The Road Behind Us escrita por Ethereal Serenade


Capítulo 1
Capítulo 1 — Back to Jackson City


Notas iniciais do capítulo

Okay, eu estou postando como uma forma de teste, apenas. Para ver se a coisa vai conforme eu quero (e não seja decepções atrás de decepções, como foi com Faithful). As atualizações podem ou não demorar, dependendo de mim e das minhas leitoras betas. Pode ser que eu atualize dentro de um mês, ou uma semana. Pode ser que eu altere esse capítulo futuramente, o que é bem provável. É um teste, como disse. De qualquer forma, esse é um projeto que eu não pretendo abandonar de maneira alguma.

Boa leitura o/



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/587108/chapter/1

I

Somos feitos de carne, mas temos de viver como se fôssemos de ferro.

— Sigmund Freud

*

— Okay.

Assim que a palavra saiu de seus lábios, veio uma sensação de que algo pesava sobre seu estômago. Joel hesitou — como se reconsiderasse tudo que contara num único instante. — no momento em que ela havia pedido para que ele jurasse que tudo era verdade. Sentiu, em seu interior, que ela sabia. Que ele mentiu. O pensamento se apresentou como uma verdade sutil, como se estivesse ali o tempo todo, apenas na espera de que Ellie percebesse.

Como quem vê através de águas cristalinas o fundo de um lago, aquela verdade era muito, muito clara. Ela descera por si muito mais suavemente do que quando ele contara o que acontecera quando encontraram os Vaga-lumes. E aquilo lhe causava uma estranha sensação de desconforto.

Ele deveria ter seus motivos. Tinha que ter. As pessoas fazem isso, não fazem? Mentem — a palavra pareceu absurdamente amarga naquele momento. — quando sentem necessidade. No entanto, era Joel. Aquele que a protegeu por todo aquele tempo, de tudo e de todos. Sua história, todavia, de que havia várias pessoas imunes como Ellie não era nem um pouco verossímil... Era, de todas as maneiras, impossível.

— Bom — Joel se manifestou, em meio ao silêncio incômodo que se perpetuara entre os dois. — Então vamos.

Joel começou a descer a elevação de terra, desviando-se das partes mais íngremes e das pedras. Contestou que não ouvia os passos de Ellie logo atrás de si.

— Ellie! — Joel voltou-se para ela e gritou. Sua voz repentinamente alta a pegou desprevenida, assustando-a. — Vamos logo!

— Certo. — Murmurou baixinho, mais para si. — Vamos lá.

Ellie se abaixou para saltar com mais cuidado uma parte da elevação, e chegar onde Joel estava. Ele a instruía para fazer o mesmo percurso que ele, alegando que o terreno era instável. Em dado momento, Ellie pisou sobre um amontoado de terra que começou a deslizar devido seu peso. Joel a segurou, evitando sua queda. Ele foi o primeiro a chegar ao chão, e a ajudou a descer, estendendo a mão para ajudá-la.

Ele não mentiria para ela. Cada gesto seu deixava claro o seu cuidado que tinha, o quanto se importava. Você não costuma mentir para alguém que gosta — com quem se importa, não é? Ellie pensava em tais coisas, enquanto caminhava atrás de Joel. Não, ele não mentiria. Mas por que era tão difícil aceitar complacentemente toda aquela história?

Chegaram, enfim, na cidade. Jackson City se encontrava totalmente rodeada por muros altos improvisados com cercas elétricas no topo. Duas torres de vigilância se erguiam, uma de cada lado do portão. Joel, ao ver que uma delas contava com a presença de um homem, se aproximou com cautela. As armas estavam no coldre, e as mãos prudentemente levantadas.

— Vocês dois, parem aí mesmo — Ordenou o homem que estava na torre à direita. A espingarda que ele portava estava apoiada sobre a cerca da torre. — O que vocês querem aqui?

— Meu nome é Joel. Sou irmão do Tommy. Ele... Ele espera por nós.

O homem mantinha um ar desconfiado, alternando o olhar entre Joel e Ellie. Tinha traços rústicos, barba rala e olhos e cabelos escuros. Ainda com o dedo no gatilho, ele levou a mão que segurava o cano da espingarda ao bolso, onde guardava um walkie-talkie. Comunicou-se através dele por alguns instantes, e então voltou para os dois:

— Aguardem um instante, estão vindo para reconhecê-los.

Alguns minutos se passaram enquanto Joel e Ellie aguardavam, sob o olhar furtivo do vigilante. Embora ele parecesse um pouco menos intrigado com eles dois, ainda os encarava como quem espera um comportamento repentinamente beligerante.

O portão estalou, e quando se abriu, revelou a figura de Tommy e de Maria. Tommy se adiantou, vindo em passos apressados e com um sorriso caloroso no rosto.

