Fase Experimental escrita por Camila Fernandez


Capítulo 12
Capítulo 13 - Yuri




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Já estava ficando bem cansativa essa história toda. Quer dizer, nesses últimos dias fui atacado por todos os tipo possíveis de animais. Algo que parecia um puma , mas com pintas, aves diversas, macacos e principalmente mosquitos. Inclusive parecia que eu tinha catapora devido ao alto grau de intolerância que eu tinha as picadas.. Tentando olhar o mais positivamente para tudo isso pelo menos eu estava me tornando mais forte. Sentia meu abdômen e braços um pouco mais definidos. Minha pele também já tinha passado do vermelho camarão e ardida para um tom mais moreno. Na Rússia não tínhamos muito como conseguir uma cor assim, então poucas vezes fui “moreno”.

Parecia haver uma eternidade desde que cheguei, mas para ser sincero mal fazia dois meses. Claro que nesse meio tempo nem todos os dias foram um horror, mas outros eu preferiria esquecer. Uma manhã quando acordei tinha uma faca no chão em frente a porta da casa. Mais a diante um alvo tinha sido implantado. As instruções eram óbvias, somando um mais um, uma faca mais um alvo, ficava fácil saber o que fazer. Comecei a arremessá-la em direção ao alvo. Não levava muito jeito, mal sabia onde deveria segurar, estava tão distraído que não vi quando um pequeno papel pairou ao meu lado no chão. Desdobrei-o e vi que continha algumas dicas de como fazer. Demorei um pouco até acertar o alvo pela primeira vez. Em nenhuma consegui mirar o centro, mas sentia que podia tentar em outros alvos.

De longe tinha visto um animal que reconheci dos meus livros de biologia da escola como uma anta. Atirei a faca em sua direção, não esperava muito, afinal era um alvo móvel e com o parado já estava bem difícil, porém para minha surpresa a peguei de raspão. Estava pronto para ir até lá recolher minha faca e tentar atirar de novo na minha refeição quando ela se virou contra mim. Nunca imaginei que antas eram animais que se irritavam, mas essa partiu com tudo para cima de mim. Sem pensar duas vezes disparei para dentro da casa. Ultimamente tinha cada vez mais que usar do pensamento rápido e a casa tinha se tornado o meu lugar seguro. Talvez não pudesse fugir dos meus pensamentos ou dos mosquitos, mas certamente eu podia escapar de uma anta raivosa.

Esperei que lá fora estivesse em silêncio novamente e sai. A faca continuava parada exatamente onde estava antes. Peguei-a nas mãos e limpei o sangue que restava na terra. Meu estômago reclamava de fome e eu não sentia vontade de comer peixe com legumes de novo, mas não me restava outras opções. Lembrei-me de casa e como sempre tinha algo diferente preparado pela minha mãe para as refeições. Nesse dia senti tanta falta de casa que a fome nem mais foi um problema.

Por outro lado a casa cada vez mais era a minha casa, já quase me sentia confortável em suas beliches. Depois que ganhei um sistema de som inclusive os dias ficaram mais fáceis, as vezes colocava bem alto enquanto praticava seja lá o que eles quisessem pro dia, em outros momentos enquanto dava dava uma faxinada na casa, cantava a plenos pulmões, não era como se alguém pudesse me ouvir e reclamar. Porém nem tudo isso me fazia esquecer o quanto me sentia sozinho, sabia que minha família não era uma opção, mas haviam me prometido mais gente e depois de um mês e quinze dias minha única companhia era um beija-flor que sempre vinha me visitar.

Dois dias atrás senti que tinha chegado ao meu máximo, me peguei tendo uma verdadeira conversa comigo mesmo, estava enlouquecendo de verdade. Sempre fui sociável e conversava com todos da minha sala, agora estava eu aqui com a opção de passarinho ou de mim mesmo.

