Marinwaal: besties forever escrita por Miss Vanderwaal


Capítulo 5
Fique fora disso!


Notas iniciais do capítulo

Eu meio que tentei fazer um capítulo 100% Haleb porque acho que os dois são lindos de bonitos juntos!

Espero que tenha ficado bom ^---^



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Aquela terça-feira estava novamente encoberta e o vento leve de outono movia folhas secas em pequenos redemoinhos pelo pátio de Rosewood High.

Eu me sentia leve e feliz, grande parte pelo acontecido ontem a tarde e também pelo fato de –A parecer ter tirado umas férias. Fazia mais de uma semana que não recebíamos mensagens e, antes do acidente de Mona, tais eram diárias e muitas vezes durante as aulas.

Eram nove horas em ponto e eu senti algo percorrer meu interior, acabando com parte daquela tranquilidade enquanto caminhava para a sala de inglês. Era um tanto óbvio as mensagens terem cessado por aquele tempo, não era? Mona estando afastada da equipe tornava mais difícil a comunicação e a troca de informações que era usada pelo Poderoso Chefão para nos chantagear posteriormente.

Continuava caminhando, já sentindo meu estômago começar a embrulhar novamente. Spencer concluíra que –A era uma equipe, uma teia cujos fios eram unidos por um recôndito sentimento de vingança. E não era qualquer vingança. Afinal, o alvo de tal era Alison (pois parecia que morrer não era vingança suficiente) e, se considerarmos o número de inimigos que ela fizera durante a vida, a equipe –A não deveria ser qualquer equipe.

De repente, certa frase clichê ecoou distante em minha mente: Não confie em ninguém.

Senti minhas pernas vacilarem novamente por uma fração de segundo, mas recuperei as forças assim que ouvi uma voz masculina chamar por mim.

– Ei, você – disse Caleb antes de vir até mim.

Ele estava sentado sobre uma das mesas de piquenique do pátio, com os pés apoiados em um dos bancos desta. Seu semblante não mostrava irritabilidade, ao contrário, Caleb me olhou com um meio sorriso, algo próprio dele que eu considerava extremamente sexy.

– O que está fazendo aqui? – perguntei, abrindo um sorriso e sentindo que ganhava um brilho nos olhos.

– A escola não proíbe ex-alunos de fazerem visitas estratégicas, sabia? – ele sussurrou em uma voz rouca ao pé de meu ouvido, fazendo com que os pelos de minha nuca se arrepiassem.

Eu ri, passando os braços ao redor dele e, assim que o senti beijar-me na testa, toda aquela preocupação de segundos atrás desapareceu. Fechei os olhos e suspirei, querendo prolongar aquele abraço.

– Estou feliz que esteja aqui.

Caleb pôs as mãos em meus ombros, fazendo com que nossos olhares se encontrassem.

– Da última vez que me disse algo do tipo você parecia estar à beira de uma crise nervosa – sua voz adquiriu um tom de seriedade – Isso tem a ver com Mona?

– Em parte – disse, um tanto evasiva.

– Está tudo bem? À propósito, onde você esteve ontem? Eu tentei te ligar o dia todo e as meninas também.

Novamente, ele não tinha um tom inquisitivo ou mesmo ciumento na voz, soava unicamente preocupado. Meu corpo foi dominado por um frio interior.

– Eu... – segurei as reticências no ar por dois segundos – tive uma consulta com a Dra. Sullivan.

Caleb começou a caminhar lentamente com seu braço direito ao redor de meus ombros.

– Ah – ele pareceu analisar a frase – Está vendo ela de novo?

– Me consultar com uma psicóloga é o mínimo que eu posso fazer depois de tudo o que aconteceu, não acha? – isso era um fato, embora a única vez até o momento em que falara com a Dra. Sullivan fora no dia do acidente.

– Sim, mas na hora do almoço?

– Era o único horário que ela tinha disponível – respondi sem nem mesmo pensar.

– Certo. Mas quanto tempo pode ter durado essa consulta para você ficar sem atender o celular? – ele parecia realmente confuso.

Senti aquela sensação gélida me percorrer mais uma vez. Aquilo ainda iria ficar fora de controle, era melhor parar e contar a verdade, ouvia minha consciência me advertir.

– Minha mãe foi me buscar depois da consulta e, alegando que eu parecia deprimida, fomos ao shopping – inventei, constatando que a desculpa soava minimamente plausível – E você sabe como é quando vamos ao shopping, não sabe?

