Sobre amor, tartarugas e novas chances escrita por Blue Butterfly


Capítulo 23
Capítulo XXIII


Notas iniciais do capítulo

Capítulo novo! Um pouco de tudo, espero que vocês gostem! :)



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Mudança. Era a palavra que Maura escolheu para definir esse específico momento de sua vida. Nenhuma outra caberia melhor para essa nova fase. Ela estava mudando, Jane estava mudando. E Harriet estava mudando. Isso a assustava ao mesmo tempo que a empolgava. Às vezes ela se perguntava se seria capaz, se os desafios alguma hora acabariam, se ela estava tomando as decisões corretas. Tantas coisas estavam diferentes desde que a menina chegara para ficar.

Começando pelo mais sútil e singelo momento das manhãs. Ela tinha contado sete vezes que Harriet entrara no seu quarto pela manhã, escalando a cama e se deitando entre ela e Jane, geralmente se enganchando numa ou noutra, o que significava que Harriet já estava com elas por oito dias. Ela por vezes acordava com o calor do corpo da criança ao seu lado, outras vezes com os dedos de Harriet dançando no seu peito coberto de sardas, ou no rosto, traçando desenhos invisíveis e abstratos. Quando ainda era muito cedo - mesmo para Maura - ela se virava na cama, abraçava a criança e dormia de novo. E Harriet dormia também, ou pelo menos ficava imóvel o suficiente para Maura voltar a dormir tranquilamente. Outras vezes a loira acordava e encontrava a menina deitada em cima de Jane, a cabeça virada para o lado, o cabelo escuro da criança se perdendo no da morena. Era gracioso e harmonioso o jeito como elas tinham suas semelhanças, e isso alegrava Maura. Nessas manhãs ela ficava dividida entre a tentação de beijar as duas até acordá-las ou simplesmente a pacificidade de ficar apreciando a cena.

É claro que as manhãs não seguiam tão calmas assim. Ao contrário de Harriet que sempre parecia disposta na primeira parte do dia, Jane continuava tão preguiçosa como antes. Acordar cedo era torturante para a morena, mas não podendo fugir da rotina, a alternativa continuava sendo a mesma de antes: acordar mal-humorada. Agora com a presença de Harriet, a irritação matinal tinha diminuído para quase nada, no máximo para um resmungado de palavras antes mesmo de abrir os olhos, e depois ela experimentava a transição da rotina anterior para a nova, o que lhe trazia um sorriso bobo nos lábios. Harriet era doce, esperta e sensível. Os dedos brincando com seu cabelo negro, enquanto ela esperava pacientemente por Jane acordar e se levantar, a deixava desarmada. As vezes Harriet murmurava algumas palavras para ela, do mesmo jeito que ela fazia para a garotinha antes de colocá-la para dormir. Certa manhã, quando a menina dormia encolhida na cama entre ela e Maura, Jane acordou com o murmúrio choroso da criança enquanto tinha um pesadelo. Ela a recolheu nos braços e sussurrou confortos, e quando a menina abriu os olhos ainda imersa em sono, sorriu disse seu nome. Jane se sentiu uma heroína - o tipo que mesmo o departamento de Boston não podia fazê-la se sentir. Harriet tinha voltado a dormir em paz em seus braços, sabendo que estava protegida de qualquer pesadelo que fosse a assombrar.

Não, elas não eram mais acordadas pelo soar frio e distante do alarme despertador. Em contra ponto, pelo menos nessa semana, nenhuma delas tinha sido acordada com o calor das mãos da outra. Não que importasse, por agora. Ainda que tivessem privacidade, elas não o fariam - Maura estava no período menstrual, o que significava que para qualquer tentativa de Jane, ela receberia não. Em relação ao futuro, elas descobririam um jeito de como lidar com isso. Nesse momento tudo o que queriam era aproveitar a companhia de Harriet. Uma coisa de cada vez, tudo em seu tempo.

E tempo era o que elas precisavam aprender a manipular. Ainda não tinham decidido pela escola da menina, o que resultava em Harriet em casa o dia todo. Maura e Jane trocavam os horários no trabalho, e quando não podiam se fazer ausente, Constance se oferecia para cuidar dela. Harriet - surpreendentemente - gostava de ficar com ela. A artista lhe ensinava formas educacionais de pintar desenhos. Alguns só com pontinhos, outros só com linhas, cores claras, cores escuras. Recortes e montagens com papel. Maura ficou surpresa quando Harriet lhe entregou um gatinho feito com caixa de leite, recortes e pinturas. Ela colocou a nova escultura na sala, deixando a mostra para quem quisesse ver. Quando Constance voltou para França, três dias atrás, Harriet passou a parte da manhã chorando, porque aparentemente sua granmér ficaria um longo mês distante dela. Quando Maura não entendeu a palavra, ela se viu obrigada a perguntar de novo.

'O que você quis dizer, Harriet?'

'Granmér! Minha granmér demora pra voltar!' Ela dizia inconsolavelmente, chorando.

Maura arregalou os olhos diante da realização. 'Você quer dizer grand-mère?'

'É.' Ela dizia enquanto limpava os olhos.

