Capítulo 013

Teste para Magos (Parte 2)

Mathen pensou em protestar enquanto via o amigo caminhar em direção ao adversário. Sarah, porém, segurou-o pelo ombro e enviou-lhe um sinal de negação com a cabeça. Ela queria ver como Kayan se sairia em um duelo de verdade.

Sem hesitar um segundo sequer, Dariou iniciou o embate. Enquanto ele se concentrava no feitiço warhi, uma quantidade considerável de água se acumulou sobre sua cabeça e, após isso, se dispersou na forma de uma centena de agulhas d'água, que avançaram contra o jovem mago com grande velocidade.

Mantendo a calma, Kayan conseguiu defender-se de maneira rápida e eficiente. A barreira transparente de aura se ergueu quase que instantaneamente e repeliu todo o ataque adversário, que apresentava muito pouca força.

Foi a vez de seu contra-ataque: ao mesmo tempo em que desfazia sua proteção, uma esfera de fogo começava a se formar em sua mão direita. Ele esticou o braço em direção ao adversário e uma poderosa rajada de fogo foi lançada contra o mesmo. Na tentativa de deter o fogo do inimigo, Dariou lançou um contra-ataque com um feitiço de água. No entanto, a defesa saiu muito mais fraca e apenas fez que muito vapor saturasse o ambiente, pois as chamas continuaram avançando sem perder velocidade.

Sua última esperança de se proteger foi um aurus pinn. A tentativa funcionou, embora Dariou estivesse com uma expressão de muito espanto e um pouco de temor. Sua barreira não parecia ser tão consistente quanto a que o Atreius havia conjurado, mas serviu ao seu propósito.

Novamente ele executou o feitiço do elemento água para formar novas agulhas. Elas, então, foram lançadas contra Kayan, que mantinha-se parado logo a frente do adversário.

– Ele não aprendeu que isso não funcio...

Sarah teve que se calar ao ver o corpo do amigo perfurado pelas dezenas de agulhas. Ela apenas não gritou porque o corpo começou a se tornar turvo e, finalmente, desapareceu por completo.

– Mas o que...!

Antes que mago pudesse exclamar qualquer coisa, Kayan havia reaparecido as suas costas com uma velocidade impressionante. Sua mão direita foi envolvida em eletricidade assim que ele executou o feitiço tangrea. Em seguida, ele tocou as costas do adversário, desferindo-lhe uma descarga elétrica muito poderosa, que o derrubou no chão, inconsciente.

– O que ele fez? – perguntou Sarah, incrédula.

– Acho que foi magia de ilusão – respondeu Mathen enquanto observava o amigo se aproximar. – Pensei que você não fosse bom na esfera ar ou eletricidade.

– Eu não sou – respondeu o Atreius. - Foi muito difícil pra mim aprender o tangrea. Além disso, ele sai mais fraco que os demais feitiços que eu consigo utilizar.

Mathen prestou atenção ao que o amigo dizia e pareceu entender sua explicação. Sarah, porém, passou ao lado do inconsciente Dariou Marfei e continuou até a próxima curva do labirinto. O que viu lá a deixou muito animada e ela apressou-se em comunicar os amigos.

– Chegamos ao final! Passamos no teste!

Os dois rapazes apressaram-se em se unir a ela. Assim que o fizeram, também puderam observar uma coluna cilíndrica de metal. Ela devia ter quase dois metros de diâmetro e toda a sua volta, que era de tom acobreado. Estava repleto de figuras do brasão de Drugstrein.

Os três apressaram-se em se aproximar. Kayan observou que a pequena esfera ainda estava a menos da um quarto de se tornar vermelha, o que provou que sua preocupação com o tempo era desnecessária.

– No três. Um... dois... três!

Seguindo o comando do amigo, cada pessoa da equipe tocou a superfície da peça de metal ao mesmo tempo. Ela começou a brilhar intensamente e uma pequena porta se abriu no local em que Sarah havia tocado. Eles esperavam que algo mais extraordinário acontecesse, portanto, não se assustaram.

Ao observar o novo ambiente, eles notaram que as paredes eram completamente lisas e o local era bem iluminado por lâmpadas mágicas. Degraus de uma escada em formato de caracol subiam em torno de um eixo de metal acinzentado.

Eles subiram durante alguns minutos, o que indicava que deviam estar retornando para o nível do primeiro piso do castelo, ou talvez até mais alto que isso.

Assim que chegaram ao final da estreita escadaria eles puderam ver que havia um saída tão estreita quanto a entrada. Eles atravessaram-na e, assim que o fizeram, depararam-se com Spaak, que os aguardava em pé.

O ambiente se resumia a uma pequena sala. As paredes eram de pedra e sem qualquer tipo de detalhe, exceto três luminárias. O mestre sorria para eles, enquanto os três retribuíam o gesto.

