Friendzone escrita por Blue, Mary


Capítulo 7
Sr. Reed


Notas iniciais do capítulo

Tenho algumas observações:
1ª - Um mês foi necessário para que esse capítulo ficasse desse jeitinho *-*
2ª - O título é sobre nosso Tyler ter que cuidar de uma empresa sozinho... Bem, mais ou menos.
3ª - Ficamos muito contentes com os últimos comentários, gente!
4ª - A demora foi necessária, e a quantidade de palavrinhas comprova isso! Então, leiam e nos contem o que acharam :D



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Estou em outro táxi agora, a cabeça jogada para trás e a mente rodando com tanta informação recente. Lily viajou e me deixou aqui sozinho por tempo indeterminado. E justamente quando a maior merda que podia acontecer, aconteceu.

Não sei o que pensar disso.

Mal vejo o momento em que o taxista avisa que chegamos, apenas pago a corrida e entro pela segunda vez no prédio onde trabalho por mais de cinco anos, todos eles ao lado da minha melhor amiga. Que agora viajou. Que. Porra.

Faço o caminho de sempre, dessa vez calado e cabisbaixo. Tento não ficar assim, mas não consigo. Quando volto ao meu andar e Lucy me vê, ela faz aquela cara de pena e compaixão que eu odeio.

— Ao menos conseguiu se despedir dela? — pergunta.

— Meu objetivo não era esse, era fazê-la desistir dessa viagem. Ela disse que ficará por alguns meses. — só de lembrar meu sangue ferve. Por que ela não me contou nada? — Quantos meses, Lucy? Você sabe?

— Bom... São alguns... Er...

— Lucy! — faço o melhor chefe autoritário que consigo e não sou e ela se alarma.

— Seis.

Engulo seco.

— Como é que é? — não evito gritar.

Também não evito ficar com raiva de Lily por não me contar nada.

— Seis meses?!

— Er... Sim, mas talvez ela não precise ficar lá por todo esse tempo.

— E que droga ela vai fazer em Londres por seis meses enquanto eu fico aqui sozinho? — esbravejo mesmo sabendo que a coitada da minha secretária não tem culpa alguma, mas não consigo me acalmar. — Achei que só trataria de negócios. Que negócios são esses que duram seis meses?

— Senhor...

— Tyler! Você sabe que não é senhor, Lucy.

— Sim, desculpe. Er... Bem, Lily disse que quer estudar com cuidado sobre a proposta dos ingleses e talvez confirmar o negócio e para isso ela precisa de alguns testes, ainda estando lá. Algo como uma fusão de empresas, eu não entendi bem sobre isso. Tyler, eu podia jurar que ela havia te contado. — Lucy ainda tem o olhar de compaixão.

Vou ter que me acostumar agora que sou eu sozinho nessa droga.

— Fusão? Por que diabos eu não sei disso? E por que ela não me contou? — eu posso ouvir minha própria voz e perceber resquícios de desespero.

— Eu realmente não sei. Ela só me disse que estava tudo sob controle. E o que não estivesse ainda, ficaria em breve, pois você está aqui também. Lily focou muito na amizade de vocês e em como isso sempre funcionou bem.

— É, ela está focando nisso agora, que interessante. E ela ainda diz que nada aconteceu... — falo sozinho, mas esqueço que Lucy está aqui me ouvindo.

— Desculpe, não entendi.

— Está tudo bem, Lucy. Não há muito para entender sobre Lily, só que ela é uma workaholic maluca. — respiro fundo e tento organizar meus pensamentos, mas não consigo. — Tem alguma coisa muito importante para hoje?

Ela demora alguns segundos para acessar a agenda e faz que não com a cabeça. Suspiro pesado e a única coisa que consigo pensar é em passar o dia fora. Digo isso a Lucy e ela me olha um pouco espantada.

— Mas e se acontecer algo? Só há você aqui.

Agora não posso mais tirar o dia fora porque minha melhor amiga me abandonou aqui sem dizer nada. Fico com mais raiva de Lily a cada vez que penso nela e me lembro de suas últimas palavras no aeroporto.