Maura olhou para Jane, um nó se fazendo na garganta. A morena sabia pouco francês, mas conhecia a palavra.

'Você sabe o que isso significa?' Ela perguntou ansiosa - e um pouco feliz, é verdade. O que Constance estava pensando, afinal de contas?

'Amiga mais velha?' Harriet disse incerta, como se não tivesse pensado muito nas palavras de Constance antes.

'Certo.' Jane confirmou ao seu lado, porque Maura não sabia mentir e porque ela tinha quase certeza de que se abrisse a boca, lhe escaparia um soluço e não palavras.

Maura tinha ficado surpresa com a cumplicidade e o afeto da mãe com Harriet. Nunca havia lhe passado pela cabeça, ainda mais nessa situação, de que Constance diria para Harriet que ela era sua avó. Bem, ela era a avó da menina agora, mas nada ainda estava claro. Talvez seja por isso que a mulher tinha dito a palavra em francês, e conotado um novo significado para a menina. Desde que nada tinha sido estabelecido e desde que ela não tinha pedido permissão a Maura e Jane, aparentemente ficara contente em ter a menina chamando-a de granmér, satisfeita em apenas ouvir Harriet chamando-a assim, mesmo que não soubesse o real significado. O que só aumentara sua vontade de chorar - porque estava comovida, não triste - com a atitude da mãe. A necessidade de ligar para a mulher tinha sido substituída pela necessidade de acalmar Harriet. O fato de vê-la tão abalada pela partida da artista deixara Maura preocupada e de coração partido. Ver Harriet chorando - ela descobriu - lhe causava dor física. Então ela tinha dedicado toda a parte da manhã para ela, procurando distraí-la com passeios, e Jane tinha jogado basquete e baseball com ela durante a tarde. Jane a colocou para dormir as quatro da tarde, e mandou mensagem para Maura dizendo que talvez, tudo aquilo fosse o resultado de uma noite mal dormida. Ao contrário do que se esperava, a menina tinha acordado uma hora depois, parecendo mais miserável do que antes. Quando Maura retornou para casa, a ligação para a mãe foi adiantada. Depois de trocar algumas palavras com a mulher, longe de Harriet, a loira passou o telefone para a criança. Maura nunca soube o que Constance disse, mas Harriet pareceu significativamente melhor depois de falar com ela.

Há duas noites atrás, elas receberam Hope e Cailin em sua casa. Maura sentia gratidão pelas palavras da mulher, e considerando a mudança de Hope em relação a posição que Maura ocupava em sua vida, a médica tinha decidido por criar um laço mais forte com ela também. Harriet não ficou surpresa ao saber que Maura tinha uma irmã mais nova, mas ficou perplexa ao descobrir que ela tinha duas mães. Ela tinha explicado para a menina num vocabulário adequado para sua idade que ela tinha crescido na barriga de Hope, mas que quem cuidara dela tinha sido Constance, e por isso ela tinha duas mães. Harriet observou e assimilou, em completo choque, como Hope e Maura se pareciam fisicamente, e ficou encantada com a companhia agradável de Cailin. A jovem tinha arrancado várias risadas dela, e no final da - sua - noite a garotinha tinha presenteado sua nova amiga com um desenho das duas. Jane tinha colocado a criança na cama quando os primeiros sinais de sono apareceram e depois descera novamente para se reintegrar à conversa entre as mulheres. Hope estava definitivamente feliz por Maura, e Cailin dobrara e guardara o desenho da menina em sua bolsa. A mãe biológica de Maura ofereceu à elas qualquer ajuda que pudesse dar no processo de adoção, e Cailin se ofereceu para cuidar da menina quando precisassem, principalmente nos finais de semana em que estava livre. As duas não poderiam ficar mais comovida com a atitude vinda delas, e a promessa de proximidade daquela parte da família tinha encerrado a noite da melhor forma possível.

É claro que nem tudo eram flores. É claro que Harriet tinha os momentos ruins e os de birra. Na tarde anterior, quando completou uma semana ali, a menina começou a chorar, do nada, simplesmente porque Bass tinha comido um pedaço da banana que ela tinha oferecido para ele. Ela não queria uma fruta nova, não queria abandonar aquela, e não queria, principalmente, que Jane chegasse perto dela. Irritada depois de ser recusada várias vezes, a morena deixou que ela chorasse por um longo tempo, e Harriet grudou os pés no chão e ficou em pé durante vinte minutos, brigando com Joe Friday quando a cachorrinha tentava lamber a mão, resmungando para Bass que tinha aceitado sua oferta, e chorando simplesmente porque... ninguém sabia. Em certo ponto Jane começou a rir, porque a situação era ridícula demais. Determinada, ela andou em direção a menina, pegou-a no colo e segurou com força quando Harriet tentou se soltar. Hora de encerrar a sessão choro. Ela se sentou no sofá com a menina no colo, segurando como se fosse um bebe, e descansou seu pequeno corpo em suas pernas.

'Ok, tartaruga. Já chega. Qual é o problema?' Ela perguntou e a menina ergueu a banana para ela, que agora já estava amassada, abrindo a boca e chorando mais.

Jane suspirou. 'Você não pode simplesmente aceitar outra?'

