Nem Todo Mundo Odeia o Chris - 3ª Temporada escrita por LivyBennet


Capítulo 16
Todo Mundo Odeia a Páscoa


Notas iniciais do capítulo

Seus bonitos o/
Voltei ^^
Temos mais um cap. de drama e o momento do "finalmente" porque, sério, Chris, demorou demais... -_-
Enjoy o/



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POV. CHRIS (Brooklyn - 1986)

Admito que, naquela noite, não consegui dormir. A imagem da Lizzy chorando me atormentava, e eu passei a noite inteira me revirando na cama e encarando o buraco na parede com uma culpa crescente. Na semana que se seguiu, ela mal falou comigo. Para falar a verdade, ela mal me olhou a semana toda. Falava comigo apenas o estritamente necessário. E mesmo sabendo que eu merecia, vê-la me tratar daquele jeito me matava. Eu queria explicar o que tinha acontecido, que eu não queria realmente aquele beijo, mas quando pensava em falar no assunto a coragem me faltava, as palavras não vinham.

Nós ainda íamos e voltávamos da escola juntos, mas parecíamos mais dois estranhos sentados lado a lado do que melhores amigos. Quando o Greg estava presente, pouca coisa melhorava. Parecia uma competição ridícula de quem tinha mais assunto para falar com ele, e como eu me sentia envergonhado perto da Lizzy, ficava calado a maior parte do tempo.

O miserável andava mais do que nunca na casa dela. Parecia um cão de guarda. Embora minha raiva dele tivesse diminuído consideravelmente por causa da culpa que eu sentia, ainda não gostava de ele ficar rodeando a Lizzy. Nossa, que moral eu tenho para falar. Eu sempre disse que ele a machucaria, mas quem fez o papel de babaca fui eu. E agora ela sequer olha na minha cara.

Depois de termos passado a semana inteira desse jeito, eu remoía minha culpa mais do que nunca, e, óbvio, o Greg percebeu. Ele era lento, às vezes, mas não cego. Imagino que ele esperou até que nós ficássemos sozinhos para me pressionar. Confesso que precisava falar com alguém, e ele era minha melhor opção, mas a situação não era a melhor.

Era sexta depois da aula, e Lizzy tinha acabado de se despedir de nós e entrado no carro do miserável: ia almoçar com ele. O miserável nem tinha saído do carro dessa vez, mas pude ver sua expressão assassina para mim quando a Lizzy abriu a porta para entrar. Como se minha dor de cabeça não fosse o bastante para me atormentar…

Observei com remorso, mágoa e raiva o carro se afastar, apenas virando para ver um Greg preocupado que acabara de me cutucar as costelas.

“Cara, você está bem?”

Aquela simples pergunta deu um nó na minha garganta, e eu neguei com a cabeça. Ele suspirou e, dando um tapinha nas minhas costas, indicou a direção contrária a que eu costumava ir para casa. Andamos em silêncio; eu nem me dei o trabalho de perguntar aonde íamos. Sabia para onde ele me levaria. Em menos de quinze minutos estávamos na casa dele. Entramos, ele me fez sentar no sofá e sentou do meu lado.

“Ok, agora já pode me contar. O que aconteceu entre você e a Lizzy?”

O nó na minha garganta voltou, mas eu fiz o que pude para contar tudo para ele. Sobre o convite da Tasha, o jogo da garrafa, os beijos, a Lizzy ter visto o segundo beijo e o miserável dizendo que eu só a fazia sofrer. À medida que eu falava, era como se eu revivesse aquilo. A angústia voltou, e eu só me senti um pouco melhor depois que terminei de contar tudo. Olhei para ele, mas seu rosto não me disse nada.

“O que foi? Vai me recriminar também? Muito obrigado, mas eu faço isso muito bem sozinho!”

“Você quer que eu faça o quê? Te apoie depois do que você fez?”

“Não, eu… Ah, sei lá”, disse, passando as mãos pelo rosto.

Ouvi-o suspirar e coçar a nuca.

