Breathe escrita por Little Alice


Capítulo 1
U: winter just wasn't my season


Notas iniciais do capítulo

Eu costumava ouvir essa música na minha adolescência, mas recentemente a ouvi sem querer em um desses dias nublados e meio deprimidos. E fiquei pensando em como eu me sinto como essa música agora, por isso resolvi escrever algo baseado nela.

Achei que Draco e Astoria combinavam com ela, de certa forma.

Breathe (2 AM) - Anna Nalick
https://www.youtube.com/watch?v=FAlWxZK-ps4



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2 AM and she calls me 'cause I'm still awake.
Can you help me unravel my latest mistake.
I don't love him, winter just wasn't my season
 

Eram duas e vinte da manhã quando Draco apareceu em frente à porta do apartamento de Astoria. O rosto vermelho, os cabelos molhados pelos respingos da chuva que caía sobre Londres naquela noite fria e a respiração ofegante. Astoria não esperou mais do que alguns segundos para se jogar nos braços dele, sem nem se importar em como era estranho ele estar ali.

Ele apenas estava. Por ela.

Astoria havia lhe enviado uma carta às duas horas da madrugada, em um ato completamente impensado, pedindo que ele a ajudasse a resolver seus últimos erros. Sua vida agora convergia em uma série de equívocos: a sua relação com Dafne, o seu emprego no Ministério, o seu recém-acabado relacionamento com McLaggen. Todas as escolhas que fizera pós-Hogwarts.

Ela sabia tão pouco sobre si mesma e, ainda assim, sentia o coração congelando naquele inverno pouco a pouco. Um inverno rigoroso que durava há tempo demais, há mais tempo do que poderia suportar.

― Ele partiu seu coração? ― perguntou Draco.

A garota negou e soltou um riso fraco.

― Acho que eu parti meu próprio coração.

Astoria não sabia muito bem o que estava fazendo quando decidiu sair do Ministério, deixando um pai aturdido para trás. Ela só tivera tempo de dizer um “Perdão” incompreensível e entrecortado por lágrimas, antes de entrar no elevador e apertar to­dos os botões desesperada. A garota aparatou minutos depois no apartamento do ex-namorado e cuspiu todas aquelas palavras que estavam entaladas em sua garganta há muito tempo.

― Me pareceu um pedido desesperado por socorro ― Draco pegou uma garrafa de uísque de fogo sobre a bancada da cozinha e se sentou no chão frio do apartamento de Astoria, disposto a continuar ouvindo o resto da sua história ― A vida é mesmo um grande soco no estômago. E não melhora com o tempo.

Astoria se sentou ao seu lado, encostando levemente a cabeça em seu ombro.

― Mas pense pelo lado positivo, agora não está mais com o McLaggen ― sorriu pelo canto da boca de um jeito presunçoso e ofereceu um copo de uísque a ela ― Isso é algo a se comemorar, Astoria. Porque não vai mais precisar se sentir culpada ou como uma grande vadia sem consciência, o que você definitivamente não é, toda vez que quiser transar comigo para fugir de algum tipo de tédio existencial.

― Você faz as coisas parecerem mais românticas desse ponto ― ironizou.

― Pode ser, embora isso não diminua toda essa sua situação no Ministério da Magia e o fato de que agora você é uma pessoa...

― Sem perspectiva? ― arriscou.

― Eu ia dizer desempregada ― Draco virou o copo de uísque em um único gole e segurou a mão suada de Astoria ― Mas já que preferiu esse termo...

Cause you can’t jump the track
We’re like cars on a cable
And life’s like an hourglass, glued to the table
 

Astoria precisava admitir, por mais que aquilo doesse, que levava o que sua irmã Dafne chamava de “vida torta”. Ela não tinha nenhuma perspectiva. Aos vinte anos, a maioria dos bruxos seguia por algum caminho considerado promissor. Já Astoria simplesmente não sabia como viver e isso era o máximo que podia dizer de si mesma. Pela primeira vez, nos segundos que antecederam sua fuga em direção a lugar nenhum, sentiu-se em pânico com a perspectiva de não ter perspectiva.

