Sobre amor, tartarugas e novas chances escrita por Blue Butterfly


Capítulo 26
Capítulo XXVI




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'Harriet!' Maura chamou do quarto. A menina se recusava a tirar o pijama de tartaruga. Ela pulava cheia de energia em cima da cama e já era quase uma da tarde. 'Harriet, por favor. Jane logo vai sair e...'. Nada. Ela não conseguia fazer nenhum acordo com a menina. Cansada, ela se virou e saiu do quarto e deixou que a criança continuasse pulando lá. A verdade é que ela estava nervosa. Ela odiava quando Jane precisava fazer esse tipo de coisa. O caso nem era dela. Frankie podia lidar com esse tipo de situação. Ele poderia, perfeitamente, entrar disfarçado num lugar e recolher informações sem problema nenhum. Maura entendia que era irmão dela, era seu cunhado, mas a perspectiva de Jane metida, mais uma vez, em missões assim... Ela não conseguia se lembrar de uma que não tinha envolvido armas disparadas e policiais feridos.

Ela seria apenas o reforço, caso desse algo errado. Mas e se algo desse errado? Uma pequena briga tinha acontecido entre elas na noite anterior por causa do assunto. Jane entendia o lado dela, mas não desistiu da idéia. E Maura, é claro, como ela podia exigir que Jane não fosse? Era o que ela fazia, afinal de contas. Então foi a médica que cedeu. Foi ela quem encerrou a discussão e disse que apenas estava amedrontada. E foram os braços de Jane que a abraçou lhe oferecendo certo conforto.

Mas ela ainda se sentia incomodada. Talvez ela estivesse reagindo demais àquilo. Mas não... Ela sabia que não era em relação apenas àquilo. O fato do caso da mãe de Harriet estar aberto a incomodava. O que agravava seu incômodo - e ela preferia nem pensar nisso - é que o homem que tinha sequestrado a menina tinha sido morto dentro do presídio. Ninguém sabia o porquê, ainda. Jane apostava que era por causa do risco de ele vender informações sobre a máfia para a qual trabalhava. Maura se arrepiava toda vez que se lembrava disso. Algo despertava dentro de si, deixando-a em alerta. Desde que o homem fora levado ao seu necrotério - ela escalou Susie para fazer a autópsia - ela havia ficado amedrontada. As suspeitas não se confirmavam e ela sentia que algo muito maior estava acontecendo - estava para acontecer.

Jane também estava em alerta, mas as investigações, o interrogatório com o assassino responsável não levava à nada, senão à uma briga entre presidiários. As testemunhas relatavam isso, e nada mais. E como eles poderiam dizer o contrário? A morena tentava tranquilizar Maura e depois de alguns dias a médica pareceu mais relaxada. Entretanto, algo dentro de si dizia que alguma coisa estava errada.

Alguma coisa iria acontecer. Maura não acreditava em sexto sentido, mas dessa vez ela tinha acertado em cheio.

'Vai ficar tudo bem, Maur. Eu já fiz isso várias vezes, se lembra?' Jane acariciou os braços da loira depois de ter prendido a arma na cintura.

'Eu sei.' Ela suspirou e ajeitou a blusa da morena enquanto se lembrava da bomba que explodiu antes de Jane alcançar o lugar, e dos tiros que a obrigaram a se esconder atrás de carros, de paredes. Ela tinha ficado bem. Ela esperava que a sorte se repetisse de novo e de novo, em cada vez necessária. 'Eu sei.' Ela repetiu. 'Se cuida. Se cuida e não se mete... Jane não se mete em confusão, ok?' Ela piscou os olhos verdes para a morena.

'Maura, eu nunca me meto em confusão.' Ela encolheu os ombros.

A loira tombou a cabeça para o lado como se dissesse 'sério?'.

'Eu prometo que vou me cuidar. É algo costumeiro, Maur. Nada vai dar errado, ok? O que pode dar errado?'

O que pode dar errado, era a pergunta que Jane tinha feito no mesmo dia que Paddy fora baleado. O dia em que Maura quase fora baleada. A médica não tinha tido nenhuma experiência bem-sucedida nessa área. Ainda assim ela se esforçou. 'Não importa o que aconteça, eu quero você de volta para mim.'

'Sim, senhora. Às oito da noite?' Jane sorriu aquele sorriso malandro e Maura lhe deu um tapa no braço.

'É melhor você voltar inteira.'

'SE você me deixar sair inteira!' Ela disse enquanto esfregava o braço.

