Felizes para sempre? Alternativo escrita por Zangada


Capítulo 2
Capitulo 2 - Proposta.




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A GRAVIDEZ DE GABY foi um choque para todos. Denise nem sabia que sua antiga colega de escola tinha conhecido alguém depois de terminar com seu amante casado, Max. Estava tão empenhada em esquecer Marilia — o que incluía muitas escapadas na boate de Leticia — que, na noite em que conheceu o novo namorado de Gaby, Ângelo, eles já anunciaram que ela estava grávida. Era véspera de Natal e os amigos saíram juntos. Mary tinha sido a primeira a se recuperar da novidade inesperada de Gaby .

— Brava, Gaby! — ela disse enquanto dava um tapinha nas costas de Ângelo. — É maravilhoso. Parabéns!

Denise ficou paralisada. Primeiro, olhou para sua amiga, que estava radiante de alegria,depois, para Ângelo, não tão feliz, mas ainda assim com os braços em volta dos ombros dela, em sinal de proteção. Ela pensou que ele deveria se sentir como que perante a inquisição: os amigos mais antigos de Gaby.

Mamma mia!— Anitta gritou, articulando os pensamentos de Denise. —Vocês estão loucos? Acabaram de se conhecer.

Gaby disparou um olhar fatal para Anitta.

— Estamos juntos há dois meses. Além disso, pouco importa há quanto tempo estamos saindo — ela pegou a mão de Ângelo possessivamente. — Quando você sabe que ele é o cara, você simplesmente sabe. Não é isso, Denise?

Por que ela estava perguntando isso? Gaby sabia da opinião de Denise sobre bebês, casamento e tudo o mais. Denise tomou um gole de vinho e desviou o olhar de sua amiga. O que ela poderia dizer? Gaby estava a caminho do desastre. Ela sabia.

— Amigas, vocês já têm quase trinta anos. Esta é a hora de começarmos a pensar em ter filhos, sossegar… — Gaby começou.

— Você está falando sério? — Anitta se indignou. — Meu Deus, se um dia eu sossegar, please, me matem.

Mary sorriu meio amarelo, dando um tapinha na mão de Gaby, confortando-a. Ela ficou vermelha, o namorado dela, Ângelo, olhou para Anitta horrorizado. Mas Denise poderia ter dito exatamente a mesma coisa que Anitta. Ela poderia ter dito a Gaby o que realmente pensava — que tudo terminaria em lágrimas. Como é que Gaby podia sequer pensar em ter um filho com um homem que ela conhecia havia tão pouco tempo? Será que ela tinha alguma ideia das dificuldades que estava prestes a enfrentar? Claro, Denise nada disse. Ela amava Gaby.

Tinha que se sentir feliz por ela.

Apesar disso, desde o anúncio, a amizade delas já não estava tão forte. Gaby ia a todos os lugares acompanhada de Ângelo. Denise só esteve sozinha com ela uma vez recentemente, numa exposição sobre Matisse. Estar com sua antiga amiga de escola foi como um pesadelo: de cinco em cinco minutos, ela reclamava que estava com vontade de vomitar e dizia a Denise que não imaginava que o enjoo de início de gravidez fosse tão terrível. Denise sabia. Mas é claro que ela não iria contar isso para Gaby. Há apenas uma pessoa no mundo que sabe que ela engravidou uma vez. E ela nunca mais vai vê-la, certo? Foi por isso também que ficou puta com Gaby naquele dia.

A amiga dela vivia trazendo a memória de Marilia de volta — tentando fazer com que ela falasse sobre ela, dizendo para ela ligar, alertando-a para não permitir que ela saísse da vida dela.

Na cozinha, Denise prepara uma xícara de chá preto antes de sentar à mesa. Não tem notícias de Gaby há algumas semanas. Poderia ligar para ela — saber se está tudo bem. Deveria se importar com o fato de sua amiga estar grávida, mas não quer pensar nisso. Na verdade, se for honesta consigo mesma, tem é ódio de Gaby estar esperando um bebê. Ela irá perdê-la também, exatamente como perdeu Marilia.