Um abano de cabeça, lágrimas novas escorrendo. 'Ok, ok... Vamos jogar essa fora?'

'Não!' Ela disse furiosa.

Jane franziu o cenho, a fruta tava praticamente escorrendo pela mão da menina. 'Ok...' Ela tentou de novo. 'E se a gente colocar ali em cima da mesa? Só enquanto a gente conversa? Depois você pode pegar de novo.'

A menina fez um bico e depois de pensar concordou com a cabeça. Ela mesma se levantou e colocou a banana lá, e depois se virou para Jane, ainda com um bico, parecendo magoada. Se Jane soubesse que era só birra, ela teria rido da cara da menina, mas ela parecia realmente chateada agora. A morena esticou os braços e, surpresa, ela esperou enquanto Harriet se aconchegava na mesma posição de antes.

'Sinto muito que Bass tenha comido sua banana.' Ela disse e viu os lábios da criança tremerem. 'Da próxima vez fica longe dele, ok?'

'Ok.' Ela disse entre uma nova onda de choro.

Jane começou a balançar o corpo para frente e para trás, levemente, enquanto falava com ela. 'Ele é um esquisito.'

'N-n-não.' Ela defendera o animal.

'Não? Ok. Ele não é esquisito.' Vai entender.

'M-m-meu Bass.'

'Sim, Harriet, ele é seu Bass. Ele gosta de você.' Jane a balançou no colo, esperando que o movimento a acalmasse.

A menina apontou para a banana na mesa e murmurou. 'Aca-cabou.'

Jane suspirou. 'Nós temos mais...' A frase morreu no meio da sentença. Não tinha sentido ficar discutindo sobre uma banana, o motivo tinha que ser outro. 'Harriet, querida... O que... Por que você tá tão triste? Não é só pela banana, é?'

A menina fungou e encolheu os pés no colo da morena. Jane acariciou seu rosto, limpando as lágrimas da bochecha. Agora ela olhava atentamente para Jane enquanto mordia os dedos da mão. Os dedos sujos de banana. A mulher fez uma careta e tentou afastar a mão da boca, mas a menina desviou-se e fechou a cara. Ela desistiu, não era uma boa idéia contraria-la agora. Pelo menos ela tinha parado de chorar.

'Eu tô aqui tartaruga.' Ela sussurrou enquanto embalava ela. 'Eu tô aqui com você.'

E Harriet ergueu os olhos para ela, inocentes e vulneráveis. Agradecidos. A menina encostou a cabeça em seu ombro ainda encarando ela, e Jane não deixou de notar a mudança de comportamento depois das palavras. Ela abraçou Harriet com força e beijou sua testa. A menina fechou os olhos conforme os minutos se passaram e Jane nem tentou colocá-la na cama - ou ali mesmo no sofá - para dormir. Harriet deslizou a mão por sua blusa, deixando um rastro melado de banana ali e segurou o tecido na mão com força.

Bem-vinda à vida doméstica, Jane pensou enquanto franzia o cenho. Ela mesma se deitou no sofá e aconchegou a criança numa nova posição antes que ela dormisse de vez.

O resto da noite tinha se passado consideravelmente bem, até o momento em que Maura tinha chamado as duas para a mesa na hora do jantar. Harriet comera apenas o que foi obrigada e até certo ponto. A cenoura em cubinhos tinha ficado amontoada no canto do prato junto com as ervilhas, e a garotinha parecia cansada demais, mesmo para levantar a colher. Quando Maura se conformou de que ela não comeria mais, disse que ela poderia voltar à sala para assistir desenhos. Concordando levemente de cabeça baixa, Harriet deslizou para fora da cadeira, e ignorando a presença de Joe aos seus pés, tropeçou na cachorrinha e caiu no chão, batendo a cabeça na perna da mesa. O grito de dor foi curto e alto, e tirou Maura da cadeira no mesmo instante. Entretanto, tinha sido o único som a escapar da boca da menina, que agora estava aberta na mais escandalizada expressão, uma mão pressionando um ponto da cabeça. Maura segurou sua cintura afim de levantá-la, mas sentiu o sangue congelar quando entendeu o que estava acontecendo: Harriet não estava respirando.

Apavorada, ela juntou a menina nos braços e procurou o olhar de Jane. O que ela deveria fazer? Ela sentiu sua própria respiração ficar pesada ao passo de que a menina continuava sem ar.

'Maura', Jane disse com toda calma, 'se você se apavorar, ela vai se apavorar.'

A loira fez que sim com a cabeça e se controlou, colocou uma mão no peito da criança e pediu com calma. 'Harriet, querida, você pode respirar para mim?'

Os olhos azuis encararam os dela, mas fora isso, nenhuma mudança. Maura abraçou a criança, segurou sua nuca e tentou de novo. 'Tá tudo bem, Harriet, não foi nada demais. Você me deixa conferir seu cabeça, querida?'