Mesmo sem ter motivos tinha acordado feliz hoje. Meu cabelo já estava começando a ter um tamanho normal. Entrei no banheiro pela manhã para lavar o rosto e lá estava ela de novo, a máquina de raspar. Totalmente contrariado a liguei e pouco a pouco fui me desfazendo dos meus lindos fios aloirados. Minha "barba" também começava a crescer, mas ignorei e torci que eles fizessem o mesmo, me dava um ar de mais velho, quase cara de 17 anos e isso era legal. Pus a roupa do "acampamento de férias" e sai para ver o que o dia me reservava.

Do lado de fora havia uma pistola. Talvez o jeito mais rápido e mais frio de se matar. Meu avô tinha uma, um dia quando tinha nove anos peguei de dentro de sua gaveta do escritório. Sai sem que ninguém me visse e decidi brincar de caçador. Puxei o gatilho com ela apontada para cima, não esperava que estive carregada e muito menos engatada. O barulho foi ensurdecedor e a pressão me jogou de encontro a neve fofa. Comecei a chorar na mesma hora pensando no que poderia ter acontecido se eu estivesse mirando em alguém. Assim que consegui me levantar corri para onde a tinha pego e devolvi. Nunca contei aos meus pais sobre o ocorrido.

Pode parecer hipocrisia eu ter coragem de matar por uma faca ou arco e não por uma arma, mas simplesmente me parecia errado. Minha visão da arma era de algo construído com um único propósito, e ele era  ruim. A maioria das outras armas são instrumentos antigos e mesmo os mais novos precisam de um contado mais direto. Com uma arma de fogo não é assim que funciona. Pode-se argumentar que o arco e flecha também não deixa suspeitos, mas ainda assim é diferente. Peguei a arma que me era dada e segurei com as duas mãos. Parecia pesar toneladas, mesmo que não devesse passar de meio quilo.

Olhei para o alvo na minha frente. Reunindo forças coloquei a munição e a preparei. Depois do ocorrido saí uma vez com meu pai para caçar com espingarda e ele me ensinou o básico, quando me perguntou se queria tentar disfarcei e recusei, nunca mais ele me chamou. Com tudo preparado só faltava agora dar o tiro. Me concentrei no alvo à frente e na minha respiração. Contei até dez e apertei. Senti toda a pressão que tinha sentido daquela vez, mas pelo menos achava que meu braço estava no lugar. Não estava longe do esperado. Eu devia estar feliz por isso, mas não gostava dessa arma, sentia repulsa, e tendo acordado tão bem quanto acordei hoje decidi que não deixaria uma pistola acabar com meu dia.

Saí então para caçar. Peguei duas pedras e afiei uma delas com a outra. Entrei no rio sentindo a refrescante água lavar minha alma de todas as coisas ruins. O peixe podia esperar. E fiz bem em mandar ele esperar pois terminei com um salmão delicioso.

Depois de ficar mais um tempo no tédio e assistir o noticiário russo (sim eu podia ver daqui), optei por ir para minha cama dormir. Apaguei o interruptor e me deitei. Não consegui pegar no sono por muito tempo. Não parava de pensar que alguma hora seria obrigado a atirar de novo e isso me assustava.

Pensei então no outro grupo que existia e do qual eu não conhecia nada. Será que ela já tinha um time montado? Será que também sentia falta de casa? Não sabia nem o nome dela. Talvez se pudéssemos conversar nos sentíssemos menos sozinhos. Droga eu estava divagando demais e amanhã acordaria cedo como sempre, aliás sentia falta disso também, em casa pelo menos nos fins de semana eu podia dormir até bem tarde, aqui eu duvido ter acordado depois das sete até hoje.

Como já sabia que aconteceria fui acordado com a claridade na minha cara. Me levantei em direção ao banheiro ainda meio dormindo. Estava na porta quando algo me surpreendeu. O susto foi tão grande que não gritei, só fiquei parado de boca aberta. Havia uma menina só de sutiã e short parada na minha frente se olhando no espelho enquanto arrumava o cabelo num rabo alto.

—Olá. -disse ela. -Meu nome é Louise e você? Quem é?




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