Free Days escrita por Tia Leh


Capítulo 1
Prologo.


Notas iniciais do capítulo

Espero que leiam o Prologo, acontecimentos 3 meses antes.



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Luzes. Luzes por todo lado. Era só o que eu via.

Alguma coisa – ou alguém –, puxou minhas costas. Foi quando percebi que estava deitada. Não conseguia ouvir nada com clareza. Talvez pela musica alta, ou os gritos a minha volta. Gritos que chamavam o meu nome. Lentamente, me senti adormecer.

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Algo duro e frio pressionava contra a minha bochecha, o que deixou uma certa dormência.

“Droga, nós deveríamos deixar ela aqui. A menina tá viajando mesmo. ” Escutei. O som parecia abafado, lutando contra os ruídos que vinham de todos os lados. Aquela voz era... familiar. Virei minha cabeça do que pensei ser o chão e vi pessoas agachadas a minha volta. Não conseguia lembrar de nada. Que lugar era aquele?

“Que merda tá acontecendo aqui?” Perguntei o mais alto que pude, pra que me notassem.

Quatro ou cinco cabeças olharam para baixo. Demorei um pouco para que os reconhecesse. Meus sentidos estavam confusos.

“Shhh, cala a boca. Não deu pra te carregar muito longe. ” Alguém disse.

Foi então que o barulho em meus ouvidos cessou e só restou um som não muito distante de sirenes. Levantei um pouco mais e olhei em volta. Com exceção de mim, deitada com a cabeça contra um contêiner de lixo, todos estavam sentados no chão. O lugar parecia uma espécie de beco entre dois prédios. A rua logo a frente não possuía nenhum tipo de movimentação de carros.

Enquanto tentava controlar minha respiração, os fatos finalmente começaram a se organizar em meus pensamentos. Um, alguns dos meus colegas de classe estavam ali. Meus colegas de classe. Dois, por algum motivo que não conseguia me lembrar, eu tinha apagado. Três, eles tiveram de me carregar até sei lá onde nós estávamos. Quatro, aquelas sirenes não significavam boa coisa. E Cinco, a minha cabeça doía. Muito.

“Essa foi por pouco, hein?” Suspirou aliviado um dos garotos, quando não se ouviam mais sirenes. Ele não era da minha turma, mas de fato do meu colégio.

Conseguia me lembrar pouco daquela noite. Fui com alguns conhecidos a uma festa no segundo andar de um bar no centro de São Paulo. Nada muito pesado, além de álcool e bala. Ficamos lá por uma hora até que alguém começou uma briga, e... E oque?

“Como vocês...-”

“Te encontramos? ” Andrés, um dos meus melhores amigos de escola, me interrompeu. Ele parecia cansado e manchado de sangue. Assenti e esperei pela resposta.

“Então, como a social na casa daquela sua amiga, a Marcela, tava um saco, esse gênio aqui” ele apontou pra o garoto que eu não sabia o nome “resolveu nos arrastar pra essa festa que ele ficou sabendo. O único problema é que ninguém nos avisou que era só mais um clube cheio de drogados. Já estávamos indo embora quando começaram a brigar e ficamos presos numa sala. Quando eu consegui sair, te achei jogada no chão do corredor e a policia já tava entrando por todo o lado. Então te arrastamos pra cá. Acho que não deu pra andar nem três quarteirões. ”

Merda. Sabia que agora estava ferrada. Nenhum dos amigos sabia de algumas das festas que eu frequentava, e pretendia manter daquela maneira. Ia abrir a boca pra falar alguma coisa, mas não conseguia pensar no que. Minha cabeça latejava.

“De qualquer forma, eu prefiro nem saber oque você estava fazendo lá. A sua cabeça tá toda manchada de sangue, e se ele é seu, é melhor ir pro hospital. ”

Passei a mão na minha nuca. Ela parecia encharcada, o que me assustou um pouco. A dor ainda era muito intensa e eu não conseguia identificar de onde vinha. Mas eu não poderia simplesmente ir pro hospital. E os meus pais? Droga, droga, droga.

Murmurei que não e tentei levantar apressada. Precisava sair dali e ir pra casa. Mas isso foi algo estúpido. Ao tentar levantar, minha cabeça doeu o que me pareceu dez vezes mais e senti minha visão se apagar de novo.

–---//----

“Seis pontos na nuca, meio litro de álcool no sangue e uma repreensão da porcaria do juizado de menores. Me esqueci de alguma coisa?” Meu pai perguntou. Sua voz parecia artificialmente controlada. Continuei fitando o chão e não respondi.

“Me esqueci de alguma coisa?” Ele perguntou de novo, mais irritado dessa vez.

“Não senhor.” Só tudo o que você não sabe, pensei.

Ele suspirou. O silêncio denso era capaz de engolir o som das nossas respirações. Já faziam três dias que haviam me liberado do hospital e meus pais ainda não tinham conversado comigo sobre isso. O sofá da sala do nosso apartamento nunca pareceu tão gelado.

“Tudo bem então. Não tem discussão. Você vai ir pro sul com a gente.” Meus pais andavam com essa ideia a alguns meses, mas eu havia suposto que ficaria morando em São Paulo com os meus irmãos, ou talvez com os meus tios, até me formar. E provavelmente isso era o que iria acontecer, até essa droga desse acidente se meter no caminho. Nunca algo tão sério havia acontecido durante alguma noitada. Eu sabia que eles não permitiriam que tudo continuasse igual, mesmo que não concordasse que fosse um grande problema.

“Eu sei.” Murmurei.

“Eu vou te perguntar uma coisa... e preciso que prometa que vai ser sincera na resposta” Minha mãe disse.

“Tudo bem. Eu prometo. ” Falei, mesmo sabendo que provavelmente não seria.

“Você... alguma vez...” Ela parecia nervosa. “Já usou algum tipo, qualquer tipo de... droga?”

Comecei a rir. Aquilo era inesperado.

“Além de remédios pra dor de cabeça? ” Brinquei.

Ela me lançou um olhar tão severo que me arrependi no segundo seguinte. Eliminei meu sorriso e respondi.

“Não, mãe. Não. Não seja tão idiota. De onde veio essa pergunta? ” Aquilo era uma meia mentira. Eu já havia experimentado algumas, mas não naquela noite. Fiz uma pausa pra formular minhas palavras. “Tudo que aconteceu foi que eu tava numa festa na casa de uma das minhas colegas do colégio, bebi um pouco demais e bati a cabeça, só isso. ”

“Então porque ninguém nos avisou que você estava no hospital, e ninguém estava lá com você?”

“Ninguém queria se meter em confusão, já disse. E além do mais, o problema era meu. A burrada foi minha. ” Suspirei.

Meus pais trocaram olhares e permaneceram em silêncio por algum tempo, talvez pensando se deveriam ou não confiar em mim, talvez pensando como fazer isso parecer pior do que eu fiz parecer. Naquele momento, talvez um pouco de culpa por tantas mentiras e abuso de confiança possa ter me atingido. Não que eu jamais fosse admitir.

“Desculpa. ” Foi tudo o que eu disse, enquanto abaixava o olhar para o tapete.

“Você sabe que está de castigo,?”

Assenti.

“Pode ir, então. ”

Me levantei e fui pra o meu quarto, onde tranquei a porta e deitei. O visor do meu celular marcava 94 mensagens não lidas. Vão continuar não lidas pra sempre. Pensei. Depois de me largarem no hospital, meus colegas haviam sumido. Não que isso me importasse. Depois de dois dias, todos os tipos de rumores já haviam se espalhado e todos os tipos de amigos e conhecidos me mandaram mensagens pedindo satisfações. Como se eu devesse alguma.

Assim como o esperado, o pessoal que inicialmente foi a festa comigo não me ligou. Bando de trouxas. Quem abandona um amigo desmaiado no meio de uma briga? Talvez eles simplesmente nunca foram meus amigos. Perceber isso machucou um pouco, mas eu não poderia dar bola por muito tempo. Isso não importava nada, agora que me arrastariam para morar tão longe.

Talvez isso não fosse tão ruim. Começar de novo... E repetir tudo de novo. Ou talvez não tudo, mas quase. Eu sempre tive comportamento e notas satisfatórias no colégio, e talvez fosse por isso que tanta gente me mandou mensagens confusas sobre o porquê de me encontrarem em um lugar daqueles. Eu não conseguiria enfrentar a resposta, mesmo se quisesse. Nem agora, nem nunca.

Lugares podem mudar. Pessoas? Talvez. Eu? Acho que não. Mas ainda estou decidindo se isso é bom ou ruim.


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Notas finais do capítulo

Bom, agradeço por ter chegado até aqui, sendo críticas e sugestões muito bem vindas ;)

Obs: Lembrando que desenvolvimento do enredo principal ocorre somente a partir do próximo capítulo.



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