“Sinceramente, não sei de quem eu tenho mais raiva: de você ou dela.” Virei o rosto em sua direção, sem compreender.

“E por que você teria raiva dela? O babaca fui eu.”

“É que…”

Pelo tom de voz dele e pela cara que ele fez, percebi que ele escondia algo muito sério e escondia há muito tempo.

“É o quê, Greg?”

“Cara, eu não… Eu não posso te contar, ok?”

“Por que não? Se me envolve eu quero saber.”

“Não é um segredo meu para que eu conte. Foi mal.” Bufei, irritado, e ficamos em silêncio. Depois de alguns minutos, ele continuou: “Mas… você vai fazer o quê para consertar isso?” Ri amargamente.

“Como se eu soubesse o que fazer. Ela mal fala comigo, foge sempre que ficamos sozinhos, e eu não consigo mais falar com ela porque eu fui um idiota! Eu…” respirei fundo, sentindo o nó na minha garganta apertar ainda mais, “... não sei o que fazer.”

Pelo canto do olho, pude ver a expressão de compaixão do Greg. Apoiei os cotovelos nos joelhos e pus novamente o rosto nas mãos. Senti sua mão no meu ombro, mas não me mexi.

“Cara, eu não sei porque você se tortura desse jeito. É tão claro o motivo de você estar sofrendo assim que eu não sei como você não consegue enxergar.”

Continuei parado e em silêncio, tentando entender o que ele queria dizer com aquilo. Pela falta de sono, minha cabeça começou a doer horrivelmente, e eu achei melhor ir para casa. Era meu dia de folga do Doc’s, mas eu não sabia se gostava ou odiava. Significava que eu tinha mais tempo desocupado, o que também significava que eu tinha mais tempo para pensar. Não que isso resolva alguma coisa…

 

Apesar de ter achado que eu teria muito tempo para pensar, minha casa não era exatamente um local de paz. Principalmente não quando minha mãe estava quase arrancando os cabelos de ansiedade pelo desfile de chapéus que nossa igreja tinha toda Páscoa. Aparentemente, tinha uma mulher nova, que era dona de uma loja de chapéus. Como se já não bastasse o espírito competidor de Rochelle Rock, a louca da mulher se recusou a vender um chapéu da sua loja para a minha mãe, dizendo que ela mesma venceria o concurso.

“Ah, se ela pensa que vai ficar assim, não vai mesmo! Ela vai ver quem vai ganhar o concurso!”.

Tenho certeza que escutei esse mini discurso trezentas vezes da sexta de noite até o sábado à tarde. Já estava ficando insuportável. Mas se fosse só isso seria ótimo. Minha mãe ainda reclamava porque meu pai havia dito que não poderia ir à igreja na Páscoa porque tinham chamado ele para trabalhar. Quatro vezes o dobro da hora extra. Eu achei exagero, mas fiquei calado. Não culpava ele por não querer ir; também não sentia a mínima vontade de estar lá. A Lizzy também estaria, e eu ainda não conseguia falar direito com ela.

“Que cara é essa?”, ouvi uma voz familiar e irritante.

Olhei para a Tonya que acabava de sentar ao meu lado no sofá. Aparentemente ela tinha cansado de olhar o chapéu novo da mãe e resolveu me encher. Revirei os olhos, impaciente.

“Nada que te interesse. Vai contar quantas gotas de glitter tem o chapéu da mãe.” Ela riu com malícia e chamou o Drew, para o meu desespero.

“DREWWWW!!!!” Poucos segundos depois, ele saiu da cozinha.

“O que foi?” Ótimo! Vai começar o meu tormento!

“O Chris tá com uma cara tão séria, você não acha?”

Como o lesado de sempre, ele não percebeu que ela estava me provocando e respondeu a sério, colocando mais lenha na fogueira.

“É verdade, Chris. E está com olheiras também. Na verdade,” ele pensou um pouco, e eu soube que vinha algo que não devia, “acho que você está assim desde aquela festa na casa da Lisa. É algo com a Tasha? Ou com a Lizzy?” Senti uma pontada no peito ao ouvir o nome da Lizzy.

