Fins e Meios escrita por SatineHarmony


Capítulo 1
Prólogo: Nuvem




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Sentiu braços envolverem seus ombros, e cotovelos apoiarem-se nas costas da cadeira em que estava sentado. Fechou os olhos brevemente enquanto era envolvido pelo calor alheio, permitindo que parte da tensão presente em sua coluna se esvaísse. Dedos percorreram pela extensão de suas mãos, que estavam repousadas sobre a escrivaninha à sua frente.

Suspirou, baixando a cabeça para que sua fisionomia preocupada não fosse vista pela pessoa que lhe distribuía carinhos. Mordeu o lábio inferior, tentando tomar coragem para fazer a pergunta que martelava dentro de sua mente desde quando notara a mudança de estado de espírito do outro. Finalmente cedeu à curiosidade:

— Aconteceu algo ruim? — sua voz soou hesitante. Sawada Tsunayoshi sabia que acabara de entrar em território perigoso — afinal, a situação do homem ao seu lado não era nem um pouco boa; ele estava há mais de dez anos enjaulado em uma das prisões mais seguras do mundo, tendo suas ilusões como único meio de contato com o mundo exterior. Tsuna sentia calafrios percorrer sua espinha só de pensar em como deveria ser solitário e difícil viver de tal forma.

— Por quê? — Rokudo Mukuro nunca respondia imediatamente algo, por menor que fosse o questionamento: não era de seu feitio dar informações sem receber algo em troca, e este princípio era aplicado até à menor das perguntas.

— Você está estranho. — Tsuna explicou, trincando os dentes para não arquejar quando o guardião da névoa roçou o nariz contra a curva de seu pescoço. A respiração morna de Rokudo contra sua pele o fez perder o fio da meada — eles estavam conversando sobre o que mesmo?

— Como assim "estranho"? — o ilusionista ergueu uma sobrancelha. Tsuna reprimiu um estalar de língua ao ouvir isso. Essa era uma das razões pela qual raramente questionava Mukuro; ele sempre terminava evadindo-o com palavras esquivas, deixando-o sem resposta alguma.

Percebendo o silêncio do chefe dos Vongola, Rokudo decidiu pressioná-lo delicadamente. Plantou um beijo suave próximo à clavícula do menor:

— O que houve, Sawada Tsunayoshi? Perdeu a coragem de falar?

— Você é impossível. — ele murmurou em resposta, fazendo um movimento negativo com a cabeça. Encarou o ilusionista, exibindo seu rosto impaciente: — Você está me tocando mais do que o normal. Eu sei que você só vem aqui para isso, mas...

— Kufufufufu... — Tsuna foi interrompido pela risada excêntrica de Mukuro. Este afastou seu rosto do ombro do mais novo para apoiar uma mão sobre a curva esguia do pescoço de Tsuna, enquanto a outra mão se posicionava sobre a escrivaninha de madeira. Os olhos azul e vermelho fitaram-no com a intensidade extrema de sempre; apesar de dez anos terem se passado, Sawada ainda não se acostumara com aquele olhar que parecia despi-lo. — Eu pensei que, depois de todo esse tempo, nós já tivéssemos passado dessa fase. — comentou Rokudo, com um sorriso divertido nos lábios.

— Fase? — o moreno ergueu uma sobrancelha, fazendo bico. Ele não gostava nem um pouco do tom de voz de Mukuro — fazia-o sentir-se igual a uma criança do maternal que levara um sermão das “tias”.

— Sim, a fase em que você agia feito uma menininha com baixa autoestima incapaz de acreditar que o garoto dos seus sonhos também gostava de você. — franziu a testa em superioridade, desafiando-o a responder algo a altura. — Quantas vezes eu terei de falar isso para acalmá-lo? Eu sou se...