— Se acontecer algo, você pode me ligar. Só se for realmente importante e grave. Caso contrário, pode falar com o Baker ou o Smith, afinal, eles resolvem os problemas e eles não precisam chegar até a presidência. — forço um sorrisinho para Lucy e ela permanece espantada.

— Baker se demitiu. Achei que se lembrasse.

— Argh, o velho babão. É verdade. — chacoalho a cabeça tentando criar boas idéias e falho na missão. — Então fale com o Smith, eu realmente não tenho condições de ficar aqui hoje, Lucy. É sério.

— Tudo bem. Deixarei avisado a ele.

Dou as costas para ela com um breve aceno e entro no elevador. Droga, eu não sei o que fazer sem Lily aqui. Não sou bom com administração ou finanças e minha matemática é patética quando o assunto é dinheiro. Sou bom apenas com fórmulas e pessoas. E com pessoas quero dizer mulheres.

Encosto a cabeça no espelho e mantenho os olhos abertos só para ver de perto o párea que me tornei. Como pude deixá-la ir? Mas... O que eu poderia ter feito? Jogado-a em cima do ombro e saído correndo? Roubar a mala dela e duvidar se iria sem bagagem?

Deveria tê-la beijado.

Certo, mas porque eu a beijaria? Isso não faz sentido.

De repente a porta se abre e paro de bater a cabeça no espelho. Olho para trás e vejo Victoria sorrindo para mim. Ela entra no elevador e para ao meu lado, quase em cima de mim. Praticamente em cima de mim.

— Olá, Reed.

— Victoria.

Ela limpa o canto da boca vermelha e me encara pelo espelho. Eu não sinto nada. Admito que em qualquer outro momento eu estaria sobre ela, provavelmente colado na parede, mas não estava afim.

— Então, que tal um encontro mais tarde? — já transamos tantas vezes assim que ela pergunta dessa maneira direta?

— Ah, não. Obrigado.

— Como assim “não, obrigado”?

— Eu estava sendo gentil.

— Hã?

— Cavalheiresco... O que seja. Não estou afim. — não me dou ao trabalho de olhar para ela para responder.

— Tyler, você sempre está afim. Ou agora é gay?

Expiro de boca aberta, impaciente e irritadiço.

— Eu só não vou mostrar para você quem é o gay porque não estou a fim de comer ninguém hoje. Especialmente você.

A porta do elevador se abre no térreo e saio o mais rápido possível, deixando Victoria parada, como minha avó diria, soltando fogo pelas ventas. Que Deus a tenha, minha avó. A cada frase com dez palavras, quatro eram palavrões. Ela era ótima.

Paro na calçada e olho ao meu redor à procura de algum táxi. Miseravelmente, não vejo nenhum. Qual é, estamos em NY, sempre tem algum táxi. Minha impaciência me faz resolver voltar para casa andando, afinal, são poucos quarteirões até meu prédio.

— Pelo menos não está chovendo. — olho para o céu só por precaução e o sol forte me cega. — Mas vou torrar até chegar lá.

Com as mãos nos bolsos da calça, saio chutando a calçada. Ando por um tempo que acho ser a direção certa, mas, de repente, me vejo parado em frente ao prédio de Lily. Mas olha só, que coincidência idiota.

— Que droga.

Respiro fundo e espero de uma maneira meio tosca que, de repente, ela apareça, atravesse a rua e me abrace. O que não vai acontecer, porque neste momento ela está num avião sobrevoando o oceano atlântico rumo à terra da Rainha. Porra, ela nem gosta de chá! Com a Lily ou é café puro ou aquele Frapuccino nojento... Mas nunca chá.

Aposto que ela vai odiar tanto que voltará em menos de três semanas. Até porque eu consigo viver sem ela, mas ela sem mim.

Mudo a rota para o meu prédio, posso dizer até que um pouco mais tranqüilo. Pensar que Lily estará de volta em poucas semanas me faz sentir melhor. Aquela sensação inspiradora, contudo, me pega de surpresa de novo e paro de andar. Olho em volta tentando encontrar seja lá o que for que esteja me inspirando tanto e percebo que estou parado em frente a uma floricultura. De onde essa loja brotou?

Procuro o nome da loja e encontro uma plaquinha bem simples, Maison de La Ninfa. Será que nos fundos da loja funciona algum tipo de bordel? Que tipo de pessoa coloca um nome desses numa floricultura? Só podem ser tarados sexuais.

