Esparros escrita por Emme


Capítulo 13
Capítulo 13- Diego


Notas iniciais do capítulo

Diego é uma pessoa gentil e extrovertida, sempre fazendo piadas e sorrindo. Seu coração é enorme e sua energia, constante, mesmo quando está em momentos difíceis. Com carinho, apresento o décimo terceiro membro de "Esparros".



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Diego vomitou mais uma vez.

                Algumas horas atrás, ele estava na festa de aniversário de Júlia, irmã de Helena, e acabara bebendo mais do que deveria (como sempre). Álcool já fazia parte do seu metabolismo.

                Foi Vic quem se voluntariou, dessa vez, para pegar um táxi e dar ao amigo os cuidados necessários. A distância da festa até a casa de Diego era pequena, podiam até ir andando, mas Vic achou melhor pagar um taxista do que sair por ai andando tarde da noite carregando um bêbado cambaleante.

                Manter Diego acordado estava difícil, ainda mais quando Victor teve que procurar as chaves no bolso do jeans do amigo, abrir o portão e desviar dos pulos que o cachorro de estimação de Diego dava enquanto caminhavam pelo jardim em direção à entrada.

Os pais de Diego haviam viajado e definitivamente não iam gostar de ver o filho nesse estado. Vic deu graças a Deus por não estarem lá. Mariana, irmã um pouco mais nova, por outro lado, teria provas no dia seguinte (motivo pelo qual não compareceu à festa) e provavelmente estava dormindo, então Victor resolveu não acordá-la.

Subiram as escadas que levavam para o segundo andar e entraram no banheiro. Ajeitando Diego no vaso, Victor retirou seus sapatos, sua blusa social branca (que estava toda manchada de roxo claro e amarelo desbotado) e as calças jeans, também sujas de algo que cheirava à catuaba. Sentou-o suavemente na cabine do chuveiro e ligou a água, gelada e constante.

Ele imediatamente protestou, mas, aos poucos, foi retomando a consciência. Abria os olhos, sacudia os cabelos úmidos e esfregava o rosto na medida em que se molhava. Ficou assim por uns quatro ou cinco minutos, até Vic desligar o chuveiro.

— Bom dia, flor do dia-, disse Victor, com um tom de voz gasto, preocupado e levemente irônico. Em seguida saiu do quarto e voltou com roupas limpas, deixou-as na pia e saiu.

                Diego se levantou lentamente, tendo flashes dos acontecimentos da festa: como se sua memória fosse um download sendo realizado em um computador de internet discada. Beijou algumas meninas, fez a “dança do caranguejo” com Pedro e roubou os brigadeiros de Malu (o que a deixou monstruosamente irritada).

                A questão é que, quando Diego começava a ficar sóbrio novamente, era preenchido por um grande sentimento de impotência e tristeza. Era como se seu corpo gastasse toda sua energia tentando se livrar do álcool e, consequentemente, deixasse-o vulnerável aos pensamentos e momentos ruins que já passara.

                Ele se questionava se realmente valia a pena beber sabendo que iria passar por essa “bad” pós bebida, mas na maioria das vezes, era algo tão impulsivo, tão “não pensado” que, quando ele se dava conta, já era tarde demais. Mas, mais do que isso, Diego sabia que a tristeza não era aleatória: ela vivia ali, dentro dele, pronta para sair a qualquer momento. A bebida só facilitava as coisas.

                Ele precisava pensar; precisava digerir a sós seus pensamentos. Vestiu as roupas e, sabendo que Vic estaria a sua espera na sala, evitou-o passando pela área de serviço até a escada, que dava no terraço da grande casa que vivia.

                O céu naquela noite estava sem vida, com nuvens escuras e cinzentas bloqueando todas as estrelas. Ele se aproximou da mureta, baixa comparada ao seu corpo de 1,90m. E chorou. Soluçou. Não havia pessoas por perto, ele não precisava ser forte. Não precisava se esconder por trás de brincadeira ou piadinhas.

                Quando finalmente se acalmou, fez-se silêncio.

— O céu nublado é tão bonito, ainda mais essa hora. - disse Vic. Diego se virou, evitando olhar o amigo nos olhos. Victor estava escorado na porta, contemplativo; os braços cruzados sob o peito, o olhar, indecifrável.

