Desirée ainda estava impressionada com tudo o que viu e ouviu. Katia era mesmo a culpada daquele roubo, mas seus motivos eram mais sinistros do que ela pensava. Como iria saber que o irmão da ladrazinha estava envolvido com dívida de drogas? Isso era realmente perigoso! Não só para o irmão, mas para toda a família dela. Só que Desirée também não podia deixar isso passar em branco. O grêmio da escola não poderia arcar com isso tudo. Ela precisava fazer alguma coisa, mas o que? Embora o livro revelasse tudo, ela não podia simplesmente chegar e dizer que sabe da culpa de Katia porque viu num livro mágico. O livro dá a verdade, mas não prova a verdade. E agora?
        - Desirée! - chama a empregada, da sala lá embaixo - Tem alguém no telefone. Acho que é a sua amiga
        - Ah! Já vou, Suzana!
        Ela se recompõe rapidamente e desce as escadas. Ela agradece à Suzana e reconhece a voz de Priscila imediatamente.
        - Alô? Dê? - diz a voz do outro lado da linha
        - Sou eu Pri. O que foi?
        - Só queria saber se você tem mais alguma ideia sobre aquele caso, sabe. Eu recebi um e-mail da escola alertando que se a gente não esclarecer essa história até depois de amanhã eles suspendem todo mundo do grêmio
        - O que?
        - É o mais certo, não? Sem contar que seremos expulsos da gestão e aqueles Espertos vão assumir! Isso é muito injusto!
        Desirée concordava. Era muito injusto passar por tudo isso por causa dos problemas de uma única pessoa. Por melhores que fossem as intenções daquela Katia, ela não podia usar um dinheiro que não era dela para ajudar o irmão. Dê precisava consertar tudo aquilo da melhor maneira possível. E só ela sabia a verdade. O que poderia fazer? Eis que ela se lembra de um detalhe que podia ajudar. Sim. Era o que ela precisava!
        - Espera...espera, Pri! Tive uma ideia!
        - Ideia? Que ideia?
        - Não fala nada. Só marca uma reunião com todos os membros da diretoria do grêmo amanhã depois da última aula de novo. Acho que consigo dar um jeito nessa situação!
        - Sério? Mas o que é? Fala!
        - Você vai ver...amanhã..amanhã. Beijo!
        - Espera..Dê
        Mas a garota já tinha desligado. Priscila desliga do seu lado bem curiosa. O que a amiga teria pensado?
        De qualquer forma, no dia seguinte, Priscila convoca a reunião com todos os membros do grêmio estudantil. Desirée parecia bem confiante no que ia dizer, mas Priscila ainda não tinha a menor ideia do que ela estava pensando, mesmo tendo insistido a manhã inteira para que a amiga falasse alguma coisa, por menor que fosse. O que poderia ser?
        - Fala logo, Dê! Você descobriu quem roubou o dinheiro?
        Os outros três membros, principalmente Katia, estavam bastante tensos e nem falavam muito. Mesmo Dimas que era o mais comunicativo estava na dela aquela hora. No que Desirée teria pensado para estar tão confiante?
        - Bem, não diria que descobri, mas existe um jeito muito fácil de saber isso
        Todos ficam espantados. Katia começa a gelar, com um frio na espinha. Como ela poderia saber disso? Impossível...a garota tinha tomado todas as precauções possíveis quando pegou o dinheiro. Como Desirée poderia saber? Impossível, realmente impossível.
        - Como, Dê? - pergunta Priscila, mais uma vez - Que jeito é esse? Vai menina, conta tudo pra gente!
        - Calma, calma. A resposta era mais simples do que vocês imaginavam    
        Todos a olham em silêncio. Do que ela estaria falando?
        - É isso! - ela tira um tipo de DVD do bolso. O que aquilo poderia mostrar de tão inovador?
        - Um DVD? - pergunta Waldir
        - Exato. Um DVD com imagens das câmeras de video da escola. Pedi permissão à coordenação para ter acesso a esse arquivo
        Todos ficam espantados, mas logo Priscila lembra de algo desanimador
        - Mas...a gente já pensou nisso, Dê. O problema é que a sala do grêmio não tem uma câmera. Não conseguiriamos provar nada
        - É. Eu sei - responde a mocinha, ainda bem confiante - Mas não precisamos das imagens de dentro da sala. Apenas o video do lado de fora, no corredor da sala, já bastam    
        Katia fica praticamente branca. Como isso poderia ajudar?
        - I-Impossível! - retruca Katia - No que um video do lado de fora da sala do grêmio pode provar sobre o roubo?
        Desirée dá um sorriso meio irônico (afinal, ela já conhecia a verdade) e continua.
        - Diga, Waldir. Você costuma ser sempre o último a sair da sala?
        - Normalmente sim - ele responde - Se bem que...não!
        - Pela sua cara...acho que já entendeu, né?
        - Que cara? Fala aí, Waldir! O que aconteceu?
        - Bem...na semana passada...a Katia saiu antes de mim
        Todos olham para Katia. Mas havia alguma prova de que havia sido ela?
        - E-Espera aí, gente. Vocês não estão achando que fui eu?
        - Não, calma aí. Eu só lembrei que você saiu depois de mim aquele dia e...só isso. Isso..isso não prova nada, não é Desirée? - pergunta Waldir, também preocupado com o andamento daquele caso. O clima estava bem tenso.
        - Infelizmente...se vocês verem todas as cenas desse video...verão que ninguém mais entrou na sala até o dia do roubo. A última pessoa a sair da sala foi a Katia
        Todos voltam a olhar para ela que ficava cada vez mais tensa
        - Espera aí. Isso não prova nada!