Resolvo cheirar cada flor que está do lado de fora só para saber se é o cheiro de alguma que está me deixando ligado. Imagine a cena mais esquisita: um cara cheirando flores numa floricultura com nome de bordel. Demais. Agora acrescente uma garota sardenta encarando o cara da bolsa masculina.

— Posso ajudar?

— Eu... Que cheiro é esse?

A garota me olha sem piscar, deve estar decidindo se me responde ou sorri encantada por mim. Mesmo nos meus dias mais chatos, atraio as mulheres de uma maneira inexplicável até quando não quero, como hoje. No entanto, ela suspira e se aproxima de mim.

— Qual cheiro?

— Não sei bem. Não é rosa ou gardênia...

— É doce? — ela cruza os braços e imito sua posição. — Como mel?

— Talvez. — coço o queixo e a olho. — Mas eu não sei, não é enjoativo como alisso-doce.

— Como conhece tantas flores? — ela está surpresa. Já está encantada comigo e com meu conhecimento.

— Sou perfumista. — respondo sorrindo e sentindo orgulho de dizer minha profissão.

— Sério? — ela sorri como se isso fosse improvável. — Sério mesmo?

— Sim. Tyler Reed. O cara famoso, sabe?

— Sarah. — ela estende a mão e eu a seguro. — Não sou famosa.

Sou obrigado a rir. Não, ela não é famosa. Eu sei disso, porque deve ser difícil esquecer alguém como ela.

— Então, sobre o cheiro...

— Bom, tem uma flor usada para perfumes que você provavelmente conhece, mas não sei se é o cheiro que está sentindo já que ela está lá dentro, nos fundos.

É agora que vamos para os fundos e descubro que é realmente um bordel, cheio de garotas seminuas esperando pobres desavisados em busca de flores entrarem na loja para atacá-los.

— Quero ver.

Entro atrás da garota na loja e, olha que loucura, é realmente como uma casa de ninfa. Visito muitos fornecedores todos os anos para encontrar ingredientes para meus perfumes, mas nenhum lugar é de perto tão bonito quanto essa loja. Sigo embasbacado para os fundos da floricultura e paro ao lado de Sarah. De repente o cheiro me atinge tão forte que fico atordoado.

— É isso!

— Seu olfato é muito bom mesmo, senhor perfumista. — ela aponta os vasos no chão, cheios de pequenas flores brancas penduradas como sinos. — São convalárias.

— Lírios-do-Vale. — não consigo não soar desapontado.

— Exato.

As flores preferidas de Lily.

Sarah se abaixa e, surpreendentemente, consegue pegar um dos vasos e segurá-lo rente ao corpo. Ela sorri com isso e então começa a ficar vermelha, afinal, o vaso é metade da altura dela, o que não é grande coisa. Seguro o vaso pela base e ela respira aliviada.

— Ufa, pesado. — ela ri.

— Sarah?

— Aqui, Jeremy!

De repente um cara alto aparece e olha de mim para a garota e imagino que não esteja nada feliz com o que vê. Rapidamente tiro minhas mãos do vaso, mas Sarah dá uma guinada e sou obrigado a segurar o vaso novamente, com os braços em volta dela.

— Algum problema por aqui? — o cara aproxima-se perguntando e eu não me dou ao trabalho de me importar com ele.

— Jemy, poderia fazer o favor de ajudar? — a sardentinha diz.

O cara se adianta e pega o vaso de nossas mãos e o coloca no chão. Vejo-o parar ao lado dela, superprotetor, e sinto a irritação crescendo dentro de mim. O que esse mané está pensando? Eu nem dei em cima da garota! Não que eu não quisesse, aliás, em qualquer outro dia provavelmente já teria feito isso, mas hoje não estou afim.

— Quem é você? — ele pergunta.

— Tyler Reed. — forço um sorriso que demonstra minha total falta de interesse na garota e no seu namorado ciumento.

— Jeremy Evans. — ele passa o braço por sobre o ombro dela. — Namorado dela.

— Ok, pirralho, pare com isso. — Sarah sai de baixo de sua asa e lhe dá um tapa do braço. — Não precisa agir todo territorial.