Caleb sorriu, parecendo convencido, e eu me senti desprezível. Afinal, por que diabos eu não poderia contar ao meu namorado que eu fora visitar minha melhor amiga que estava temporariamente em um hospital psiquiátrico? Não era como se o Radley fosse um lugar não-supervisionado e internos em estado crítico fossem me atacar a qualquer momento.

– Mas eu senti sua falta – disse com veracidade, entrelaçando nossas mãos.

– Isso quer dizer que eu posso passar na sua casa hoje a noite?

– Deve – agora com os braços em seu pescoço, dei-lhe um beijo de despedida – E quero comida tailandesa – disse em tom de brincadeira.

Caleb deu um “sorriso inteiro” e se afastou devagar, me deixando ir para minha primeira aula da manhã.

O dia transcorreu tranquilo – o que dava para ser considerado um presente dos céus. Nem Aria, Emily ou Spencer pareceram estranhar quando contei-as sobre a suposta consulta que tive com a Dra. Sullivan ou sobre a tarde que, em teoria, passara com minha mãe gastando sola de sapato no shopping King James.

Mentir é feio, te ensinam antes mesmo de você sair das fraldas. Também há quem diga que as mentiras contadas pelos motivos certos são inofensivas e, contando esta, a única coisa que eu tinha em mente era preservar minha relação com Mona, que, depois da tarde passada, pareceu melhorar significativamente. Mas, se de fato todas as mentiras têm pernas curtas, eu esperava que esta tivesse um par extra de pernas-de-pau.

Ao fim da aula, Spencer convidou-se para passar a tarde em minha casa, assim me ajudando nas lições de casa, já que eu havia perdido a metade das aulas do dia anterior e mais dois dias inteiros na semana passada. Aria e Emily também entraram na onda.

Fiquei feliz com aquilo, afinal, eu não conseguia me lembrar quando fora a última vez que passáramos uma tarde inteira juntas sendo apenas o que éramos: garotas do ensino médio.

Por mais que estivesse divertido, enxotei-as carinhosamente antes das seis horas, alegando que Caleb daria o ar de sua graça em breve. As três, depois de fazerem um “hmmmm” em unissono, atravessaram o jardim entre risadinhas.

Somente quando fechei a porta, voltando a ficar sozinha naquela casa exageradamente grande para apenas minha mãe e eu, foi que percebi o quanto sentira falta daquilo. De ser uma garota comum, cujo unico medo era ser reprovada em um teste de álgebra e a única preocupação era ser aceita em uma boa faculdade. Será que estaríamos ganhando, lentamente, nossa vida normal de volta? Era um pensamento pretensioso mas gostei de tê-lo comigo por um tempo.

Qualquer que fosse o sentimento de alento que estivera comigo durante aquele curto espaço de tempo começou a se dissipar quando deu sete horas no relógio da cozinha e Caleb ainda não tinha aparecido ou tampouco ligado. Sete e meia e eu me encontrava com um tipo ruim de ansiedade que me causava formigamento pelo corpo.

Caleb era coberto de bom senso, não era de seu feitio preocupar as pessoas, mas o celular estava desligado, indo direto para o correio de voz. Deixei duas mensagens de “Cadê você? Estou preocupada.” e depois desisti, indo para a cama antes das dez e meia com não muito mais que meio sanduíche de frango no estômago. Meu último pensamento antes de me render ao sono foi se isso não teria sido um tipo de “troco” pelo dia anterior. Mas isso também não soava como Caleb.

Acordei no dia seguinte antes do despertador tocar e a primeira coisa que fiz foi correr a mão pelo criado mudo em busca do celular. Nada. Um misto de sensação de rejeição, raiva e vazio começou a me dominar e eu fiquei encarando o teto por o que pareceu ser longos minutos.

Peguei o celular novamente com o intuito de ligar para o Radley. Pensei que se me certificasse de que Mona continuava bem, um pouco daqueles nós em minha garganta fossem desaparecer.

Reconheci a voz da recepcionista que vira nas duas únicas vezes que visitara Mona ao ouvi-la dizer “Sanatório Radley”. Eu ainda odiava quando alguém se atrevia a chamar aquele lugar de sanatório, porém tentei ignorar o sentimento de ofensa que me invadia.

– Oi – cumprimentei, não querendo soar exitante – Eu não sei se você vai se lembrar de mim, mas eu estive aí duas vezes visitando uma amiga, Mona Vanderwaal? Uma anteontem e a primeira no sábado. Meu nome é Hanna Marin.

