Smother escrita por stardust


Capítulo 6
Thank you, Charlie


Notas iniciais do capítulo

Acho esse cap tosco, mas é o que tem :/



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Depois de um tempo deitados na grama, fomos xeretar aquela casinha. Era, na verdade, um chalé de madeira, mas tinha a mobília velha de uma casa. Tudo estava abandonado e cheio de poeira.
“Porque será que abandonaram isso?”, Emma perguntou, passando a mão por uma mesa empoeirada. “Parece que largaram tudo de repente, do jeito que estava, e ninguém nunca voltou.”
“Também queria saber”, respondi.
Emma andou até a janela e tentou abri-la. Estava meio emperrada, mas depois de insistir, ela se abriu.
“Do lado de fora do parapeito tem uma flor”, ela disse, e pegou a flor. Parecia ser a única coisa que não estava empoeirada e sem cor naquele lugar. Ela passou os dedos pelas pétalas macias e depois virou-se pra mim. “Eu penso que sentimentos são como flores. Um descuido...” Ela deixou a flor cair. “Outro descuido...” E pisou na flor.
“Poético.” Ela sorriu, irônica, e voltou a tirar pó das coisas com a mão para que pudesse vê-las melhor.
Um dos cômodos era um quartinho com uma cama de solteiro ainda arrumada, porém cheia de pó. No pé dela havia um baú que eu nunca consegui abrir. Também tinha um guarda-roupa no estilo antigo, alto e largo, de madeira.
Emma abriu a janela dali e coçou o nariz. Sentei na cama, não me importando muito com o pó.
“E esse baú?”, ela perguntou.
“Não consigo abrir ele, já tentei várias vezes.”
“Não custa tentar”, retrucou, e puxou a trava dele. Alguns esforços depois o baú abriu com um estrondo. “Você precisa comer mais feijão, lagartixa.”
Ela colocou a mão lá e fez uma expressão surpresa.
“O que tem aí?”, perguntei. Ela tirou um livro empoeirado de lá, como tudo era ali. Sua capa estava meio rasgada e ele devia ser bem antigo.
Emma folheou o livro e sentou do meu lado.
“Olha”, ela disse, mostrando as páginas para mim. Estavam lotadas de palavras e datas escritas em nanquim que eu não conseguia entender. “Tem poesias e acontecimentos...”
“Isso não é português nem inglês”, eu disse.
“É uma língua que aprendi a traduzir um pouco... Vou tentar ler alguma coisa, espera aí.” Ela folheou o livro mais um pouco e abriu uma pequeno texto. “Hm... Aqui diz: Sinto falta dela em todos os cômodos desse lugar. A casa não é a mesma sem ela, tudo parece sem cor e sem vida. Vou enlouquecer se continuar aqui. Acho que logo vou ir embora.”
“Nossa”, exclamei. “Então agora sabemos por que o lugar foi abandonado.”
“E tem mais... O que eu sou? Apenas um homem morrendo lentamente porque perdeu seu amor, perdeu todas as razões para sorrir, perdeu seu maior motivo pra querer viver.” Emma franziu a testa, pensativa. “Eu vou levar esse livro pra nós lermos melhor ele, tem problema?”, perguntou.
“Acho que não. Se o fantasma desse homem decidir te atormentar, eu não tenho nada a ver com isso”, brinquei. Emma deu um sorriso mínimo e fechou o baú. Colocou o livro em cima da cama e abriu o guarda-roupa.
“Pó, nada e nada”, ela disse. “Eu realmente estou com pena do homem.”
Coloquei a cabeça na janela e percebi que já tinha escurecido. Começou a ventar levemente, mas era um vento frio.
“Acho melhor irmos... Se não vamos chegar muito tarde”, eu disse. Ela suspirou, pegou o livro e foi andando na minha frente.
“Meu nariz já tá querendo gritar por socorro de tanto pó que eu respirei agora”, ela falou, coçando o nariz.
Saímos e começamos a andar. O céu estava estrelado e a lua estava brilhante, o que criava um cenário muito bonito.
Peguei uma flor e entreguei pra Emma. Ela ergueu as sobrancelhas e colocou-a no cabelo.
“Temos mesmo que ir agora?”, ela perguntou.
“Na verdade não”, respondi, e ergui as sobrancelhas também. Ela deitou novamente na grama, e foi então que reparei o quanto ela era bonita, porque eu realmente não ligava pra isso quando tínhamos até 12 anos. Mas Emma não era só bonita de rosto, ela era bonita por dentro. Bonita e diferente. Totalmente incomum.
Deitei do lado dela e suspirei profundamente.
“Eu gosto do outono.” Ela disse de repente.
“Porque?”, perguntei. Devia ser mais uma das coisas misteriosas que ela falava do nada e me deixava sempre com uma cara de interrogação, querendo entender melhor.
“Sabe as folhas mortas que caem das árvores no outono? São como as almas na eternidade. Um dia todos vamos cair dessa árvore... Mas as vezes alguém vem e te puxa dela ou até te rasga. Aí você é uma folha defeituosa, só esperando cair pra acabar seu sofrimento.” Ela virou pra mim e me encarou com seus olhos profundamente azuis.
“Você foi rasgada?”, perguntei. Ela hesitou antes de responder. Achou que minha pergunta teve malícia sem que eu percebesse, então ela começou a rir. Mas não aquele riso triste. Por um momento, Emma Adams abandonou aquele sorriso triste e riu de verdade.
“No sentido do que estamos falando... Sim.” Não era uma resposta boa, porque no sentido de que estávamos falando, significava que alguém tinha entrado na vida dela e tirado sua vontade de viver e feito ela desejar morrer. Mas ela ainda ria, e eu fiquei feliz com seu riso. Naquele momento, tudo parecia certo.
Ela voltou a olhar pro céu e sua mão deslizou para a minha. Apertei levemente seus dedos com os meus e vi de relance o sorriso que brotou em seu rosto.

Por algum motivo, nós não soltamos nossas mãos até chegarmos em frente a casa dela. Ela parecia bem melhor do que antes, já que agora sorria após tantas lágrimas de um tempo atrás.
Ficamos em silêncio, parados e nos encarando em frente à porta. Ela batucou a madeira com os dedos e umedeceu os lábios rapidamente. Parecia indecisa, até que me abraçou. E bem forte.
“Obrigada. Não sei o que teria feito se você não tivesse me tirado do meu quarto hoje, se não tivesse me abraçado, se não tivesse falado aquilo tudo. Não sei o que seria do meu dia se eu não estivesse naquela casa empoeirada com você, pisando em uma flor ou traduzindo um livro depressivo. Obrigada, Charlie.” Como sempre, ela não esperou que eu respondesse e entrou em casa.


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