— Mas, Ninfa, o cara estava com...

— Jeremy, por favor. Ele não estava fazendo nada e mesmo que estivesse você acha que eu daria moral?

Reviro os olhos e cruzo os braços. Ela daria moral sim. E ia adorar cada segundo. Só diz isso porque devem namorar há pouco tempo e ela quer que ele acredite que só há ele no mundo. Que patético.

Odeio isso.

— Parece até que vocês namoram há décadas. — ironizo.

— Estamos juntos há seis anos. — o tal Jeremy faz uma cara de presunçoso que me irrita.

— Como podem agir dessa forma depois de tanto tempo? — minha pergunta sai antes que eu possa pensar em fazê-la.

— Estamos mesmo tendo essa conversa? Pelos deuses, parem já! — a garota joga os braços para cima de forma birrenta, mas vejo Jeremy sorrir atrás dela. —Vai querer algum vaso? Ou acha que é melhor sair correndo antes que meu pirralho aqui comece a pirar?

Esqueço um pouco da frustração que esse casalzinho me traz. Eles são quase um retrato do que eu e Dianna seríamos se tudo tivesse dado certo. A mágoa ainda está em mim mesmo depois de todos esses anos.

— Quero comprar, mas, não posso carregar. — falo querendo terminar isso o mais rápido possível.

— Tudo bem, entregamos para você. Quantas unidades?

— Dez. Talvez compre mais daqui um tempo, mas por enquanto é só.

— Uau. — a garota sorri surpresa. Ela vai ganhar uma bela grana com essa venda. — Ok, Jeremy, dez vasos de Lírios-do-Vale para o senhor perfumista, por favor.

Vejo o garotinho ciumento ir para os fundos da floricultura enquanto finalizo a compra e apenas penso em continuar meu caminho até chegar em casa.

***

Um mês depois

— Lucy! — saio apressado do laboratório e paro em frente a mesa da minha secretária. — Preciso de mais Lírios, talvez uns quinze vasos. Compre da mesma floricultura, por favor.

— Ok, Tyler.

Volto para o laboratório e suspiro tentando conter minha irritação com tudo dando errado. Mas que grandessíssima bosta! Por que está tão complicado encontrar a fórmula para essa fragrância? Dez vasos de lírios e eu não consegui encontrar a fórmula certa. Faz muito tempo que não tenho uma inspiração tão forte como essa, não posso deixar tudo dar errado.

Arrasto-me até a banqueta e olho os béqueres na mesa. Já tentei cinco dos dez ingredientes que mais combinam com Lirio-do-Vale e nenhum deles chegou sequer perto do que preciso. E agora minhas convalárias acabaram e preciso esperar que a Maise de La Ninfa me mande mais. Ótimo, amo esperar.

Ando tão concentrado em encontrar uma fórmula que dê certo com os lírios que não penso em mais nada. Na verdade, além da fórmula, penso nas festas que diminuí alguns dias na semana, em como sinto falta de morar com meus pais e ter a comida incrível da minha mãe, e em como sinto falta daquela idiota da Lily. Fiquei extremamente despontado quando me dei conta de que ela ficaria mais do que três semanas, talvez ela realmente consiga viver sem mim. Conversamos poucas vezes por telefone, ela sempre evitando assuntos que não envolvessem a empresa e eu tentando convencê-la a voltar porque é insuportável cuidar de coisas como conflitos entre acionistas e comandar vários setores como ela faz.

Eu sempre soube a importância que tem em minha vida, mas não tinha noção do quanto ela é importante para a Reed & Carter. Nomezinho patético, eu sei, mas foi Lily que escolheu e ela não é muito criativa.

***

Dois meses depois

Eu não consigo encontrar o cheiro. E agora tenho essa porcaria de reunião.

— Ainda está com os óculos de proteção na testa, Tyler.

— O que foi, Lucy?

— Os óculos.

Lucy aponta para minha cabeça e então me lembro de quando prendi os óculos ali quando ela bateu à minha porta dez minutos atrás avisando que estava quase na hora da reunião com Lily e os europeus. Na verdade, estou pouco me ferrando para essa reunião, mas a expectativa de ver minha amiga me distrai.

