1/2 Pitada de Romance escrita por ChatterBox


Capítulo 1
Etapa Um - Encontro casual entre duas pessoas


Notas iniciais do capítulo

Olááá
Para quem já me conhece eu sei que passei muito tempo sumida. É porque estava abandonando a maioria das minhas fanfics, e isso estava me deixando muito frustrada porque não é justo com os leitores.Então resolvi que não postaria nada a não ser que tivesse terminado. Fiquei um ano escrevendo esse livro, e agora que terminei, quero ver a reação das pessoas.
Então sejam sinceros.
Boa leitura ;D
Beijitos, ChatterBox.



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Quando as coisas estavam começando bem, eu vi aquele caminhão na calçada. Sim, um enorme caminhão estava estacionando bem ali, onde eu sempre estacionava. E não estacionava ali por qualquer motivo. Eu estacionava ali porque aquela vaga, era especialmente em frente à minha Cafeteria. Ou seja, muitas coisas minhas estavam sendo tiradas de mim naquela manhã, ao mesmo tempo.

Tudo bem, eu não iria reclamar porque queria estacionar ali, porque tecnicamente, eu não tenho direito de tomar uma vaga da calçada. Afinal, ela é patrimônio público, então qualquer um poderia estacionar ali, se bem entendesse. Mas ainda assim me sentia no direito de reclamar pela visão da minha Cafeteria! Quer dizer, aquele caminhão estava bem na frente, e isso era péssimo para a visibilidade do meu ponto comercial, então com certeza eu tinha por quê reclamar.

Isso fez com que eu estacionasse muito mal num lugar ali perto, e saísse tempestuosa a caminho do caminhão. Ele estava manobrando para se encaixar na vaga, e eu não tive paciência para esperá-lo terminar. Fui até a porta do motorista, e bati três vezes para ser vista pelo homem que dirigia.

Quando eu bati na porta, ele tomou um pequeno susto. Virou-se e olhou para mim por debaixo da sombra do boné encardido, parou de manobrar, e abriu a janela.

― Pois não?

Ele perguntou.

― Me desculpe, incomodar, mas eu sou dona dessa Cafeteria ― apontei para a entrada do meu negócio, logo em frente ― e eu realmente preciso pedir que o senhor estacione em outro lugar. Não posso permitir que fique aqui, porque vai tirar a visibilidade do negócio, além de monopolizar quatro vagas que poderiam ser preenchidas pelos meus clientes.

― Ah, me desculpe senhora. ― ele disse, soando preocupado, mas parecia não saber bem o que fazer ― eu gostaria de ajudar, mas eu estou aqui para trazer os móveis do novo ponto comercial. O responsável que me contratou deu ordens para que colocássemos aqui.

Eu respirei fundo, inflando o peito de ar, e tentando trazer a paciência junto comigo. Eu geralmente não me aborreço tão fácil, mas naquela manhã eu não estava no meu normal. Talvez estivesse de TPM, não tinha certeza, mas com certeza eu estava mais estressada do que o de costume.

― Tudo bem. – tentei sorrir e ser paciente. – onde está esse responsável?

― Está lá dentro. – disse, e apontou para um ponto comercial, que ficava bem ao lado da minha Cafeteria, o lugar estivera vazio há anos. Por algum motivo eu simplesmente não tinha percebido que ele tinha sido reformado recentemente, e que por isso, alguém deveria tê-lo comprado ― o nome dele é Scott. Scott Pascle.

Eu não esperei muito. Segui até o local, irrompi apressada, e lá dentro, aproveitei para dar uma boa olhada ao redor. Eu não posso mentir, aquilo tinha me dado uma pitada de preocupação. Concorrência não tinha sido um problema para mim há anos. Jamais tiveram outros comércios naquele quarteirão e eu não sabia o que aquele lugar seria exatamente. Se por acaso fosse outro Café? Ou até mesmo um bar poderia fragilizar o sucesso dos meus negócios.

Pode imaginar a minha desolação quando vi aquele balcão do lado direito. Um balcão de bar, sem dúvida. E haviam algumas prateleiras com estoques de bebidas alcoólicas ali.

Fora isso, o espaço estava vazio. Era maior que o espaço disponível do meu Café. Haviam caixas por todos os lados, e o lugar estava precisando de uma boa limpeza. Mas fora isso, aquele Scott tinha conseguido sem dúvida se transformar em um belo imprevisto.

Eu estava atordoada demais. E então eu caminhei até um dos homens que tinham acabado de colocar uma das caixas no chão e perguntei, um pouco zonza:

― Eu posso falar com o Scott?

― Ah, sim, ele está...

Quando o rapaz estava prestes a responder eu ouvi uma voz distinta responder por ele:

― Eu estou aqui.