Finalmente o choro apareceu de novo, e Maura fechou os olhos em alívio. Um choro que não durou quase nada. Enquanto Jane retirava a mesa, a médica tinha se sentado com Harriet no sofá, massageando a cabeça da criança à procura de algo, mas nada tinha encontrado ali. A menina tinha os braços dobrados na frente do corpo, e mastigava os dedos da mão em seu jeito infantil, e parecia esgotada para quem tinha acabado de acordar. Será que ela estava ficando doente? Maura sabia que não tinha sido uma boa idéia Jane oferecer sorvete para ela nesse tempo frio. Ela encostou a mão na testa da menina mas a temperatura estava como deveria estar. Maura suspirou e acariciou suas costas.

'Parece que você teve um dia ruim hoje.' Ela falou baixinho e acolheu Harriet em seus braços, que agora tinha se encostado nela.

A menina suspirou e murmurou um único som, em concordância às palavras de Maura.

'Vou te levar para você escovar seus dentes e dormir, assim amanhã chega mais rápido e você vai acordar melhor. O que você acha?'

Os olhos piscaram para ela, mas a menina não disse nada. Maura tomou o silêncio como consentimento e se levantou com ela no colo. Ela observou enquanto Harriet escovava os dentes com paciência e lançava olhares a ela pelo espelho. Algo tinha dado muito errado para a menina nesse dia, e ela não sabia o que era. Se Jane não tivesse contado sobre o episódio da banana, ela diria que o choro ao tombo era totalmente normal, mas Harriet não parecia nem mesmo ser esse tipo de criança.

Depois de descer do banquinho - um que tinha sido designado para ficar no banheiro, justamente para a garota alcançar a pia sem problemas - Maura andou para dentro do quarto de novo e puxou o edredom. Harriet parou ao seu lado e segurou na barra de sua blusa.

'O que foi, garotinha?' A loira encostou a mão em suas costas e Harriet se encostou na perna dela. 'Pronta para dormir?' Maura insistiu de novo, mas a menina não disse nada. Aflita, Maura se ajoelhou no chão para ficar na mesma altura que ela e colocou uma mecha de cabelo escuro atrás de sua orelha. 'Harriet, você tem algo para me dizer? O que está acontecendo?' E o apelo em sua voz deve ter sido tão grande que a menina finalmente falou.

'Dói.' Ela suspirou.

Maura arregalou os olhos. Ela tinha perdido algo enquanto vasculhava a procura de hematomas na cabeça da garota? 'Dói aonde?'

'Dói, dói, dói!' Ela disse irritada porque Maura não a compreendia e começou a chorar de novo. 'Tu-tudo dói!'

'Shhh... Não vai doer mais amanhã, Harriet.' Ela recolheu mais uma vez a menina nos braços e a levantou. O choro era tão dolorido que Maura sentia o coração pesando ao ouvir o som. Ela não sabia o que era pior: o fato de Harriet estar chorando assim ou de ela não estar sendo capaz de ajudar.

'Ma-ma-ma-ma...' A menina dizia entre o choro, e o apelo deixava Maura fraca.

'Aqui, Harriet. Sua Maura. Eu prometo que vai passar, minha tartaruguinha.' Ela dizia enquanto sua mão acariciava gentilmente as costas da criança.

Levou tempo para que Harriet parasse de chorar. Custou energia para que Maura colocasse a menina em seu pijama de tartaruga. Tão logo a loira fechou o último botão do pijama Harriet jogou seus braços em torno de seu pescoço e resistiu quando a loira tentou deitá-la na cama. Ela soluçou quando Maura tentou soltá-la de si, e a ameaça de uma nova onda de choro a fez desistir da idéia. Harriet queria sua companhia, estava claro. Ela se deitou na cama com a menina apoiada em seu peito, e somente quando ela imergiu num sono profundo foi que a médica a acomodou gentilmente na cama, cobrindo-a com o edredom e com beijos.

'Amanhã você vai estar melhor.' Ela disse em voz baixa, esperando que fosse verdade.

Ela e Jane não demoraram muito para ir para cama também. O trabalho era exaustivo, e ter uma criança em casa adicionava carga extra de trabalho no dia. Maura estava preocupada com Harriet, mas Jane tinha quase certeza de que tinha sido apenas um dia difícil para ela, aparentemente sem razão nenhuma. Crianças eram assim, não eram? Dias bons e dias ruins. A preocupação foi cedendo lugar ao sono enquanto o carinho de Jane em seu cabelo a ninava preguiçosamente para a escuridão tranquila dos sonhos. Maura dormiu nos braços da mulher, protegida e aquecida da noite fria. Quando acordou, o quarto estava começando a se iluminar junto com o céu lá fora, mas o sol ainda não tinha aparecido. Maura se virou para o lado para se encontrar com Jane bem próxima a ela. Era cedo, muito cedo. A morena ainda dormia tranquilamente, a respiração igualada e calma. Maura levou a mão para o cabelo indomável de Jane e acariciou-lhe os cachos. Ela era linda sob a luz fraca da manhã - sob qualquer luz, realmente - e poucas foram as vezes que Maura resistiu a tentação de tocá-la; mesmo antes de começarem a namorar os gestos eram sutis e inofensivos, mas que levaram Maura ao êxtase. Agora que não havia barreiras, Maura se sentia livre para fazê-lo quando sentisse vontade. Ela aproximou seu corpo da morena e passou uma mão no seu quadril, apertando seu corpo contra o dela, em possessão. Jane era dela e durante sete dias seus corpos passaram tempo demais longe um do outro. A loira percorreu o contorno do quadril, da cintura e parou sua mão no ombro de Jane, e sem resistir a tentação ela beijou seu pescoço e seu colo. A morena se remexeu levemente, e Maura segurou as costas dela para mantê-la perto de si.

