu não quero que isso mude.” Não vou dar chance para ele se meter entre nós.
       “Eu também não. Eu só queria que você entendesse o quanto esse emprego é importante para mim.” Suspirei, cansado daquela discussão, e me aproximei dela.
       “Não vou dizer que entendo sua fixação com esse emprego, mas aceito não me meter. A decisão é sua no fim das contas. Não vou mais brigar por isso.”
       Os olhos dela brilharam, e ela me abraçou de repente. Soltei um leve sorriso e a abracei de volta. Então era isso que ela queria ouvir…
       “Obrigada. Não tocamos mais no assunto?”, perguntou, soltando o abraço. Assenti em retorno.
       “Não tocamos mais no assunto.”
       “Ótimo. A Donna disse que vai dar uma festa de inauguração no fim do mês, então eu pensei se você não gostaria-”
       “Liz…” interrompi antes que ela se empolga-se mais. “Eu aceitei sua decisão; não significa que irei até lá. Ainda não gosto daquele lugar e muito menos da roupa que você usa lá.” Seu olhar magoado quase me fez voltar atrás, mas fui firme. “Sinto muito.”
       “Tudo bem”, ela disse, mas seus olhos estavam fixos no chão. Ela realmente queria que eu fosse nessa festa, mas eu tinha meus princípios.
Ergui seu rosto para que ela me olhasse e beijei sua testa.
       “Eu aceitei o que você escolheu. Por favor, faça o mesmo por mim.”
       “Ok”, ela concordou, depois de respirar fundo, e beijou meu rosto.
       De repente algo me ocorreu.
       “Mas não chame o miserável para ir com você.”
       Seu olhar para mim foi desafiador.
       “Chris…”
       “Será que dá para me escutar uma única vez?”
       Nos encaramos por alguns segundos, tentando ver quem cederia. Acabou sendo ela.
       “Tudo bem. Você ganhou. Vou sozinha.” Assenti, agradecido.
       “Quer ir jantar lá em casa?” perguntei, cedendo à vontade de abraçá-la e beijar seu pescoço. Seu suspiro em retorno era tudo o que eu precisava para me sentir em paz. “Você disse que estava cansada. Te poupa o trabalho de fazer o jantar.”
       Ela assentiu contra o meu peito.
       “Só tenho que tomar banho.” Dito isso, se soltou do meu abraço, pegou uma roupa e entrou no banheiro. “Saio em dez minutos”, disse com a voz abafada pelo outro cômodo.
       Sorri e sentei em sua cama para esperar. Me deixei levar e acabei deitando de costas na cama. Eu fiquei muito idiota depois que me apaixonei por ela… Fechei os olhos, sentindo seu perfume me envolver, e sorri, idiota. Não que eu me importe…


***


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Notas finais do capítulo

Então? Vocês ainda estão aí apesar dessa autora mega-atrasada?
Reviews!

P.S.; O próximo cap. será o seguinte a esse (Todo Mundo Odeia o Dia da Terra); só teremos cap. do Greg depois do "Dia da Terra". Estarão relacionados.
See ya soon ^^



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