— Meu Deus, Joel. Achei que esse momento nunca chegaria. — E o abraçou, ainda mais forte do que da última vez que haviam se visto. Desta vez, Joel não fora pego de surpresa pelo gesto por parte do irmão, e o retribuiu em igual afetuosidade. Quando se afastaram, Tommy perguntou:

— Quando tempo se passou? Um ano?

— Não exagere. — Joel respondeu sorrindo. — Eu diria que se passaram alguns meses. Sete. Oito, no máximo.

Maria observava os dois com um ar divertido. Todo aquele tempo que se passara desde que Joel e Ellie haviam partido se mostrou um período excruciante para Tommy, onde não tinha um único dia em que ele não se colocasse em uma das torres de vigilância que davam para a floresta ao entardecer, aguardando o retorno do irmão. E agora, que finalmente ele voltara, a sensação não poderia ser menos que alívio, e felicidade por ele.

— E você, Ellie — Maria voltou-se para a garota. —, como vai? — Aproximou-se dela, colocando uma mão sobre seus ombros e guiando-a para dentro da cidade.

— Sobrevivendo. — Respondeu, num tom melancólico involuntário.

Os quatro atravessaram o portão, e o homem que fazia vigília no topo da torre se ofereceu para fechá-lo. Era a primeira vez que Joel e Ellie tinham um vislumbre da cidade de perto, e a primeira impressão que tiveram fora que era a cidade mais bonita que já tinham colocado os pés em muito tempo.

As casas eram pequenas, porém incrivelmente conservadas. Embora uma ou outra casa que viam apresentasse degradações, além de algumas janelas vedadas com ripas e jornais, grande parte parecia bem cuidada.

Algumas pessoas conversavam animadamente na frente de suas casas, uma com as outras. Havia também algumas crianças correndo pelas ruas, brincando com o que parecia ser uma bola de futebol. Duas pessoas, um homem e uma mulher, andavam a cavalo pelas proximidades, com os rostos encobertos por chapéus típicos de cowboys, e espingardas nas costas. À distância, acenaram para Tommy e Maria, e eles retribuíram.

— Espero que vocês dois fiquem dessa vez. — Tommy disse, e era visível a esperança que ele nutria quando pronunciou essas palavras. — Por Deus, Joel, achei que você tivesse morto!

— Depois de tantos anos vivendo nesse mundo, irmãozinho, você aprende algumas coisas para sobreviver.

— Não houve um único dia em que ele não falava o nome de vocês dois. — Maria revelou, sob um olhar de censura de Tommy, o qual ela ignorou. — Vocês não têm ideia de como foi difícil convencê-lo de que vocês se virariam sozinho. — Maria pausou brevemente, abrindo um ligeiro sorriso. — Levou dias para impedir de que ele partisse atrás.

Joel riu, olhando para o irmão que ia ao seu lado. Este parecia ligeiramente constrangido com a revelação que Maria dera.

— O tempo passa, e você continua o mesmo. — Joel comentou, nostálgico.

Ellie observava os dois, e ver Joel feliz daquela maneira não deixou de fazê-la se sentir igualmente feliz. Era a primeira vez que ambos teriam, verdadeiramente, paz. Aquela perspectiva de deixar a vida de sobrevivente para trás era algo estranho para ela; era como ter em mãos a concretização de um sonho idealizado por muito tempo, e vê-lo acontecer parecia quase surreal.

Tomaram rumo em direção a uma rua a esquerda. Todas as casas aparentemente não continham moradores, as vedações do lado de fora confirmavam isso. Se encaminharam até o final da rua, parando na frente de uma casa de dois andares.

— Agora que vocês dois estão de volta — Disse Tommy. — Posso finalmente dar... bem, um presente. — Ele indicou a casa na qual estavam na frente.

Era uma residência um pouco maior que as outras, com grandes janelas de vidro e uma porta dupla de madeira maciça com entalhes de arabescos. Porém, era maior que as demais, e ao lado havia uma garagem fechada. Também era a única que Joel e Ellie haviam visto que possuía um alpendre, embora contasse com alguns ramos de hera nas pilastras. De toda forma, era uma bela residência.

— Tommy, isso é...

— Levou tempo para arrumar tudo. E manter tudo em ordem deu um pouco de trabalho. Mas... Sempre achei que vocês iriam voltar... — Tommy declarou com a voz um pouco baixa.

— Isso é nosso? — Ellie indagou, sem esconder a surpresa escancarada em seu rosto.

— Ah, é sim. — Foi Maria que respondeu. — Há três quartos, e conseguimos concertar o aquecedor. Tem eletricidade, é claro, mas a casa possui um gerador próprio que ainda dá ‘pro’ gasto.

