Sociopathy escrita por Ille Autem


Capítulo 4
Parte I - Pretérito Imperfeito - IV




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–Como assim não tem nada? -eu perguntei incrédulo enquanto ele olhava as gravações das câmeras do dia anterior.- Isso é impossível!

–Sinto muito, Sr. Caleb, mas não há nada nas câmeras, parece que houve uma espécie de blackout em todas as câmeras. Sendo assim, a família De Lune está completamente livre de qualquer envolvimento com a morte de seu pai.

–Mas isso só prova que eles sabotaram!

–Não, Hugo. Isso não é prova alguma.

Eu estava indignado. Não podia falar que tinha visto o vídeo, seria violação de segurança, porque mesmo tendo acesso as câmeras, eu não podia ter. Papai me dera a senha para vigiar qualquer movimentação estranha pela igreja, porque confiava em mim, mas o bispo da diocese era totalmente contra qualquer outra pessoa vigiar a igreja.

–Mas e quanto ao resto das coisas? -eu perguntei aflito.

–Sem provas, nada adiantaria. Afinal, seu pai está, com todo respeito, morto e de nada adianta. A sra. De Lune pode negar tudo, não há provas. Não há nada a fazer.

Eu baixei os olhos.- E agora?

–Vamos continuar com as investigações, mas creio que não possamos fazer muita coisa. Eu sinto muito, Hugo. -ele respirou fundo.- O melhor a fazer é tentar esquecer e sepultá-lo logo.

Ele tinha razão. Já estavam preparando o velório de papai que seria mais tarde naquele dia. Não tinha decidido se iria, seria uma dor horrível, mas era a última vez que eu veria o rosto dele. Mesmo que deformado, mas o enxergaria como só eu enxerguei. Mesmo que morto, mas sentiria seu calor e sua vontade e esperança de viver de novo. Mesmo que ele estando junto a Deus, eu sentiria sua presença viva em mim sempre, no meu coração e nas boas memórias que ele deixou.

–Você está certo. -eu sorri disfarçadamente.- Obrigado.

Ele assentiu e deixou a casa.

Aquilo era impossível e eu estava começando a ficar inquieto e com mais raiva do que antes. O que Claire tinha feito? Sumido com as imagens? Algo estava muito errado e eu precisava descobrir o que era. Mas como? Era impossível penetrar-se na mansão De Lune, e muito menos eu, o filho do padre morto pela herdeira da família.

O velório foi naquela tarde, ao pôr do sol. Muitas famílias, muitos paroquianos e pessoas ilustres da cidade estavam presentes na cerimônia, e ainda por cima, os De Lune. A família deu entrevista falando da triste perda para o mundo, dizendo que se todos fossem pessoas como Padre Maycol, o mundo com certeza seria melhor. Aquilo me irritou de tal forma que eu iria também pronunciar algumas palavras.

–Sr. Caleb! -disse um jornalista moço se aproximando de mim enquanto eu olhava o caixão fechado já que o rosto estava muito deformado.- Será que o senhor pode dar algum pronunciamento da morte de seu pai?

Eu forcei um sorriso.- Logo mais eu direi algumas palavras reveladoras. -ele anotou no bloco em que tinha nas mãos.- Como é seu nome?

–George Curious. -ele respondeu.- Que tipo de palavras reveladoras, Sr. Caleb?

Eu sorri vitorioso.- Vamos nos sentar, acredito que você possa me ajudar a revelar toda a farsa dessa família poderosa, os De Lune. -e então contei tudo a ele, a mesma história que ao delegado. Quando finalmente terminei, o jornalista estava com as mãos calejadas de tanto escrever e parecia surpreso e indignado como eu. Prometeu me ajudar e depois de um aperto de mão eu me levantei.

–Boa sorte, Sr. Caleb.

Eu assenti e me dirigi para o pequeno palanque montado para homenagens.

–Boa tarde a todos. -disse ao microfone. Muitos flashes e microfones me cercavam naquele momento.- Eu não tenho palavras para descrever meu pai, não só por ser quem era, mas pelas coisas que fazia. Desde acolher desabrigados até crer que pessoas impuras e indignas de seu perdão, pudessem ser perdoadas. Pessoas essas que aqui estão, prestando falsas homenagens. Pessoas, meu caro George, como Claire e Madeline De Lune, que muito fizeram papai sofrer e a mim também, o tirando de mim e com interesses absurdos sobre nós! -todos pareceram ficar surpresos e a comentarem ao mesmo tempo. Sem demora alguns seguranças me tiraram do palanque para me acalmar. Eu tinha conseguido, agora todos saberiam da verdade.