Eu me virei, e lá estava quem deveria ser o tal Scott. Imaginava que ele fosse um pouco mais velho. Mas ele deveria estar por volta dos vinte e sete e nem tinha cabelos brancos. Na verdade o inconveniente Scott era bem bonito. Pelo jeito que se vestia, ― com uma jaqueta de couro e calças jeans. ― e pelo fato dele ter um excelente porte físico, com os músculos todos definidos, formando linhas aqui e ali, podia presumir que ele deveria ser um garanhão e paquerador bem barato.

Os olhos eram castanhos, assim como o cabelo que era liso. E boca era vermelha, rodeada por um generoso cavanhaque. Por um minuto, eu não vou mentir, me distraí com a aparência do sujeito ― era impecável. Ele não era de se jogar fora. Mas logo eu respirei fundo e pensei: “recomponha-se, Rebecca... Está confraternizando com o inimigo!”.

Pisei mais forte com os pés no chão e soltei um pigarreio, enfatizando a minha seriedade.

― Oi. – saudei, sem muito ânimo. – eu sou a Rebecca e eu sou a dona da Cafeteria ao lado.

― “Nata”. ― ele respondeu, pronunciando o nome com um pouco de indiferença, mas eu não liguei. ― sei.

E cruzou os braços sobre o peito largo. Não tenho certeza se ele estava tentando ser amedrontador, ou simplesmente estava sendo natural, levando em conta que ele também estava com as sobrancelhas juntas como se estivesse me desafiando com o olhar. Mas eu não me senti nem um pouco ameaçada.

― E eu estou aqui, porque, bom, eu preciso que você tire o seu caminhão dali imediatamente. Esse é um dos horários de maior movimento e eu preciso que o meu comércio seja visto e reparado por quem passe. É só isso.

― É? Ah tá, eu não percebi. Eu não vou incomodar, vou pedir para que coloquem do outro lado da rua. Até porque, eu acho que a gente deve se dar bem, já que vamos dividir o mesmo quarteirão.

Ele explicou, e saiu em direção ao balcão, ali perto. Pegou uma das caixas no caminho e começou a esvaziá-la, perto das prateleiras.

― É, eu percebi. – devaneei, um pouco antes disso. Eu sinceramente não queria estar demonstrando a minha preocupação, mas eu realmente precisava me preparar para o que está por vir. Conhecer o inimigo é uma estratégia muito importante. Eu tenho que saber o que vou enfrentar. – eu não quero ser muito intrometida, mas... O que exatamente será esse comércio? É um bar?

Ele se virou, e sorriu. É, ele tinha um sorriso belo e largo.

― É. É um bar com mesas de sinuca e fliperama. É mais um lugar mais masculino e tal. Um pub.

Parei para pensar. É, eu acho que não era assim tão ameaçador. Afinal, a Nata é exatamente o oposto disso. É um Cafeteria com tortas e doces, é aconchegante, e tem estantes de livros para alugar e ler enquanto está lá. Na verdade é um lugar bem feminino se você for pensar bem. Mas é bastante frequentado por homens. De qualquer forma, não acho que o tipo de homens que visitam a Nata iriam parar naquele lugar.

Se você curte um bom livro e um capuccino, é provável que a ideia de ir para um lugar beber e jogar sinuca não seja muito a sua. Eu acho que temos públicos-alvo diferentes. Aquilo realmente me tranquilizou bastante.

― Eu estava mesmo querendo te conhecer.

Scott disse, quebrando o silêncio e eu lhe lancei um olhar confuso no mesmo instante. Isso porque fiquei um pouco intrigada. Qual era o interesse dele em me conhecer?

― É mesmo? ― eu indaguei, hesitante.

― É – afirmou. ― Na verdade eu já fui seu cliente.

― Você já foi na Nata? ― franzi o cenho ― quantas vezes? Eu não me lembro de você. Eu geralmente me lembro.

― Já fui umas duas vezes. Eu não fui para ler, me desculpe. Não sou muito do tipo intelectual. ― é notável. ― Eu fui comer. Quando estava vindo assinar o contrato de compra do espaço. Vocês têm umas tortas...! Meu Deus, são tão boas... Quem é a sua doceira? Eu pago o que for preciso para ela ensinar a minha cozinheira. Acho que alguns doces iriam dar um diferencial ao meu negócio.

Eu abafei um riso ao ouvir isso. Porque, bom, eu sou a doceira.

― Está falando com ela.

Eu contei, e cruzei os braços, esperta, enquanto sorria. Scott pareceu surpreso com isso, porque deixou o maxilar cair, boquiaberto. Não sei por quê, mas parecia ter achado graça naquilo.