Ela precisava sentir o calor de Jane. Cuidadosa, ela conferiu a porta do quarto: fechada. Não havia nenhuma chances de Harriet entrar sem ser percebida. E as chances dela aparecer nessa hora eram baixas. Era cedo demais e ela parecia exausta na noite anterior. Confiante agora, Maura voltou sua atenção para a morena e deslizou a mão por dentro de sua blusa. A pele quente queimou em seus dedos, mas era uma sensação mais do que bem recebida. Seus dedos se encontraram com o seio firme da detetive e acariciaram, e depois ela apertou sua mão ali, arrancando de Jane um suspiro. A morena jogou a mão no quadril de Maura e pressionou inconscientemente seu centro contra a coxa da loira. Oh sim. Ela pretendia chegar lá, mas antes ela tinha muito a explorar. Ela virou Jane na cama e os dedos ligeiros começaram a levantar a blusa da mulher, e foi aqui que Jane acordou.

'Maur, muito cedo.' Ela murmurou, mas não mostrou resistência nenhuma quando a loira ergueu sua blusa acima do peito.

Maura respondeu beijando sua barriga, deslizando sua mão pela cintura e seios, se deliciando com cada parte que não tocava pelo que lhe parecia uma eternidade. Quando os lábios úmidos de Maura encontraram um mamilo endurecido de Jane, a morena se contorceu e soltou um gemido. Maura rapidamente levou uma mão à sua boca para abafar o som.

'Sem barulho.' Ela repreendeu, mas a boca de volta sugando seu seio tornava uma tarefa muito difícil de ser cumprida.

'Maur.' Ela sussurou enquanto a outra mordiscava seu seio. 'Sem provocar.'

A loira sorriu maliciosamente sabendo exatamente o que Jane queria dizer, mas optando ainda por sugar seu outro seio. Ela sentiu os dedos de Jane prendendo seu cabelo e a pressão do corpo da mulher contra sua boca. Ela sugou com força, prendendo o mamilo entre seu dente gentilmente e soltando em seguida. Jane arqueou as costas e mordeu os lábios para suprimir o som prestes a escapar de sua garganta.

'Maura, sem provocar!' Ela disse de novo, e de qualquer jeito Maura queria estar dentro dela agora. E sua mão deslizou facilmente por dentro da calcinha da morena, e como Jane havia pedido, ela não provocou. Os dedos percorreram o caminho que já sabiam de cor, e molhados e determinados penetraram Jane de uma só vez. Ela gemeu e Maura mais uma vez a repreendeu. 'Eu disse sem barulho, Jay.' E a loira pressionou seus lábios nos dela enquanto seus dedos investiam com força dentro da morena.

Jane precisava da sensação de Maura dentro de si. Ela precisava de seus dedos e do seu calor e de sua língua. Ela precisava do alívio. Ela precisava de seu corpo se contorcendo, como estava agora, sob o corpo da loira. 'Maura', ela murmurou pedindo por mais força, por agilidade. Por mais um dígito. Ela viu um sorriso se formar no rosto da loira e sentir dedos abandonando seu corpo, só para ser preenchida com mais. As costas arquearam novamente, e Maura, sem piedade, sugou novamente seu seio, enquanto movimentava os dedos ritmicamente dentro de si, mandando ondas e ondas de prazer pelo corpo inteiro.

'Não resista, Jane.' A loira sussurrou para ela, beijando-lhe o queixo. 'Eu posso te dar mais, mais tarde.' E ela pressionou a palma da mão no clitóris inchado da morena, e Jane sentiu o corpo tremer deliciosamente, enquanto sucumbia ao poder dos dedos da loira dentro de si.

'Oh!' Ela exclamou e Maura riu em malícia, adorando a sensação do corpo trêmulo de Jane embaixo do seu. E ela adorava ser a pessoa que, depois de fazê-la atingir um orgasmo com força, cuidava de Jane enquanto ela se recompunha. E era por isso que ela agora estava juntando Jane em seus braços, deslizando suas mãos nas costas suadas e definidas da mulher, como se recolocando e firmando cada pedaço de Jane em si, como se provasse a existência dela e do ato que tinha experimentado.

Jane ainda respirava fundo quando descansou a cabeça no ombro de Maura. Ela sentiu a loira abaixando sua blusa e abraçando-a com carinho, firme o suficiente para se sentir protegida e amada. Jane plantou um beijo no pescoço dela e murmurou seu nome.

'Durma, meu amor.' Ela escutou a voz doce de Maura invadir seu ouvido, e o convite para dormir naquele colo parecia irresistivelmente aconchegante, inegável. Ela fechou os olhos e obedeceu.

Quando Maura acordou pela segunda vez, ela sentiu os dedos de Jane mexendo em seu cabelo preguiçosamente. Ela só teve certeza de que a mulher estava acordada quando inclinou a cabeça para ver melhor seu rosto e Jane sorriu e pressionou seus lábios em seu pescoço.

