Entre armas e rosas escrita por RoseGun


Capítulo 4
Callie


Notas iniciais do capítulo

nova narradora!!!!



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Callie

Flor de Begônia

Correr, cansaço e perigo. São as únicas palavras que vêm a minha cabeça neste momento. Acabei de roubar comida para a minha família e estou fugindo de três grandes e fortes soldados. Escondo-me atrás de uma árvore e os vejo andando lentamente em minha procura, seus distintivos vermelhos que possuem o símbolo nazista passam diante de meus olhos. Malditos nazistas... Maldito Hitler. Antes, a maioria das pessoas não precisaria correr e nem roubar para suas famílias sobreviverem. Era uma cidade pacífica, onde havia pessoas alegres e gentis juntas, se ajudando e não se importando com as condições de um ou de outro, e onde diversos judeus iguais a mim viviam tranquilamente... Até assinarem aquele acordo onde entregavam a Polônia de bandeja para a Alemanha. Agora, Lublin é uma cidade cheia de nazistas, onde as famílias que sempre moraram aqui têm que viver fugindo para não serem torturados e mortos. Sobram-nos apenas os guetos* para vivermos com um pouco de paz.

Quando eu espio pela arvore vejo que os soldados se concentram em outra coisa e se vão, então eu corro para casa. No entanto quando eu menos esperava um soldado aparece atrás de mim e agarra meus braços. Como pude não ter o notado? Pensei que tinha ido embora. Vejo que os outros dois soldados voltaram para ajudar e eu tive que me obrigar a me acalmar e relembrar o que eu sabia de luta. Rapidamente memórias da minha infância passaram por minha cabeça. Meus pais sempre tentaram trabalhar o máximo que podiam, mas nunca tivemos boas condições, e quando a situação era difícil eu saia com alguns amigos para assaltar algumas lojas. Não contava para meus pais, é claro, mas na nossa cidade uma das coisas que as crianças adoravam fazer eram círculos de lutas na floresta.

Escalando arvores, arranjando brigas com quem aparecesse, às vezes por diversão, às vezes pela minha própria sobrevivência. Sempre fui mais rápida e ágil que as outras crianças e hoje que os soldados.

Respirei fundo, lentamente mexi meus braços e me abaixei de modo que consegui me soltar. Rapidamente me virei contra o soldado que me segurava e chutei sua costela, o deixando sem ar. Sai correndo e me inclinei enquanto corria. Quando os outros dois soldados chegaram me arrastei e girei, derrubando ambos no chão. Não esperei levantarem, me virei e corri com a maior força que pude. Então, nesta corrida, avisto minha casa. Acelero ainda mais os passos e em uma fração de segundos, sem eu menos esperar, meus olhos se escurecem e caio ao chão.

Abro os olhos e retiro às mechas de cabelos castanhos, longos e ondulados de minha face. Meu coração acelera quando vejo novamente o distintivo vermelho, porém a tensão logo se alivia quando o soldado estende a mão e me oferece ajuda para levantar. Quando já estou de pé ele recolhe os alimentos que haviam caído junto comigo. Eu agradeço a gentileza e ele pergunta o meu nome, eu assustada respondo apenas meu primeiro nome, Callie, com medo de que ele reconheça o meu sobrenome judeu e me prenda. Porém, ao contrário do que eu esperava de um soldado, ele sorri; e é aí que percebo que ele é um soldado diferente. Ele aparenta ter a minha idade. Não sei se são os brilhantes olhos azuis, seus cabelos loiros claros ou a face tranquila, mas coro por um tempo e retribuo o sorriso. Pergunto seu nome e ele me responde Luke. O soldado me acompanha até a porta de minha casa. Queria poder conversar mais; contudo, os passos de minha mãe se aproximando da porta me obrigam a entrar e fechar a porta rapidamente. “Sinto muito, Luke”, penso comigo mesma.

Minha família é judia e muito conservadora: minha mãe é como sempre, muito rígida, baixa e forte, devido às horas que passa curvada sobre a máquina de costura. Meu pai é bem mais afetuoso; alto e robusto, ele é sapateiro e, embora não tenha feito muito este trabalho pela falta de dinheiro, também se encarrega de comprar os materiais para as costuras de mamãe. Eu fico encarregada dos serviços domésticos e da entrega das roupas prontas.

Nos dias que se seguiam, mesmo depois de ter fechado a porta de casa sem nem me despedir, Luke começou a me visitar frequentemente. Íamos para a floresta e conversávamos por horas sem nem ver o tempo passar. Éramos como melhores amigos, eu contava tudo a ele e ele contava tudo a mim, mesmo que ainda houvesse um limite entre nossa amizade.