        - Se não foi você, foi quem? O Waldir?
        - Não foi você, né Waldir? - pergunta Dimas, já também preocupado - Eu não quero acreditar, véio...não pode ter sido alguém daqui. Não pode
        - Você...você tem certeza, Dê? - pergunta Priscila - Você está fazendo acusações muito sérias! Você tem como provar que foi mesmo a Katia?
        - Bem, vendo pelos videos, a última pessoa a sair da sala foi mesmo a Katia. Se fosse você ou o Dimas, que saíram antes do Waldir, teríamos tido conhecimento do roubo bem antes, concordam?
        - É...verdade
        - E o Waldir, sendo tesoureiro, poderia ocultar o roubo nos relatórios. Mas ele mesmo anunciou que houve roubo. Portanto, só consigo suspeitar da Katia
        - Katia...não foi você, foi? - Priscila se vira para a garota, naquela altura já muito assustada
        - E-Eu..
        - Bem - diz Desirée, cruzando os braços com um olhar sério - Se você tem um argumento bom em sua defesa...é melhor usá-lo agora. Se o que eu falei não foi o bastante...posso mostrar os vídeos. Apesar de que são várias horas...mas podemos ver
        Vendo que não podia contra-argumentar e já desesperada com a pressão dos amigos, Katia não vê saída a não ser confessar
        - Tá bom! Tá bom! Fui eu! Fui eu, sim! - diz ela, com lágrimas nos olhos.
        - Katia! Você! - se espanta Priscila - Mas por que você fez isso?
        - Eu...eu...tive que fazer isso....pra salvar minha família!
        - Hã? Que história é essa, mina? - pergunta Dimas - Conta isso aí, direito
        Katia conta tudo, desde como seu irmão já havia se metido com drogas e como ele havia se endividado seriamente dessa vez
        - E é isso...meu irmão é dependente e devia dinheiro para traficantes..eu...eu não podia deixar a vida dele correr risco...mas eu...eu prometo que pago o dinheiro..de alguma forma
        - Pagar o dinheiro...o problema não é só esse, Katia - argumenta Waldir - A reputação da nossa chapa vai por água abaixo quando descobrirem que realmente foi um de nós que levou o dinheiro
        - Desculpem..me perdoem! - ela continua, chorando. Dimas dá um abraço nela, mas o problema ainda continuava.
        - Que situação...então você assistiu todas as horas de video só para resolver esse caso, Dê?
        - Bem...mais ou menos isso
        Claro que Desirée ainda não podia contar sobre seu livro misterioso, mas a desculpa valeu a pena. Embora a história sobre ter pedido permissão para ver as imagens da câmera do corredor tenha sido verdade. Sorte dela que a moça que trabalhava naquela seção era muito amiga da mãe de Desirée.
        - Mas e agora? O que a gente faz?
        - Eu...eu vou contar a verdade - diz Katia - A culpa disso tudo é minha. Eu vou contar tudo para a direção e assumir as consequências disso tudo
        E, de fato, foi o que ela fez. Ao ouvir o relato de Katia, a direção decidiu suspendê-la, mas não chegaram a expulsá-la. O irmão dela conseguiu quitar as dívidas de drogas e reiniciou seu tratamento. Já Katia teve que assumir um contrato de trabalho com a escola, auxiliando na secretaria e em outros setores até pagar o que devia. Infelizmente, ela não podia mais ser a vice-presidente do grêmio, passando esse posto para Dimas.
        - Vice-presidente também? Vai ficar meio puxado pra mim - diz ele
        - Tudo bem. Depois desse rolo todo, não acho que a gente vá ser eleito mesmo
        - Será que não? - comenta Desirée - Já leram isso que colocaram na comunidade da escola?
        - Hã?
        Desirée estava olhando alguns comentários no computador da sala do grêmio e as pessoas pareciam ter se sensibilizado com a história de Katia. Como a chapa dos Estudantes mostrou honestidade, muitos estavam repensando seus votos.
        - Mas ainda tem muita gente achando que a história é só balela para encobrir os verdadeiros fatos
        - É. A oposição também não brinca - termina Desirée, fechando a janela do computador.
        - Mas mesmo que a gente perca...foi bom trabalhar no grêmio e ver como funciona essa coisa toda. Administração é uma coisa complicada
        - Imagino    
        - E aí, Desirée? Por que você não entra para nossa chapa também? - pergunta Dimas - Você é inteligente, fala bem, ia se sair bem com a gente
        - Ah, não. Valeu. Política não é minha praia
        - Pena
        Mas ela não queria mesmo se envolver em política. Isso incluiria se envolver muito em coisas que ela não queria se aprofundar. "É um mundo bem perigoso se você não tiver cabeça...", pensa a garota sobre a vida política, "Mas acho que a Priscila se daria bem com isso. Mesmo nas horas difíceis ela se esforça para se dar bem"
        Aparentemente, o problema da Katia estava resolvido. Será mesmo? Ao chegar em casa, Desirée quase pega seu livro para tentar ver se estava tudo correndo bem com Katia, mas...para de repente. "Espera...não preciso fazer isso...se ela falou que está tudo bem, então está, né? Não precisa usar o livro sem necessidade. Não...não mesmo". Ela abandona a ideia e sai do quarto...mas ainda dá uma olhada para trás. "Não!", ela pensa, chacoalhando a cabeça e indo embora de vez. Mas o livro permanecia ali, trancado no quarto, em todo o seu brilho dourado.