Madeline ouviu todas as palavras do filho do padre e deu um sorriso cínico enquanto puxava o marido e a filha para que saíssem logo dali.

–Convoque o tal George que ele pronunciou no discurso, acho que é aquele novo jornalista do jornal da noite. -ordenou ao segurança e bateu a porta do carro preto.

Para ela, aquilo não ficaria barato assim. Hugo já estava passando dos limites com aquelas acusações em público e revelando tudo o que sabia a qualquer um que perguntasse. Será que ele não sabia que as coisas não funcionavam assim? Para tudo existe uma dose, e existem vários jeitos de se revelar a verdade. Pessoas ignorantes a tiravam do sério, mas felizmente, ele era um e assim ficava mais fácil derrubá-lo com um simples sopro e um bom cheque.

Para Claire, a consciência estava muito pesada. Sabia que de início, o plano era apenas se aproveitar de Hugo, mas ela tinha ido longe de mais e se apaixonado. Só não sabia disso. Só soube depois de ter assassinado o pai de seu amado. Amado que agora a odiava e estava disposto a tudo para acabar com ela e sua família, não estava errado, ela merecia, mas era preocupante, vergonhoso e doloroso demais.

Mas já Roger, estava irritado. Sua esposa e sua filha tinham ido longe demais com aquela busca pelos diamantes da igreja. Matar um padre? Tinha sido um golpe de sorte que o delegado tivesse aceitado a proposta de Madeline, mas e se não aceitasse? Eles morfariam na cadeia e o banco ia falir em questão de horas. A vida deles podia ir a ruínas a qualquer momento, ele precisava fazer alguma coisa.

–A cada dia isso está ficando mais perigoso. -disse o homem quando entraram em casa.- Vocês deviam ter tido mais precaução. Incompetentes. -berrou agora explosivo.- Não sabem o risco que corremos? Querem perder tudo?

–Não seja tolo, Roger. -disse Madeline enquanto tirava o elegante paletó preto e os óculos escuros.- É só uma fase. Hugo logo deixará de nos perseguir, ele está num momento difícil e de raiva.

–E não está errado! -ele berrou.- Isso tudo é culpa de vocês que não souberam agir direito. Não sei aonde eu estava com a cabeça quando deixei que assumissem esse compromisso.

–Não seja ridículo. O plano daria muito certo se o babaca do Maycol não tivesse aberto a boca para falar ao garoto todo o nosso passado. Estava indo muito bem enquanto ele e o filho brigavam, mas não, ele tinha que abrir a maldita boca. Padre miserável!

Ela então se sentou no belo sofá branco e o segurança apareceu na sala seguido de um rapaz jovem e meio desengonçado. Era o jornalista, George Curious.- Que bom que veio querido. -ela respondeu mudando completamente o semblante.- Sente-se, acho que temos muito o que conversar.

–Eu que o diga, Sra. De Lune. -o rapaz parecia alterado.- O que a senhora fez aos Caleb é repugnante. -ele continuou e a mulher sorriu.

–O que te contaram que fizemos com eles, é repugnante. Não quer ouvir o outro lado da história? -e fez sinal para que se sentasse.- Quer dizer, não existe outro lado. Hugo está certíssimo de tudo, mas é tudo passado Sr. Curious e não existem provas concretas, tudo foi destruído relacionado a ambos os casos, nossas ligações com os crimes do passado e do presente, não existem mais. -ela sorriu.- Isso seria terrível para sua carreira como jornalista, cobrir e defender um caso sem base. Com base apenas nas palavras de um rapaz que perdeu o pai recentemente, mas que não tem provas concretas.

–Aonde a senhora quer chegar? -ele perguntou interessado, ela realmente tinha razão. Hugo Caleb estava muito alterado durante o velório e não era digno de confiança. Isso podia ser um caso a perder, e pegaria mal para ele entre seus colegas de trabalho e para o seu currículo. Precisava pensar no seu futuro, com sua noiva e quem sabe seus filhos num futuro não tão distante.

–Quero lhe oferecer um cargo de assessor de imprensa da família De Lune. Terá passe livre em todos os eventos, coberturas e pronunciamentos da família. É um cargo de muita importância, mas que você vai precisar esquecer todas as palavras do jovem Hugo. O que você prefere?


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