Ouvi o som de papéis sendo vasculhados.

– Ah, sim – ela respondeu com uma voz simpática – Posso ajudá-la em algo, querida?

– Hã... acho que sim – gaguejei, desejando que o motivo não soasse estúpido – Na verdade eu só queria mesmo saber se ela está bem.

Fez-se um breve e agoniante silêncio. Silêncio depois de uma pergunta como essa nunca era bom. Senti um aperto no peito.

– Eu vejo aqui que, temporariamente, ela não tem ordem para receber visitas – o tom de voz da recepcionista mudou, parecia agora um tanto severo porém com uma ponta de lamento.

Agarrei a gola do pijama com a mão que estava livre e foi como se me tivessem feito um buraco no estômago. Perdi a habilidade de falar por alguns segundos.

– O quê? Por quê? – consegui dizer, ainda sentindo certa falta de ar.

– Eu não tenho ideia, querida – ela realmente parecia lamentar – Diz aqui apenas que ela teve uma crise depois de receber uma visita ontem a noite e agora está fortemente sedada.

Uma crise.

– Eu... eu não entendo – disse, lutando bravamente contra as lágrimas – Ela estava bem da última vez.

– Eles são assim mesmo – ela tentava me tranquilizar – E nem sempre é culpa de alguém em particular. Eles são instáveis. Mas isso não quer dizer que sua amiga voltou a estaca zero – pareceu sorrir.

– Você ao menos sabe quem foi visitá-la? – engoli em seco, controlando a voz.

– Não, querida, eu não trabalho no turno da noite.

Suspirei pesadamente.

– Olhe, quem sabe você não passa por aqui daqui a alguns dias? – propôs com certa animação na voz, me dando um fio de esperança – Ela está sendo medicada e talvez se recupere rápido.

– Tudo bem – disse em tom de voz baixo – Obrigada.

Larguei o celular no colchão, pegando um travesseiro e colocando-o sobre minha cabeça. Queria gritar mas nem para isso tinha forças.

Era oficial. Deus ou qualquer outra força cósmica que estivesse acima de nós não gostava de me ver feliz.

Depois de ter passado a manhã e o começo da tarde de quarta-feira na escola pensando na pior das hipóteses, tanto em relação a Caleb quanto em relação a Mona, decidi que em breve iria de fato falar com a Dra. Sullivan e pedir que ela me recomendasse um calmante, pois seria impossível seguir vivendo daquele jeito, com o coração prestes a saltar pela boca a qualquer momento.

Não fui capaz de absorver uma palavra sequer dita por aquela gama de professores, pois minha mente só foi capaz de comportar as memórias do entardecer de segunda-feira.

Eddie nos havia dado o que parecia ser uma toalha de mesa para que Mona e eu nos deitássemos sobre ela na grama do jardim dos fundos. Apesar do friozinho de outono que começava a se manifestar, alguns dos internos caminhavam tranquilamente pela área espaçosa acompanhados de seus cuidadores ou estavam em bancos conversando entre si. E mais uma vez eu não conseguia entender porque aquele lugar às vezes era mal encarado por muitos cidadões da Filadélfia.

A áurea estava magicamente tranquila e o céu escurecia lentamente, revelando pontos dispersos e brilhantes. Nós não éramos as únicas deitadas sobre a grama a olhar tamanha imensidão azul, mas de alguma forma eu sentia que éramos meio que o centro das atenções.

– É bonito, não é? – perguntara Mona, com uma voz sonhadora e sem tirar os olhos do céu.

– É mesmo – respondi, virando o rosto na direção dela.

Ela tinha as duas mãos entrelaçadas sobre o abdome. Toquei delicadamente em sua esquerda com dois dedos de minha direita, fazendo-a em seguida deslizar de encontro com minha palma.

Mona olhou-me com um leve e curioso sorriso que parecia perguntar “por que isso?”, mas eu apenas sorri de volta, confiante. E ela deixou sua mão ainda quente repousando sobre a minha; uma das melhores sensações que já tive.

Enquanto nos despedíamos naquela noite, percebi, olhando em seus olhos, que ela não era a Mona Malvada de uma semana atrás; também não era a Mona Nerd e insegura do primeiro ano ou tampouco a patricinha versão-mais-branda-de-Alison do segundo. Eu precisei admitir que aquela era uma versão de minha melhor amiga que eu não conhecia, mais frágil e excessivamente doce, com a qual eu adoraria conviver.

