Bang bang, that awful sound

Bang bang, my baby shot me down

Bang Bang — Nancy Sinatra

Kali se apaixonou por Julia num átimo de segundo. Foi uma dessas assustadoras realizações, algo que está lá onde antes não estava; uma revelação. Uma profecia. É como se Kali estivesse predestinada a amar Julia, aquela que era como um sol no céu, aquela que sorria e aconselhava com a mesma desenvoltura com que beijava a ponta dos dedos de Kali e dizia está tudo bem, vai ficar tudo bem. Julia que era como um mar se estendendo até além do horizonte, Julia que habitava todos os sonhos de Kali — sempre que ela fechava os olhos via Julia, inesquecível de tantas vezes que já a amou.

Mas foi como um desses pesadelos que começam pacíficos. A maré que antes só lavava os pés se tornou um tsunami irrefreável de traição e dor e então — e então Julia estava lá, terra e sangue. Kali não conseguia olhar para ela, tamanho seu remorso, tamanho o nojo que sentia de si mesma. Kali se sentia baixa — nem todos os monstros fazem coisas monstruosas, mas, quando fazem, como lidam com a culpa? Se sentia vil e desgraçada e o sangue de Julia manchava seu corpo e ela queria nunca ter nascido. Julia que era tão inocente, que era tão boa, que era tão pura. Não teve coragem de seguir em frente. Deu uma última olhada para aquela que tinha sido tudo em seu mundo antes do inferno — poder cheira tão bem — tocar sua face e beijou suas mãos, seus pulsos imundos e as lágrimas em suas bochechas, um milhão de por favor me perdoe por favor me perdoe, gritos que nunca saíram de sua garganta. A deixou ali. Sozinha, no chão, machucada e quase morta. Kali ainda não sabe de onde tirou forças para apenas ir — de onde tirou forças para não cair ao lado dela e por favor eu não queria eu tive que fazer isso você entende julia por favor você entende?

Julia não entendia. Kali sabe disso agora.