— Como me achou aqui?- perguntou, escondendo a voz ainda fanha pelo choro.

— Você demorou e não estava no banheiro. Preocupei-me e te procurei. Fui ao quarto da sua irmã, na cozinha... nada, até que decidi olhar aqui em cima. É pra onde eu iria se eu quisesse ficar sozinho.

—Se imaginou que eu queria ficar sozinho, por que veio?

Ele parou e olhou Diego calmamente, antes de responder:

— Porque eu gostaria que alguém viesse atrás de mim. Eu odeio ficar sozinho.

                Victor se aproximou e sentou na beira do telhado. Puxou Diego para perto e passou seus braços pelo ombro do amigo, reconfortando-o. “Todos nós passamos por coisas ruins”, disse, sabendo o quão clichê esse tipo de frase é. Todavia, não tinha muitas opções.

—Vic... –ele começou- Minha coluna não está melhorando. Estou com medo de ter que operar, e isso significaria não jogar mais vôlei por um bom tempo... para sempre, na verdade.

—Di, eu sei o que você est...

—NÃO, VOCÊ NÃO SABE!-Diego interrompeu, as mão cerradas em punho de tamanha frustração. Ele odiava não ter controle sobre as coisas que aconteciam na sua vida. Suspirou. - Desculpas. Mas é que eu já estou cansado de perder as coisas que eu amo. Foi o vôlei que me fez sentir útil pela primeira vez na vida. Você não imagina como é perder o que faz te sentir especial.

—Você realmente acha que eu não sei pelo o que está passando? Eu cresci sozinho, vendo os poucos amigos que eu tinha se afastando. Eu nunca consegui me senti especial por mim mesmo, pelo contrário, eu só era especial se alguém me considerasse especial. Até hoje eu sou assim.

                Vic se sentou na mureta e girou, deixando suas pernas suspensas diante dois andares. Em seguida, ficou de pé. Um movimento brusco e ele despencaria do terraço até o térreo.

—Ultimamente, Diego, a única coisa que eu consigo pensar é em diferentes formas de morrer. A mais comum é em alto mar. Alguém que eu amo cai na água,eu pulo atrás para salvá-la. Eu consigo impedir que ela se afogue e me aproximo do barco nadando com dificuldade.  As pessoas do barco a puxam para cima e, quando vão me ajudar, uma onda surge e me arrasta para longe. Quando volto para a superfície em busca de ar, outra onda me empurra para baixo, isso várias vezes, até eu me afogar. Fim. – parou, com os olhos fixos na grama do jardim lá em baixo.- Eu também poderia pular de algum lugar e morrer sabendo como é a sensação de cair. Poderia me jogar na frente de um carro atravessando a rua da faculdade e ter uma morte cotidiana... tantas opções... A questão é que eu ainda estou aqui, vivo, tentando ficar melhor, buscando amor próprio e felicidade. Perdi pessoas e ainda estou aqui. Você vai superar isso, primeiro que não está sozinho, segundo que você é forte.

                E naquele momento, Diego viu Victor verdadeiramente; conseguiu olhar além dos sorrisos e roupas floridas. Seus olhos estavam cansados, havia uma ruga na testa e uma pequena lágrima na bochecha. A mania de roer unha havia sido substituída pelo hábito de pressioná-las contra os braços ou a palma da mão, deixando marquinhas.

—Todos nós temos nossas sombras e perdas. Não deixe que as suas te vençam. Não seja engolido pelas ondas, Diego.- concluiu Victor, que se abaixou com cuidado e desceu do pequeno muro.

                Diego não podia perder as esperanças. Em primeiro lugar, devia manter o pensamento de que tudo ficaria bem, mas caso tivesse que recorrer à cirurgia, não estaria sozinho; teria sua Ohana ¹ para apoiá-lo, até finalmente ficar bem.

                E foi refletindo que Diego percebeu que, naquela noite, ainda haviam estrelas no céu.


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Notas finais do capítulo

¹ "Ohana quer dizer família, família quer dizer nunca abandonar ou esquecer"- Lilo e Stitch



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