Tonya me olhou como se tivesse ganhado na loteria.

“Ah, então é isso? Brigou com as duas?”

Reclinei a cabeça no sofá e soltei um grunhido de irritação.

“Será que dá para me deixar em paz? Vocês não têm mais o que fazer não?” Tonya deu de ombros.

“Já nos entediamos com o chapéu da mamãe, então vim te encher.” Rolei os olhos mais uma vez. Por que nem na minha casa eu tenho paz?

“Vão emboooooora…”, disse, demonstrando toda a minha falta de saco por eles estarem ali, mas eles me responderam na mesma moeda.

“Nããããããããããããoooo…” Com as maiores caras de pau… Eu mereço isso?

“Ok”, eu disse, atingindo o limite da minha paciência. “Se vocês não saem, eu saio.”

Levantei e joguei uma almofada em cada um, rapidamente saindo da sala e da casa. Eles têm prazer em tirar minha paciência…

Ao olhar de relance para a calçada da casa dela, vi o carro do miserável parado no meio fio. É claro que ele está com ela… Não iria perder a oportunidade…  Enfiei as mãos nos bolsos, irritado, e comecei a descer a rua, sem rumo.

Continuei andando por vários minutos, sem realmente prestar atenção onde ia, até que me vi no parque. Respirei fundo, me sentindo levemente melhor. Eu sempre acabava indo ao parque para pensar, mesmo sem ter consciência disso. Comecei a andar pela orla, mas acabei indo para o meio das árvores e me sentando ao pé de uma. Recostei a cabeça no tronco, e minha mente começou a lembrar uma das várias vezes que eu tinha ido ali com a Lizzy.

 

Flashback on

 

“Para, Chris!” Ela pedia, rindo, e por isso eu não levei a sério.

Era o primeiro sábado de 1986 e um dos raros sábados pela manhã que minha mãe não me sentenciava a ir à lavanderia. Eu tinha passado a semana inteira reclamando que nós não tínhamos mais saído, até porque ela e os pais tinham ido passar o Ano Novo com a Cibele. Então ela teve a ideia de fazermos um picnic no parque.

Ela havia feito quase todas as comidas; eu só tinha ficado encarregado do suco e dos biscoitos. Arranjamos a cesta com o Doc, e acordamos bem cedo para arrumar as últimas coisas. Como recompensa, tínhamos a manhã toda só para nós.

“Sério? Você gostou mesmo dos biscoitos?” Ela revirou os olhos, mas ainda sorria.

“Já disse que sim. Quantas vezes ainda vai perguntar?” Balancei a cabeça, indicando que já havia parado.

Havia poucas pessoas, mas mesmo assim escolhemos o lugar mais reservado do parque para sentar. Estávamos ao pé de uma árvore: ela sentada com as costas encostadas no tronco e eu deitado com a cabeça em seu colo. Já havíamos comido quase tudo e agora só jogávamos conversa fora. Eu sentia sua mão acariciar minha cabeça levemente enquanto acabávamos com os biscoitos que eu tinha feito.

“Ainda tem mais algum?” Ela olhou dentro da cesta e negou.

“Não. Já acabou”, ela disse e fez uma carinha triste.

Eu ri e ergui o braço para afagar seu rosto. Suas bochechas coraram e, mais uma vez, eu fiquei fascinado em como ela era linda. Desviando os olhos dos meus, ela mudou de assunto.

“Pronto para ter aula depois de amanhã?” Gemi de frustração.

“Isso é injusto. Por que nós temos férias de dois meses no meio do ano e só duas semanas no final?”

“Não sei, mas agora que paro para pensar é injusto mesmo.” Assenti.

“E eu também não estou ansioso para rever o Caruzo… e nem o comedor de arroz.” Ela riu e puxou minha orelha de leve.

“Qual a sua implicância com o Yao?” Dei de ombros, um pouco irritado ao lembrar do asiático sorrindo igual a um idiota toda vez que a via.