― Não brinca...! ― se aproximou e ficou numa distância onde só o balcão nos separava, e seus olhos castanhos estavam diretos nos meus. Eu tentei não ficar distraída com aquela distância tão íntima e repentina. ― você faz aquelas tortas?

― É. ― afirmei. ― E eu sinto muito, mas não sei se posso dar as minhas receitas secretas para você.

― Você não parece ser das garotas que entendem de cozinha.

Ele disse, soando curioso, de cenho franzido, e as mãos grandes espalmadas sobre o balcão de madeira.

― É, eu sei. Eu não pareço ser muitas coisas. ― dei de ombros, desanimada ― também não pareço gerenciar um Café com aluguel de livros, e ser do tipo que está sempre carregando um livro na bolsa, mas olha só... Eu sou assim.

Quem olhava para mim nunca imaginaria que aquele era o meu emprego. As pessoas que são envolvidas em atividades tão relaxantes quanto a leitura geralmente são pessoas doces e estão sempre sensíveis. E eu não sou nada sensível. Eu sou bem séria na verdade.

― A vida é mesmo cheia de surpresas.

Ele inclinou um sorriso torto, e ficou um minuto parado me encarando, com os fios do seu cabelo castanho escorregando detrás das orelhas e caindo por sobre os olhos. Ele tinha uma certa rebeldia e ao mesmo tempo tinha um ar tão inocente, como se conseguisse ser as duas coisas ao mesmo tempo.

Eu sei, eu não deveria estar reparando naquele sujeito daquele jeito, mas eu estava realmente sem saber o que era sexo faz meses e ele tinha o tipo de aparência que sugeria exatamente esse tipo de coisa, eu não conseguia evitar.

― E quanto a você, eu não posso dizer a mesma coisa.

Eu comentei. Isso o fez rir, e ele fez isso com todas aquelas pérolas brancas que ele guardava na boca.

― É, isso eu não posso negar.

Confirmou.

― Quando a abertura do bar vai acontecer?

― Daqui a duas semanas. Eu vou dar uma festa e eu espero que venha. Acho importante que os comerciantes mantenham uma certa amizade, não acha? Acho que ajuda a nos ajudarmos mutuamente no futuro.

Eu acho que ele estava tentando garantir que a gente não entraria em pé de guerra pelos clientes. Eu também achava aquilo importante, quer dizer, eu não tenho tempo nem energia para esse tipo de coisa.

***

O dia até que foi bem calmo. Não tive muito movimento. Afinal, era plena segunda-feira, e no começo da semana, todos estão abafados demais com a retomada das suas rotinas diárias para ter um tempo para relaxar tomando um café e lendo um bom livro.

Eu amo o meu trabalho. Mirtes e Thomas, meus funcionários, estão comigo desde o início da Cafeteria Nata. Tive que demitir alguns antes de achá-los, é verdade, mas depois que achei, nunca mais os deixei ir. Eles são ótimos, praticamente da família.

Arrumamos juntos a caixa cheia de livros novos que tinham acabado de chegar, nas prateleiras, quando o lugar estava praticamente vazio. E conversamos a tarde toda.

A Nata tinha um ambiente tranquilo. Sou muito orgulhosa de ter conseguido trazer o lugar que esteve por tanto tempo na minha mente, à realidade.

Era uma Cafeteria agradável, com chão e móveis de madeira, com uma parede de vidro, que possibilitava a visão da típica rua nova-iorquina do lado de fora. Era toda decorada com lustres em formato de abajur sobre as mesas, vasinhos de flores, e os quadros e paredes em cores leves, como salmão; azul-claro, e rosa-bebê.

A única parte da Cafeteria que era reclusa, era a cozinha. Eu fazia questão de mantê-la pessoal, porque assim eu me sentia no conforto necessário para fazer as minhas tortas. Parecia que quando eu não estava serena, então isso refletia no que eu cozinhava, por isso era tão importante para mim estar em um lugar pacífico. Me concentrar nos ingredientes, ficar no silêncio dos meus pensamentos... Para mim era a melhor parte de cozinhar.

O expediente terminava às dez. Geralmente eu ficava por último, para fechar as portas e ver se estava tudo ok antes de ir para casa. Como naquele dia.

No silêncio do fim da jornada, ouvi o sino que anunciava a chegada de um freguês tocar. Estava atrás do balcão, trancando a caixa registradora, e levantei o olhar para quem entrava.

Scott estava lá, com seu um metro e oitenta de altura, e parecia abafado com alguma coisa, estava respirando de uma forma tensa e virando o corpo para os lados, meio agitado, como se tivesse corrido até ali. Quando me viu, começou a se lamentar:

― Ah, não... Não me diga que já está fechando!