Arranco os óculos no segundo em que Lily aparece na tela na parede. E eu mal consigo afastar os olhos de seu rosto. Queria vê-la de perto, já são dois meses sem ela e é horrível vê-la por videoconferência. Que coisa idiota. Odeio tecnologia, gosto das coisas perto de mim, das pessoas perto de mim.

— Olá, Tyler. — ela e sua pose extremamente profissional interage comigo na imagem virtual.

— Lily.

E a hora seguinte passa num estado de dormência. Só estou nessa reunião virtual estúpida porque sou a outra metade original da empresa e Lily precisa do meu aval para qualquer negociação. Cheguei a pensar em ligar para ela e pedir que me liberasse dessa, mas passei tanto tempo enfurnado no laboratório que me esqueci de tudo. Faz mais de três semanas que não vou ao bar ou faço algum tipo de programa com amigos.

Será que estou me tornando uma Lily de calças? Um workaholic? Essa não.

***

Três meses depois

Meu laboratório está abarrotado de Lirios-do-Vale. Acho que tem uns cinco vasos na bancada e mais uns dez no chão, todos esperando para serem picados e amassados. Faz três meses que tento encontrar o cheiro perfeito, aquele que sinto momentaneamente, mas o universo não está cooperando.

São três meses sem Lily.

O pior de tudo é que, nesse tempo todo, nos falamos pouquíssimas vezes para uma dupla de melhores amigos. Sinto tanta falta dela que acho até que pode estar me afetando e me impedindo de me concentrar no meu trabalho. Na minha tarefa de encontrar a droga da fórmula com os lírios. Sinto falta de Lily, falta da minha melhor amiga, das nossas conversas sérias de trabalho e das mais idiotas. Dos sermões que ela me dá porque se preocupa com quem saio e quanto bebo numa noite depois de me acompanhar no momento mais obscuro da minha vida. Sinto falta do seu abraço, de quando está extremamente cansada, mas, ainda assim, topa minhas maratonas de séries e filmes e tenta ficar acordada só para me agradar. Sinto falta de sua risada quando lhe faço cócegas e ela tenta me bater por se irritar. Ela odeia cócegas.

Acho que sinto tanto sua falta que chego a sonhar com ela algumas noites.

Ficar sem Lily transforma minha vida em algo que não gosto. Melancólico e chato. Monótono. Tedioso. Uma droga.

Eu gostaria de dizer a ela que fiquei mais responsável por ficar sozinho na empresa, mas isso é uma mentira. Eu chego aqui pela manhã, me tranco no laboratório e deixo que o mundo se exploda lá fora. Quando algo acontece, Lucy recorre a Smith. Mas quando nem ele consegue resolver, ela liga para Lily. E a única coisa que faço é assinar, e assinar mais, e aparecer em algum lugar que exija minha presença ou a dela. Nem a festas tenho comparecido. E eu amo festas.

Na semana passada vi uma reportagem que dizia: “Por onde anda o famoso perfumista, Tyler Reed? Será que a recente crise no mercado europeu o assustou?”

Eu não tinha me dado conta do quão público era até isso.

— Eles não sabem nada sobre mim.

Desço da minha banqueta e arranco um lírio da haste. O cheiro é delicioso. E então os esmago. Assusto-me quando batem na porta.

— Atendo apenas dançarinas do ventre!

— Senhor Reed!

— Desculpe, Lucy. Pode entrar.

Lucy entra rindo, mas para desconfiada e então me vê do outro lado da sala. Sorrindo, ela se aproxima, o tablet na mão, o telefone na outra. Parece genuinamente contente, como se uma coisa muito boa tivesse acontecido. Será que Lily voltou? A perspectiva de que isso seja verdade me deixa insano.

— Tyler, a senhorita Lily...

— O que foi? Ela está voltando? Quando chega? — já estou eufórico só de imaginar que isso seja verdade.

— Ela ainda não está voltando. — volto a ficar irritado imediatamente, e antes que eu exploda, Lucy ameniza a situação com uma simples frase: — Mas está no telefone, quer falar com você.

Pego o telefone de sua mão antes que ela possa sequer piscar. Encosto o aparelho no ouvido e posso ouvir Lily rindo e falando com alguém do outro lado. Não consigo ouvir muito bem, mas só de ouvir sua voz e alguns risinhos de novo me sinto mais leve.