E eu deveria simplesmente aceitar que da noite para o dia tudo isso mudara completamente? Qual seria a versão que eu iria encontrar se abrisse a porta daquele quarto outra vez?

Andando de volta para casa depois da aula a passos rápidos e pesados, eu não me permitia pensar em tal pergunta. Sentia a mandíbula travada e dois dentes superiores mordendo firmemente o lábio inferior quando avistei Caleb sentado nos degraus da frente de minha casa.

– Eu seria capaz de te beijar e de te estapear ao mesmo tempo – disse entre dentes, pausadamente, assim que cheguei perto dele.

Caleb se levantou prontamente ao me ver.

– Sinto muito por ontem a noite – disse ele, seu semblante parecendo esgotado – Eu sei que devia ter ligado.

– Devia – rebati rapidamente – Aliás, qual é a dificuldade de pegar um telefone e dizer: “Hey! Estou vivo e não vou conseguir passar aí para jantar. Desculpe. Te amo.”?

– Eu sei – ele repetiu, como que tentando manter meu tom de voz baixo – Mas eu não conseguiria te ligar e apenas dizer parte da verdade.

Franzi uma sobrancelha.

– Que verdade? Onde você foi?

Caleb ainda se mantinha calmo, porém inquieto. Olhava ao redor, como se estivesse com medo dos vizinhos.

– Podemos discutir isso entre quatro paredes? – perguntou ele, quase que entre dentes.

Bufei, tirando uma mão da cintura e girando a chave na porta, jogando-a no sofá da sala em seguida. Fomos direto para a cozinha, que era o cômodo mais espaçoso e iluminado da casa.

– Muito bem – recoloquei a mão na cintura, permanecendo em pé, de frente para ele – O que é?

Caleb suspirou, sentando em um dos bancos altos do balcão.

– Eu fui visitar Mona, no Radley – explicou pausadamente, em rendição.

Fez-se alguns segundos de silêncio. Eu tentava processar aquela informação.

– Por que você foi visitá-la sem me dizer nada? – perguntei, mais calma.

– Antes de eu te responder isso, apenas me deixe perguntar uma coisa.

Cruzei os braços, em expectativa.

– Lucas sabe sobre –A? – ele balançou sutilmente a cabeça, corrigindo-se em seguida – Sobre Mona e as ameaças?

Eu, obviamente, me sentia mal quando associavam -A a Mona, mas não tive tempo de focar em tal detalhe, devido a tamanha perplexidade que o nome de Lucas naquela conversa me causava.

Caleb sabia que Lucas e eu nos tornáramos amigos em meu segundo ano, sendo Lucas um antigo alvo das provocações venenosas de Alison. Começara minha amizade com ele ainda no início do ano, quando ele ainda era fotógrafo do anuário escolar. Caleb, na época em seu último ano em Rosewood High, chegara a conversar com Lucas, mas nada muito além do cordial, muito mais por mim do que por uma suposta necessidade dele de fazer um novo amigo.

– Sim – eu finalmente respondi, ainda bastante confusa – Na quarta-feira, quando voltei para a escola, eu sentia que precisava de alguém para conversar sobre tudo o que estava acontecendo e as garotas ainda evitavam falar sobre o assunto, como se tivessem medo de como eu poderia reagir, então eu desabafei com ele. Por quê?

Não parecia que Caleb teve sua pergunta respondida.

– Ontem – ele começou, paciente - , eu estava na fila do The Brew para pegar um café antes de ir trabalhar. Lucas estava no caixa ao meu lado. Eu tentei puxar conversa fazendo alguma piada idiota sobre a dose grande pela qual ele estava pagando e ele respondeu, sem olhar para mim, com uma ponta de sarcasmo na voz: “a estrada principal que leva à Filadélfia exige paciência”.

Caleb fez uma pausa, a fim de observar minha expressão. Meus pés não haviam se movido e eu ainda continuava com os braços cruzados e um olhar atento.

– Normalmente, tal constatação não me provocaria curiosidade – Caleb continuou – Mas eu decidi perguntar porque ele estava indo para a Filadélfia. E o que mais me impressionou foi que ele disse, sem exitar, que estava indo “inspecionar a Mona Maluca”.

Caleb me fitou rapidamente outra vez, podendo constatar que a confusão em meu olhar havia aumentado.

