O Homem sem Vida escrita por Dama das Estrelas


Capítulo 1
A triste sina do senhor Biggs




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Que fim para o senhor Biggs; um fim para um homem que nem ao menos existia...
New York, cidade dos sonhos, do sonho americano... o senhor Biggs já viveu este sonho uma vez, há muito tempo; mas agora...? Ele já não vivia mais.

Uma casa no lugar mais privilegiado na Grande Maçã, um emprego maravilhoso, e uma esposa amável; esse era a vida do senhor Biggs... entretanto de uma hora para outra, ele se viu sem nada, sem ninguém, sem sua própria vida.

Foi bom aproveitar a vida, gastar o dinheiro com bebidas, festas e outros prazeres da carne, não é, senhor Biggs? Foi prazeroso passar noites com várias mulheres, e sua esposa nem suspeitava, achando que o 'fiel' marido trabalhava fora.

De champagnes de luxo, agora ele convivia com meias garrafas de vinho de quinta categoria, e que tinham um cheiro pior que urina de bêbado e o sabor, nem se fala.

De uma cobertura com vista direta para a gloriosa ilha de Manhattan, agora o viaduto era seu único teto. O senhor Biggs viveu uma vida de rei, agora terminava numa situação pior que porcos mal cuidados.

E sua esposa? A senhora Biggs? Bem, ela largou este sobrenome miserável preferindo o nome de solteira; e agora ela estava numa situação melhor, bem melhor; dormindo com o melhor amigo do senhor Biggs; ou melhor, ex melhor amigo.

Falando em amigo, onde estariam os melhores amigos do senhor Biggs?! Que amigos? Já não os tinha mais; estavam bem longe, vivendo suas vidas maravilhosas com seus empregos, suas casas e seus familiares.

Quando descobriu que estava falido, o senhor Biggs entrou em desespero: brigava com a mulher constantemente, chegando a agredi-la uma vez; Aquela foi a gota d'água para a senhora Biggs, que o largou, quando ele já havia deixado-a de lado há muito tempo.

Ele foi despejado de seu apartamento e tudo foi tirado dele; seu dinheiro, joias, carros, tudo. Um mês depois, ele já se encontrava derrotado, debaixo de uma ponte; ele já não era ninguém.

Suicídio? Talvez... já não tinha mais nada, já não era mais nada; quem se importaria?
O senhor Biggs optou pelo álcool: beber, beber e beber até não conseguir mais; e assim apagar sua existência daquele mundo, sendo que ele já não existia...

Mas não deu certo.

Ele ficou dias e dias passando mal, tendo dores terríveis no estômago devido à péssima qualidade das bebidas que tomava. Aquilo só estendeu o sofrimento daquele homem que uma vez viveu, e que agora ninguém dava a mínima. Nem ao menos havia uma ambulância para levá-lo para um hospital particular; por quê? Porque ninguém se importa com alguém que não existe, com um ninguém que se escondia nas sombras com vergonha de mostrar-se ao mundo a pessoa que era agora.

Logo, o senhor Biggs, viu-se no mundo das drogas: para ele, injetar-se a substância e morrer era a melhor escolha. Então com os pouquíssimos trocados que carregava em seus trapos que ele chamava de roupas, e alguns objetos pessoais sem valor, ele conseguiu arranjar uma seringa contendo LSD, achando que a quantidade bastaria para lhe "proporcionar" uma overdose e assim, terminando com sua vida.

Assim, ele injetou a droga em si mesmo, na veia de seu braço...

Entretanto, aquilo também não foi o suficiente.

Passou horas vendo as piores alucinações possíveis; ele via sua ex esposa, seus amigos, suas namoradas, seus bens; tudo estava distorcido. Sentiu frio, calor, dores de cabeça, insegurança, desespero; tudo de pior ele sentiu naquele momento, somado à situação que se encontrava. Ficou eufórico, deprimido; feliz, triste... antônimos e mais antônimos de reações e sensações.