— Lily?

— Tyler! — ela ainda parece animada quando diz meu nome.

— Quando Lucy me falou de você achei que estivesse no avião voltando para a terra do Tio Sam. Ou simplesmente a terra onde mora seu melhor amigo que está morrendo de saudades. — rio da minha própria piada boba, apesar de no fundo não achar tão engraçado assim ficar sem ela por tanto tempo.

— Não, ainda não estou voltando. E mesmo morrendo de saudades da terra do Tio Sam e do meu melhor amigo... — sua voz baixa gradativamente e eu não gosto disso.

Sei que sempre vem notícia ruim quando faz isso.

— Qual é agora? Vai dizer que prefere a terra da rainha?

— Decidi ficar mais um mês. — ela fala rapidamente.

Rápido até demais para seu costume.

— O quê?! — sai quase como um berro. — Está brincando? Mais um mês? Lily, que droga você está fazendo nesse lugar?

Ouço-a suspirar e isso me traz a assombrosa e, ao mesmo tempo, deliciosa sensação de ouvir seus suspiros de prazer ao meu ouvido.

Mas que merda.

— Preciso de mais tempo. E você sabe o que estou fazendo aqui, trabalhando. Preciso mostrar como será o resultado das nossas empresas juntas, ou não aceitarão. Nós precisamos disso, é um ótimo investimento e você sabe muito bem.

— E eu vou ter que ficar mais da metade de um ano sem te ver. — agora minha voz quase não sai e eu odeio isso. Odeio sentir tanta falta dela e ela sequer sentir o mesmo.

— Tyler, você percebeu como esses três meses passaram voando? Pois então, serão apenas mais quatro que também passarão bem rápido. — ela usa sua voz de persuasão, fica meiga, mas de um jeito esquisito e psicopata. Nunca funciona comigo.

A única técnica de persuasão que ela faz que funciona comigo é quando é realmente meiga e fofa, e não é uma técnica, é ela naturalmente.

— Olha, tudo bem. Fique um ano se quiser, eu não tenho nada a ver com isso.

— Tyler...

— É isso mesmo, Lily. Não preciso falar muito porque você me conhece e, no mínimo, já sabe como estou irritado.

Na verdade estou soltando fumaça pelos ouvidos como nos desenhos animados.

— Eu sei.

— Pois então, poderia ter me poupado disso e dito a Lucy que vai ficar mais um mês. — tento ser frio como ela e acho até que estou indo bem.

— Ty...

— Não vem com essa de Ty. — eespiro bem fundo e não sei de onde vem toda essa frustração que parece me consumir e agir assim com ela. — Se não se importa, tenho trabalho a fazer.

— Agora é essa desculpa que usa? — ela ri.

— Não é desculpa, estou realmente empenhado em conseguir uma fórmula. Se você só se preocupa com seu trabalho aí na terra da rainha, eu me preocupo com o meu trabalho aqui.

— Tem algo acontecendo que eu não saiba?

— Não. Eu só preciso ir. Tem algo mais a ser dito?

Um silêncio é estabelecido, mas dura pouco.

— Não. Eu queria te avisar sobre esse mês extra e também queria falar com o meu amigo, mas parece que não é uma boa hora.

Lily soa levemente desapontada, ela não gosta de deixar as coisas transparecerem demais.

— Acertou, não é uma boa hora. Se era só isso, só me resta desejar felicidades na sua vidinha londrina tomando chá com limão toda tarde.

— Tyler, pare de ser idiota.

— Beijos, Lily. Não se apresse em voltar.

Desligo o telefone sem remorso algum.

Estou sentado no sofá, confortável e tranquilo. Preguiçoso. Sinto suas mãos tocarem meus ombros e em seguida deslizarem sobre meu peito e então ela me abraça pelo pescoço enquanto cola o rosto no meu.

— Parece preguiçoso hoje.

Deito a cabeça para trás e encaro os olhos azuis de volta. Sorrio.

— De fato estou.

— Estou com uma energia extra hoje, especialmente. É uma pena que você esteja assim, sem ânimo para nada.

— Para você eu nunca estou preguiçoso ou sem ânimo.

