Ó Eros, ente que une os tais

Os contrários, os opostos,

Os diferentes ou os iguais.

Completarem-se, fado serão

No princípio eram os deuses,

e hoje ainda são.

Aria, morena de olhos avelã

Chama a moça que ali vai,

À Menina, destino de ser pagã

Ao canto doce, segue e se atrai

Uma música, um canto belo,

Infantil, a loira persegue.

Ela, doce como uva, jeito singelo,

Linda puela*, não há quem negue

Oi, como se chama?

Hanna, meu nome é, que é?

Me clama a brincar na lama?

Sim, é o que parece, zé?

Se inicia uma amizade

Talvez longa, não sei, breve

Resiste, pois, à idade?

Lama pra bolo também serve

Dez anos se passaram. Segundo ano do ensino médio. Os alunos voltavam às suas casas. Rotina de sempre. Nada novo. A cidade parecia a estar normal, apesar de eventos ainda recentes. Há um ano, morria uma garota. Escrota, marota, uma garota. Defina-a quem a defina-a? Cabe a todo mundo descrevê-la. Desenhar num quadro fúnebre, gelado. Todo cinza, mas o cabelo e os olhos de cor vária. Madeixas loiras, olhos cerúleos*. Rest In Peace, Bitch! Durma em Paz, tanto faz sua falaz. Seu retrato calado parecia dizer algo. Rosto Inerte, mas tremia na imaginação. Suas quatro amigas haviam tido pesadelos no início. Hoje, não mais. Só Emily.

Elas tinham seguido suas vidas. Vidas complexas, mas interessantes. Adolescência, fase de experimentar. Fase de enxergar o mundo com novos olhos. Fase de descobrir os amores. Fase de transição, do meio, como a terra está entre o mar e o céu. Como Gaia está entre Tétis e Urano. Fase, que se faze o divertir, menos uma garota morena e magra. Spencer esforçava-se a tirar boas notas para entrar na U-Pen, um dia. “Juíza ou Promotora? Juíza! Promover a acusação era jogo da Allison. E nisso era boa. Todos eram peças de seu tabuleiro. Mentir e esconder era sua arte. Segredos, meu bem, só são mantidos entre duas pessoas quando uma morre.

No dia seguinte, no horário de almoço, Hanna ouve que Emily era amiga também de Allison.

–É, faz um ano, e ainda sonho-a a me beijar.

–Emily, pensei que você sonhava com uma piscina, sei lá, cheia de garotas…

–Eu não sou você, que mostra o sutiã numa blusa transparente!

–Tá me chamando de cachorra?

– …

– Estou brincando. Quer uma pera?

Aria, la petite morena, passava e viu o rosto de Hanna. Parecia-lhe familiar.

– Oi, posso sentar?

–Ah fica á vontade, disse as duas, generosas.

–Obrigada

–Tu eras amiga da Alli também?

–Um… - replicou, hesitante, a pequena - Pode-se dizer que sim…

–É, mas a Alli nos fez um favor, não somos mais aquelas impopulares, han?

–Ah, oh, sim, creio que sim - disse, timidamente, a de olhos cerúleos

–Falando em nerde, olha quem vem?

–Emily, não evitou ser indiscreta, não podia deixar de notar a beleza de -Spencer.

–Emily? - acenou com a mão à frente dela a Aria

–Ô, me desculpem.

–Ô Emily, você tem queda pelas garotas, hã?

–Sim, não escondo. Amo-as

–O que faz você gostar delas? - inclinou-se Aria

–Sim, o que lhe faz gostar delas? - emendou Hanna

–Hum... a forma, o jeito, o cheiro...tão suave e arrebatador...não sei...acho que os anjos são como mulheres…

Hanna cruzou os braços em volta do peito, recostando-se à mesa, pensativa. Aria olhava para o plano da mesa, tentando trazer a imagem descrita por Emily.

–Você já beijou uma menina, Emily? - pontuou Hanna

Aria olhava à Emily, com sua expressão meiga, doce, que dá vontade de beijar e abraçar.

–Sim, já. Tinha 10 anos

Isto lembrava vagamente Aria de algum evento parecido. Mas não conseguia mesmo lembrar-se de verdade

–Eu acho que também, mas não tenho certeza - compartilhou a loira.

–Não lembro com quem dei meu primeiro beijo… - disse, a olhar levemente para cima, pensativa, a pequena morena.

A menina atlética ria daquilo, mas delicadamente.

–Tenho que ir à minha aula de natação - recolheu apressadamente Emily sua bandeja

Hanna e Aria a observavam se retirando, e depois de alguns instantes, encontraram os olhares.

–”Não sei, mas não consigo me lembrar de onde a conheço” - esforçava-se Aria.

–Então, nós éramos amigas de uma mesma pessoa e sequer nos conhecíamos - dizia Hanna totalmente amnésica de quando conheceu Aria ainda pequenas.

– Pois é, é curioso nos encontrarmos depois de sua morte.

– É…

Aria pensou em fazer uma piada de humor um tanto negro, mas não o fez. Hanna pegou de seu prato - Vamos? - E foram-se as duas para a aula de História

Elas sentaram-se na mesma fila, em cadeiras imediatas.

–Aria é nome curto de Berengaria - disse num tom cômico a bela loira

–Não! Eca! É Aria mesmo!

A loura não se conteve e deu uma leve gargalhada

–Então, turma, hoje vamos falar dos gregos - o professor era bonita, mas não chamava a atenção de Hanna nem Aria, talvez de Aria, mas muito timidamente.

Hanna resumia-se a rabiscar, a fazer desenhos de seus astros do rock. Ela gostava de rock, não de História - “Uh!”- pensou tremendo os ombros de nojo daquela disciplina. Já Aria, assistia à aula meio atenta, ainda absorta um pouco, tentando recuperar a lembrança de onde vinha a loira.

–A poetisa Safo, supostamente, escrevia poemas para suas amantes ou mulheres objetos de seu desejo.

Aria ouvia aquilo, mas nada vinha, só uns cachos loiros e a brunez da lama.

Hanna desenhava umas crianças, das quais duas eram meninas, a se incluir e uma brunete.

Levantou levemente os olhos e viu os cabelos brunos da parva morena.

Veio á mente uma ligação entre a morena à sua frente e à do desenho. Mas ainda nada exatamente.

Terminada a aula, Hanna se pôs a dirigir à sua casa. Aria caminhava, já que era perto sua residência. Emily entrou na porta traseira de um carro, conduzido por sua mãe. Spencer andava apressadamente em direção à carona de sua irmã.