Mas o guardião da névoa não teve chances de terminar sua declaração. Como não era a primeira vez que isso acontecia, Tsuna não esboçou surpresa ao ver o olho vermelho ser escondido por um tapa-olho, os cabelos azulados serem tingidos por um tom escuro de violeta, e as longas madeixas — que antes estavam reunidas por um elástico — serem soltas, emoldurando o rosto de Chrome Dokuro.

— Boss, eu... — ela foi incapaz de lutar contra o rubor que chegou às suas maçãs do rosto ao notar a forma inadequada na qual estava curvada sobre seu chefe. — Desculpe-me. — mordeu o lábio inferior, temerosa, recuando para o lado oposto da escrivaninha.

— Você não é culpada por nenhuma das duas coisas. — Tsuna deu um sorriso consolador, fazendo-a corar ainda mais.

Era fácil ver através de Chrome — sempre que a garota tomava forma após os encontros de Sawada com Mukuro, ela pediria perdão como se se fosse a responsável por Rokudo estar na prisão e por "dificultar" o relacionamento deles dois. E, quando Chrome retornava, sua reação mais previsível era ficar vermelha de vergonha ao se ver em alguma posição comprometedora junto de Tsuna. Ele compreendia o ponto de vista da jovem, claro — e justamente por isso que se esforçava em deixar claro que ela era inocente de tudo e qualquer coisa.

— Sim, sim. — Chrome assentiu prontamente. — E, com todo respeito, precisamos conversar sobre algo. — engoliu em seco, seu nervosismo transparecendo em seu rosto — Algo importante.

* * *

Era possível cortar a tensão com uma faca. O elevador costumava demorar menos de um minuto para levá-los do saguão até o andar da sala de seu chefe, porém, neste particular momento, ele parecia estar levando longas horas.

Yamamoto Takeshi notou à primeira vista a aura tempestuosa que o outro estava transmitindo, porém decidiu permanecer calado, lembrando-se da crença do seu pai de que "o bom humor é capaz de passar de uma pessoa para outra". Sendo assim, arriscou um "bom dia", que foi correspondido por um breve olhar irritado da outra parte. Isso o fez erguer as sobrancelhas em surpresa — Gokudera Hayato amadurecera com o passar dos anos; sua imprudência diminuíra e, como consequência, seu pavio curto alongara-se a ponto de ele passar a fazer uso de atributos considerados corretos pela sociedade, como "delicadeza" e "educação", então o guardião da chuva foi pego desprevenido pelo atual nível de exasperação do seu amigo.

Até mesmo o ar próximo do guardião da tempestade estava diferente, mais denso. Era como se Gokudera estivesse fortificando os muros à sua volta, com o objetivo de se excluir ainda mais do mundo. Algo sério aconteceu, notou Yamamoto; algo muito sentimental, para ele estar tão na defensiva. Franziu os lábios, controlando o impulso de começar alguma conversa — por mais que eles tenham conseguido manter sua "amizade" por todo esse tempo, existiam limites claros, definidos por Gokudera, e um deles era questionar o seu bem-estar "em situações sem fundamento" — lê-se: quando eles dois não estavam numa missão em que Hayato tivesse sido seriamente ferido.

Yamamoto conhecia muita bem Gokudera: estenda a mão para ajudá-lo e ele irá mordê-la sem pensar duas vezes, portanto não havia o que fazer para melhorar a situação. Com um suspiro de derrota, o moreno passou os dedos da mão direita por entre os fios de seu cabelo castanho, permitindo que ambos fossem tomados por um silêncio ensurdecedor.

Finalmente o elevador parou, mostrando-lhes a porta-dupla de madeira que dava acesso ao escritório de seu chefe e melhor amigo. Eles mal tinham dado um passo para fora da cabine quando viram Chrome sair do cômodo, exibindo uma expressão apreensiva. Ela cumprimentou-os com um rápido assentir antes de seguir para dentro do elevador.