Ele parou perto da entrada e olhou para os pés, com pesar. Fiquei um minuto o encarando, um pouco distraída, antes de responder:

― Infelizmente, sim.

Dei de ombros. Se aproximou, parando na minha frente. Estávamos separados por um balcão de novo. Como já tinha desligado parte das luzes, a sua silhueta era quase uma sombra na minha frente. Ainda assim os seus olhos castanhos cintilavam um pouco.

― Ah, por favor ― fez um tom suplicante, suspirando ― eu trabalhei o dia todo arrumando o bar hoje, estou morrendo de fome e cansaço... Não quero ter que cozinhar nada quando chegar em casa. Me dá só uma dessas suas tortas maravilhosas e uma coisa para beber e eu te deixo ir pra casa ― pausou, esperando que eu dissesse alguma coisa ― por favoor...

Suspirei. Tá legal, era muita sorte a dele que eu estivesse de bom humor e não tivesse tido um dia agitado.

― Tá.

Cedi, revirando os olhos. O rosto dele se iluminou no mesmo instante.

― Obrigada, eu sabia que você era uma boa pessoa Becca ― baforou, aliviado, sentando-se ao balcão ― Posso te chamar de Becca, não é?

― É, eu acho que sim.

Dei de ombros de novo, e fui ligar a vitrine mais uma vez para pegar um pedaço de uma das tortas.

― Eu gosto da de frango.

Ouvi ele se esticando para que eu conseguisse escutar, quando agachei para abrir a vitrine.

Cortei uma fatia, e coloquei na sua frente. Depois enchi a xícara com café com leite puro, foi o que ele disse que queria.

Assim que tirou a primeira garfada, ele apertou os olhos, e gemeu de prazer.

― Hmm... ― pairou, para apreciar ― Nunca vou entender como você faz isso. ― fiquei olhando para ele, enquanto bebericava seu café. E pensando em como ele parecia um homem grande demais para sentar em um balcão. Estava um pouco apertado para ele ali, eu conseguia ver que ele estava limitando seus movimentos, para não derrubar nada. O que era bastante engraçado, para falar a verdade. ― Então, Becca... ― ouvi ele dizendo. ― qual a sua história?

Fiquei paralisada, piscando na direção dele, porque não esperava exatamente aquele tipo de pergunta.

― A minha história...?

Perguntei de novo, para me certificar que ele estava realmente interessado nisso. Ou se só estava tentando se gentil. Scott juntou os nós dos dedos sobre o balcão, e me fitou com seriedade.

― Sim ― reafirmou ― Como conseguiu esse negócio sendo tão jovem?

Na realidade, ele parecia bem sincero no seu jeito de falar. Não estava tde deboche, nem nada, o que me surpreendeu bastante.

Eu olhei bem para ele. Para os seus cabelos lisos que caíam sobre o olho, e seu olhar rebelde, enquanto ele curvava aquele sorriso torto de um jeito irresistível. E pensei que para homens como aquele, com aquela facilidade de conseguir transar com uma mulher e provavelmente nenhuma intenção de ter um relacionamento sério com alguém... Ele era bem interessado na vida pessoal alheia. Isso não é típico.

― Você não está espionando o meu negócio, está?

Sugeri, descontraída, mas ao mesmo tempo eu abafei uma risada, um pouco nervosa. Foi quando curvou um sorriso travesso de novo e abriu a boca para responder:

― Eu garanto que não. Se você quiser, eu também te conto a história do meu negócio, quando terminar.

Como ele parecia sincero, me debrucei sobre o balcão, para ficar mais perto dele, já que seria uma história longa, e eu tinha de estar relaxada. Quando fizemos contato visual, avisei:

― Está pronto? Não acha chato ouvir a história de vida dos outros?

― Geralmente sim, ― admitiu, em um tom de voz mais baixo. – mas não a sua, algo me diz que ela é interessante.

― Acho que vai se decepcionar.

― Faça uma tentativa.

Encorajou, e fez isso arqueando as duas sobrancelhas, esperto. Respirei fundo, e fiquei um minuto pensando em como começar, quando encontrei o ponto certo, parti dele:

― Comecei a cozinhar aos doze anos.

― Doze?

― Sim, nas aulas de culinária da Escola. Foi lá que descobri o meu talento para confeiteira. Comecei a cozinhar em casa, e tentava coisas novas. Minha mãe logo percebeu que eu fazia umas tortas muito boas e me convenceu a me aventurar no negócio dos cupcakes.

― Aos doze?

