Se o Amor é uma Ilusão, Deixe-me Ser Iludida escrita por snow Steps


Capítulo 22
Capítulo 21


Notas iniciais do capítulo

"A cobra vai fumar" - Ratinho, sobre o capítulo de hoje



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Passaremos sexta, sábado e a manhã de domingo em Búzios, e isso significa viver no pior pesadelo de todos. Talvez soe um tanto dramático da minha parte, mas vá por mim, não é: estou sozinha num meio cercado de gente falsa, com o cabelo completamente frisado pela maresia, usando um biquíni cuja estampa desforma devido aos meus quadris tão largos, vendo a paixão da minha vida me ignorar e o meu ex-amigo-marido-perfeito-caso-Marco-não-me-queira ser dominado brutalmente pelas garras da francesa nojenta.

Sim, a única coisa de útil que fiz desde minha chegada a Região dos Lagos foi arrancar qualquer ínfima informação sobre a inesperada Allais. E devo confessar, não foi tão difícil assim. Bastou puxar Natasha para um dos banheiros e gritar “amiiiigaa, me conta esse babaadooo”, e ela fez um relato tão específico quanto um depoimento policial. Embaixo está listado o que basicamente faz Allais Chermont ser... Allais Chermont:

– Ela tem descendência francesa com direito a dupla nacionalidade. Note o sobrenome de escrita e pronúncia difícil que denota charme – “Cheeerr-môun-te”.

– Estuda Medicina numa faculdade pública. De fato, é uma menina prodígio.

– Fala em três línguas: Português, Francês e Inglês, para a sorte de Tomas.

– Eles estão juntos há mais ou menos uma semana. Não há provas concretas de que estão num relacionamento sério.

– Se conheceram na festa que Tomas fora no mesmo dia do aniversário de Marco.

– Ela é extremamente grudenta. Mas essa informação foi obtida por mim mesma.

Esta noite faremos uma espécie de lual burguês – invés de sujarmos nossas caras vestimentas da Ralph Lauren e Michael Kors com a areia encardida da praia pública, faremos uma pequena fogueira elétrica (isso mesmo, elétrica, com uma churrasqueira de tomada) no quintal da casa de Natasha. Preparamos alguns petiscos e levamos caixas e caixas de isopor com cerveja para o gramado que se estende ao lado da piscina, ouvindo Bernardo tocar Beatles no violão com mais erros do que acertos nas notas musicais.

Marco chegara tarde à casa, por volta das sete da noite. Está com uma bermuda e camisa xadrez – o primeiro botão sempre aberto para exibir a entrada do seu peitoral perfeito – e brinca com os amigos e azara as garotas como sempre foi o de seu costume. Ele já esbarrou comigo pelo menos umas quatro vezes, mas apenas esboçou um sorriso cumprimentador e nada me disse. Como pode? Eu tive um encontro com ele! Um encontro bastante mal terminado, aliás! O fuzilo através do olhar enquanto estamos sentados em volta da fogueira improvisada, arquitetando pensamentos malignos. Eu posso acabar com sua vida num estalo, o tenho na palma da mão e ele nem se lembra disso. Observo Marco sussurrar maliciosamente no ouvido de Isabella que está ao seu lado, e esta gargalha sedutoramente.

Como ele consegue disfarçar por tanto tempo? E tão bem?

Talvez ele jogue na regra do 100% e ataque ambos os lados. Se esta afirmação for verdadeira, outra incógnita surge: o seu amor europeu pertence a qual sexo? Ou ele seria um hermafrodita...

_ Nora. Noooora. Acorda! – Exclama Gabi me chacoalhando pelo ombro e me tirando da rancorosa hipnose. – Quer mais cerveja?

Encaro meu copo ainda cheio, e num gesto súbito, viro o líquido garganta abaixo em generosas goladas, parando para respirar somente quando a última gota é sorvida.

_ Caraaalhoo – Grita Matheus apontando seu dedo para mim e segurando o riso abismado com a outra. – A garota é pica!

No mesmo instante, todos os presentes voltam sua atenção para mim, enquanto a espuma de cerveja ainda está se apagando no meu buço. Encaro atonitamente Marco, que finalmente nota minha presença ali, Tom, que finalmente olha para mim, e Allais, que meneia a cabeça em tom de reprovação discretamente.

Para que a situação se torne mais embaraçosa, não consigo evitar que um arroto gaseificado escape pela boca, provocando risadas.

_ Foi mal – Me desculpo rapidamente, corando o rosto de imediato.

_ Acho que você vai precisar de outra lata – Determina Gabi, tirando o copo vazio da minha mão e se dirigindo até a caixa de isopor.