Yamamoto viu Gokudera estreitar os olhos, uma ruga de desconfiança aparecendo entre suas sobrancelhas. O guardião da chuva compreendia a sua reação, uma vez que já fazia alguns meses que Chrome vinha passando mais tempo do que o usual com seu "boss", porém ele confiava no julgamento de Tsuna e não se preocupava com isso — mas Gokudera obviamente não compartilhava sua opinião.

— Gokudera-kun, Yamamoto. — Tsuna chamou-os com um largo sorriso, gesticulando para que entrassem na sua sala.

O guardião da tempestade, precipitado, percorreu a distância com longos passos, logo tomando seu lugar em uma das poltronas do cômodo. Apoiou os cotovelos sobre os joelhos e curvou-se para frente em expectativa:

— O que houve? Há algo de errado com o nosso último relatório? — perguntou, afobado.

Takeshi sentou-se na outra poltrona vaga e viu Tsuna posicionar-se em sua cadeira, atrás da extensa escrivaninha de madeira:

— Não, o seu relatório estava bem claro. — Sawada respondeu pacientemente, os cantos de sua boca curvando-se para cima diante da preocupação de Gokudera. — Eu chamei-os aqui porque posso contar apenas com vocês dois no momento. — lançou-lhes um olhar sério. — Nii-san está na Itália, Hibari-san está, como sempre, incomunicável, e Chrome acabou de me dizer que se ausentará por algumas semanas... — recitou, franzindo a testa minimamente. Inspirou fundo, como se esperasse que um deles falasse algo. Ao ser recebido somente por silêncio, continuou: — De acordo com Giannini, o radar da nossa base detectou o uso de um Mare ring.

— Mas como?... — Gokudera tombou a cabeça para o lado, confuso — Quando Yuni se sacrificou, ela selou os Mare rings do futuro e do passado.

— Justamente por isso que acho que talvez seja uma falha no sistema. — Tsuna justificou-se — Porém prevenir nunca é demais, então pensei em enviar alguém ao local para ver se algo fora do comum aconteceu lá.

— Eu e Gokudera podemos ir. — Yamamoto pensou em voz alta — Não é? — virou-se para o seu amigo, uma sobrancelha erguida em dúvida. Ele viu Hayato tamborilar os dedos no braço da poltrona, um de seus hábitos quando se encontrava em um dilema.

— Na verdade... Eu não posso. — enfim admitiu, numa voz frustrada. — Isso chegou do correio hoje de manhã. — Gokudera tirou uma carta do bolso do paletó, e colocou-a sobre a mesa. Tsuna fez um silencioso pedido de permissão para abri-la, e o outro deu de ombros em resposta. Sawada viu o conteúdo da correspondência:

— Uma passagem de voo noturno para a Itália. — reconheceu, lendo as informações do pedaço de papel — Para hoje. — concluiu, franzindo o cenho, e virou o envelope e leu o nome do remetente: — Gokudera-kun, foi o seu pai que enviou isto! — exclamou.

— Eu sei. — murmurou. — Essa é a forma dele de pedir que eu vá visitá-lo. — Hayato franziu os lábios, claramente desgostoso com a situação em que se encontrava.

— E o que você fará, Gokudera? — Yamamoto lançou-lhe um olhar preocupado, desconcertado com a notícia. Então é por isso que ele estava tão irritadiço... Takeshi não podia culpá-lo por ter ficado tão afetado com isso — afinal, tudo era extremamente delicado quando se tratava da família do guardião da tempestade.

— Eu irei. Nós não nos falamos há o quê, quinze anos? Acho que chegou a hora de passarmos as coisas a limpo. — sua fisionomia estava reflexiva. Um meio-sorriso apareceu no rosto de Yamamoto em resposta, em aprovação ao grande passo que seu colega pretendia dar. — Principalmente porque, bom, aneki esclareceu uns pontos para mim. — acrescentou Gokudera. Sim, ela esclareceu... Uma década atrás, pensou com amargura. No entanto, agora ele estava pronto para enfrentar o seu pai; enfrentar não, conversar civilizadamente. — Mas caso você precise da minha ajuda, eu posso participar da missão sem problemas, juudaime. — informou num tom apressado, querendo mostrar que ainda estava disponível para seu chefe.