“E eu preciso de motivo? Só não vou com a cara dele.”

“Chris, tem que ter um motivo.” Ela me olhou, esperando minha resposta. Me ergui e sentei ao seu lado, já meio emburrado.

“Ok, tem um motivo. Sempre que ele te olha dá para ver as segundas intenções escritas na cara dele.” Ela me olhou, chocada.

“O Yao não é assim. E mesmo se fosse, você sabe que já deixei bem claro que não gosto dele desse jeito.” Eu sabia que era verdade e me permiti um pequeno sorriso.

“Sei.” Ela continuou me encarrando até começar a rir. “O que foi?”

“Bobo”, e dizendo isso, inclinou-se para a frente e beijou meu rosto.

Fechei os olhos por um breve segundo e suspirei. Eu adorava quando ela fazia isso. Fazia eu me sentir especial.

 

Flashback off

 

Passei as mãos pelo rosto e suspirei de impaciência e frustração. Sentia um aperto constante no meu peito; era como se eu fosse sufocar a qualquer momento. Tentei respirar fundo, mas de nada adiantou; o aperto continuava lá, e eu sabia o porquê. Ela fazia muita falta. Tanta falta que era quase insuportável. A frieza com que ela me tratava agora era a pior parte de tudo. Eu preferia que ela gritasse comigo, que dissesse que eu fui imbecil e babaca por esconder coisas dela, mas ela não fazia nada disso. O “bom dia” frio e seco que ela me dava todos os dias quando me encontrava era pior que um tapa. Era como se ela tentasse fingir que nada aconteceu quando nós dois sabíamos que era impossível.

Eu sentia falta de tudo: das nossas conversas, da sua atenção, do seu sorriso, dos seus olhos brilhando… Ouvir a voz dela rindo com outras pessoas era torturante. Mas eu sabia que a culpa era minha. Se eu tivesse sido honesto com ela, talvez nada disso tivesse acontecido. Se eu não tivesse sido idiota, talvez ela estivesse sentada comigo ali no parque, rindo da competição ridícula de chapéus que veríamos no domingo de Páscoa. Mas ela não estava.

 

POV. LIZZY

Tinha sido uma semana difícil. Eu juro que tinha tentado fazer o meu melhor para não deixar nada transparecer, mas obviamente tinha sido inútil. Só olhar para ele me dava uma vontade quase incontrolável de chorar. O Greg ficou sendo nosso mediador de conversas. Confesso que senti compaixão; ele não tinha porque ser envolvido. As idas e voltas de casa para a escola eram um funeral. Mal nos falávamos, e eu fazia o possível para não olhá-lo. Estar perto dele já era o suficiente para me machucar.

Ao contrário do que eu achei que faria, ele não tentou se explicar. Acho que foi o que me machucou ainda mais. Mas por que ele deveria se explicar? Ele é livre para sair com quem quiser… Pelo menos era isso que eu tentava dizer para mim toda noite. Agora dormir era uma tarefa ainda mais difícil. O sono quase nunca vinha, e quando vinha, eu sonhava com ele. Eu já devia esperar isso porque, não importava quantas vezes eu lavasse os meus lençóis, o cheiro dele continuava lá.

Mas eu não falei nada para o Daniel. Ele estava sendo tão atencioso e cuidadoso. Vinha me ver quase todos os dias e fazia o possível para me distrair. Na sexta, ele foi me buscar na saída da escola e me levou a um parque de diversões que tinha chegado perto de Long Island. Consegui esquecer as dores por um tempo e agradeci muito a ele. Também fiquei aliviada em perceber que ele não tinha mais tocado no assunto de gostar de mim. Ele estava respeitando o meu tempo e o meu espaço e tentando me ajudar ao mesmo tempo. Era bem mais do que eu pediria.