Maura colocou as mãos na cintura e apertou os olhos, e depois balançou a cabeça.

'Hey, Maur. Eu amo você. Não se preocupa, qual é... Logo tô de volta, ok?'

'Uhum.' Ela disse enquanto Jane beijava seu lábios.

A morena direcionou para a menina que estava grudada nas pernas de Maura. 'Tartaruga! Sua missão é cuidar de sua mãe. Entendido?'

A menina se aproximou e colocou a mão na testa, em posição de 'sentido'. 'Sim, senhora.'

E Jane riu e a pegou no colo - ainda vestida com o pijama - e lhe encheu de beijos. 'Eu amo você, tartaruguinha. E eu volto logo.' Mais um beijo na bochecha.

'Eu amo você.' A menina respondeu e abraçou seu pescoço.

Depois da despedida Jane entregou a menina no colo de Maura e lhe deu mais um beijo nos lábios. 'Eu volto.' Ela sorriu e se foi.

Maura só fechou a porta quando viu o carro desaparecer pela rua, e Harriet apertou as pernas na sua cintura. Ela suspirou, se virou e trancou a porta. Com a menina finalmente em seus braços, ela viu uma vantagem.

'Agora', ela disse, 'nós vamos tirar você desse pijama.'

'Nããããooo.' Ela protestou e tentou se soltar, se contorcendo no colo da mulher, mas riu a medida que Maura beijava sua barriga e segurava-a pela cintura.

...

O relógio marcava 14:55. Maura esfregou os olhos depois de terminar de ler o relatório sobre o último exame feito em uma das vítimas que estavam no necrotério. Ela pegou o celular e digitou uma mensagem para Frost, dizendo que a toxina era realmente veneno, um difícil de ser identificado, a não ser por meio de exames clínicos. Portanto, de acordo com os resultados finais, o homem tinha sido assassinado. Mais um caso para uma semana corrida.

A loira descansou as costas na cadeira e olhou para o relógio mais uma vez. 15:06. O que era isso? A hora estava voando? Ela ainda tinha dois relatórios enviados por Susie para ler, e determinada a acabar antes do jantar, a loira abriu a nova pasta no email. Ela se perguntou o que Harriet estaria fazendo agora, já que estava tão quieta havia vários minutos. Como se em resposta à sua pergunta, ela ouviu um vidro se quebrar no andar de baixo.

Harriet já tinha quebrado um copo, um prato e uma xícara, tudo nessa semana. Ela se perguntou o que seria dessa vez. A fruteira em cima de mesa? Ela suspirou fundo. Ela não se importava com as coisas, apenas se preocupava com o vidro cortando a menina.

'Harriet.' Ela chamou alto demais e inclinou a cabeça esperando pela resposta. Ela estava se levantando quando a menina apareceu na porta.

'Sim?' Ela parecia completamente inocente.

Maura franziu o cenho. 'Você não estava lá em baixo?'

'Não.' Ela ergueu a mão segurando um morango. 'Bass.'

Oh. Oh. Maura se levantou rapidamente. 'Você quebrou alguma coisa?' Ela se apressou em dizer que não tinha problema.

'Não, eu só estava...'

Maura sentiu o corpo gelar. Algo tinha se quebrado lá em baixo. Ela não estava enganada. Ela juntou a menina nos braços e colocou o dedo indicador nos lábios em sinal de silêncio. Harriet obedeceu, já parecendo assustada. Maura escutou atentamente. Joe não estava latindo. Isso era um bom sinal, não era? Mas Maura se lembrou de invasores que jogam pedaços de carne com calmantes para os animais, e a apreensão a acertou em cheio de novo.

Alguém tinha invadido sua casa. Havia uma escada e um corredor a serem vencidos para que a pessoa chegasse nelas. Ela fechou a porta sem fazer barulho, se apressou e pegou o celular, rapidamente abriu as mensagens e desesperadamente selecionou a primeira pessoa da lista - a última que tinha encaminhado uma mensagem minutos antes. Frost.

O coração batia rapidamente no seu peito, e as mãos tremiam.

Invasão. Ajuda. AGORA!

Foi o que ela conseguiu digitar. Ela devolveu o celular em cima da mesa e pegou Harriet e, apavorada, se perguntou o que iria fazer para proteger a menina. Proteja a menina. Você precisa proteger Harriet. Maura, pense! Os olhos pousaram no armário e ele era a única solução possível.

