A Chegada Dela escrita por Kam_ted


Capítulo 6
Capítulo 6




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 Não aguentava ficar no mesmo lugar que meu pai. Ele se prestava disposto quando estava em casa e aquilo me soava cínico descaradamente. Minha mãe não notava nenhuma mudança e se comportava normalmente com sua presença, os mesmos cafés, almoços e jantares honorários, sempre correndo à frente para adiantar as coisas que ele ia fazer, mas sem nenhum amor ou prazer, mas por obrigação. Um ar tão igual ao de ontem, ao de anteontem e sucessivamente, um ar que só voltava e voltava e voltava pairava permanentemente na casa onde eu morava.

 Meu pai encontrava afago nos braços de outra mulher. Tenha sido, talvez, a própria esposa que o tenha feito sair em busca do que necessitava. Minha mãe fazia os deveres de casa passiva, sempre rezando baixinho sozinha no seu canto. Pensava quase sempre sobre a vida deles, sobre tudo o que quiseram e um dia se viram casando, tão novos e criando uma família e o dia em que tudo se tornou silêncio. Meu irmão andava pelos cantos calado. Ele andava em casa, ultimamente, coisa rara. Estava sempre pelas cidades vizinhas trabalhando para alguém. Certa manhã, sentei-me a mesa para tomar café e ele estava frio sentado ao outro lado. Pedi a faca que usara mas ele não ouviu. O chamei e ele me olhou perdido, acordando aturdido de um mundo onde estava habitando solitário, os seus olhos cresciam aflição, um semblante cansado. Senti uma pena enorme tomar conta dos meus instintos; quis salvar-lhe a alma também. Contei à ela sobre meus desejos ternos impossíveis.

- Eu queria salvar nossas almas, que estivéssemos imune a tudo e todos.

 Ela, limpa e clara, respondeu:

- Então não seria vida.

 Dei o coelho sem nenhum rancor ou mágoa que guardava do meu pai. Kinf, apelidou sua nova dona que agradeceu com sorrisos sinceros de criança ao ser presenteada. Enxergou toda uma graça que não enxerguei no animal. A tarde tremia junto com os sintetizadores de Baba O'riley que era executado na vitrola. Absorvia tanto de sua imagem ao brincar com Zoé, Agenor e o Kinf. Apartir do momento em que o coelho passara para outra pessoa, passei as mãos pelas suas orelhas sentindo vibração de um ser inocente. Então levantei e diverti-me ao crepúsculo ouvindo The Who.

 Em casa, o rosto aliviado do meu irmão não dava jus à situação presente na sala. Uma moça que não era mais moça estava grávida. Espiava tudo pela escada, de onde fui permitida assistir a sentença de morte de um pobre rapaz ligeiramente alegre e satisfeito. Sorri, da escada, para meu irmão e ele deve ter entendido o sorriso que lhe deitei porque me sorriu timidamente deixando nascer suas covinhas. Uma semana mais tarde, o abracei transpassando amor que nunca passei a ele. Andou de mãos dadas até o carro do seu novo sogro com a loira gestante. Um capítulo do seu livro havia acabado. Assim senti e chorei o vendo partir.


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