No sábado da Páscoa, ele me convidou para almoçar com ele e com a Meggie em sua casa. Concordei; eu não tinha tido tempo de falar direito com a Meggie desde que ela chegara. Sempre que eu ligava, ela tinha saído e ninguém sabia para onde. Foi um almoço divertido e eu ri bastante. Tinha esquecido como a presença da Meggie deixava tudo muito mais relaxante. Pouco depois da sobremesa, Daniel deixou eu e a Meggie a sós, e ela veio sentar perto de mim no sofá com uma expressão preocupada.

“Então, como você está?” Suspirei, tentando sorrir.

“Melhor. O Dan te contou?” Ela assentiu.

“A versão dele, cheia de palavrões e xingamentos. Ele chegou possesso naquela noite. Mas, se não se importar, gostaria de ouvir como você está se sentindo.” Assenti.

“Tudo bem. Eu estou melhor do que eu pensei que ficaria em uma situação assim. Ainda vamos à escola juntos, mas nenhum dos dois fala uma palavra sequer.” Ela fez uma leve careta.

“Imagino o quanto ele deve estar envergonhado.”

“Não sei se está.”

“Claro que está. Vergonha de não ter sido honesto com você.”

“Não acha que ele teria vindo se explicar se fosse só isso?”

“Não. Acho que ele não teria vindo se explicar justamente porque é isso. Homens não lidam bem com a vergonha, Lizzy. Mexe com o orgulho deles. Faz com que se sintam fracos. Por isso escondem o que sentem sob uma máscara de silêncio.”

Considerei o ponto de vista dela, mas não comentei. Era uma possibilidade, e eu não queria criar esperanças em cima de mais nada. Já tinha me machucado o suficiente.

 

Apesar de tudo o que estava acontecendo, eu tinha um motivo para ficar feliz. Meus pais viriam passar a Páscoa comigo. Depois que haviam se mudado para o Queens há algumas semanas, eu já tinha visto os dois várias vezes. Fiquei feliz por notar que a distância não os tinha afastado de mim.

Eles chegaram pouco antes o jantar no sábado, com duas malas pequenas. Recebi os dois com um grande abraço de saudade. Minha mãe me afastou e me olhou de perto.

“Está mais linda que nunca.” Sorri, sem graça, e foi a vez de meu pai.

“Como estão as coisas aqui?”

“Estão bem, pai. Só senti saudade.”

“Nós também, minha filha.”

Eles olharam em volta da casa e sorriram. Minha mãe se adiantou:

“Adorei a nova mobília. Escolheu bem.”

“Sim, mas não escolhi sozinha. Eu tive ajuda do--”, me chutei mentalmente por trazer o nome dele à tona, “--Chris.”

“Então, vocês dois têm muito bom gosto”, disse minha mãe. “Ele sabia que nós viríamos?”

“N-não, eu… esqueci de contar. Mas nós veremos todos amanhã na igreja.” Observei com atenção eles sorrirem e dizerem que iam subir para o quarto para desfazer as malas. Assenti e sorri.

Assim que ouvi os passos deles subindo as escadas, caí sentada na primeira cadeira do balcão que eu havia modificado na cozinha. Maldição! Por que eu tive que falar o nome dele? Resisti à ânsia de chorar respirando fundo. Eu preciso me controlar. Preciso!

O Domingo de Páscoa chegou, e eu não sentia a mínima vontade de ir à igreja. Chris estará lá, e eu mal consigo olhar para ele... Mas meu pais estavam lá, e eu não podia simplesmente dizer que não iria. Então, me arrumei, coloquei meu melhor sorriso e desci para encontrá-los.

“Minha filha, você está linda!”

“Obrigada, pai. Vocês já estão prontos? Podemos ir?” Minha mãe assentiu.

“Claro. Estávamos só esperando você.”

Assim, saímos de casa e fomos para a igreja.

Nos anos que morei em Bed-Stuy, eu sempre frequentei a mesma igreja que o Chris. Apesar de atrair muitos olhares no começo - já que todos os presentes eram negros -, logo eles se habituaram à minha presença e logo depois à dos meus pais.

