Nada.

Simplesmente não tinha nada para lhe oferecer. Nem dinheiro, nem terras, nem jóias, nem metais ou sedas preciosas.

Desde a trágica morte de sua mãe que Inuyasha não usufruía de nada seu, excepto o traje do rato de fogo. Uma vestimenta que esteve ensopada em suor e sangue enquanto o hanyou crescia lutando por sua vida. Era o único que de facto tinha, uma lembrança de despedida de seu pai antes da morte, implacável e egoísta, o levar. Era o único que tinha de sua propriedade que podia oferecer a Kagome. Isso e um nome sem valor.

E ele o fez. Sim, ofereceu o único que tinha: seu traje. Cada vez que podia a cobria com ele, protegendo-a e reconfortando-a, com tudo o que possuía. Kagome implantava seu aroma exótico na sua veste, e por sua vez ele fixava o seu nela. Marcando-a como sua.

No entanto, o que um meio youkai poderia oferecer a alguém como Kagome? Ela naquele momento poderia estar casada e vivendo em uma enorme casa rodeada de terras luxuosas e vestida com os mais elaborados e coloridos kimonos. Deveria ter-se casado com um de esses nobres que ela tão facilmente encantou e que sempre andavam perguntando por ela, ou com um dos machos de seu próprio mundo que tentavam cortejá-la dignamente, Homens que poderiam dar-lhe tudo o que ela quisesse, o próprio céu se fosse necessário. Não, ele não a merecia. Mas mataria qualquer um que ousasse arrebatá-la dele.

— Ela é minha!

Grunhiu rouco, apesar de não restar nenhum ser vivo que o pudesse escutar. Sacudindo o sangue da rata de fogo em suas garras, rapidamente vestiu a sua hinezumi. A batalha não foi fácil, e muito provavelmente iria sentir as queimaduras e os arranhões amanhã pela madrugada, mas valeu a pena. Obteve seu prémio.

Estava na hora de um novo traje. Semelhante ao dele, mas melhor...

Kaede lhe disponibilizou alguém que cortasse a pele por ele, quando descobriu o que o hanyou estava a planear, no entanto Inuyasha queria fazer tudo pelas suas próprias mãos. Assim que escutou atentamente e pacientemente todos os conselhos do ancião, logo se preparou para trabalhar na pele. Queria apressar-se, já era muito tarde, porém faria tudo hábil uma vez que desejava que o objecto fosse perfeito. Precisava de ser leve e flexível.

Assim que limpou os restos da rata de fogo da pele o melhor que conseguiu, logo a estendeu num rio para a lavar. Duraria uns quantos dias, consoante lhe tinham dito, para retirar todas as impurezas. Desse modo, a deixou de imersão. Se sentou na beira e maldizia todos os youkais para que esta se movesse. Observava a pele a flutuar na água cristalina, questionando-se se teria sido sua mãe ou seu pai a dar-lhe o seu traje, e se teriam sido eles a fazerem o tecido.

Dois longos dias mais tarde, a pele estava pronta. E assim, começou o longo e entediante processo de de remover a pele. Era um trabalho especialmente difícil já que a pele tentava reparar-se continuamente. Era até mais difícil encontrar o momento para fazê-lo sem que ninguém o descobrisse. Tinha de escapar durante a noite para realizar sua tarefa sem ninguém desconfiar de nada, principalmente Kagome que não poderia suspeitar de sua ausência prolongada. Não queria que ninguém fizesse alguma pergunta inconveniente. Era privado. E importante.

Uma vez que ficou limpa e sem pêlo, ele lembrou-se que teve de cumprir o mais difícil em que podia pensar... Pedir ajuda.

Um aldeão habilidoso lhe deixou as ferramentas e o treinou nos últimos passos para converter a áspera pele num suave couro. Demorou bastante tempo, mas recusou-se a desistir diante de sua impaciência. O resultado final compensaria seu esforço. Quando terminou, o produto resultou numa larga pele suave com mais de um metro de comprimento, melhor que o seu kimono à prova de fogo. Contudo, naquele momento, parecia uma manta assimétrica.

Todavia assim estava perfeito, não acreditava que ela se incomodasse com tal detalhe insignificante.

As palmas de suas mãos transbordavam de suor quando entrava na cabana, com o presente escondido dentro de sua própria vestimenta. Kagome ergueu o olhar enquanto o hanyou adentrava pela habitação. A habitação deles. Estonteante, ela desenha uma bela curvatura em seu rosto angelical.

— Bem-vindo, Inuyasha. —sussurrou carinhosa, aproximando-se para remexer gentilmente em sua orelha identicamente à época em que se conheceram.

Um gemido escapou pelos lábios do meio youkai, saudoso das carícias delicadas de sua esposa. Extremamente nervoso, ele ajoelhou-se ao lado dela. Com os dedos trémulos, retirou a pele de sua veste. Ao princípio não parecia saber o que fazia com um pano vermelho com uma aparência estranha. Mas quando Kagome se apercebeu do que estava nas mãos de Inuyasha, seus olhos acastanhados se encheram de lágrimas, reflectindo o grande amor que sentia por ele naquele momento. Inuyasha ruborizou com o olhar dirigido a si, a carga emocional que suas esferas transmitiam. Amor, por ele. Ela era sua. Sua companheira. Sua mulher.

— Oh, Inuyasha! —a tocou amorosamente— É linda... E muito suave!

O peito do hanyou apertou agradavelmente, ameaçando explodir de orgulho, pela felicidade descrita claramente na feição da Higurashi.

— Podemos cortá-la mais tarde, converte-la no que quiseres que seja.

Com o coração abarrotado, ele agachou sua cabeça, colando as testas misturando as suas respirações numa deliciosa dança. Sedutor, a beijou, voraz mas amoroso; ainda não crendo que ela era de facto sua. Dele, e só dele.

— É um presente.

Logo, segurou no tecido e o envolveu ao redor do pescoço de Kagome, dando uma leve mordida no ombro de sua mulher enquanto finalizava o laço. Saboreou, deliciado, o suspiro de prazer que ela dera para ele. Só ele escutaria aquele som, e mais ninguém. Inuyasha recolheu-a em seus braços fortemente, a prendendo contra o seu abdómen, feliz com a vida que tinha.

Inuyasha não tinha muito que oferecer a Kagome ou a sua filha. Porém lhes daria tudo o que tivesse, nem que para isso tivesse de lutar sem sua vestimenta.

E, acima de tudo, nunca as abandonaria... Sempre velaria pelo bem de ambas, porque ele as amava acima de qualquer bem material. Elas eram o único que ele tinha.