_ Não lembro de vê-la bebendo tanto assim – Ressalta Marco, atraindo os olhares para ele agora. O fogo lhe concede uma nuance dourada para sua face, que resguarda um sorriso de canto provocante.

_ Você não lembra de muitas coisas, Lorenzito – Devolvo, num tom mais rude do que pretendo ser. – Cuidado com o que fala.

Marco ergue as sobrancelhas, surpreso com minha resposta. Os outros nos encaram aturdidos, incluindo Tomas.

_ Bernardo, você sabe tocar Mamonas Assassinas? – Isabella muda de assunto logo em seguida, segurando um dos braços de Marco como um gesto protetor. Renata, que também o cerca, faz o mesmo.

Assim Bernardo começa a dedilhar Um Robocop Gay, e todos cantam a música em coro. Também tento acompanhar no refrão, porém estou tão agitada interiormente que meus lábios parecem se mover de forma dessincronizada com meu cérebro. Olho furtivamente em direção a Marco, e entre as chamas medíocres da fogueira elétrica, vejo seu olhar verde-oliva acompanhado de Renata e Isabella que me encaram feito duas súditas que defendem seu rei.

_ O que está dando em você hoje? – Murmura Gabi, entregando-me uma nova lata de cerveja.

_ Eu estou cansada dele, só isso. – Resmungo, abrindo a lata num clique refrescante.

_ Calma, Norinha. Você vai tê-lo daqui a pouquinho – Ela afirma, com um quê de malícia.

Franzo o cenho para ela, descrente.

_ Ele não me quer, o.k? Já aceitei isso, de verdade. Uma prova disso é que Marco me ignorou desde que chegou aqui, e ainda me lança essa brincadeira sem graça.

_ Bem, não foi exatamente assim que os passarinhos me contaram... – Gabi insinua, com expressão gozada.

_ Ele te falou alguma coisa? – Pergunto, incisiva.

Ela balança a cabeça de um lado para o outro, fingindo não saber de nada.

_ É sério, Gabi. Você já pôde perceber que hoje não estou muito afim de gracinha.

_ Ai, tá bom, cruz credo. – Ela arma as mãos em concha e as põe em volta da minha orelha, falando num tom de murmúrio. – O Leo me contou que os garotos fizeram uma aposta para ser realizada esta noite. E envolve Marco e você.

Ela termina de explicar e se volta para a música de violão, deixando-me explodindo de ansiedade.

_ Que aposta é essa, Gabi?!

_ Apressadinha você, hein? Essa é a melhor parte da música! Enfim – Ela se volta para a mesma posição, continuando a cochichar. – Bem, tudo começou quando Marco disse acidentalmente para Matheus que ele saiu com você. Aí lógico que o Matheus espalhou para o mundo inteiro, e todos ficaram na dúvida se ele te levou ou não para cama. Marco tentou fugir da resposta e logo concluíram que não aconteceu nada. Aí começaram a chama-lo de borracha fraca, bichinha e por aí vai. Ele ficou bastante puto, e então o desafiaram a tirar sua virgindade, hoje. E Marco aceitou.

Permaneço alguns segundos perplexa, digerindo aquele pedregulho de notícia.

_ M-mas como assim tirar minha virgindade? Eu já perdi, sabe, há muito, muuuito tempo! Foi com... foi com o Fred. Nos meus dezesseis anos. – Tento mentir, afoita.

_ Nora, está tudo bem. Todo mundo percebe que você nunca... fez. – Consola Gabriela, colocando a mão no meu ombro.

_ Mesmo assim... não, isso é horrível. Apostar minha virgindade? Ele acha que sou o quê? Mais um troféu para a lista dele? Tipo, eu me preparei para esse momento a vida inteira. Tem que ser especial, entende? Não numa... aposta ridícula. – Retruco, indignada.

_ Nora, toda garota sonha com a primeira vez especial. A minha foi num banheiro de boate, a da Natasha na dispensa da cozinha. O que quero dizer é: nunca será como você sonha. Por mais que planeje. E afinal de contas, não é tudo o que você queria?

_ Não. Não assim. – Respondo quase num tom inaudível, cada vez mais abismada. Contemplo Marco outra vez, e ele me fita também. Que canalha. Cretino.

Sinto tanta raiva dele que estou prestes a gritar em plenos pulmões sobre o seu amor secreto na Europa, sobre sua falsa masculinidade e galinhagem que só serve para disfarçar o que ele realmente é. Mesmo assim, não possuo provas para desbanca-lo em frente aos amigos, e eu seria apenas uma louca desvairada gritando xingamentos. Mas... eu posso consegui-las. Até que facilmente.