― É ― assenti. – ela disse que podia vendê-los no trabalho dela, e que poderia começar a fazer por encomenda. E aí teria o meu próprio dinheiro. Eu gostei da ideia e iniciei a fazer isso. Como todos no trabalho da minha mãe gostavam dos cupcakes, comecei a fazer também outras coisas. Uns doces, e croassants... Logo as encomendas começaram a acontecer, e as pessoas queriam em grande quantidade... E eu não sabia como cuidar disso e do Colégio ao mesmo tempo. E com um tempo, minha mãe começou a me ajudar.

“As coisas foram tão bem, que eu decidi que queria fazer isso para o resto da minha vida. Como eu gostava de ler, a ideia da Cafeteria com leitura veio um pouco depois. Mas o fato é que, quando eu terminei o Ensino Médio eu já tinha bastante dinheiro guardado das encomendas que fazia, então eu comprei um ponto, só para encomendas. Como meus pais tinham dinheiro guardado para me levar para Faculdade, e viram que na realidade eu não precisava mesmo ir, porque já tinha um bom mercado como confeiteira, eles me ajudaram com o dinheiro que iriam usar para pagá-la, aplicando no meu negócio.”

“Contratei uma ajudante, e uma pessoa para fazer a entrega, então quando o dinheiro foi vindo, eu fui pagando os funcionários e aos poucos fazendo a minha reserva. Até finalmente poder comprar esse lugar.”.

― É impressionante.

Scott assentiu, fazendo uma cara de impressionado.

― E quanto a sua?

Eu quis saber.

― A minha...? ― pareceu confuso.

― É. Disse que contaria a sua quando eu terminasse.

― Ah, a minha não é tão gloriosa quanto a sua, é bem deprimente na verdade.

― Ah, é mesmo?

Inclinei o rosto para o lado, intrigada.

― Basicamente, eu e o meu irmão Patrick não tínhamos um futuro. Nós éramos irresponsáveis, e não tínhamos um emprego fixo. O nosso pai estava sempre reclamando e dizendo que deveríamos tomar um rumo na vida. Aí ele morreu.

Eu fiquei gélida durante dois minutos, aí me apressei em dizer:

― Sinto muito.

Mas ele parecia muito bem com a história, só assentiu e continuou contando como se fosse uma coisa super normal:

― É, bom... Eu e ele ficamos bastante alarmados, e é o tipo de coisa que faz você pensar. E achamos que deveríamos usar o dinheiro da herança para fazer o que ele queria. Para que tivéssemos um emprego sério e uma fonte de renda. E bares sempre foram a única coisa da qual nós entediamos bem, então... Acho que tudo fez sentido. Agora estamos decididos a mudar. E estamos mudando.

― Hm. ― pairei por um tempo, pensativa. ― E vai mudar com relação a tudo? Digo... As coisas que você gostava. De sair, e beber...

― Ah, sim... Bom, eu vou sair muito menos agora. Vou me concentrar em fazer o negócio dar certo. Pra falar a verdade eu não estou muito na vibe de sair desde que meu pai morreu, e toda vez que eu penso nisso, lembro dele, então não é a mesma coisa.

Estava um pouco chocada em como ele estava sendo franco e contando todas aquelas coisas pessoais para mim, na total naturalidade. Como se fôssemos amigos há décadas.

― Hm. Nossa.

Foi tudo o que consegui dizer, enquanto fazia uma cara de assustada, e não acho que ela foi muito convincente. Estava um pouco indecisa com relação a como deveria reagir a isso. Eu mal o conhecia, e, bom, não me sentia no direito de falar muitas coisas.

― É. Bom, ―ficou um tempo quieto, mas logo voltou a ficar bem distraído. Como se aquela história já tivesse sido contada muitas vezes para lhe trazer tristeza. ― e agora falando de coisas menos entristecedoras... Conta a sua história de verdade. A sua vida.

Fiquei estupefata.

― É sério? ― fechei os olhos, querendo morrer. ― Não já morreu de tédio com a história do meu negócio?

― A história do seu trabalho é bem legal, na verdade. Eu gostei.

― Ah, não é não. Estou ficando um pouco enaltecida com esse interrogatório. Isso é alguma cantada? Está tentando me conquistar ou algo assim? Esse é o tipo de coisa que os caras fazem quando querem alguma coisa.

Isso o deixou um pouco embaraçado. E eu só fiquei lá o observando e me perguntando o porquê.

― Ah, me desculpe ser tão franco, mas eu nunca iria ficar com você.

Depois disso, eu só pude olhar para ele, em choque. E esperei ver algum sinal no seu rosto de que estava brincando, e não encontrei, o que me deixou... Ofendida? Eu nem sabia o que dizer. Só consegui abrir a boca, e depois fechar, porque não tinha ideia do que falar.