– Sim. Fiz exatamente esta cara ao ouvir aquilo dele – ele pareceu achar certa graça da situação por uma fração de segundo – Fiquei parado por um tempo, tentando achar algum tipo de possível conexão entre os dois, porque, no segundo ano, Mona parecia ser o exato tipo de vadia que Alison foi, pronta para chamá-lo de Hermie, o Hermafrodita a qualquer momento.

Dei um passo na direção dele. Caleb não chegara a, de fato, conhecer Alison (ele viera de uma escola em Connecticut apenas para o último ano em Rosewood High), mas era terminantemente impossível não saber quem ela fora ou os apelidos que ela maldosamente colocava em praticamente cada aluno da escola que não fosse ela.

– Os dois sofreram nas mãos de Alison – tentei justificar – Talvez... talvez o acidente tenha feito Lucas se lembrar de que Mona também era tachada de perdedora assim como ele. Talvez uma empatia tenha nascido entre os dois a partir daí, não sei. Talvez, como eu, ele entendesse porque Mona fez o que fez.

E talvez Lucas também fizesse parte da equipe –A.

Tal pensamento me atingiu como aqueles pesadelos nos quais você sonha que está caindo de um precipício, mas depois “aterriza” na cama sentindo como se estivesse carregando uma dose quase letal de adrenalina no sangue.

Isso estava fazendo cada vez mais e menos sentido ao mesmo tempo. Sim, Lucas levara durante a vida alguns chutes nas costelas, tanto literais quanto figurados, mas... ele era um cavalheiro nerd e bobo que tinha uma coleção de revistas da Liga da Justiça no fundo do guarda-roupa. Isso... isso não estava certo. Se bem que pensar em minha melhor amiga como uma terrorista também parecia-me bastante errado.

– Foi a primeira coisa que passou pela minha mente também – informou Caleb, continuando com os relatos do dia anterior – Mas assim que vi que ele ia em direção à porta, eu apertei o passo para alcançá-lo, perguntando-o em seguida porque ele estava indo ver Mona. E outra vez, sem exitar, desta vez me olhando, ele respondeu: “Para ver se ela está realmente maluca”. Ele deu um gole no café e, percebendo que eu estava confuso, acrescentou: “Eu sei que isso também te preocupa em relação a Hanna".

– E o que mais? – perguntei, ainda na mesma posição, estranhando um pouco o quão fria minha voz soava.

– Mais nada – ele deu de ombros – Andou a passos apressados em direção ao carro dele e foi embora.

– E você? – eu quis saber, mantendo a voz firme. Ele baixou a cabeça e eu dei mais um passo na direção dele – Caleb.

– Tive que me segurar para não pedir para que Lucas me levasse com ele.

– O que quer dizer?

Caleb revirou os olhos.

– Eu nunca havia pensado realmente na possibilidade de Mona estar fingindo. Mas assim que Lucas mencionou, foi como se uma lâmpada se acendesse em minha mente e minha consciência me chamasse de imbecil.

– Por que ela estaria fingindo? – coloquei a mão esquerda no balcão, me sentindo um tanto sem forças.

– Porque é mais fácil ficar em um sanatório do que em uma cadeia – cuspiu ele, em um tom de voz mais elevado – e pensar nisso foi o que me motivou a ir ao Radley depois que saí do trabalho.

Baixei a cabeça e fechei os olhos. O jeito como ele deu ênfase às palavras "fingindo" e "cadeia" me desconsertaram. Eu não poderia deixar que ele me visse chorar, não agora. Se chorasse, daria razão a ele, e isso eu não faria nunca.

– Você foi o responsável por tirarem o direito dela de receber visitas? – perguntei, a voz contida e os olhos provavelmente vermelhos de raiva, embora eu já tivesse a resposta em mente.

Caleb pareceu surpreso com a pergunta e gaguejou um pouco ao formular a resposta.

– Bem, eu não sabia que eles iriam literalmente colocá-la em uma solitária, mas... levando em consideração o jeito como ela surtou...

– O que foi que você disse a ela? – interrompi, elevando a voz e sentindo a cólera subir pelo meu estômago. Um silêncio se fez. – Caleb!

– A única coisa que eu disse foi para ela ficar longe de você! – rebateu ele pausadamente, no mesmo tom de voz alto.

– Não – eu disse, a centímetros do rosto dele, agarrando a gola de sua camisa – Eu quero cada palavra. Desde quando você colocou o primeiro pé naquele lugar.