— Tommy, eu... eu realmente não sei o que dizer... — Joel estava aturdido. De todas as maneiras que ele pudesse ao menos imaginar sua chegada em Jackson, aquela sequer se mostrou uma possibilidade.

— Não diga nada. — Tommy colocou a mão sobre o ombro de Joel. — Você está em casa, irmão.

Ele indicou para que entrassem na casa. Joel e Ellie subiram a pequena escadinha para a varanda, e Joel deixou que Ellie fosse adiante.

— Vá em frente, garota. Faça as honras da casa.

Ellie não pode deixar de sentir uma estranha sensação apreensiva quando girou a maçaneta. A ideia de que teria uma casa era algo quase surreal. Ao final, aquela sensação de apreensão nada mais era do que uma expectativa velada, diante de algo que parecia inalcançável naquele mundo.

Era um lugar bem arrumado, apesar da condição da mobília ser decadente. Havia uma sala de jantar separada da cozinha, e outras duas salas que eram para receber visitas e outra para a TV, que embora não houvesse sinal, ainda poderia exibir alguns filmes por conta do aparelho de DVD que milagrosamente funcionava. A de visitas, por sua vez, contava com uma enorme lareira rodeada pelos sofás. Os quartos ficavam no andar de cima, e todos possuíam um banheiro próprio. Ainda contavam com um sótão, acessível através de uma portinhola no teto próximo aos quartos. Tommy informou que, se tudo corresse bem com os trabalhos que estavam sendo feitos na estação de tratamento de água, em breve teriam água corrente.

— Cara... isso tudo é nosso mesmo? — Ellie passeava pela sala de estar, fascinada pelas estantes cheias de livros. — É enorme!

Joel se dirigiu a sala onde Ellie estava, sentando-se em uma poltrona de couro cheia de furos na lateral. O móvel rangeu estridente, o que Joel ignorou. Nunca parecera tão confortável se sentar em uma daquelas coisas.

— Bom, vou deixá-los se acomodarem. Amanhã trarei algumas coisas que vocês irão precisar. Sintam-se em casa.

Maria se dirigiu a saída, e Tommy foi logo atrás. Antes que ele saísse, porém, Joel se adiantou, e lhe disse:

— Obrigado, Tommy. De verdade.

— Não há de quê, Joel. É bom ter você de volta.

*****

Quando Tommy saiu e ele e Maria se despediram, Joel fechou a porta e se dirigiu ao andar superior, onde Ellie se encontrava. Era possível ouvir o som de seus passos pelo assoalho. Viu que ela estava em um dos quartos, observando o ambiente.

— Escolha o quarto que achar melhor. — Disse à Ellie.

Meu quarto, pensou. Não estava acostumada a ter seus próprios aposentos. Passara grande parte da infância dormindo em quartos apinhados de beliches, onde várias pessoas também dormiam. Além disso, ela passou seus últimos tempos compartilhando com Joel, e preferia que continuasse assim. No fim, escolheu o quarto à direita, que dava uma boa visão para a cidade e não tinha janelas quebradas ou com remendos.

O quarto tinha um discreto odor de poeira e mofo. As paredes eram beges, como todo o resto da casa, e havia um velho calendário na porta. Havia uma cama de casal de madeira e uma cômoda, e um único criado-mudo ao lado esquerdo da cama, com um abajur e um minúsculo vaso de cactos secos. Ellie colocou sua mochila na cama, e começou a retirar seus pertences.

Retirou um pequeno saco de amarras onde guardava roupas sujas, os quadrinhos Savage Starlight e algumas cartas e bilhetes que encontrara ao longo de sua jornada. Dobrou os papéis e os colocou no criado-mudo, e suas roupas colocou dentro de alguma das gavetas da cômoda. Retirou, então, do seu bolso, seu canivete e o colocou lá também.

— Não tem muita coisa para se arrumar. — Comentou Ellie, enquanto fitava o objeto que manuseava.

— Nunca precisamos de muito para sobreviver lá fora. — Disse Joel, observando seus poucos pertences, se atentando para a lâmina nas mãos dela. — Ei, onde você conseguiu esse canivete?

Ellie hesitou um pouco antes de responder, ainda manuseando o objeto em suas mãos. Sem olhar para ele, respondeu:

— Era da minha mãe. — Disse com a voz baixa. — Ela deixou pra mim.

Joel se sentiu um pouco inconveniente ao ter perguntado aquilo. Apesar de todo o tempo que passaram juntos, e de todas as coisas que enfrentaram, sequer sabia algo a respeito do passado de Ellie além de vagas menções, porém não tinha conhecimento algum ao que se referia aos seus pais.

— E, hum... você a conheceu?