'Dia.' A voz rouca da morena arrepiou sua pele.

'Bom dia.' Maura acariciou sua cabeça e beijou sua testa.

Era o dia de folga de Maura e Jane só trabalharia na parte da tarde, o que significava que as duas podiam ficar na cama até mais tarde. A médica sorriu ao se lembrar disso, e fechou os olhos quando Jane beijou novamente seu pescoço, carinhosamente, enquanto acariciava sua cintura. Ela suspirou em satisfação e correu as mãos nas costas da morena.

'Eu estava sentindo falta disso.' A loira apertou os dedos na cintura de sua mulher e a puxou para cima de si.

Jane riu e pressionou seus lábios nos lábios que ela amava tanto. 'Eu sinto tua falta sempre que você tá longe.' Ela disse em tom de competição, entregou beijos rápidos nos lábios, bochecha e pescoço da loira.

Maura riu e apertou os braços em volta da mulher. 'Quem diria que a detetive Rizzoli pudesse ser tão... melosa?'

'Eu não sou melosa, Maura.' Ela ergueu uma sobrancelha.

'Não?' A loira imitou o gesto, arqueando a própria.

'Às vezes?' Ela espremeu os olhos.

Maura inclinou a cabeça de um modo sugestivo.

'Ok, ok. Mas será que você não conta pra ninguém? Você sabe, eu tenho uma reputação de insensível e durona para manter.'

Maura riu e beijou seu queixo. 'Na verdade, eu fico muito feliz de ser a única a conhecer esse lado. Eu guardo segredo.'

'Quem é a melosa agora?' Jane apertou os ombros da loira e abriu um sorriso em vitória.

'Você é muito competitiva, Jane, francamente!' Maura revirou os olhos.

Jane apertou os olhos em pensamento. 'Qual é o problema com os adjetivos hoje?'

A loira abriu um sorriso malicioso e puxou Jane para perto de si pela nuca, apenas para sussurrar em seu ouvido. 'Se você quiser eu posso falar sobre... outras coisas.'

'Oh... Eu ficaria muito feliz, Dra. Isles.'

'Você se importa?' A voz era sedutora, e Maura percebeu a tensão correndo pelo corpo da morena.

Jane balançou a cabeça, dando permissão para que ela seguisse em frente.

Maura deu um beijo no ouvido da mulher, e começou. 'Ontem eu estava no laboratório e recolhi amostras de larvas de borboletas e fiz um milk shake delas, para recolher as fezes e o conteúdo estomacal para determinar o local da morte do cadáver.'

Jane afastou o rosto e olhou em completo horror para Maura. Não era isso que ela estava esperando ouvir. Não mesmo. A risada da loira invadiu seu ouvido e ela franziu o cenho, não achando nada engraçado a princípio.

'Isso é completamente nojento, Maura!' Ela exclamou, ainda escandalizada.

A loira apenas ria, chacoalhando todo o corpo, divertida com a expressão de choque no rosto da morena. Ela não tinha resistido. Ela tinha enganado Jane, e a morena geralmente era tão esperta para cair em suas brincadeiras. Ela riu ainda mais.

'Não é engraçado, Maura.' Jane se afastou agora, fingindo - muito bem - estar irritada.

'Me desculpa!' A loira laçou sua cintura com as pernas e a puxou de volta para si. 'Você deveria ter visto tua expressão, quer dizer...'

Jane revirou os olhos, mas em seguida sorriu para ela. 'Quem diria que você pudesse... bem, fazer piadas. Piadas boas, Maura.' Ela adicionou quando a loira foi se defender.

Maura espremeu os olhos e deu um tapa no ombro dela.

'O que? Foi um elogio!' Ela se defendeu e beijou os lábios da loira. 'Eu preciso tomar um banho. E embora eu queira ficar o dia todo aqui com você... Algo me diz que logo nós vamos ter companhia.' Ela suspirou.

'Harriet não apareceu por aqui hoje.' Maura franziu o cenho. Jane estava certa. Na verdade, considerando a hora, Harriet já deveria ter aparecido antes.

'Não... Talvez ainda esteja dormindo, quer dizer... Ontem foi um dia pesado pra ela.' Ela disse enquanto se sentava na cama e Maura se levantava junto.

'Eu vou checar.' Mas antes de sair ela segurou Jane pelo braço e roubou um último beijo - que foi devidamente correspondido.

A médica abriu a porta do quarto da garotinha lentamente. A pequena forma estava deitada na cama em posição fetal, e foi somente quando a loira andou alguns passos para dentro que ela percebeu que Harriet estava acordada.

'Hey, bom dia.' Ela sussurrou, ainda familiarizada com o silêncio da manhã.

'Hey.' Harriet disse de volta, a voz rouca por causa do sono.

Maura se sentou na cama e acariciou sua bochecha. 'Senti tua falta hoje de manhã.' Ela ofereceu, esperando que Harriet dissesse alguma coisa. Tinha sido incomum que, depois de dias seguidos, a menina não aparecesse no quarto dela.