'Harriet.' Ela sussurrou enquanto abria uma porta. Felizmente Maura era organizada e havia espaço de sobra para colocar a criança ali dentro. 'Você não pode fazer nenhum barulho. Você não pode sair daqui. Não importa o quê, não saia daqui. Você me ouviu?' Ela segurou o rosto da menina entre as mãos.

A menina balançou a cabeça em sim, apavorada. Os lábios se curvaram para baixo e os olhos estavam arregalados de medo.

'Querida', Maura disse com a voz calma, o máximo que pôde, de qualquer jeito, 'não chore. Vai ficar tudo bem, okay? Você só precisa ficar aqui. Eu cuido disso.'

'Mamãe.' Ela murmurou segurando firme no punho da loira.

'Eu amo você.' Maura beijou a testa da menina. 'Eu amo você. Não saia daqui, me prometa Harriet.'

'Eu amo você, eu amo você.' Ela dizia e Maura sabia que era 'fique aqui comigo', porque Harriet puxava o punho da outra para si.

'Querida, eu venho buscar você.' Ela se soltou e fechou a porta do armário. Rápido o suficiente em sua pressa. Lento o suficiente para ver os olhos assustados de Harriet implorando por ela.

Frost, leia logo a mensagem, por favor. O pensamento cruzou sua cabeça enquanto ela voltava para sua mesa. O que ela poderia fazer? Talvez devesse ir para outro quarto... Talvez despistasse, quem quer que fosse, de Harriet. Se suas pernas ao menos ajudassem. Ela parou para escutar, e para sua aflição a casa permanecia silenciosa demais. E se ela estivesse enganada? E se ela tivesse assustado a menina sem necessidade? Joe não estava latindo porque...

E se fosse Jane?

Mas ela sabia que não era, porque Jane sempre a chamava quando chegava em casa e não a encontrava no andar de baixo. Bem, talvez tenha sido a janela do vizinho...

A quem ela queria enganar?

Ela se sentou na cadeira porque mais um minuto e ela cederia ao peso das pernas. Ela esperou. Ela sabia que iria acontecer e dali de cima, do andar onde se encontrava, não havia escape. Frost, eu estou contando com você. Ela olhou para o celular que estava imóvel. Harriet obedecia e continuava em silêncio dentro do armário. Ela encarava o móvel que ficava bem na frente da mesa em que estava. A porta ficava à sua direita.

Boa menina, Harriet. Não sai daí. Por favor, querida, não saia daí.

E então ela ouviu. O medo havia se concretizado em passos no corredor. Ela sentiu o corpo enfraquecer. Ela queria chorar. Gritar por ajuda. Mas quem a ajudaria nesse ponto? Quem a salvaria?

Não saia, Harriet. Por favor minha garotinha, não faça barulho.

Ela apertou os olhos com força. O que ela iria fazer?

A porta se abriu lentamente, e ela prendeu a respiração e sentiu o sangue sumir de seu rosto quando a figura de um homem se materializava na passagem da porta.

Ela se levantou trêmula da cadeira, descobrindo que podia ficar em pé. Mais do que isso, ela descobriu uma faísca de fúria crescendo no peito.

'Quem é você? E o que você quer?' Ela perguntou com a voz rouca - trêmula - e apertou os dentes.

O homem deu um passo para frente, colocou as mãos no bolso da calça e sorriu. Um sorriso malicioso. Irônico. 'Eu acho que nós dois sabemos o que eu quero, doutora.'

Ele sabe quem eu sou, Maura pensou. Mas nessa altura, quem não sabia? Em quantas revistas ela tinha saído por causa de seus artigos? Em quantos jornais ela contara seu rosto estampado, ao lado de Jane ou não, por ser filha de Doyle? Ela havia se tornado uma figura pública, assim como Jane. Os habitantes de Boston, os conectados diariamente à televisão e as manchetes sabiam.

Quando Maura correu os olhos pelo rosto do homem, algo estalou dentro de si. Ele era familiar. Ela já o tinha visto. Mas aonde? Ela deu um passo atrás, de modo que ficou entre a outra extremidade da mesa e ele. 'Não faço idéia.' Ela insistiu. Frost, por favor.

'Deixa eu clarear sua mente confusa, doutora.' Ele fez um sinal com a mão, se referindo à casa. 'Você não vive aqui? Com a sua detetive e uma certa garotinha?' Ele sorriu ironicamente.

Uma certa garotinha. Ela estava certa, ele queria Harriet. Ela resistiu à urgência de olhar para o armário. Não denuncie o esconderijo dela! Maura balançou a cabeça em negativo.