— Não. Ela morreu quando eu ainda era bebê, e então a Marlene passou a cuidar de mim.

A menção do nome de Marlene trouxe de volta a mente de Joel todos os acontecimentos que se desenrolaram quando Ellie estava em seus braços, na garagem, e ela tentou impedi-lo. Você ainda pode fazer a coisa certa. Aquelas palavras pareceram ecoar em seus ouvidos de uma maneira agonizante, como um fantasma. Tentou afastar aquelas imagens e sons de sua cabeça, e perguntou em seguida:

— E o seu pai?

— Ele tinha ido embora antes disso. É só o que eu sei.

E então Joel se sentiu incrivelmente mal por ter tocado naquele ponto tão delicado sem ter tato algum.

— Sinto muito.

— Tudo bem. Eu queria ter conhecido eles, mas... Querer não os trará de volta. — E ela o encarou com uma intensidade que ele jamais vira em seus olhos. — As coisas acontecem, e nós seguimos em frente.

Ellie abria a e fechava o canivete em suas mãos.

— Acho que isso não vai mais servir.

Ela foi até o quarto desocupado, cuja janela estava aberta. Uma brisa fria soprava, sacudindo as cortinas finas e transparentes. Andou até o parapeito da janela, sentando-se na beirada e observando o dia lá fora. Finalmente, deixou a lâmina do canivete exposta e colocou encostado no parapeito.

Era uma espécie de adeus, adeus a muitas coisas, embora Ellie não soubesse ao certo a quê, exatamente. Era uma despedida da vida de sobrevivente que levou por tanto tempo, a vida onde ela teve que matar para sobreviver. E de certa forma, representava um adeus a sua mãe, e por associação, ao pai que jamais conheceu e sequer soubera o nome, e a qualquer coisa que a mantivesse ligada ao seu doloroso passado.

Ao pensar na palavra pai, tão logo pensou em Joel. Desde os acontecimentos posteriores a ida a cidade do Bill, ela sentia que algo entre eles havia mudado, de uma maneira incrivelmente sutil. Com o tempo, ela passou a vê-lo como o que seria mais próximo que já tivera do que poderia considerar como pai. Era estranhamente reconfortante, considerando que jamais teve uma figura paterna em toda sua vida até aquele momento.

Admitir tal fato para si mesma naquele momento, todavia, parecia inviável. Os acontecimentos de Salt Lake City abalaram aquele pensamento, ninando seus sentimentos com uma sensação de desconfiança, mesclada com um profuso sentimento de decepção. No fundo, ela sabia que ele não havia contado a verdade. Ele jurou. Jurar é apenas uma palavra, mas Joel sabia do seu peso no momento em que fez seu significado valer? Ele omitiu — mentiu, corrigiu-se rapidamente. — Os verdadeiros acontecimentos, e por quê? O que ela não deveria saber a ponto de Joel inventar uma história tão disparatada?

Ela ouviria a verdade, algum dia?

E estaria ela pronta para isso?

E em meio a todo esse conflito interno, outra perturbadora questão a amargurava: por que ela, dentre todos, tinha que sobreviver? Todas as pessoas que ela havia conhecido — e que tinham se tornado importantes em sua vida. — estavam mortas, à exceção de Joel. Ela sobrevivera ao fim do mundo, suportado várias perdas e seguido em frente, enquanto era, também, a possível chave para a redenção da humanidade, pelo menos do que restou dela. E depois de tudo o que ela e Joel enfrentaram por todo aquele tempo, aqueles esforços se mostraram vãos.

Eles pararam de procurar uma cura, ele lhe afirmara. Havia muitos como você, Ellie. Vários. De repente tudo pareceu tão injusto. Por que não era Riley, recebendo uma oportunidade de vida como aquela? Ou Tess? Ou Sam? Por que ela tinha que ter permanecido viva? Por que tudo de repente parecia tão confuso?

A vida pode valer a pena, as palavras de sua mãe vieram como um sussurro suave, um lembrete para relembrá-la de que, embora naquelas dúvidas inquietantes, ela estava viva, e deveria fazer isso valer.

Joel a observava, silente, encostado na soleira da porta. Ellie percebeu sua presença, e quando seus olhares se encontraram, ela deu um sorriso ligeiramente triste.

— Está tudo bem? — Perguntou Joel.

Levou alguns instantes para que Ellie respondesse. Olhou mais uma vez para o canivete, e se levantou do parapeito. Encarou-o novamente, e respondeu:

— Está.

Não estava, mas Ellie não queria, naquele momento, dar vazão a tudo o que sentia. Depois de tudo o que aconteceu, um pouco de sossego em Jackson City seria muitíssimo bem-vindo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. E até o próximo o/