— Não há necessidade de se preocupar com a missão, Gokudera-kun, eu o compreendo perfeitamente. — Tsuna sorriu largamente, como sempre — Na verdade é até um exagero chamar esse trabalho de missão... Nós podemos ver tudo isso como uma simples viagem a Sapporo.

— Sapporo? O sinal foi detectado aqui no Japão? — Takeshi estranhou.

— Sim, de madrugada, por volta das duas da manhã. Pelo menos é isso que consta no computador. — respondeu o chefe dos Vongola, fazendo menção de pegar o telefone sem fio que estava sobre a escrivaninha. — Então está tudo certo? Gokudera-kun irá hoje à Itália, e eu e Yamamoto, a Sapporo?

— Se está tudo certo?... — Hayato repetiu, franzindo os lábios, sinalizando que algo ainda não o agradava — Juudaime, se me permite a pergunta, por que você também irá? — esta era uma das raras ocasiões em que Gokudera mostrava educação e respeito autênticos. — Se é algo tão insignificante, não é necessário, certo?

Tsuna abriu um sorriso amarelo, passando ambas as mãos pelo seu cabelo eternamente bagunçado:

— Eu e Reborn pensamos em duas hipóteses: ou é uma armadilha, ou é um erro do computador. No primeiro caso, enviar apenas uma pessoa me deixaria com a consciência pesada, e aumentaria as chances de alguém se machucar, o que quero evitar de acontecer a todo custo. — ele parecia estar refletindo em voz alta — Minha hiper intuição me diz que é nada de mais, porém eu também tenho uma sensação estranha... — franziu o cenho, e sua fisionomia endureceu — De qualquer forma, no pior dos casos deve ser uma família pequena tentando algo tolo. Não precisamos nos preocupar. — assegurou.

— E mais, nós dois impediremos quem quer que seja. — garantiu Yamamoto, dando um sorriso divertido que mostrava todos os seus dentes. — Viu só, Gokudera? Você pode ir para a Itália sem nenhum problema. — deu um toque descontraído no ombro do guardião da tempestade. Takeshi pensou que ele fosse se afastar do toque, porém Hayato permaneceu imóvel, exibindo uma expressão pensativa:

— Você é quem sabe, juudaime. — soltou um suspiro resignado, parecendo ainda não gostar da situação. Notando o humor de Gokudera, Tsuna deu-lhe um sorriso compreensivo como consolo, mas com um quê de autoridade. Ao lado de Hayato, Yamamoto o observava com olhos felizes e, ao mesmo tempo, temerosos.

* * *

Aquele era o sétimo cigarro que fumava desde que “chegara” ao aeroporto — chegara entre aspas, pois ele não adentrara o prédio ainda, preferindo permanecer no estacionamento para fumar. Gokudera estava protelando ao máximo fazer o seu check-in, porém faltava menos de meia hora para o seu voo, então não havia mais jeito. Trincou os dentes, irritado, e deixou o cigarro cair no chão, apagando-o com a sola do sapato.

Mais de doze horas sentado e um Hayato entediado depois, o guardião da tempestade finalmente chegou ao seu destino, ficando brevemente surpreso ao ser recebido por um japonês que conhecia muito bem:

— Obrigado por vir me receber, mas isso não era necessário. — Gokudera revirou os olhos em desprezo dissimulado, porém a preocupação estampada no rosto de Sasagawa Ryohei era autêntica:

— Eu recebi uma ligação de Reborn, parece que aconteceu algo com Yamamoto e Sawada durante a missão deles. Nós voltaremos para o Japão agora.


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Notas finais do capítulo

Err, e é isso. Eu não sei se alguém lerá isso, mas vale o risco. Eu estou realmente disposta a continuar essa história, então caso alguém queira que eu poste a continuação, é só se manifestar ^^



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