Esparros escrita por Emme


Capítulo 6
Capítulo 6- Pedro


Notas iniciais do capítulo

Nos olhos claros de Pedro, está estampado o reflexo de um coração grande, amoroso e politicamente correto. Preparem-se para conhecer o sexto integrante do Esparros.



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É hoje.

Os olhos azuis de Pedro se abriram e foram rapidamente preenchidos por uma felicidade contagiante. Naquele dia, ele e alguns amigos iriam fazer uma viajem ao sul da Bahia com a escola, em uma excursão diferenciada, restrita a apenas alguns alunos. Se levantou, escovou os dentes e penteou o cabelo loiro e liso, preparado para ir à aula do turno da manhã. O passeio, que duraria 4 dias, só iria se iniciar na parte da tarde, de forma que Pedro resolveu se despedir de seus colegas que ficariam em Belo Horizonte para as "animadas" aulas de matemática e biologia.

Quando chegou ao colégio, não fez questão de esconder a sua ansiedade ao entrar na sua turma. Victor já havia chegando, e assim como ele, estava empolgado. Na verdade, para descrever seu amigo, Pedro provavelmente usaria algo como "tão feliz como se ele estivesse cavalgando em um unicórnio rosa purpurinado em cima de um arco-íris que terminasse em uma piscina de roupas de grife", e imaginando a cena, cumprimentou-o gentilmente.

As aulas antes do recreio foram mais lentas que o comum, e nem pudera trocar bilhetinhos com alguém por estar sentado bem na frente da mesa da professora. Dessa forma, a árvore verde e velha que podia ser vista pela janela se tornou a única coisa interessante. De fato, era um bom aluno e tinha notas bem satisfatórias, mas não estava com cabeça para resolver problemas relacionados a dissociação de substâncias.

Assim, depois das quase seis horas de aula, se despediu dos amigos que teriam aula a tarde, voltou para casa e terminou de arrumar as malas. Quando finalmente regressou ao colégio, o sol estava coberto por nuvens, com um vento fresco, quase frio. Helena o esperava na portaria de baixo para poderem se acomodar, pois era sua companheira de poltrona.Ela usava calças jeans, uma blusa larga e All Stars, e no ônibus, enquanto ajeitava a almofada de encosto, Victor se juntou a eles. Usava calças jeans skinny, blusa lisa cinza sem gola, coberta por uma verde musgo florida, além de um mocassim desse mesmo tom.

– Não é sempre que se pode ser fashion diante do povo do colégio. Odeio o uniforme!- disse, concertando os óculos e se inclinando para dar um beijo em Helena.

Aos poucos, os demais alunos foram entrando e se acomodando: Tayara, companheira de viagem de Victor, Thomás, Tina... Não demoraram muito para partir rumo a Bahia. Usando um microfone já meio velho, a guia da viagem (que futuramente, Vic descreveu como gentil, apesar da incrível capacidade de entrar em conversas e fotos alheias, mesmo que não propositalmente) explicou o cronograma do passeio:

–Bem, senhores, boa tarde!- começou ela- Como sabem, ficaremos quatro dias na Bahia, e durante esse tempo iremos ficar hospedados em chalés cuja capacidade é de três a cinco pessoas. Assim, já desçam e se acomodem no seu aposento de acordo com a lista que irei passar. Ao longo desses dias, nós iremos ir à Caravelas, uma cidadezinha com um artesanato super fofo, o pantanal, e alguns outros lugares, até que no ultimo dia, mergulharemos no arquipélago de Abrolhos. Mais tarde...

Pedro nem notou quanto tempo ficou ali, parado, olhando pela janela. As ruas haviam se tornado desconhecidas e desertas há um longo, longo tempo, o que indicava que já estavam fora da área rural de BH há umas boas horas. As árvores passavam devagar, em contraste com os pássaros que voavam, planavam e desapareciam em um flash, aceitando o chamado da noite para um bom sono.

–Brocador? Brocador? BROCADOR!-chamou Helena- Você está parecendo aquelas mocinhas de filme antigos caretas que ficam refletindo na janela quando seus namorados as trocam por suas irmãs mais novas.