Astoria sabia que estava muito perto de se tornar o tipo de pessoa que aceitava qualquer destino como alguém presa a uma trilha de trem, sem poder saltar, e aquilo a assustou. Ela estava naquele emprego pelos motivos errados, apenas para não decepcionar os pais mais uma vez.

― Conversei com Rawle ― dissera seu pai, durante um jantar na casa deles tempos atrás. Embora sua mãe tivesse chamado sua atenção por brincar com a comida, Astoria continuou remexendo o purê de batatas com ervilhas em seu prato, sem muito interesse. Ela ergueu os olhos ao ouvir o pai interromper o silêncio ― Ele me contou que há uma vaga no Escritório Internacional de Direito em Magia. Posso conseguir uma entrevista para você, Tori.

Ela não queria. Astoria ousou olhar para a mãe, que a observava com uma expectativa quase palpável e soube que os pais planejavam propor aquilo há dias. Não podia dizer que não notara o olhar de reprovação da sua mãe, quando declarou, após a viagem de formatura, que não sabia muito bem o que gostaria de fazer da sua vida. “Não sabe?”, a Sra. Greengrass questionou, sem esconder a decepção. Ela apenas queria arrancar aquela expressão de desapontamento do rosto dos pais.

Just a day, he sat down to the flask in his fist
Ain’t been sober, since maybe October of last year
Here in town you can tell he’s been down for a while
 

― Não é como se eu realmente quisesse continuar nesse emprego ― Astoria deu de ombros. Draco simplesmente a fitou, sério. Ele sabia o que a garota estava fazendo e não gostava disso. Não lhe parecia justo que alguém como Astoria, que poderia ter um futuro brilhante e cheio de possibilidades, pudesse desperdiçar a vida daquela maneira estúpida, enquanto Draco não tinha escolha nenhuma. Esperança nenhuma.

Se Astoria sentia o seu coração congelar pouco a pouco naquele inverno, Draco já não possuía coração algum dentro do peito. Ele era o próprio inverno. E nada podia florescer. Era alguém condenado a viver na pele de um pária. Alguém preso a memórias e a um sobrenome que já não significava mais nada para ele ou para qualquer outra pessoa. Condenado por uma marca negra. Os seus pedidos de socorro eram muito maiores e mais desesperados dos que os dela.

Não havia um dia sequer em que estivesse completamente sóbrio. Porque precisava do álcool para suportar a própria existência inútil e todos aqueles fantasmas do seu passado. Isso até Astoria entrar em sua vida, em um dia potencialmente nublado e frio, quando a garota se sentou ao seu lado em um pub qualquer e os dois pediram um quarto porque não tinham nada melhor para fazer em uma noite como aquela. E porque ele estava bêbado. E porque ela estava bêbada. E os dois completamente fartos.

E era também a primeira vez que Astoria pulava para fora dos trilhos e ele entendeu isso.

Os dois continuaram se encontrando, mesmo que a garota tivesse a porcaria de um namorado que Draco passou a amaldiçoar – e secretamente invejar – dia após dia. Não se importou de continuar com aqueles malditos encontros até descobrir, de maneira bastante dolorosa, que talvez estivesse se apaixonando por aquela garota que cheirava a cigarro barato, álcool e rosas. Embora agora ele só conseguisse sentir o cheiro das rosas. Soava egoísta, mas Draco passou a desejar Astoria só para ele – ainda que soubesse que McLaggen nunca a teve como ele a tinha.

E tudo porque Astoria era a porra da faísca. Da fagulha. A porra da esperança que estava fazendo o seu coração já congelado e praticamente inexistente voltar a bater. Dolorosamente, mas bater.