_ Se Marco quer tirar minha virgindade, vamos ver se ele consegue – Digo, com a cólera sobressaindo nas palavras.

_ Hmm... por que sinto que você vai jogar merda no ventilador?

_ Porque é exatamente isso que irá acontecer. E eu prometo, irá feder muito para o lado dele.

Músicas vem e vão e latas de cerveja se acumulam na beira do deck feito um castelo de alumínio. As pessoas começam a ficar altas, e assim como o controle do riso vai embora, o bom senso para as brincadeiras também vai. Tomas e Allais se retiram cedo do lual improvisado alegando que estão cansados, mas obviamente os garotos não aceitam essa desculpa tão fácil.

_ Isso mesmo, Tom! Manda ver! – Incentiva Leo, o mais ruim de todos.

_ Pelo menos um de nós precisa se dar bem, né! – Continua Matheus.

Os dois já adentraram na casa, e provavelmente não os ouviram.

_ Somente um não, dois precisam – Provoca Leo, olhando de esguelha para Marco.

_ Tudo tem seu tempo – Marco responde, bebendo um gole da sua bebida tranquilamente.

Essa é a deixa, penso.

Ergo-me do gramado e limpo a terra do short, indo até Natasha e Isabella que estão preparando mais petiscos na cozinha. Encontro-as preenchendo as tigelas com amendoim, e as chamo para conversar.

_ O que foi? – Elas questionam, quase simultaneamente.

_ Eu planejo uma vingança para Marco. Por todo o mal que ele já me causou. – Determino, com ar decidido.

Elas se entreolham, espantadas.

_ Certo... a gente tá com você nessa – Concorda Natasha, um pouco receosa.

_ Você não vai fazer nada que dê cadeia, né? Tenho uma viagem para Nova York semana que vem – Avisa Gabi.

_ Claro que não, tola. Será uma vingança embebida no próprio veneno dele. Eu aceitarei a participar na aposta. Tudo o que vocês precisam fazer é chamar todos, absolutamente todos, para ficarem de espreita atrás da porta.

_ Ah filha, para isso a gente não precisa mandar em ninguém para fazer – Brinca Natasha.

_ Mesmo assim, chamem. Para garantir. Irei desmascará-lo no seu próprio jogo.

_ Espera... você está querendo dizer que o Marco é broxa? – Tenta adivinhar Gabriela.

_ Não. Esse babado é bem mais forte que isso.

_ Assunto à vista, assunto à vista, assunto à vista – Alerta Natasha, rapidamente se voltando para a tigela de amendoim.

Não entendo muito bem o recado e viro para trás, dando-me praticamente cara a peito com Marco Lorenzo Vittorelli.

_ E aí – Ele simplesmente diz, impedindo minha passagem.

_ E aí – Devolvo, sem graça.

_ Escuta, desculpa pela brincadeira. Não achei que você a levaria tão a sério.

_ Desculpas aceitas, Lorenzito – Digo, fazendo uma tentativa fracassada de dar um sorriso sedutor.

Não sei quanto a você, mas todas as vezes que tento fazer uma cara sedutora, parece que estou tendo um AVC.

_ Fico contente por isso. Nora, você se importa em conversar comigo a sós? Deixei alguns assuntos pendentes naquele encontro. – Ele pede, colocando suas mãos gentilmente nos meus braços.

_ Claro. Nós poderíamos ir lá para cima – Ofereço, inocentemente.

_ Seria ótimo.

Deixo que Marco vá na frente, e as mattildinhas logo abandonam seus afazeres improvisados para nos observar. Antes de deixar a cozinha, olho para elas e faço sinal para que chamem os outros que estão no quintal. Elas afirmam animadamente, soltando gritos mudos.

Sigo o italiano pelas escadarias e alcançamos o segundo andar da casa, o qual sei que é apenas constituído por quartos de casal. Paramos no corredor, com as mãos enfiadas nos bolsos.

_ Então, o que você deixou pendente no encontro? – Pergunto, com um quê de indiferença.

Sinto Marco se aproximar de mim, e posso sentir sua respiração acelerada aquecer meu rosto.

_ Isso – Ele diz incisivamente, avançando em direção a minha boca e mergulhando num beijo profundo.

Marco segura meus braços e me empurra em direção à parede, quase tirando meus pés do chão. Seu beijo desce para meu pescoço, e sua língua impiedosa me provoca um calafrio na espinha. Com a mão livre, ele abre a porta mais próxima e em seguida me carrega em seu colo num golpe enérgico, sem tirar seus lábios dos meus. Com os olhos fechados, posso ouvi-lo trancar a fechadura da porta atrás de nós.

Tomara que minha ideia dê certo.


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