– Parabéns, vocês três passaram no primeiro teste. E já devem imaginar qual era o objetivo dele, certo?

– Certamente que sim. Ele foi feito apenas para testar nossa capacidade de agir em equipe, além, é claro, da capacidade de lidarmos com situações adversas.

– Exatamente, Kayan. Devo dizer que vocês três formaram uma excelente equipe e certamente serão mantidos juntos caso passem no segundo e último teste.

Em seguida, o mestre abriu uma porta de madeira.

– Podem passar e aguardem na próxima sala. Logo mais alguns magos deverão passar por aqui. Vejo vocês mais tarde.

Os três caminharam pela passagem indicada por Spaak. Todos estavam ansiosos pelo próximo teste, pois já imaginavam que tipo de teste seria.

O novo salão era muito mais amplo que a pequena salinha onde eles estiveram há pouco. As paredes eram de rocha cinzenta e, em um lado, havia muitas janelas. A tapeçaria era a típica de todo o restante do castelo, mas em formatos variados, que tirava a impressão de ser sempre a mesma coisa.

Havia, situadas em distâncias idênticas, amplas arenas, o que dava aos candidatos a certeza de que o próximo teste seria um duelo. De que forma isso seria decidido ninguém imaginava, mas certamente seria uma competição entre os presentes.

Em uma rápida olhada pelo ambiente, Kayan percebeu que em uma das laterais havia os outros dois mestres: Aghata e Luen. Eles estavam sentados em duas das três confortáveis poltronas e verificavam anotações em um livro que estava em cima de uma mesa de madeira nobre. Em um outro canto estavam três rapazes, que não chamaram muito a atenção do Atreius, pois seu olhar logo se desviou para Thays e sua equipe.

A contragosto de Sarah, Kayan caminhou até a garota que ele havia acabado de avistar; seus dois amigos o acompanharam.

– Olá – disse ele.

– Oi – a Cyren respondeu-lhe em meio a um sorriso.

Eles, então, repararam nas duas garotas que estava com ela. A mais alta e de cabelos castanhos era Ellien, que Mathen já conhecia bem. Ela tinha a cintura muito fina e seu rosto era muito bonito. A outra garota tinha os cabelos loiros e era pouca coisa mais alta que Thays. Ela chamava-se Sonnya, mas Kayan não se lembrava do nome dela, apesar de terem estudado juntos.

– Vocês foram os primeiros a concluir o teste? – o Atreius perguntou para a amiga.

– Na verdade não, chegamos pouco antes de vocês três. Aqueles foram os primeiros.

A garota apontou os rapazes em um gesto discreto e Kayan reparou um pouco melhor neles. Era notável que os dois mais jovens eram gêmeos. Seus cabelos eram castanhos, os olhos escuros e as sobrancelhas muito grossas.

O mais velho também era semelhante aos outros dois, o que indicava que os três eram irmãos. No entanto, apesar dos cabelos e olhos da mesma cor e sobrancelhas parecidas, seus cabelos eram bem mais longos que os muito curto dos dois irmãos mais jovens. Abaixo dos olhos todos eles tinham uma pequena marca em formato elíptico, algo que Kayan achou muito curioso.

– São os irmãos Wigg – Mathen informou a todos. – Antigamente eles eram uma família numerosa e influente na Ordem de Drugstrein. Todos os reconheciam graças as duas pequenas tatuagens abaixo dos olhos. Nas últimas décadas, porém, eles começaram a perder poder e, com a Rebelião Negra, praticamente desapareceram. Esses três são os últimos deles, até onde sei.

– Será que eles são bons? – Kayan perguntou enquanto observava-os. O mais velho o encarava com estranho interesse.

– O mais velho chama-se Karion. Ele tem dezesseis anos e tentou esse teste há dois anos atrás, mas não conseguiu passar. Seus dois irmãos, Anion e Arion terminaram o curso no ano passado, mas não fizeram o teste daquele ano. Eles passaram em tempo recorde no primeiro teste, então devem ser magos muito competentes – explicou Mathen.

– Ele deve ser um adversário formidável, esse Karion.

Sarah, então, percebeu o que os dois rapazes faziam. Eles se desafiavam com o olhar.

– Quero duelar contra você – disse Thays, de repente, para Kayan.

– Você também será uma ótima adversária. Também gostaria de te enfrentar – respondeu ele, sem surpreender-se.

Sonnya, então, manifestou-se.

– Vocês são doidos. Já vi o que a Thays é capaz de fazer. E você, Kayan, pela fama que tem... não quero nem passar perto de um duelo contra vocês dois.

– Tem razão, Sonnya, esse teste devia ser separado entre os magos normais, como nós, e os excepcionais, como esses dois.

Ellien fez seu comentário, que provocou sorrisos de satisfação em Kayan e Thays.