Ao chegar na igreja, contra a minha vontade, meus olhos escanearam o salão em busca do Chris. Encontrei-o de pé, perto dos irmãos e da dona Rochelle. Meu coração bateu mais forte quando o vi sorrir de leve com algo que a mãe falou. Ele sempre ficava lindo de terno preto, e aquela não era uma exceção. Senti minha boca seca e me forcei a desviar os olhos dele; uma tarefa difícil. Como era inevitável, meus pais foram até eles para cumprimentá-los.

“Rochelle, seu chapéu está maravilhoso.”

A voz da minha mãe trouxe a atenção para nós e logo o olhar dele encontrou o meu. Nos olhamos por alguns segundos até ele se aproximar e me cumprimentar.

“Feliz Páscoa, Lizzy”, ele sussurrou.

“Feliz Páscoa”, disse no mesmo tom.

Ele pareceu querer dizer algo, mas naquele momento meu pai me chamou para acharmos um lugar. Me despedi dele sem graça, cumprimentei os outros e fui procurar um lugar. Por fim, achamos um lugar dois bancos à frente dos lugares da família do Chris. De alguma forma, eu conseguia vê-lo pelo canto dos olhos.

Depois que sentamos, meu pai virou para mim, aproveitando a distração da minha mãe com outra irmã.

“Lizzy, está tudo bem?”

“Está sim, pai. Por que pergunta?”

“Você e Chris estão muito estranhos. Brigaram?” Fui pega de surpresa por sua percepção.

“Bem,... Na verdade,... Sim, nós brigamos.” Senti seu braço ao redor dos meus ombros.

“Vai ficar tudo bem. Vocês vão se acertar.” Assenti.

“Espero que sim.”

 

POV. CHRIS

Sentei no meu lugar tentando controlar meu coração acelerado e minha respiração irregular. No momento em que a vi, perdi o fôlego, literalmente. Ela estava mais linda do que nunca. Aparentemente ela tinha escolhido o vestido para me matar. Era verde escuro com algumas bolinhas brancas na parte de cima, saltos pretos e o cabelo levemente preso atrás. O batom vermelho destacava sua boca assim como a cor do vestido destacava seus olhos. Por que ela tinha que estar tão linda? É algum tipo de tortura? Porque está funcionando.

Discretamente, olhei em sua direção. Ela havia se sentado pouco mais a minha frente, e eu podia vê-la perfeitamente. Ela sorriu levemente para uma das irmãs que foi falar com ela, causando uma angústia em mim. Será que ela realmente não percebe o quanto eu sinto a falta dela?

Chamando a atenção de todos, o pastor começou a celebração. As horas começaram a passar, mas o tempo parecia parado para mim. Não consegui me concentrar no que o pastor dizia, conseguia apenas pensar nela. Vez por outra meus olhos procuravam por ela, e eu passava um tempo indeterminado observando-a e me roendo por dentro. Não sabia o que mais me torturava, se era sua proximidade ou sua indiferença.

Suportei o mais que pude, mas chegou o momento que eu não aguentei mais. Me sentia sufocado, angustiado; eu precisava sair dali. Agradeci mentalmente por ter escolhido ficar na ponta do banco que ficava próxima à parede e virei para sussurrar para o Drew.

“Se a mãe perguntar por mim, eu não me senti bem e fui para casa.” Ele me olhou estranho, mas assentiu.

Levantei discretamente e, com um último olhar na direção dela, saí da igreja. Do lado de fora, respirei fundo, tendo pouca melhora com aquilo. Então, comecei a andar na direção da minha casa. Estava tão distraído com meus pensamentos que ao chegar em casa, não achei estranho a porta da rua estar aberta. Só percebi que tinha alguém em casa quando abri a porta da sala e tive a visão do meu pai deitado no sofá assistindo beisebol. Ele me olhou com a cara de “pego no flagra”.

“Pai? O que está fazendo aqui?” Ele fez uma careta e sentou.

“Eu menti sobre o trabalho. Só queria descansar um pouco.” Suspirei e sentei em sua poltrona, abrindo o terno e afrouxando a gravata.

