O abismo estava a nossa frente, flamejante, castigante, pronto para engolir qualquer um que desse um passo em falso. Especialmente aquela garota com os cabelos pretos curtos e olhos estreitos. Porque viver? Sua vida já havia acabado, o que restara era carcaça.

Seus olhos estavam vazios, era impossível perceber qualquer sinal de vida diante deles. Era impossível vê-la se movimentar, apenas sob uma pedra, paralisada diante da visão do abismo sem fim abaixo de seus pés.

Ser consumida pelo fogo era algo normal e simples para restos humanos como ela era agora. Seria repugnante, os pecados penetrados em sua carne fariam do cheiro irsuportável. Não havia salvação, para todos os lados tudo o que havia era sangue, dor, sofrimento, escuridão e apenas os fantasmas de seu passado.

Aquela menina nunca cometera pecado algum, mas estava rotulada pelo o que todos os humanos haviam feito, e iria continuar assim, o rótulo iria fazer com que ela pagasse pelos pecados de outras pessoas. Quem nasce de uma carne pecadora automaticamente adquire uma carne pecadora.

Ela saltara de seu abismo mental sem nenhuma mão em que se segurar, e ao achar alguma, em pouco tempo a mesma mão a soltara e a deixava morrer silenciosamente. Cada vez saltando com mais e mais profundidade até chegar em seu limite. E naquele momento, seu limite era onde estava. Seu limite era estar sob aquela pedra queimada acima do abismo flamejante para onde estava destinada.

Sua existência e sofrimento finalmente iriam acabar, ela não estaria mais presa à carne facilmente machucada, ela iria permitir que a queimassem e levassem sua alma para qualquer lugar fora dali, um lugar onde ninguém era e conhecia nada.

Se não fosse por ele. Ele, que era a única lembrança de algo bom. Ele, que não iria deixá-la pular de lugar algum. Ele, que não estava ali.