― Ah, não me entenda mal. ― foi quando ele percebeu o meu desconforto e começou a se explicar. ― É que o tipo intelectual não é mesmo para mim. Eu ficaria com a maior cara de burro quando você falasse coisas como “enaltecida”. Eu não sei o que essa palavra quer dizer.

Ah. Bem melhor agora, que tinha uma explicação lógica e não a que estava passando na minha cabeça, que era mais ou menos “você é um nojo e eu nunca vou dar em cima de você por isso”. Minhas bochechas pararam de queimar e eu passei a dar uma risada.

― Quer dizer lisonjeada... Admirada. – expliquei.

― Ah, sim. Claro. – assentiu, por obrigação. – e para ser bem claro, é que a minha aversão não é exatamente contra garotas inteligentes, é só que eu não estou muito adepto a relacionamentos em geral e tudo. Eu espero que não se importe, já que baseado nos tipos de livro que você deve ler, deve ser uma garota bem romântica e agora deve estar pensando que eu sou um cara bem sem coração por causa disso.

Ai meu Deus. Isso me causou uma gargalhada. Uma alta e absurda gargalhada. Scott só ficou me encarando sem entender nada enquanto eu ria sem parar.

― Eu não acho que você é sem coração ― eu consegui explicar, quando finalmente encontrei fôlego para isso, depois parei de rir. ― Por incrível que pareça, eu também não sou adepta a relacionamentos. Eu nunca me apaixonei por nenhum dos meus namorados.

Eu não sei porque estava contando isso a ele. Quer dizer, nós tínhamos acabado de nos conhecer. No entanto, ele estava ali e me contando todas aquelas coisas que eram totalmente íntimas da vida dele, e eu achei que eu deveria contar algo sobre a minha também. Já que é pra ser justo.

Scott só ficou lá parado, me mirando fixamente, parecendo totalmente pasmo com o que acabei de contar.

― É sério? ― e eu assenti. Ficando ainda mais pasmo, ele continuou ― Você cozinha. E lê romances. Como isso é possível? Você deveria ser a garota mais sensível que existe. E se apaixonar em questão de segundos.

Ironia, não?

― É ― encolhi os ombros, desanimada. ― pois é. Acho que nem tudo é como deveria ser.

Mas ele só continuou me encarando, e parecendo ter muita dificuldade para digerir aquilo.

― Acho que agora eu entendi porque tinha tanta vontade de te conhecer ― soltou de repente. E foi a minha vez de não entender nada. ― é bom poder conversar com uma pessoa diferente de vez em quando. É complicado ter uma conversa com uma mulher quando todos os seus comentários sobre relacionamentos ficam sendo julgados o tempo todo como infantis ou egocêntricos...

Acho que não entendi muito bem o que ele queria dizer.

― Então... Eu sou a mulher que não vai te julgar?

Me certifiquei se tinha entendido direito o que disse.

― Sim. Eu nunca encontrei uma mulher que fosse igual a mim. Assim... Que não se apaixonasse com facilidade. Seria bem legal ter uma garota que não é altamente emotiva para conversar e falar o que eu penso, de vez em quando. E eu acho que devo ser o mesmo para você.

― Ah, sim, claro. ― agora fazia mais sentido. E quer saber? Ele não estava errado. Fazia um tempo que eu tinha chegado à conclusão que relacionamentos são uma perda de tempo, pelo menos para mim, e não tenho ninguém para conversar que compartilhe do mesmo ponto de vista. ― Acho que é uma boa ideia.

Eu sorri, tentando ser simpática. Ele retribuiu o sorriso. Estava terminando de comer a sua fatia de torta de frango.

Nós conversamos sobre algumas coisas depois disso. Ele era muito bem humorado. Seu sarcasmo era realmente muito sagaz e apesar de uma hora ou outra eu ter de parar para explicar o significado de algumas palavras, foi um bom bate-papo.

No fim ele agradeceu pela torta. Trocamos telefones, e ele saiu pela porta. Disse que ia manter contato e que talvez devêssemos almoçar juntos amanhã. Achei uma boa ideia.

― Vou esperar sua ligação.

Eu disse, um pouco antes dele sair pela porta. E ele respondeu com um sorriso torto e mostrando um polegar.

― Beleza.

Confirmou.

***

Holly e Heidi foram me visitar na manhã seguinte, no trabalho. Sentaram-se no balcão e pediram, como de costume, seus deliciosos frapuccinos. Porém, para Heidi sem canela, e para a Holly com bastante.

Não precisei perguntar o que queriam. Prontamente fui lá e preparei os dois. Quando se têm melhores amigas,― principalmente iguais àquelas duas gêmeas chatas,― é impossível que não se saiba o que elas gostam de beber ― e tudo o mais que é preciso saber. Já que, nos conhecemos há... Quantos anos...? Desde o pré-zinho, acredito eu.