Em certo dia, enquanto esperava a visita de Luke, que já era quase rotina, comecei a sentir um nervosismo estranho, uma... Ansiedade. Quando ele chegou, não pude conter a felicidade e o abracei. Não sei o que estava acontecendo comigo:

– Luke, o que seria isso? - Perguntei ao ver uma cesta em sua mão.

– Ah – Luke respondeu – É apenas uma cesta para o nosso piquenique – Ele disse como se fosse óbvio.

Embora não tivéssemos combinado piquenique algum, concordei. Estendemos um lençol em um lugar especifico da floresta, em um local sem muitas arvores, na grama onde batia uma rajada de sol que deixava o ambiente ainda mais aconchegante. Não muito longe da onde nos sentamos, percebi que existia um laguinho com uma pequena cachoeira. Conversamos, rimos e comemos. Ficamos ali por tanto tempo que mal percebi quando o Sol começava a se por atrás de nós. Então depois de um tempo refletindo, resolvi perguntar:

– Luke, você pareceu conhecer bem este lugar quando viemos para cá.

– Bem, este é um lugar de que eu gosto muito.

– Por quê?

–Está vendo aquele laguinho ali atrás? Lá mora um casal de tartarugas tigre d´agua.

– Tartarugas?- Disse me levantado para ver.

Andei para o laguinho e vi um casal de tartarugas nadando felizmente como se tudo no mundo fosse perfeito e não existisse nada para se preocupar. A luz do pôr do sol batia na agua e na pequena cachoeira das tartarugas, deixando a agua brilhando em um tom de dourado e prata. Percebi que ao lado da cachoeirinha, cresciam várias flores que reconheci como flores de açucena, o que dava ainda mais beleza ao lugar. Aquilo era certamente a coisa mais bonita que já vi. Uma das maravilhas da natureza:

– Quem as colocou aqui?

– Não sei- Disse Luke rindo- Eu já frequentava algumas vezes este lugar. Era calmo e bonito. Mas um dia elas simplesmente... Apareceram. Eu não ousei tira-las dali, afinal, estão tão felizes. E desde então eu venho visita-las todos os dias.

– Realmente... - Disse para Luke rindo e admirando aquele lugar- É um ótimo lugar. É... Lindo.

Luke pegou minha mão ainda sorrindo e me levou de volta ao local de nosso piquenique. Quando nos sentamos ele disse:

–Ah, eu já ia me esquecer. – Ele tira uma caixa de madeira vermelha lisa e me entrega- Aqui, é para você.

Olhei sem palavras. Ninguém nunca tinha me dado um presente antes. Claro que já recebi diversos cortejos, mas nada deste gênero. Eu abri a caixa cuidadosamente e fiquei sem folego. Dentro tinha um colar onde a corrente formava vários círculos de prata que iam se enroscando até o final, e no centro se tinha uma rosa vermelha de rubi onde cada pétala era coberta por uma fina camada de prata na borda que dava ainda mais brilho à joia:

– Achei que combinava com você. Você é linda e merece cuidado como uma rosa. E vermelho porque, bem, seu sobrenome é Ruth* não?

Parei por um momento olhando para ele assustada. Como sabia meu sobrenome? Nunca o tinha dito:

– Você deve estar um pouco confusa. – Disse Luke rindo, parecendo ter praticamente lido minha mente- Ouvi algumas das pessoas de onde você mora te chamarem assim de umas das vezes que fui te visitar. Conclui que seria seu sobrenome e quis te fazer uma surpresa. É um nome bem bonito.

Pelo jeito Luke não tinha descoberto ainda tudo sobre mim. Mesmo assim tinha adorado o que tinha feito, não pude evitar um sorriso em meu rosto enquanto acariciava a joia:

– O meu é Smithen. - Disse Luke.

– O quê?

– É meu sobrenome. Luke Smithen.

Luke tira o colar da caixa e cuidadosamente o põem em mim:

– Ficou lindo- sussurra.

Olhei para ele sem palavras. Do jeito que dizia, Luke me dava um novo significado para vermelho. Antes era a cor que me amedrontava por conta dos símbolos nazistas. Mas agora me fazia lembrar a força e beleza do nome de minha família, e até o curto amor que lentamente desenvolvia por ele:

– Luke... Obrigada.

Ele sorri suavemente e se aproxima de meu rosto. Com uma das mãos começa a me puxar para mais perto de si enquanto seu outro braço cautelosamente entrelaça minha cintura. Luke encosta os lábios nos meus e me beija, me abraçando fortemente. No mesmo momento enrosco meus braços em seu pescoço. Esse era nosso primeiro beijo, e o mais perfeito. Desejei que esse momento durasse para sempre.


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