No one can find the rewind button, boys
So cradle your head in your hands
And breathe, just breathe
 

Foi por isso que decidiu simplesmente parar de vê-la, porque não havia um feitiço que pudesse reverter isso. Assim como não havia um feitiço que pudesse reverter toda sua existência e Draco só podia continuar ali, lutando para respirar. Ele já havia ultrapassado há muito tempo aquela linha tênue que haviam estabelecido no início. Era doloroso demais continuar com aquilo, ainda mais sabendo que era apenas uma muleta emocional na vida dela e que não podia esperar muita coisa além daquilo que ela estava oferecendo.

Draco não quis ter nenhum tipo de esperança boba quando recebeu aquela carta de Astoria durante a madrugada, pedindo que a ajudasse, porque sua vida estava uma bagunça e ela havia feito besteira. Só que ele teve.

― Por que me chamou aqui, Tori? ― ele quis saber.

Ela não sabia a razão, apenas que o fez. Astoria olhou para suas mãos entrelaçadas e disse:

― Talvez eu só precisasse que alguém segurasse minha mão como está fazendo agora.

Isso também soava egoísta. Desejar que Draco, ou alguém, estivesse ali, por ela. Astoria não queria que alguém lhe dissesse como prosseguir ou indicasse o caminho certo. Astoria sabia que ninguém poderia lhe responder isso, a não ser ela mesma. Há certas coisas que só se fazem sozinha. Ela queria apenas alguém que segurasse sua mão durante esse trajeto, para que não caísse, para que continuasse. Para que resistisse e continuasse respirando. Em troca, ela seguraria sua mão de volta.

E Draco era essa pessoa para ela.

― Eu não quero continuar com isso ― Draco se levantou ― Eu não quero ser essa pessoa que vai transar com você de vez em quando por qualquer motivo torto e sem valor ou que vai enxugar suas lágrimas e segurar sua mão apenas porque você não tem outra pessoa ao seu lado e eu sou sua única opção nesse momento.

Astoria o encarou, sem entender.

― E eu não quero ser essa pessoa que vai te dizer que você está jogando sua vida fora. Ou que você está sendo pateticamente estúpida por não ver todos os talentos que possui e que poderiam ser aplicados para algo prático e útil e que você está fazendo tudo errado por simplesmente não lutar ― Draco respirou fundo ― Eu não quero ser essa pessoa, Astoria. A vida já é um saco o suficiente sem isso...

― Você entendeu tudo errado ― Astoria o interrompeu ― Eu não te chamei aqui apenas para enxugar minhas lágrimas ou juntar todos os cacos de vidro que ainda sobraram da minha vida. Eu te chamei aqui porque, sim, você é a minha única opção. A única pessoa em que eu confio e acredito. E que estranhamente me faz bem no meio de tanta neve e caos. E eu esperava que você soubesse disso, Draco. Eu esperava que você soubesse que não é apenas essa pessoa com quem eu transo de vez em quando por qualquer motivo torto e sem valor.

Draco a abraçou forte. E enterrou o rosto entre os cabelos dela, respirando aquele cheiro de rosas. Astoria sentiu como se suas costelas pudessem ser esmagadas e retribuiu o aperto com essa mesma intensidade, praticamente se agarrando a ele. Era como se os dois estivessem descontando o peso do mundo naquele abraço. E eles simplesmente não queriam que aquilo acabasse.

― Eu achei que você soubesse que as coisas estão confusas demais e que eu ainda estou tentando achar as respostas e buscando coragem para ir atrás daquilo que é importante para mim. E isso meio que incluía você.

Ela sentiu a respiração de Draco ficar mais lenta.

― No que está pensando agora?

― Que talvez tenha uma luz no final de cada túnel, mesmo que a gente pareça tão distante da saída agora.

Astoria o abraçou ainda mais forte, como toda a força que possuía, porque queria acreditar que Draco estivesse pelo menos um pouco certo sobre aquilo. Sobre as luzes e esperanças no final de cada túnel.

There's a light at each end of this tunnel
You shout 'cause you're just as far in
As you'll ever be out


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Notas finais do capítulo

É isso. Espero que tenham gostado.

Beijos ;*



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