Em resposta, ela simplesmente levou a mão na boca e mordeu os dedos - um hábito que vinha fazendo muito ultimamente.

Maura suspirou quando nenhuma resposta veio. 'Que tal se a gente for fazer café juntas? Jane vai gostar.' Ela tentou de novo.

Harriet concordou com a cabeça e se levantou da cama. A mão pequena passou pela mão de Maura e ela olhou para cima, como se esperando algum comando. Quando elas saíram do quarto, Maura notou o jeito incerto da garota andar, tão diferente do dia que ela a tinha conhecido. Algo estava errado. Alguma coisa estava incomodando Harriet e ela não tinha a menor idéia do que era. O silêncio da garota só piorava sua preocupação, e ela se sentia culpada por não poder adivinhar o que ela estava sentindo.

A parte da manhã tinha sido calma. Maura optara por ler um livro enquanto Harriet assistia desenhos - a cabeça da menina apoiada em seu colo recebia hora ou outra carícias da loira. No meio do período Jane convidara a menina para socar o saco de areia com ela. Harriet concordou sem muito ânimo, e desistiu da brincadeira quando as luvas, que eram grande demais para ela, começaram a incomodar. Ela simplesmente sentou-se no chão e ficou observando a morena bater repetidamente até sentir os braços doerem. Jane disse que compraria luvas novas para ela, no tamanho adequado, e Harriet sorriu educadamente. A morena teve que admitir que Maura estava certa, algo estava errado com a menina, em outros dias ela teria se mostrado no mínimo animada.

Jane sentou-se do lado dela no chão e começou a tirar as luvas. Ela sorriu para a menina e estava prestes a perguntar o que havia de errado quando o celular tocou. Ela esticou o corpo e atendeu a ligação, e com uma careta murmurou um xingamento. Alguém tinha sido assassinado. Ela teria que ir até o local do crime, o que significava que Maura também teria que estar lá, o que significava consequentemente que ela teria que ligar para sua mãe para cuidar de Harriet.

Angela chegou minutos depois, exatamente quando Maura apareceu no andar de baixo avisando Jane que estava pronta. As duas mulheres deram um beijo de despedida na criança e deixaram a casa. Num último olhar, Jane observou Harriet e Angela na sala, antes de partir para o trabalho. Se a morena depositasse um pouco mais de fé em sua mãe, teria logo sabido que seria ela quem descobriria o problema de Harriet.

Como uma boa cozinheira italiana, Angela se apressou para a cozinha para preparar uma refeição que seria consumida a noite. Ela passou uma hora montando uma lasanha, e quando finalmente colocou a massa para assar, sentiu necessidade de conversar um pouco mais com Harriet. Ela caminhou o quintal, onde a menina estava, e correu ao seu encontro quando a viu olhando para a bola que estava no chão, chorando silenciosamente.

'Harriet?' Ela chamou, os olhos arregalados. 'Você se machucou?' Ela perguntou aflita.

A criança balançou a cabeça em não.

'O que houve, querida?' Ela se aproximou e se abaixou no nível da menina.

Harriet fez um bico e abriu a boca para dizer algo, mas um soluço escapou pelos seus lábios. Mais do que depressa Angela segurou sua pequena cintura e a levantou no colo. Ela tinha cuidado de três crianças incontroláveis, incansáveis e extremamente diferentes uma das outras. Ela saberia o que fazer.

'Você tá triste, não tá?' Ela perguntou o óbvio, mas era a melhor forma de começar a conversa.

'É.' Ela disse entre o choro.

'Hum... Eu tô triste também.' Ela confidenciou para Harriet e a menina a olhou curiosa. A isca tinha funcionado.

'Por que?' Ela perguntou baixo.

'Argh! Você vê? Você tem um apelido legal, eu não tenho nenhum. Isso me deixa triste.' Angela franziu o cenho, fingindo estar chateada.'

'Oh.' Harriet imitou o gesto, aparentemente analisando a situação.

'E você, por que está triste?' Angela perguntou casualmente.

A menina fez um bico de novo e olhou para baixo. 'Agora eu não tenho nenhuma.' Ela disse magoada.

'Não tem nenhuma o quê, querida?'

'Mãe!' Ela jogou os braços para cima como se fosse tão óbvio. 'Jane tem uma, você, e Maura tem duas! E eu não, minha mãe foi embora!'

Angela limpou as lágrimas que estavam caindo no rosto da criança. Tinha sido tão fácil. 'Harriet... Você ainda tem uma mãe, ela só não tá aqui pessoalmente, sabe?'

A garota mordeu um dedo enquanto pensava. 'Queria ela de volta, e meu Boo.' O bico estava lá outra vez, e se não fosse tão triste, ela pareceria adorável.

'O que é um Boo, querida?'

'Meu Boo!'

'Não tenho idéia do que isso possa ser.' Angela se desculpou.

'Um fantasma. De pelúcia.' Ela acrescentou a última parte como se para não chocar Angela.

'Oh, entendo.'

'Eu tenho a Dorothea, mas ainda sinto falta dele.'

'É claro que sim. E também sente falta da tua mãe...'

A menina balançou a cabeça em concordância. 'É...'