Ele riu. Às vezes esquecia que seus amigos mais próximos o chamavam de Brocador, ou simplesmente Broca. O motivo? Ele nem se lembrava direito, talvez algo relacionado aos vários pedidos de selinho... Pedro olhou para o seu relógio, já um pouco sonolento e ao canto, Victor e Tayara performavam alguma coisa que Pedro depois descobriu ser Black Widow, da Iggy Azalea ou seja lá qual for o nome da rapper branca e loira que canta Fancy.

Ao contrário dos vizinhos de poltrona, ele queria poupar energia. Se aconchegou no ombro da amiga e cochilou.

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Haviam se passado dois dias desde que chegaram no sul da Bahia. Vic já havia comprado lembrancinhas para os amigos e andava "indie conceitual urbano" com as suas pulseiras artesanais e anel de coco. Ele ficou em quarto diferente de Pedro, no chalé ao lado, e por sorte, Vic ainda tinha uma cama de casal só pra ele.

Broca, por outro lado, havia ficado com dois outros colegas. Estavam todos se preparando para a ida ao manguezal: Um arrumava a mochila, outro pegava um par de sapatos extras para poder sujar na lama e Pedro enchia as garrafas vazias com água na cozinha. Era um cômodo agradável e com um balcão de pedra acinzentado, um fogão, uma cadeira, uma perereca verde no canto da pia...

Pera, pensou, uma perereca verde no canto da pia? Diante da situação, começou a gargalhar e chamou os amigos. Se reuniram em torno do animal, pequeno e de olhos bem esbugalhados, e fizeram a primeira coisa que qualquer pessoa faz ao encontrar uma perereca: Deram-na um nome!

–E que nome melhor que Odete?- disse Pedro.

A partir daquele momento, Odete estava sempre presente com o grupinho, mesmo que discreta, atrás de uma cadeira ou móvel. Após a volta do pantanal, todos suados e com lama na canela, Pedro foi banhar. A água estava quentinha, apesar do cheiro forte de cloro, e o vapor embaçava o grande espelho com bordas talhadas em madeira.

Enquanto passava sabão, ouviu um pequeno ruído perto da janela, e enquanto pensava na possibilidade de ser um pássaro ou qualquer outra coisa que a veja como um abrigo, um par de mãos surgiu, segurando um galão de água fria...

–EU VOU MATAR VOCÊS!- berrou Broca, quando a água gelada o acertou. Não era surpresa que Vic e seus colegas de quarto, João e Bernardo, haviam preparado alguma pegadinha. E durante aquela noite e as seguintes, os seis garotos banharam atentos a qualquer coisa que se movesse perto da janela.

Mas, infelizmente, não demorava muito para Pedro, Helena e os demais voltarem para a escola. Mas, sabe, havia algo que Broca e Helena tinham que fazer: levar Vic na praia pela primeira vez, que ficava bem ali, do ladinho do chalé, mas que ainda não havia sido desfrutada pelos meninos.

E de fato, quando Victor viu as ondas, a areia branca e as conchas pela primeira vez, ele correu como nunca, seguido pelos amigos, como se não houvesse nunca uma outra oportunidade como aquela. Eles deixaram suas roupas um pouco a cima do nível da maré e se lançaram no mar.

Não demorou muito para que esquecessem de fechar a boca quando veio uma onda maior, e engoliram sal. E também riram, gritaram, nadaram e se abraçaram. Só eles, o céu, o mar, o sol... a amizade. E naquele momento, fecharam os olhos e se lembraram de todos os outros amigos que não estavam alí: Malu, Olívia, Sam, Hugo, Nick, Laís... Bem, talvez não estivessem ali fisicamente, porque iriam sempre carregar uns aos outros no espírito e no coração.

Uma nova onda veio, e com ela, mais sal. Os amigos se entreolharam e mergulharam. E foi no fundo da água, com as mãos na areia, que Pedro sorriu.


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Notas finais do capítulo

p.s: Não se sabe ainda qual foi o destino de Odete. No dia de ir embora, Pedro e seus colegas de quarto não a encontraram. Acham que a despedida seria muito dolorosa para aquele pequeno corpinho verde enrugado aguentar, mas Pedro tem a secreta sensação de que, algum dia, irá olhar para sua pia e irá encontrar aqueles olhinhos esbugalhados tão meigos.



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