'Não tem ninguém aqui. Apenas eu. Minha mulher já esta a caminho de casa e se você sair antes... Eu não presto queixa.' Um fiasco, Maura. Uma tentativa ridícula de acordo. Entretanto, o que importava para ela era o tempo... porque ela estava contando com Frost, porque ela estava esperando desesperadamente que ele e Korsak abordassem de surpresa aquele homem.

'Acho que você sabe tão bem quanto eu que isso não é verdade.' Ele deu um passo à frente e Maura se sentiu ameaçada, encurralada.

Ela não recuou. Ela podia ser forte também. Ela faria o que fosse preciso para proteger Harriet. E com uma pontada de dor, ela se deu conta de que era assim que Jane se sentia todas as vezes que colocava a sua vida na frente da de outra pessoa, em proteção. Era assim que Jane se sentia quando se colocava na frente de Maura em situações de perigo para protegê-la. Era isso que significava se doar por outra pessoa. Maura entendia agora, e ela sentia tanto orgulho de Jane nesse momento. Sua brava e corajosa Jane. A realização lhe deu coragem, força. Ela ergueu a cabeça e endureceu o rosto.

'Acho que você sabe tão bem quanto eu que você não vai conseguir o que quer.' A voz soou firme, diferente de antes.

O homem deu alguns passos à frente e parou a um metro de Maura. Ela notou, com um tremor, que ela tinha que erguer a cabeça para poder encará-lo. Ele era muito mais forte, sem dúvidas. Ela era menor, mais magra e fraca. Ela lutaria se fosse preciso, mas por quanto tempo aguentaria?

'Você não tem idéia de onde tá se enfiando.' A voz grave e ameaçadora arranhou os ouvidos, mas ela permanecia firme.

'E você sabe aonde eu posso te meter?' Ela ameaçou de volta, e talvez fosse porque ela era casada com Jane, uma detetive, talvez porque seu pai - biológico - fosse um chefe de máfia, mas a ameaça tinha soada tão verdadeira ao deixar seus lábios.

'Docinho.' O homem avançou e segurou seu rosto com força, com uma única mão. 'Você me entrega a menina, e eu não machuco você.'

Maura estava assustada. Ela sabia que tinha começado e ela não sabia como iria terminar. A mão pressionava de forma dolorida e ela segurou o punho do homem com força. Mesmo em desvantagem, mesmo sendo menor... 'Nunca.' Ela não cedeu. Em vez disso, ela levantou uma mão e com toda força que conseguiu juntar tapeou o rosto do homem. As unhas desceram com força na pele do rosto dele.

Ele a soltou imediatamente com um empurrão, e desorientada ela bateu a cabeça em uma... no que tinha sido? Na quina de alguma escultura que estava na estante? Sim, porque agora ela estava espatifada no chão. Sua testa estava cortada, ela sabia.

Irritado, o homem avançou para ela novamente, e sem tempo de se recuperar, mas ainda assim não retrocedendo, ela não facilitou em nada. Um braço forte a prendeu na parede oposta, o impacto expulsou o ar dos pulmões e ela mal conseguia respirar. Ele pressionou seu corpo contra o dela, o suficiente para neutralizar qualquer movimento, mas o forte o bastante para enfraquecê-la.

'Me deixa ser bem claro, docinho. Seu QI é bem alto, não é? Acho que você vai entender. Você me entrega a menina, e eu não machuco você. Você continua com isso, e sua mulher vai chorar sobre seu corpo.'

Maura pensou em Jane. A detetive jamais cederia. Ela não entregaria Harriet também. Ela balançou a cabeça em negativo, e a falta de ar nos pulmões dificultava cada movimento. Ela murmurou alguma coisa inaudível, e ele sorriu.

'Quer tentar de novo, bonequinha?'

Ela balançou a cabeça e olhou para baixo. Ele desapertou o corpo dela, rindo uma risada sombria. Ela pegou uma golfada de ar e murmurou de novo.

'Nós cuidamos uma das outras.' Ela disse mais para ela do que para ele. Ela nunca soube se foram as palavras, ela se perguntou durante um bom tempo o que teria acontecido se ela jamais tivesse dito, porque logo em seguida...

'VOCÊ NÃO MACHUCA MINHA MAURA!' A voz de Harriet preencheu todo o quarto, furiosa, indignada. Algo atingiu as costas do homem e se partiu em mil cacos no chão.