Embora há até pouco tempo eu ainda conseguisse confundir as duas. Não era minha culpa serem clones uma da outra. Tudo ficou mais fácil depois que a Holly resolveu aderir ao chanel tingido de vermelho, e a Heidi, preferiu continuar com seus longos loiros lisos.

― E então, pedaço de mau caminho, novidades? ― Ouvi Heidi perguntar. Enquanto eu despejava o café nas xícaras. ― algum cara novo?

― Não, sério, ― Holly interrompeu, fechando o livro que tinha começado a ler há alguns minutos, e parecendo muito preocupada de repente. ― agora falando de algo realmente importante. Amiga, você viu aquele bar potencialmente perigoso para suas finanças bem aqui do lado? Eu não acreditei quando vi. O que você pretende fazer em relação a ele?

E então as duas ficaram caladas olhando para mim, esperando o que eu ia dizer. Suspirei, e comecei a explicar, enquanto passava um pano para limpar o balcão, antes de colocar os frapuccinos das duas na frente delas:

― Respondendo a pergunta das duas... O único cara novo que eu conheci foi o dono do bar, e ele é potencialmente gentil, para falar a verdade. Uma certa pegada de garanhão, mas nada que seja da minha conta.

Enquanto dizia isso, fui até a prateleira, e peguei um dos livros novos que chegaram semana passada para dar uma folheada.

― Ele é bonito?

Holly perguntou, assim que eu terminei de falar. Virei para ela e a vi piscando os olhos azuis sob a sombra da sua boina na minha direção, cheios de curiosidade.

― É. Muito bonito. – respondi, calmamente ― não que isso faça alguma diferença. Eu detesto lembrar que, meus antigos namorados também eram bonitos e nenhum deles me deixou apaixonada.

Me sentei na cadeira alta ao lado do balcão da cozinha e abri o livro. Minhas amigas se calaram, responderam com um suspiro. Eu sabia porque. Porque elas sabiam que era verdade. Elas acompanharam de perto a minha desprezível vida amorosa, que tem sido um desastre desde que começou.

Uma história cheia de corações partidos, lágrimas e traições? Não, não chega nem perto disso. Eu acho que talvez o problema seja exatamente a ausência disso.

A triste e dura verdade é que, eu nunca me apaixonei por ninguém. Eu sei, eu não sei o que há de errado comigo. Quer dizer, se apaixonar está em toda natureza humana, é algo que a gente faz com frequência, e se você é uma garota, com ainda mais frequência.

Eu já tive quatro namorados a minha vida toda. Bonitos; gentis; bem sucedidos. Fizeram de tudo para ganhar meu coração, e sem obter sucesso, foram embora.

Eu já, praticamente desisti. Não que eu vá me trancar em uma sala e deixar de encontrar pessoas e fazer sexo, nem nada. Mas já acabei aceitando que talvez eu seja incapaz de sentir isso, paixão. Talvez eu seja essa mulher fria destinada a nunca sentir o que é uma paixão de verdade.

Exceto quando eu leio os romances que eu tanto amo, não consigo sentir aquele fogo interior de estar apaixonada.

O meu desconforto com relação a isso me fez procurar uma analista, há um tempo atrás. Porque depois do meu terceiro relacionamento fracassado, comecei realmente a cogitar se havia algo de errado comigo. Foi necessário encontrar um especialista que me tirasse a dúvida.

Já que, se eu tivesse realmente algum problema, talvez ele pudesse me dizer como resolver, e tudo ficaria bem.

Mas o que aconteceu não foi bem assim. A Dra. Pascott, depois de uma longa conversa comigo, me explicou o porquê de eu ser tão indiferente nas minhas relações afetivas com o sexo oposto.

Ela disse que não tinha exatamente algo errado. Que na verdade, a minha dificuldade de me apegar a alguém tem a ver com o fato de eu não ter nenhuma necessidade emocional a ser suprida.

Entenda... pelo fato de eu ter uma família muito bem estruturada, que raramente briga ou se desentende, e onde recebo toda a atenção e amor que preciso. E o fato de possuir uma cadeia firme e amorosa de amizades, fazia com que eu não tivesse nenhum tipo de carência afetiva, que poderia ser preenchida com um romance.

As pessoas procuram se apaixonar, porque sentem a necessidade de se sentirem amadas por alguém. E eu, bom, eu já me sentia suficientemente amada.

Eu não conseguia sentir que precisava de um parceiro para ser feliz, porque no meu subconsciente, eu sabia que na verdade, sem ele eu continuaria sendo plenamente feliz.