A conversa se estendeu durante pouco mais de uma hora. Após isso, todos os que haviam obtido êxito no primeiro teste já estavam reunidos naquele grande salão. Neste momento, então, os três mestres chamaram a atenção dos presentes para explicar como seria o segundo e definitivo teste a ser realizado.

O barulho que os jovens magos faziam foi diminuindo gradativamente enquanto os três mestres pediam a atenção de todos. Luen Gastler foi quem iniciou o oratório, parabenizando os candidatos.

– Temos aqui quarenta e oito candidatos, ou seja, dezesseis equipes conseguiram passar no primeiro teste, o que é um número formidável. Infelizmente, nem todos terão vagas como magos de Drugstrein, portanto, os mais capacitados a duelar serão os selecionados.

– Vinte e sete é a quantidade de magos selecionados a cada duas estações, sendo vinte e sete na primavera e vinte e sete no outono. A avaliação será feita através de duelos com limite de tempo, onde uma vitória atribui 3 pontos e um empate apenas 1. Os primeiros candidatos a somarem 9 pontos serão os qualificados a entrarem para a nossa ordem.

Aghata falou de maneira rápida, mas todos conseguiram compreender o sistema que seria empregado no teste final. Spaak, então, pegou uma pequena caixa, que ele demonstrou estar repleta de esferas de madeira numeradas.

– Cada um de vocês deverá pegar uma dessas por rodada. Os magos que tirarem o mesmo número duelarão entre si. É claro que dois magos não poderão duelar entre si duas vezes. Boa sorte e que vençam os melhores.

A caixa de madeira foi colocada em cima de um pedestal. Os candidatos eram chamados por seu nome um a um e, aproximando-se do local, retiravam seu número.

Kayan foi um dos primeiros a ser chamado e, para sua infelicidade, demorou a saber contra quem iria ser seu primeiro duelo. Por fim, após sua espera, seu adversário pegou o número idêntico ao seu próprio. Então todos exclamam ao ver a assistente escrevendo o nome dele no painel utilizado para esse fim: Karion Wigg.

Os olhares dos dois rapazes se cruzam em desafio um ao outro. Assim que ele se afastou do local, Kayan disse, entusiasmado, aos amigos.

– Perfeito esse sorteio. Esse duelo será muito bom.

– Você é maluco? Esse cara é praticamente um veterano. Vai ser muito difícil pra você vencer esse duelo – Mathen desaprovou a alegria do amigo

– Sim, mas é nisso que está a diversão. Vou poder me testar em um combate de verdade. Estou ansioso.

Com exceção de Thays, todos acharam um absurdo o que o amigo dizia. Entretanto, cada qual comentou o que achava do próprio adversário.

– Eu acho que tenho chances de vencer. Meu oponente não deve ser assim tão forte – disse Sarah, confiante.

– Kayan, você tem sorte. Meu adversário vai ser um mago mediano que eu nem conhecia até agora há pouco – comentou a garota de cabelos azulados.

– Não se preocupe – disse à Thays. – Os próximos serão melhores que esse.

Eles aguardaram o fim do sorteio e, então, os primeiros confrontos tiveram seu início. As arenas eram três, pois cada mestre deveria supervisionar uma delas. Kayan não estava muito feliz com a espera, mas nada podia fazer além de assistir o duelo de seus amigos.

Sarah encontrou alguma dificuldade, mas venceu o seu embate. Mathen, por outro lado, conseguiu a mesma coisa de maneira muito mais fácil, fato que o deixou muito mais confiante em sua própria capacidade.

Por fim, depois de quase duas horas aguardando, Kayan e Karion foram chamados para subir na arena. Os dois rapazes seguiram para o local indicado e o Atreius cumprimentou Spaak que seria o juiz do duelo. Os dois rapazes se estudaram mutuamente e, antes que qualquer ação tivesse início, o mais velho decidiu dizer algumas palavras ao mais jovem.

– Então você é o famoso Kayan Atreius?

– Não sei se sou famoso, mas este é meu nome.

Certa hostilidade ficara óbvia no tom de voz empregado pelos dois.

– Fiquei sabendo de coisas que você fez enquanto estudava aqui. Provavelmente você fará parte da Ordem de Drugstrein, mas este duelo você não vencerá.

– Quanta prepotência. Quer dizer que você acha que o embate está decidido antes mesmo de começar?

– Você não tem a menor chance.

A maneira como o Wigg o tratava, com tanta arrogância e ar de superioridade irritaram o Atreius e faziam-no lembrar-se de Viktor Smalter, que havia voltado para a guilda do próprio pai. No entanto, apesar da antipatia que tinha por seu adversário, ele não deixaria que isso lhe atrapalhasse e duelaria com frieza e habilidade.

Eles se posicionaram. O duelo estava para começar.