Harriet tinha saído do armário. Harriet tinha tacado algo nele. Harriet estava tentando proteger Maura.

'Não!' Maura gritou desesperada, desconsolada. Por que Harriet tinha saído? Ele iria pegar a menina, ele iria levá-la para Deus sabe aonde e ela jamais iria vê-la novamente. 'Não!' E de novo, porque ela tinha sido atingida por mil facadas e o corpo doía terrivelmente. E lágrimas quentes escapavam de seus olhos. Toda força fora extraída de seu corpo. Todo controle de suas emoções tinha se dissolvido em medo.

Ela viu o sorriso maligno se formando no rosto do homem. Ela viu quando ele lançou um olhar vitorioso para ela que tinha sido derrotada. Ela notou, entre seu imenso desespero, o descuidado dele. Ela agiu por impulso. Chutou o meio de suas pernas com toda força que lhe restava - que ela nem sabia se era muita. Pego de surpresa, o chute lhe causou imensa dor e Maura se desviou para chegar até Harriet. Ela empurrou o homem para ganhar tempo e se apressou em direção a menina.

Proteja Harriet. Corra, Maura, corra!

Ela esticou os braços para alcançá-la e Harriet fez o mesmo, mas no momento em que seus dedos se tocaram, o homem ergueu Maura do chão, pela cintura.

'Não!' Ela gritou de novo, e naquele momento qualquer esperança tinha sido substituída pelo mais puro terror. Ela tentou se soltar, mas foi em vão. Ele a virou com força - com força – e jogou seu corpo magro contra o armário. A dor ecoou pelo corpo inteiro e sua visão escureceu por uns instantes. As costelas tinham atingido com força o armário de madeira... a maçaneta da porta. Ela soltou um gemido de dor e o corpo despencou no chão. O movimento causou uma nova onda de dor e ela trincou os dentes para abafar o som que estava prestes a sair de sua boca, mas em vão. Deus.

Ela esticou um braço para Harriet, porque a menina ainda estava fora de alcance. 'CORRA!' Ela gritou, o pulmão queimando em protesto. Para seu horror, a menina correu.

Em sua direção.

'Não...' Ela murmurou quando Harriet a abraçou. Ela estava machucada. As costas doíam insuportavelmente, seu braço doía e ela não tinha certeza do motivo. Harriet abraçou seu pescoço e depois passou os braços em sua cabeça, como se em proteção.

'Harriet, não...' Maura passou um braço em volta do corpo da menina e chorou. Ela havia perdido a batalha. Ela não se importaria em ser encontrada morta ali. Mas Harriet... Ela não conseguiria viver sabendo que a menina tinha sido levada às suas custas. O que aconteceria com ela? Seria vendida? Seria abusada? Seria morta, torturada?

'Não.' Ela murmurou de novo e apertou o braço com força na cintura da criança.

'Ma-ma-ma-maa.' A menina respirava fundo e choramingava, mas mantinha o abraço firme, se negando soltá-la. Protegendo-a.

E a sequência de eventos ocorreu tão rápida quanto a anterior.

Alguém havia arrombado a porta do andar de baixo. Por um minuto os três ficaram confusos com o barulho, até que...

'Maura?' A voz de Frost soou alta e insegura.

'Frost!' Ela gritou do quarto e viu o rosto do homem de contorcer em confusão. Ele avançou para agarrar Harriet mas Maura a abraçou com força. 'Não!' E agora ela estava furiosa. 'FROST!' Ela gritou mais alto e ignorou a dor nos pulmões. Esse homem estava enrascado. Sem chances, ele seria preso. Jane o esfolaria se tivesse a chance.

Ou Maura pensou. Quando os passos se tornaram altos na escada, ele fez sua escolha. Andou apressado até a janela, a abriu e sem hesitar... pulou. Os arbustos amorteceram a queda e de alguma forma ele conseguiu fugir.

'Maura!' Frost entrou de arma na mão e ela apontou para a janela. 'Merda!' Ele se voltou para ela. 'Ele fugiu!'

'Loiro', ela disse enquanto Harriet sentava em suas pernas, 'alto, c-com uma tatuagem no braço. Arranhei o rosto dele.' A médica disse rapidamente e Korsak que tinha entrado logo em seguida já estava passando o alerta para as patrulhas.

'Meu Deus, Maura.' Frost se ajoelhou na frente da mulher. 'Você tá machucada.' Não era uma pergunta. Ele apoiou a mão no joelho da loira enquanto ligava para Susie. 'Chang, preciso de você na casa de Maura e Jane. Agora. Traga um kit de primeiros socorros.' E ele desligou.