“Te entendo.”

“E você? Fugiu da igreja?”

“Tipo isso. Não estava com cabeça para aquilo.” Ele assentiu e ficamos em silêncio, só ouvindo o locutor do jogo. Movido por um instinto, eu perguntei: “Pai, tem um minuto?” Ele me olhou, levemente interessado, e colocou a TV no mudo.

“Qual é o problema?”

Continuei em silêncio por mais alguns segundos até tomar coragem e perguntar:

“Como você sabe que está... realmente apaixonado por alguém?” Observei meu pai ficar mudo e abrir e fechar a boca várias vezes antes de responder.

“Eu acho que você deveria falar sobre isso com a sua mãe--”

“Não”, interrompi. “Ela não entenderia. E eu duvido que eu entendesse qualquer coisa que ela me explicasse. Por favor, pai.”

Ele suspirou e coçou a nuca. Eu sabia que tinha colocado ele em uma posição difícil, mas era minha última opção. Alguns instantes de silêncio depois, ele começou:

“Chris, eu… Quando eu… conheci a sua mãe, admito que minha vida mudou. Nunca fui dado a sentimentalismo, mas ela me fez sentir tudo o que eu pensei que jamais sentiria. Ela se tornou a pessoa em quem eu mais pensava, com quem eu queria compartilhar as coisas boas e ruins. Ao mesmo tempo, eu ficava nervoso perto dela, queria impressioná-la, queria que me visse como eu a via. Sua felicidade virou minha felicidade, e sua tristeza, minha tristeza. O sorriso dela era a coisa mais bonita do meu dia, e ficar muito tempo longe dela era insuportável. Fazê-la feliz e protegê-la eram minha prioridade, e eu odiava vê-la perto de qualquer outro homem.” Ele riu, e eu tive a dádiva de ver meu pai sem graça pela primeira vez. “Engraçado que até hoje eu sinto ciúmes. Acho que nunca acaba de verdade.” Ele me olhou e franziu o cenho. “Tudo bem, Chris?” Assenti lentamente, tentando afastar a dormência que tinha tomado conta do meu corpo.

“Tudo, pai. Obrigado. Eu vou… subir para o meu quarto.” Ele assentiu e voltou ao jogo.

Subi as escadas devagar, pensando em tudo o que ele tinha me dito; todas as peças finalmente se encaixando na minha cabeça. Tudo o que eu sentia quando estava perto da Lizzy fazia todo o sentido. A frequência com que eu pensava nela, a felicidade por sua atenção, o maldito ciúme quando ela estava com o asiático ou com o miserável, a vontade de sempre estar com ela, a paz que seu sorriso me dava, o instinto de proteção que eu tinha com ela, a angústia e a solidão que eu vinha sentindo desde aquela maldita noite...

Entrei no quarto, fechei a porta e encostei-me nela.

Deus, eu fui tão cego. O Greg tinha razão; o motivo da minha agonia é claro demais. Eu sou apaixonado pela Lizzy, sempre fui. O que eu sinto por ela vem aumentando a cada dia que passa, mas eu fui idiota demais para perceber. Todos os dias que passei com ela, sempre foram os melhores dias. Ela me faz derreter só com um beijo no rosto ou um sorriso. Como eu pude confundir isso com amizade?!

O peso que eu sentia sobre os meus ombros diminuiu, mas isso não ajudou o meu ânimo nem melhorou o sentimento de angústia que me perseguia a semana inteira. Deslizei pela porta até sentar no chão, sentindo o aperto na minha garganta ficar mais forte.

“Mas por quê? Por que agora que ela me detesta?”

 

***

 


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Notas finais do capítulo

E aê? Gostaram? Opiniões? Reviews?
Ah, tenho uma coisa para vocês. No próximo capítulo, vocês vão finalmente conhecer as caras da Lizzy, do Daniel e da Meggie.
Finalmente encontrei as fotos perfeitas para os três. Espero que vocês gostem.

Próxima leitura: Capítulo 3 - O Coração de um Nerd



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