E que isso não é exatamente ser uma pessoa fria. Afinal, com a minha família e amigos eu sou realmente amorosa e dedicada. Esgoto toda a atenção com essas pessoas e por isso não sobra mais nada para mais alguém.

Estranho, eu sei. O fato de eu ser feliz, de uma certa forma, me atrapalha. Porque querendo ou não, eu continuo querendo muito saber qual é a sensação de estar perdidamente apaixonada, e não posso sentir. Porque por mais que eu queira me enganar dizendo que preciso de um homem na minha vida, o meu cérebro sabe que, exceto para sexo, um homem nunca fez falta.

Por fim, Dra. Pascott disse que achava, que a única maneira de finalmente me apaixonar por alguém, seria encontrar alguém que me tirasse da minha zona de conforto. Alguém que me despertasse os sentidos, e me mostrasse conflitos. Já que na minha vida inteira, eu nunca tive muitos conflitos a resolver, e segundo ela, a paixão se desperta para o que é novo, essa seria a forma certa para promover em mim, a mudança.

Só é um pouco frustrante ter de esperar por um “cara conflituoso” aparecer. Quer dizer, exceto nos livros, até hoje numa fui apresentada a nenhum deles. Essa coisa de “um cara que te desperte os sentidos”, parece fantasiosa demais para mim. Do tipo de coisa que não acontece na realidade, principalmente quando você precisa que aconteça.

Então eu meio que estou dando uma pausa. Chega dessa coisa de tentar me apaixonar. Provavelmente, vai acontecer, mas na hora certa. Então porque eu não posso me divertir um pouco? Eu gostaria de me envolver sem compromisso com alguém. Alguém que não esperasse que eu me apaixonasse perdidamente, e que estivesse disposto a um relacionamento aberto.

Mas assim como é difícil encontrar um “cara conflituoso”, é também muito difícil encontrar um cara que aceite esse tipo de coisa. Porque para os homens é sempre tudo ou nada. Ou você fica com eles de verdade, ou então, simplesmente não fica.

― E foi só isso?

Heidi me indagou, frustrada. Me virei para ela:

― Isso o quê...?

― Foi só isso... Você e o gostosão do bar ao lado?

Quis saber.

― Nós vamos ser amigos. ― contei. ― nós conversamos ontem, quando ele veio aqui para comer uma torta, e... Ele me ligou essa manhã. Disse que podíamos nos encontrar para almoçar juntos. O irmão dele vai estar lá. E convidou a Mirtes e o Thomas para se juntarem a nós.

― É mesmo? ― a Holly, que antes escutava tudo quieta, começou a se interessar pela conversa, puxando seu banco para mais perto do meu. ― e quando vamos conhecê-lo?

― É, estou mais do que curiosa.

A Heidi enfatizou.

― Gente, não é um relacionamento, tá legal? ― deixei bem claro, quando percebi que estavam tomando conclusões precipitadas. Elas não entendem muito bem a história do “relacionamento aberto”. Também não acreditam muito nela.― Nós somos colegas de trabalho. Só estamos tentando manter um bom tom entre os comércios do mesmo quarteirão.

― Tudo bem, mas e se rolar...?

A Holly sugeriu. Elas sempre estavam esperando que aquilo acontecesse. Revirei os olhos, impaciente. Eu as amava, mas por favor, aquilo não iria acontecer, esquece.

― Eu nem faço o tipo dele.

Respondi, num ato e proferi um olhar incitante para as duas. Pareceram confusas.

― Como você pode saber disso?

Heidi retrucou, como sempre duvidando das minhas conclusões. Acha que eu sou muito pessimista.

― Ele me disse, tá? Ele “não curte as intelectuais”. Palavras dele. Não modifiquei nem um pouco.

O que era absolutamente verdade. Mas é claro que elas não iriam confiar em mim.

― Talvez ele mude de ideia quando conhecer o “furacão Becca”.

Heidi deu uma piscadela, como se quisesse sugerir alguma coisa. Mas aquilo era realmente muita ilusão. Nunca acredite que você pode mudar um homem. É total perda de tempo.

― Esquece, gente. ― abanei a mão no ar, enfatizando o meu desprezo por aquele discurso. ― não quero fazer isso. Não vou me envolver com o meu concorrente. Isso é a última coisa da qual eu preciso agora.

E encerrando o assunto, eu voltei para o meu livro. Ainda soltei algumas baforadas aborrecidas, porque aquilo tudo era muito cansativo.


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Notas finais do capítulo

Pois bem. Vai começando devagar, depois vai esquentando. Espero que tenham gostado.
Até o próximo.
Beijitos, ChatterBox.



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