Harriet chorava assustada no colo da mulher, e Maura tinha os braços em volta da menina. Ela apoiou seu queixo na cabeça pequena da criança e sussurrou qualquer conforto para ela, e somente minutos depois, quando Harriet parou de soluçar, é que ela se dirigiu à Frost.

'Ela tentou... Ela tentou me proteger, Frost.' Ela engoliu o nó na garganta. 'Eu disse para ela ficar no-no armário e, Deus... ela saiu porque achou que podia me proteger.'

'Maura, vocês estão bem, ok? Ela tá bem. E nós vamos pegar ele. Eu prometo.' Ele apertou levemente o joelha da mulher, sabendo tão bem quanto ela que de agora em diante, ela seria tratada como vítima. Susie viria para recolher evidências.

'Frost, você pode segurar ela? Ela não... Ele não encostou nela.' Maura pediu depois de beijar a cabeça de Harriet.

'É claro.' Ele tentou segurar a menina mas ela se encolheu.

'Harriet, querida. Tudo bem. Você pode ir com o Frost? Você lembra dele, certo?'

A menina balançou a cabeça em sim.

'Você foi tão corajosa, Harriet. Você quase me matou do coração, mas você foi tão corajosa. Frost é meu amigo, e seu amigo, e agora você não precisa se preocupar. Certo?'

Os olhos azuis encontraram os verdes dela. 'Certo.' A menina murmurou e enxugou o rosto.

'Isso, ótimo. Eu amo você, tartaruguinha.' E Maura beijou a testa da menina.

Frost a recolheu em seu colo e se sentou ao lado de Maura.

A loira respirou aliviada, livre da pressão do corpo da criança contra seu corpo dolorido. Agora com a mente mais calma, ela pensou em Jane. A detetive iria armar uma cena, ela tinha certeza. Ela ouviu dois carros de patrulha para perto de sua casa. Tratariam aquele lugar como uma cena de crime. Maura odiava ser a pessoa que ela via todos os dias no trabalho - a pessoa desamparada, assustada, machucada. Ela fechou os olhos e desejou que Jane estivesse ali com ela.

'Frost', a loira disse e as duas cabeças viraram para ela, 'Jane não sabe.' E ela viu a cabeça do homem balançando em entendimento.

'Vou avisar...'

'Não.' Maura disse e balançou a cabeça. 'Korsak. Ele sabe lidar com a fúria dela.'

E Frost não se sentiu nenhum pouco ofendido - era a mais pura verdade. Depois de Maura, a única pessoa capaz de acalmar Rizzoli era Korsak.

'Certo. Eu vou dizer para ele.' Ele se levantou com a menina ainda no colo.

'Mamãe.' A menina murmurou e apontou para Maura.

'Você se senta do meu lado, querida?' Maura perguntou esperançosa. Ela sabia que de qualquer forma a criança não ficaria longe dela.

'Sim.' A garotinha respondeu.

Frost a colocou no chão e fez um gesto com a cabeça para Maura antes de sair. Ele parou na passagem da porta e conversava em voz baixa com Korsak. O homem mais velho balançou a cabeça em afirmativo e colocou o celular na orelha. No mesmo instante que ele sumiu, alguns policiais entraram no quarto. Susie foi a última a entrar e Maura se sentiu tão bem por ter outra mulher perto de si - alguém amigável - que seus olhos se enxeram de lágrimas.

'Dra. Isles.' Susie disse, o tom preocupado não passou despercebido. 'Eu sinto muito.' Ela olhou para Harriet e ofereceu o sorriso mais gentil que conseguiu no momento. 'Oi, Harriet.' E a menina mordeu o dedo e olhou curiosa para ela.

Maura balançou a cabeça e a mulher tomou a mão da loira entre as suas, agora já com as luvas. Ela esperou um tempo em silêncio, o tempo que Maura precisava para entender que ela estava do seu lado, que ela realmente sentia muito, que ela se importava com Maura.

'Pronta?' A mulher perguntou dando o controle da situação para a loira.

Ela achou que jamais estaria pronta, agora que Susie estava ali para começar o processo o ataque se tornava ainda mais real, e soava tão assustador quanto o momento da ação. Não, ela nunca estaria pronta, mas ela balançou a cabeça em sim, de qualquer forma.


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Notas finais do capítulo

O dom que eu tenho de estragar as coisas =P Não me matem. hehe