Angela pensou por uns segundos no que poderia fazer para que a menina se sentisse bem. Talvez se...

'Harriet, você acha que Jane e Maura dariam boas mães?' Ela perguntou soando não muito interessada.

'Aham, sim.' Ela deu de ombros e se remexeu no colo da mulher, parecendo interessada.

Angela sorriu. 'Sabe o que é? Você tem razão, Maura tem duas mães.'

'Ela tem!' Harriet parecia indignada, principalmente pelo fato de ela considerar como se não tivesse nenhuma.

'Eu tô aqui pensando... Por que você não pega elas para você?' Ela sugeriu inocentemente.

'O que?'

'Você sabe, como mães.' Angela fez curvou os lábios para baixo, como se esperando uma reação positiva à proposta.

'Mas você disse que eu tenho mãe, mas que ela não tá aqui.' Ela franziu o cenho, confusa.

'É claro que tem!' Angela pareceu escandalizada. 'Eu não disse que não tinha, só estou dizendo que talvez você queira ter mais duas.'

A menina abaixou os olhos enquanto pensava. A proposta parecia realmente muito boa, mas...

'Você acha que minha mãe vai ficar triste?' E pareceu tão frágil que Angela queria abraçá-la.

'Claro que não.' Ela afirmou. 'Você não tá substituindo, está só acrescentando. Constance ou Hope parecem triste por dividirem Maura?' Ela ergueu uma sobrancelha.

'Não parecem, não.' Ela disse naturalmente, e diante de sua percepção era verdade.

'Pois é! Três mães parece um número bom. O que você me diz?'

'Eu posso fazer isso?' Ela perguntou, incerta.

'Mas é claro!' Angela riu e balançou a cabeça em positivo.

Harriet apertou os olhos para ela. 'Mamãe Anna.' Ela murmurou o nome da mãe enquanto contava um dedo. 'Maura e Jane.' Ela juntou mais dois dedos a conta. Depois ela contou a sequência em sua cabeça. Jane tinha uma mãe. Maura tinha duas. Ela teria três. Fazia sentido do jeito que sua mente organizava logicamente a sequência.

'Três é um número bom.' Ela sorriu para Angela. 'Dá pra ser.'

'Bom, parece que você saiu ganhando! Três mães! Quem teria tanta sorte?' Angela riu, mesmo que por um lado fosse tão triste a dor pela qual a menina passou - estava passando. Elas, Jane e Maura, podiam transformar isso em algo bom, e Angela também queria colaborar com a recuperação da garotinha.

'Ainda sinto falta dela.' Harriet disse, se referindo a 'primeira' mãe.

'Eu sei que sente, querida, mas não se esqueça: você tem suamãe, aqui.' Ela apontou para o coração da garotinha e bateu com o dedo de leve ali. 'E agora tem mais duas aqui, nessa casa.' Ela sorriu e os olhos de Harriet brilharam para ela.

A menina balançou a cabeça em sim, ainda refletindo sobre as palavras de Angela. De repente, como se lembrasse de algo, ela jogou a cabeça para o lado - do mesmo jeito que Maura fazia - e perguntou, 'do que você gosta?'

'O que?' Angela estava perdida.

'Jane me chama de tartaruga porque gosto de tartarugas.' Ela deu de ombro, simples assim.

Angela abriu um sorriso em vitória. 'Nonna.' Ela disse a palavra em italiano para avó. Se Constance podia, por que ela não poderia?

'O que é uma nonna?' Harriet pareceu intrigada.

'Bem, vou deixar que você descubra com o tempo. E você não pode perguntar para ninguém, eu sei que você é esperta e vai descobrir sozinha.'

'Oh!' Ela pareceu indignada, mas não insistiu. 'Você quer que eu te chame de nonna, seu apelido?'

'Eu adoraria!' Angela soou verdadeiramente feliz.

'Tá bom. Nonna.' E Harriet sorriu mostrando os dentes, contente em resolver o problema da mulher, da mesma forma que Angela tinha ajudado ela a resolver o seu.

A menina limpou os últimos vestígios de lágrimas do rosto, Angela sorriu e a abraçou. Sua neta, definitivamente. As coisas estavam finalmente mudando ao seu redor: Jane a Maura tinham agora uma filha - não era oficial, mas Angela sabia, como toda mãe sabe, que era só uma questão de tempo para que o juíz decidisse a favor das duas - e ela tinha sua neta.

Algumas mudanças eram sutis e iriam acontecer pouco a pouco, como Harriet compreender que as duas mulheres iriam bancar o papel de sua mãe, e Jane e Maura compreenderem, por sua vez, que se preocupar com o bem estar de uma criança era absolutamente o efeito colateral de ser mãe. Ao mesmo passo, outras mudanças não eram mascaradas: a marca de mão suja na parede, a caneca de leite em cima da mesa da sala, a meia jogada no sofá e os lápis espalhados pelo chão. Era só prestar um pouco de atenção: sinais de que a chegada de Harriet naquela casa, naquelas vidas, implicava que todas elas estavam submetidas à transformação e ao aprendizado. Era novo, um tanto desafiador e assustador, outro tanto prazeroso. E soava de uma forma singular, tão promissor.


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