Caleb suspirou. O ponto da camisa onde eu havia agarrado estava agora visivelmente amassado.

– Ela estava sentada em uma mesa na sala de jogos, sozinha, agrupando cartas de um baralho em fileiras. Nos cumprimentamos e ela perguntou se eu queria me juntar a ela. Assim que o fiz, ela começou a encher linguiça contando sobre um tio que a ensinara a jogar paciência, e eu, sarcasticamente, a elogiei, dizendo que ela parecia ser boa com jogos. Em seguida, como você já sabe, avisei-a para ficar longe de você. Ela não pareceu se abalar, rebatendo sobre nós fazermos um casal bonito, quase que em deboche. Ao fim, eu disse algo sobre ela não poder sair por aquela porta, como todos nós, e isso sim pareceu irritá-la. Tudo que sei é que cartas e mesas voaram em minha direção segundos depois.

Dei dois passos para trás, não podendo conter uma leve risada, ainda que duas lágrimas já escorressem por meu rosto.

– Deus, você é mesmo um imbecil, não é? Como espera que uma pessoa com problemas mentais reaja depois do que você disse?

– Tudo que quero é fazer você entender que ela é perigosa! – Caleb desceu do banco em que estava sentado.

Ela é minha melhor amiga! – gritei, fitando-o com os olhos já cheios de lágrimas.

– Que fez de sua e de outras três vidas em particular um pesadelo! Deus, Hanna, como pode ser são cega?

Fiquei por um momento em silêncio, sentindo minha respiração pesada, o choro preso em minha garganta. Eu não tinha argumento contra isso, mas ainda tentava, de todas as formas possíveis, me convencer de que não era verdade.

– Isso foi antes de ela... – apoiei os dois braços no balcão, apoiando a cabeça entre eles por um momento. Agora parecia que nada era capaz de justificar as ações anteriores de Mona. – Qual é, você sabe que ela está doente!

Caleb ficou de costas para mim por alguns segundos, me fitando em seguida, sacudindo a cabeça em desaprovação, completamente descrente.

– Não – disse ele, firme – Não sei. Tudo que sei é que aquele lugar parece estar cheio de covardes que não têm coragem para pagar pelos próprios atos.

O tom da voz de Caleb dizia que ele estava profundamente enojado. Talvez não apenas em relação a Mona mas também em relação a outros internos possivelmente criminosos.

Me render àquela voz significaria negar tudo o que Mona representava para mim. Negar que me divertia quando ela me confidenciava algum rumor maldoso (que geralmente acabava por não ser verdade) no banheiro feminino; negar que sentia orgulho dela por ter ganhado tanta autoconfiança ao longo do segundo ano; negar que minha amizade com ela era algo genuíno, diferente de qualquer outra coisa que eu já vivenciara e, principalmente, negar que aqueles olhares que ela me dirigira na tarde de segunda-feira fossem verdadeiros.

Meus movimentos não foram calculados, nem mesmo o menor deles. Tudo que senti foram meus pés em movimento e, logo em seguida, a palma de minha mão direita se chochando contra o rosto de Caleb. O barulho, que seguiu outro breve momento de silêncio, pareceu ensurdecedor.

– Você não sabe nada sobre ela – me ouvi dizer, com um indicador apontado para ele, em uma voz não muito alta, mas sentia que a raiva chegava a transbordar pelos olhos.

Caleb tocou o maxilar sem me fitar e deu um de seus meio-sorrisos, mas agora, ao invés de parecer sexy, parecia irônico e pretensioso.

– Tem razão – disse ele, em uma voz calma, se afastando em seguida para pegar a mochila que havia deixado no sofá da sala – E agora sinto que não conheço muito mais de você também.

Suspirei.

– Por uma única vez fique fora disso. Eu não preciso de sua proteção.

– Eu vou ficar fora disso! – interrompeu – Não se dê ao trabalho de me expulsar.

O barulho da porta da frente batendo foi outro assustadoramente ensurdecedor.

Chutei uma cadeira à minha frente, despencando no chão da cozinha logo depois, trazendo as pernas para junto do corpo. Uma massiva sensação de vazio me dominou, me avisando que talvez eu tivesse cometido a maior estupidez de minha vida. E, numa sensação completamente nova e desconhecida, tive certeza de que não tinha ninguém a quem recorrer.


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Notas finais do capítulo

Sofri junto com a Hanna Banana escrevendo esse capítulo T_T

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Tá, parei :P