Chá da Meia-Noite - Fic Interativa escrita por Elora


Capítulo 2
Lua nova


Notas iniciais do capítulo

Olá,pessoal!
Desculpa a demora,eu fiquei um pouco enrolada.Mas,eu espero que gostem do capítulo.
Beijos!



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As roupas esfarrapadas manchadas amassadas aos meus pés, uma tempestade tímida de cacos de vidros amarelados encoberto no chão imundo de uma esquina qualquer do ginásio, a vodka translúcida traçava córregos pequeninos entre os caos dos estilhaços, o asfalto endurecido, parecia tão confortável para alguém como eu. O sangue coagulado escuro estava deferindo golpes, como um lutador experiente de boxe, me nocauteando com as lembranças, me fazendo lembrar-se do corpo magricelo daquela garota, com cabelos acobreados vivos e olhos amenos. Eu não queria ter feito aquilo.

A brisa percorreu descontente na minha pele exposta, para além do céu nebuloso, o conjunto desajeitado de nuvens cinza pairava sem vida, esperando algo mais atrativo, do que um rapaz incomum repleto de tormentos. A besta aniquiladora serpenteou dentro de mim, contudo não rebelou o meu corpo esta noite. A Lua Nova, era a sua cela. Ainda faltam alguns dias, para a fera reclamar o meu corpo para ti.

Uma moça atravessou o ginásio em passos rápidos, por vezes tropeçando em seus próprios pés, ela parecia perturbada com alguma coisa, as palmas das mãos cobriam o seu rosto ovulado, que era chicoteado por mechas douradas cor de mel desciam até os seus ombros. A sua aura fundida num cinza escurecida meio desbotado, as cenas em seu subconsciente, um labirinto de imagens de diversos ângulos do corpo inerte, com a auréola de cabelo cor de cobre, as transcrições feitas de sangue destacadas sobre dimensões simétricas e um rapaz com uma face submergida num espanto e horror, ao seu lado. Ela descobrira. A morte da garota de olhos nebulosos.

Sai em disparada em sua direção, os meus pés descalços embatiam no chão frígido, as minhas pernas, habituadas a corridas noturnas, seguiam num compasso constante, o corpo fluía ritmado ao encontro da moça desconhecida.

– Aconteceu alguma coisa? – eu perguntei, a poucos metros dela, não queria intimida-la. Eu precisava me aproximar cautelosamente, para assim ter mais acesso às informações sobre os seus pensamentos.

– Nada.

A sua voz melancólica abafada, por suas mãos pequenas sobre a face, preencheu a lacuna entre nós. Os seus olhos amendoados foram como flechas investidas injetadas de soda caustica em mim, o espanto sobrepondo o medo, assim que me fitou com a bermuda caqui em farrapos e o peito nu, tinha muita pele exposta para digerir assim tão facilmente, a primeira vista.

– Eu não vou machucar você.

Eu articulei. Eu caminhei um passo em sua direção, ela recuou com uma expressão acuada estampada nos seus traços delicados.

– Do jeito que você estar, parece que você já machucou alguém – ela disse, num tom áspero.

Desatei uma gargalhada dissimulada.

Bingo.

Eu confesso, eu fiquei desconcertado com suas palavras. Principalmente, quando elas tinham um pouco de veracidade.

– Você é sempre engraçada assim? Ou é o meu charme? – eu insinuei, com a voz zombeteira, o ar oprimido difundido com o meu humor negro entre os meus diálogos, não surtiu efeito algum. Só precisava de um toque, para desmantelar toda a sua tela mental; eu teria acesso a todos os seus pensamentos, sentimentos e emoções. Iria modificar as suas percepções, ela não se lembraria de nada do nosso encontro casual.

– Você é um babaca – ela vociferou, aos prantos. Por um instante, eu percebi que tudo tinha sofrido uma reviravolta inacreditável. Tudo sumiu. A sua aura luminosa evaporou num milésimo de segundo, as figuras macabras do longa-metragem horripilante, as cores opacas acinzentadas, as correntes transversais de sentimentos de pavor e assombro, os fragmentos do rosto de um garoto e os apanhadores de sonhos ensanguentados. Tudo havia desaparecido miraculosamente.

– Quem é você? – eu questionei curioso.

Os seus olhos cor de caramelo fundido em ouro derretido, exprimiam as balas douradas disparadas de seu olhar fatal, o nariz arrebitado retocado de raiva, os lábios escravizado pela linha dura e ofensiva. Ela parecia uma amazona feroz. Uma guerreira. Uma caçadora.

– Você não vai querer saber – ela revelou afogada em sua penosa bravura.

Um sorriso travesso esboçou em minha boca.

A garota desolada e melancólica, de alguns minutos atrás, havia sido convertida por uma armadura impenetrável, com muralhas indestrutíveis com milhares de espessas de proteção, um arsenal dourado acoplado em seus olhos por metal amarelo intenso e uma capa de invisibilidade de suas reflexões e fantasias.

Ela parecia inquebrável.

Movido pela impulsividade tola, diminui a distancia curta entre nossos corpos e alojei a mão em seu braço com força; a corrente elétrica excruciante debelou os meus músculos e ossos, a cacofonia mortífera de ruídos de ossadas sendo trituradas e expandidas, os músculos constituídos de membros humanos sendo supridos por partes dianteiras e traseiras. O ser bestial assumiu as rédeas do controle do meu sistema nervoso, a enchente claustrofóbica de adrenalina camuflada de ferocidade e a dor dissimulada encolhendo a prudência dos meus atos.

– Me solta – ela esbravejou. A voz descompassada e longínqua, presa num universo alternativo entre os lampejos de agonia e ponderação. Senti picadas de alfinetes distribuídas em meus dedos alongados e libertei-me daquela sensação abrindo a mão.

Um rugido impetuoso submerso na ferocidade desprendeu da minha garganta, os olhos aguçados reluziam a verde musgo e a musculatura de homem havia sido transfigurada para um lobo de pelagem marrom dourado. Os sensores de predador despertaram com as badalas descompassadas de ruídos de passos, a presa humana corria em zinguezague entre a pista de acesso a “Floresta da Saudade” e a sua respiração desacertada fatiava como uma lamina o ar congelante.

O vulto desesperado seguia floresta adentro, as bufadas de oxigênio ficavam espessas em contato com a nevoa misteriosa do ambiente, os galhos baixos com pontas afiadas deferiam arranhões em sua pele, o perfume carmim sangrento arrebatava as minhas narinas dilatadas. Os meus uivos ensurdecedores ecoavam na atmosfera, as minhas patas mal atingiam o solo rasteiro e a velocidade exacerbada acariciava os meus pelos castanhos cor de avelã. A noite era uma corrida de campeonato automobilístico e a presa o prêmio principal. Eu ganharia esse prêmio.


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Notas finais do capítulo

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