Ela me beija a bochecha e ri, o que me faz sentir cócegas. Vou puxando-a como posso até fazê-la pular sobre o sofá e cair com metade do corpo sobre mim com um pouco de força demais, o que nos faz rir.

— Somos desastrados juntos, não acha?

— Não. Temos uma empresa que vale milhões e somos ótimos empresários. Não somos desastrados juntos.

Sua risada misturada a minha me faz genuinamente feliz.

Ela fica sentada e volta a me beijar, ainda estou do mesmo jeito, preguiçoso, apenas respondendo aos comandos do melhor beijo de todos. Lily tem um poder de fazer o que quiser comigo com apenas um beijo. É dizer que me beijará e eu farei o que ela quiser. E eu sou sempre todo seu quando faz o restante.

Suas mãos deslizam lentamente pelo meu pescoço e, ainda me beijando, ela senta no meu colo e passa os dedos rapidamente pelo meu cabelo, e então o puxa e faz meu rosto afastar do seu de propósito. Vejo seu sorriso sacana e seu olhar de prazer em fazer isso comigo.

— Você adora me maltratar. Por quê? — pergunto entre risos.

— Porque você merece.

Não.

Nããããããããããããão!

Estou suando, o lençol gruda na minha pele e percebo que estou excitado no meio da noite por culpa de um sonho com a droga da minha melhor amiga! Isso não pode estar acontecendo!

Só pode ser algum tipo de maldição que alguma maluca jogou em mim! Uma penitência pré-purgatório, talvez? O que fiz para merecer isso?

Aposto que é culpa. Só pode ser culpa por ter dito aquelas coisas ao telefone para Lily. Que tipo de melhor amigo sou se não consigo respeitar as vontades dela? Se ela quer ficar mais um mês na Inglaterra, que fique. Quer ficar mais um mês longe de mim, à vontade! Quer me fazer sofrer me deixando sozinho, sem ninguém para conversar ou rir de mim, olha, nem estou ligando!

Mas me fazer sentir culpa é demais.

Fico sentado e pego o telefone e logo escuto o tu, tu, tu, como se fossem pessoas gritando que a culpa é minha, minha, minha. Cai na caixa postal.

— Por que não atendeu o celular? Está tudo bem? Você sempre atende... Bem, talvez seja porque não quer falar comigo... — respiro fundo, derrotado. —Desculpe pelo que eu disse antes, foi idiotice. Eu sei que você se importa com tudo o que acontece, só que não é legal ficarmos separados por tanto tempo. Sinto sua falta e é covardia me fazer ficar mais um mês longe de você. Serão sete meses no total, Lily. — minha voz quase falha. Que raiva. — Sei que sente minha falta também porque não vive sem mim, mas começo a pensar que não sente tanto assim já que decidiu, tranquilamente, ficar mais tempo. É só que... — de repente sinto um vazio no peito que me assusta. — Não estou acostumado a ficar tanto tempo assim longe de você. Poxa, já foram três meses. E eu não queria falar isso, até porque você já sabe, mas eu não sou nada sem você. É um saco chegar de manhã no escritório e olhar para a sua sala e saber que você não vai chegar. É um saco não ter com quem brigar e depois gastar dinheiro no Starbucks pra fazer as pazes. — sinto saudades como não imaginei sentir. — Eu não sei bem o que dizer, só precisava me desculpar e dizer que preciso que volte logo, preciso de você aqui comigo. Mesmo sabendo que isso não vai fazer diferença e você vai ficar aí, mas... — suspiro pesado e me jogo deitado na cama de novo. — Bem, acho que já falei muito. Eu só precisava falar com você, mas não resisti em deixar o recado.

Desligo o telefone e me sinto péssimo. Quanto mais fundo respiro, a sensação que senti por tanto tempo nos anos mais difíceis da minha vida volta como uma assombração. Eu preciso beber. Arrasto-me pelos lençóis e sigo para a sala, onde tem uma garrafa de uísque. O que mais preciso agora é ter minha melhor amiga comigo, mas, como não posso tê-la, a bebida vai suprir essa saudade. No final, ela sempre esteve comigo.


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Notas finais do capítulo

Comentem, ok? Beijos!



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