Denise abre o laptop. Ela não lê seus e-mails há alguns dias. Gosta da ideia de não estar disponível o tempo todo. Às vezes, ela se imagina tendo coragem de atirar seu celular do alto do Duomo só para vê-lo se espatifar no chão da praça, mas sabe que isso seria um suicídio profissional. Tem uma quantidade considerável de e-mails, todos chatos em sua maioria, mas uma mensagem na caixa de entrada atrai sua atenção. Ela olha o assunto com interesse:

“Exposição de Fotografia Erótica.”

Quando abre a mensagem, precisa ler duas vezes para entender. Ela está sendo convidada para fazer parte de uma exposição coletiva sobre fotografia erótica na Lexington Gallery, no Soho, em Londres, no final do mês que vem!

Finalmente, toda a sua dedicação e perseverança estão valendo a pena. No inverno passado, nas semanas após o término com Marilia, ela passou dias organizando portfólios e enviando-os para galerias em Londres. Fez isso porque sempre quis expor lá, porém, para ser honesta consigo mesma, também passou pela cabeça dela o fato de ser a mesma cidade em que Marilia estava morando. Sem hesitar, Denise pegou o telefone. Que se dane o jantar de família da Raquel, ela precisa falar com Leticia agora.

— Leticia, adivinha? Estou em uma exposição na Lexington Gallery, em Londres! — ela anuncia antes que sua amiga sequer tivesse tempo de atender ao telefone direito.

— Denise, isso é ótimo, mas não posso falar agora — Leticia soa excepcionalmente tensa.

— Ah, desculpe…

Denise se sente um pouco magoada, não consegue evitar. Imagina Leticia e sua voluptuosa esposa, Raquel, à mesa de jantar, com a família dela: o cheiro de comida caseira, muito vinho, conversas sobre jovens e velhos, crianças se escondendo sob a mesa, entre as pernas dos adultos. Uma cena da qual, em toda a sua vida, ela nunca participou.

— Eu te ligo mais tarde — Leticia diz com a voz mais animada. — Muito bem, de verdade, é uma ótima notícia.

Finalmente, está acontecendo na vida dela algo que possa desviá-la do sofrimento por Marilia. Enfim, seu perfil como fotógrafa de arte, e não fotógrafa de moda, começa a deslanchar. Isso a livra da sombra de sua mãe — Tina Rosselli, fotógrafa de moda ícone de Milão nos anos sessenta e setenta — de comparações com sua mãe, agora que está num universo só dela.

Talvez seja por isso que ela continue tirando aquelas fotos.

Seus episódios na boate de Leticia fazem com que se sinta melhor. Ela não é ela mesma, disfarçada em algum traje com sua câmera. É uma estranha observando estranhos, tirando fotos deles enquanto revelam seu lado mais obscuro, seus desejos secretos, suas próprias sombras. A honestidade dessas cenas nunca deixa de mexer com ela. E esses são os únicos momentos em que consegue se esconder da sua dor.

Então, continua clicando, consumida pela seguinte missão: fazer algo esteticamente transcendental, lindo e estimulante, tendo o sexo como tema.

Senta de volta na cadeira, o coração vai disparando. Em menos de um segundo, ela se decide. Rapidamente, responde ao e-mail, aceitando o convite.

Finalmente, ela poderá escapar de Milão por um tempo, assim como das memórias dela e de Marilia, que assombram os cômodos do apartamento. Em Londres, ela poderá se reinventar. E, claro, a verdade é que Denise sabe que não é só com a ideia da exposição que ela está empolgada. Agora, ela tem uma desculpa para ir a Londres, uma cidade enorme, com milhões de habitantes e, além de tudo, o novo lar de Marilia. Em Londres, ela estará mais perto dela.


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