Eles não entendem. Será que ninguém consegue entender?

Eu não posso. Não posso pôr em risco outras pessoas. Principalmente quando envolve a palavra filhos. Mas eles não compreendem. Somente Peeta. Faz alguns meses que ele nunca mais tocou no assunto. É estranho. Effie, Greasy Sae, minha mãe, até Delly tocavam no assunto, claro que tentando me dar conselhos. Mas elas não entendem. Eu não quero.

E se os jogos ocorrerem novamente? E se meus pesadelos me assombrarem pelo resto da vida? E se Peeta tivesse algum flashback? Não, eu não posso perdê-los. Não suportaria. Tive outro pesadelo com crianças perdidas esta noite. Peeta estava lá para me ajudar.

Faz 4 anos que me casei com Peeta . Daqui algumas semanas irá completar 5. Engraçado, Peeta me faz tão bem que parece que foi ontem que queimamos e partimos nosso pão. Eu quis fazer uma cerimônia simples, mas Effie fez questão de me presentear com um vestido que Cinna havia desenhado. Minha mãe me deu a idéia de decorar a casa com Primroses. Annie conseguiu autorização para vir para minha cerimônia com Fin , e eu gostei. Passava-me a impressão que eles estavam por perto, cuidando de mim.

Tenho 25 anos agora, mas tenho a impressão que tenho muito mais. Os flashbacks de Peeta estão cada vez mais raros, e quando ele os tem, são rápidos, mas ele ainda corre de mim para algum cômodo alegando que tem medo de me machucar. Noite passada discuti com Haymitch pela primeira vez sobre esse o assunto que mais me assombra: Filhos.

Acordei e Peeta não estava ao meu lado. Deve der ido para a padaria. Estranhei que não havia nenhum bilhete seu na cômoda, mas quando desci para a cozinha haviam pães. Separei alguns para levar para Haymitch. Tomei um banho e fiz minha higiene matinal. Era domingo e estava sol, então resolvi pôr um vestido laranja claro pensando que Peeta iria gostar. Sai de casa e eu percebi que os gansos de Haymitch estavam um pouco agitados. Resolvi entrar pelos fundos, a fim de me desculpar pela noite anterior, talvez. Se ele estivesse sóbrio, claro. Mas quando ia entrar na cozinha notei que havia alguém lá, virado de costas para mim. Alguém de cabelos loiros. Peeta. Me escondi atrás da porta.

– Garoto, eu sinto muito por ontem, de verdade. Eu sei que Katniss não suporta a idéia de ter filhos, mas você tem que se impor. É o seu sonho.

– Você não entende Haymitch. Eu a amo muito mais do que os meus sonhos. E eu já me decidi. Se Katniss não quer ter filhos, eu não vou mais tocar no assunto. E espero que você também não.

Senti que meu coração estava se afundando. Então Peeta desistiria de seu maior sonho por mim. Pelo meu medo. Katniss, sua ingrata.

– Peeta, por que está desistindo assim tão fácil? Vocês se casaram a pouco tempo. Quem sabe ela não muda de idéia?

– Eu percebi faz algum tempo que quando eu discuto com Katniss sobre filhos ela tem pesadelos com crianças perdidas. E estão cada vez piores. Ontem ela teve novamente. E eu não suporto isso. Não suporto como ela se debate na cama, o quanto ela chora, sofre e se culpa. Não posso vê-la sofrer. Então eu já me decidi: não vou mais tocar no assunto com ela. E espero que você também não.

Percebi que Haymitch abaixou a cabeça, vencido e se sentou.

– Certo garoto. Não tocarei mais no assunto.

– Obrigada. Então eu vou conseguir trabalhar em paz.

Dito isso, ele rumou à porta e saiu. Haymitch continuou sentado olhando para o chão.

– Você sabe não é docinho. Você nunca vai merecer esse cara. Agora saia detrás da porta. Vamos tocar café.