E mais uma vez não haviam médicos para atendê-lo... a vergonha e o orgulho o prendiam nas sombras, novamente.

Os dias se passavam, e o homem que andava nos mais luxuosos carros, agora usava suas pernas para se locomover pela cidade. E agora, senhor Biggs? O que fazer quando não se é ninguém num lugar onde ninguém o observa?

Foi então que pensou numa última tentativa de pôr um fim a esse sofrimento: um viaduto movimentado, numa cidade constantemente movimentada. Ele não perdeu tempo, e seguiu até lá, onde terminaria com sua vida, saltando daquele viaduto.

Enquanto ele andava, as pessoas mal punham seus olhos a ele. Elas não se importavam com mais um mendigo maltrapilho, elas tinham mais o que fazer, como cuidar de suas vidas perfeitas.

Em silêncio ele chegou até o meio do elevado, parou na borda; e em vez de jogar-se de uma vez, ele sentou... ficou ali, e passou os últimos minutos pensando na vida que teve e na vida que não teve... o que será que fez para merecer isso?

Pensava ele; e talvez já tivesse a resposta.
Não demorou muito até que ele pessoas começassem a se reunir em torno para ver aquela cena: mais um homem de rua que quer tirar a vida. Aquilo já era normal para a sociedade, vendo que mais um fracasso não suportou o peso de viver entre eles...

Mais curiosos se reuniam, até que, para a surpresa do senhor Biggs, uma equipe dos bombeiros já se aproximava dele. Ele imaginou que o único motivo de eles estarem ali, era porque ele não estava deixando o trânsito fluir, e alguma coisa tinha de ser feita para tirar aquele mendigo o mais depressa possível.

Após uma hora e meia de conversas com os bombeiros que tentavam 'ajudá-lo', finalmente o senhor Biggs resolveu desistir daquela ideia... Mais uma vez, seu plano havia falhado. O povo aplaudiu aquela cena, mas ele sentiu que eles aplaudiram aos oficiais, e não ao estúpido que tinha tido aquela ideia de suicídio.

Enfraticamente todas as alternativas cabíveis de morrer falharam para o senhor Biggs; existiam outras formas, é claro, mas estava cansado demais.

As lembranças retornaram; imaginou em tudo que estava passando agora seria um reflexo do que havia feito enquanto ainda 'vivia'.

O senhor Biggs, enfim parou para pensar; estava arrependido.

Pedir desculpas... para as pessoas que decepcionou; não tinha filhos, o que foi bom para ele, saber que não deixaria uma descendência pobre. Sua ex esposa agora estava feliz, em algum lugar longe dele. Aquelas pessoas a qual chamava de amigos, não eram realmente pessoas de confiança...
Escreveu uma carta e enviou para o endereço que tentou lembrar de onde sua ex mulher morava, com o título da carta "palavras de um homem que não existe".

Para o senhor Biggs, ela era a única pessoa a qual ele precisava pedir perdão.

Sem rumo, caminhou até o Central Park, até a área mais distante das pessoas que ali estavam.

Tendo em mente de tudo o que fez, o sentimento de culpa aos poucos se livrava dele, tendo uma nova sensação; alívio. Alívio por ter escrito aquela carta, por mais que ela o xingue ou o humilhe, ele, de alguma forma sentia-se aliviado.

E quem saiba, se tiver um futuro, ele se lembre de mais pessoas para pedir desculpas, porque foi uma vida inteira, descobrindo que já não vivia há muito tempo, antes mesmo de morar nas ruas.

O que fazer agora? Morrer? Não conseguia nem tirar sua própria vida, então ele preferiu esperar; por algum milagre? Talvez. Ou poderia esperar pela sua morte, que viria de alguma forma; mais cedo ou mais tarde. De um jeito bom, ou de um jeito ruim

Então, o senhor Biggs deitou-se na grama do parque, olhou para cima, e fechando seus olhos, ele sorriu.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler!