Bring me Peace escrita por Bloody Butterfly


Capítulo 1
🍁One-shot - Bring me Peace🍁




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Hoje completa um ano desde que o perdi. Ainda sinto meu coração em pedaços, estilhaçado em meu peito, buscando algo a que se agarrar, uma esperança, uma luz.

Sinto que esses estilhaços nunca vão se reparar, é uma das verdades imutáveis que tomou conta da minha cabeça desde aquele maldito dia. Lembro-me como se fosse há pouco, todo aquele drama interminável. Não, não infinito. Foi rápido demais, cruel demais. Segundos o tiraram de mim, segundos o levaram para além da vida, além do que meus dedos podem alcançar. Além do toque, além deste mundo. Muito, muito longe. Tão distante, sua vida é a nuvem que flutua ao céu, levada pela brisa, obscurecendo o sol, chovendo e me dissolvendo.

Quisera eu poder pronunciar seu nome, porém este há muito tempo se repudia a sair por entre meus lábios. Um nome, apenas isso. Entretanto a mente se recusa a voltar a este mesmo ponto, nega a mim mesma o prazer doce amargo de sofrer à suas custas.

As lágrimas secaram há muito tempo, não tenho mais nenhuma que possa derramar. Tudo foi levado de mim naquela primavera, quando as nuvens flutuavam sobre minha cabeça, quase que um prenúncio da tempestade que me aguardava. Eu senti a eletricidade no ar naquele dia. No dia em que o mundo conspirava para extinguir nossa vida.

E, no fim, fui levada pela brisa, carregada pelas aragens para longe do universo que nos pertencia. Despedaçada, eu me desfiz no momento que seus olhos vidraram no infinito. Hoje não sou nada mais. Nada me resta, nada me compõe. Meus gritos, suspiros, lamentos e choros se esvaíram. É como viver com a certeza de que algo morreu dentro de si.

Nada sinto. Não mais. Como se o próprio sentir me afastasse da realidade fria e oca que minha existência se tornara. Porém a ironia parecia eterna. O que sentir isto mudaria? Afinal, mesmo no mais derradeiro fim, nunca cheguei a senti-lo perto. A tê-lo ao meu lado. Seu toque foi o máximo que experimentei, e já era o bastante para me arrepiar por completo. Tive somente o deleite de seu sorriso, que, como brisa primaveril, acarinhou-me a face e se esvaiu, risonho e cálido; trazendo a mim os ventos revoltos da tempestade fria que se abateria sobre Tokyo naquele ano.

O tempo, e, também, a saudade, transformaram meu interior num mar revolto de emoções impróprias. Dolorosamente profundas e intensas, capazes de causar em mim marcas irreparáveis. Meus sentimentos por ele, por eles, parecem inalteráveis à passagens dos meses, das estações.

Percebi, cruelmente, outra coisa nestes meses: as memórias poderiam estar tornando-se turvas e vagas, os dias poderiam continuar passando, sua vida poderia estar andando em frente, mas a dor, a tão insuportável dor, nunca iria embora. A perda, ainda que distante, pesaria sobre meus ombros eternamente.

Toji Hisami e Kokonoe Arata.

Twelve e Nine.

Seriam estas as memórias que eu teria, assim os guardaria em minha mente e coração. Não os terroristas abomináveis que assolaram Tokyo em uma onda de crimes, e sim os garotos assolados pelo Plano de Athena, as crianças perdidas que queriam dar um significado à própria vida. Os rapazes superinteligentes que não somente me acolheram quando ninguém me aceitava, mas aqueles que me ofereceram uma amizade, ainda que débil e pouco aparente. Aprendi a vê-los como são.

O tão frio e inconformado Nine, um dos melhores hackers terroristas do Japão. O garoto que apesar de não aprovar minha presença me quis consigo, aceitou-me.

E o sorridente e carismático Twelve, que aos poucos foi capaz de me cativar com seu sorriso tão doce. Sua personalidade infantil, brincalhona que contrastava com uma frieza quase imperceptível quando comparada a seu senso de travessura.

Ele estivera sempre comigo, sempre ao meu lado, sorrindo para a tragédia aparente que nos envolvia. Um mundo definitivamente caótico, mas um mundo nosso, um lugar ao qual eu pude pertencer. O tempo foi tão pouco, os melhores dias, os mais valiosos, que passei imersa no universo de Nine e Twelve. Naquele lugarzinho ínfimo, cheio de cenários de pólvora e demolições em massa.

Você quer viver?” Perguntara Twelve naquele dia.

Quando olhei na imensidão castanha de seus olhos fui capaz de ver a vida que envolvia sua orbes tão faiscantes.

A solidão, o sofrimento, os arrependimentos e toda a racionalidade desaparecera de minha cabeça por completo, e fui capaz de dizer que sim, que queria correr todos os riscos, queria sentir-me viva.

Tão singelo quanto as pistas deixadas por eles este algo brotou em meu peito. Um sentimento tão pequeno à primeira vista, tão insignificante que poderia ter sido deixado de lado. E não foi. Deixei-o preencher-me imprudentemente, sendo tomada pelo meu tão surpreendente primeiro amor. O tipo de emoção que me fazia arrepiar ao seu menor toque, sentir-me nervosa em sua mera presença, que causava uma arritmia avassaladora a cada sorriso dele. Cada sorriso que ele deixara para trás.

Quando fui levada à montanha russa. Amarrada a explosivos, pensei ser o fim. Eu, uma vida tão inútil, uma garota tão frágil, uma pessoa tão substituível, aceitei estar de frente a morte.

Se fosse por ele, morrer não teria importância.

E quando o vi, tão assustado, tão pequeno, chamando meu nome do chão, verti lágrimas. Twelve... eu fui egoísta. Uma parte minha queria tanto que você me salvasse, que acabei por me deixar levar. Meus olhos ardiam, meu peito ribombava, não mais em desespero, não, estava em júbilo. Por você ter vindo por mim, por estar aqui. É egoísmo, não importa o ponto de vista, mas que tipo de amor não é egoísta?

No fim, tudo o que pude fazer foi me desculpar. Ardentemente, veementemente. Por tê-lo feito trair Nine, por ter lhe ferido e o ferido também. Tudo para ver seu sorriso vacilar e seus olhos cintilarem.

Ei, você não precisa mais se desculpar.”

Talvez, na época, eu não precisasse realmente. Mas hoje, ainda sinto essas amargas palavras travadas na minha garganta. Eu me desculparia quantas vezes fossem necessárias se isso lhe trouxesse de volta.

Lembro-me de outra coisa que lhe perguntei em um dos poucos momentos que tivemos.

Você destruirá o mundo inteiro?”

Twelve nunca chegou a me responder, a emboscada foi o suficiente para que eu visse a realidade por si própria. Vocês não destruiriam o mundo que nos rodeava, e nem precisavam, pois o mundo ao qual nós três fazíamos parte já estava em colapso.

Se eu tivesse ficado mais tempo ao seu lado com certeza me apaixonaria por você. Mais uma vez. Pensei que aquele sorriso tão caloroso poderia me salvar.

Doce ilusão.

Nada poderia me salvar.

Estou estilhaçada por dentro.

Apenas caindo aos pedaços.

E, sem qualquer aviso, lágrimas salgadas estavam de volta a meus olhos escuros, escorrendo livremente por minhas bochechas sem impedimento algum. Pensar nele doía. Lembrar dele machucava. Reviver aqueles momentos era abrir as mesmas velhas feridas.

Eu queria poder odiá-lo por fazer-me sentir assim. Mas não consigo. Simplesmente não posso me privar da sensação de lembrar de seu rosto atemporal, permanentemente jovem e sorridente.

Ali, sobre a relva fresca e brisa suave, o céu ardia em chamas. O sol tocava a linha do horizonte e derramava cores quentes. Vermelho. Laranja. Amarelo e Ciano. A cor do pôr do sol, a cor da explosão. Tão nostálgica e avassaladora quantos os sentimentos que transbordavam dos meus olhos.

Sentimentos que, por mais que me doessem, nunca seriam esquecidos. Foi quando a ouvi.

Pareceu reverberar em minha mente quando surgiu no ar. Meras palavras flutuaram em minha direção como fumaça, cortando o espaço e me acertando em cheio. Não. Não meras palavras, mas simplesmente por seu tom, por seu timbre e levianidade inconfundíveis.

–Yo, Lisa! Já faz algum tempo! Como você está?

Não... não pode ser. Minha mente berrava em meio à perplexidade.

Meu corpo se virou por vontade própria. Meus olhos molhados querendo ver o que meu coração ouvia. E, assim que sua imagem tornou-se nítida pude vê-lo claramente.

Cabelos e olhos castanhos, cor de chocolate ao leite. Pele branca pálida e franja sobre a vista. E o sorriso sempre presente jazendo ininterrupto naqueles lábios brincalhões.

Emudeci. Paralisei. Travei por completo. As lágrimas já caiam em torrentes volumosas por meu rosto, minhas mãos trêmulas foram ao rosto, sobre meus lábios que também tremulavam.

Era aquela voz. A única voz capaz de trazer paz às tormentas de meu coração ferido. Era ele. Ninguém mais ninguém menos do que a pessoa mais importante que algum dia cruzou meu caminho.

Antes que minha mente e coração pudessem sequer assimilar sua presença meus braços já foram ao seu encontro, como nunca antes tiveram coragem de fazer. Senti seu corpo se chocar com o meu, e o mundo despedaçado sob meus pés pareceu desabar por completo. E se reconstruiu.

Meu universo quebrado parecia estar voltando aos eixos, as feridas abertas em meu peito começavam a cicatrizar, o vazio dentro de mim parou de me puxar para baixo. Meu universo caiu e se renovou, se reconstruiu em questão de segundos. Porque ali, em meus braços, bem apertado contra meu peito, estava meu mundo inteiro, estava minha felicidade, minha paz.

–Twelve...


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