As Chamas da Vingança escrita por Tayle


Capítulo 4
A Sombra da Ambição


Notas iniciais do capítulo

"PAI, LARGA ESSA ESPADA, VOCÊ VAI ACABAR SENDO PRESO!"
— Selon, o filho do taverneiro.



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Seguiram voando o rio Nerull que saía da Mata dos Galhos Partidos, passaram por cima do vilarejo de Ridembarr, avistaram a Pequena Colina ao longe e finalmente chegaram na cidade de Valkaria, a capital de Arton.

A cidade tinha quatro entradas, cada entrada alinhada com um ponto cardeal, e uma muralha respeitável. Todos repousavam à sombra de uma estátua colossal da deusa da humanidade e da ambição. Transformada em pedra, ajoelhada e chorando, enquanto fitava os céus como se pedisse piedade, a deusa não parecia muito feliz em seus momentos anteriores à petrificação. Alguns diziam que a deusa expressava o futuro da humanidade através daquela estátua, para esses, os humanos estavam destinados ao sofrimento, independente da forma.

Ryer aterrissou em um telhado e pousou o minotauro e o irmão num beco, dois andares abaixo. Depois de alguns minutos, Leo conseguiu se recuperar e saiu do beco, juntamente com Kurt, enquanto Ryer voava em direção ao palácio real, moradia do rei-imperador Thormy, governante de Deheon e de todo o Arton.

Ao mesmo tempo, Leo e o Solaris mais velho procuravam uma taverna no bairro em que eles pousaram, na parte sudoeste da cidade. Não demorou muito até que achassem uma e ambos se apressaram em pedir um corno de hidromel.

Ao olhar um pouco em volta, Kurt percebeu que diferente das outras cidades, ali não se estranhava a presença de um estrangeiro e nem mesmo de alguém que não fosse humano. Era de se esperar que fosse assim no local que era chamado de “o centro do mundo”. Todos eram bem-vindos ali, independente do que fossem ou do que tivessem feito no passado. Em Valkaria, todos teriam uma segunda chance, mas nunca uma terceira.

– Ouça – Disse Kurt para o taverneiro – Você sabe algo sobre algum dominador de chamas?

– Acho que me lembro de algo sobre isso, mas não sei muitos detalhes. – Respondeu o taverneiro.

– Isso refresca a sua memória? – Perguntou Leo, colocando dez tibares sobre o balcão da taverna.

– Claro que sim! – O taverneiro foi ágil em recolher as moedas – Ele esteva na cidade há poucos dias. Levou uns mendigos, umas crianças, algumas mulheres. Dizem que ele vende escravos.

– Sabe pra onde ele foi? – Perguntou Kurt.

– Espere, vocês estão caçando ele? – Disse o taverneiro espantado – Dizem que o poder dele é invencível e que ele pode ser até mesmo um semideus.

– Semideus? – Kurt deu uma gargalhada – Ele é apenas um velho amigo com quem eu queria me encontrar para relembrar dos... Velhos tempos.

– Nesse caso, me acompanhem. – Falou o taverneiro enquanto chamava os dois aventureiros para o salão isolado, onde era guardado o hidromel e o vinho. – Meu filho foi pego por esse cara há três semanas, enquanto ele ainda estava aqui. Enjaularam minha criança numa maldita cela de madeira e transportaram ele numa carroça coberta por um pano, assim como se transportam animais inofensivos! E o babaca nem se deu ao trabalho de vir buscá-lo pessoalmente. Mandou um dos escravos dele para sequestrar meu filho e mais umas crianças que eram seus amigos.

– Sinto muito. – Disse o minotauro, tentando demonstrar compaixão.

– Um minotauro com pena de pessoas fracas? Eu estou sonhando? – O taverneiro esfregava os olhos em zombaria. – Bem, por sorte, muitas pessoas visitam essa taverna e conhecem meu filho, então quando ele gritou por ajuda, o povo percebeu que haviam pessoas enjauladas naquela carroça e que meu filho era um dos raptados. Alguns civis lutaram contra os escravos, enquanto outros libertavam as crianças.

– Posso falar com seu filho? – Perguntou Kurt – Talvez ele tenha mais informações sobre para onde essa maldita rede de sequestradores vai.

– Pode sim. Venha aqui, Selon! – Gritou o taverneiro.

Um garoto magro e pequeno apareceu. Ele tinha a pele queimada pelo sol e os pés e mãos calejados de tanto brincar na rua com os amigos. Era tímido e envergonhado, mas quando o pai lhe disse para contar sobre o dominador das chamas, o garoto não conseguiu suportar o peso das lembranças de todo o desespero que sentiu e lágrimas rolaram pela sua face.

– Foi horrível! – Disse o garoto, já com o rosto encharcado e com o gosto salgado do choro na boca. – Eles me enjaularam e iam me obrigar a servir de escravo para a primeira pessoa que me comprasse!

– Você sabe para onde eles estavam te levando? – Perguntou Leo.

Depois de conseguir se controlar, o garoto falou, ainda com uma voz trêmula e afetada pelas memórias. Apesar de não terem torturado e nem agredido o garoto, ser enjaulado por estranhos com seus amigos já era mais do que suficiente para traumatizar um garoto de doze anos.

– Não sei para onde eles vão, mas ouvi dizer algo sobre o preço dos escravos ser muito alto em Tapista. – Disse o menino, ainda soluçando. – Acho que eles pretendem levar todos que eles raptaram para o reino dos minotauros e vender todos como escravos por um preço alto.

– Faz sentido e seria um bom plano. – Comentou Leo, coçando os chifres.

– Sim. – Concordou Kurt – A maioria dos civis de Tapista adoram escravos e comprariam um bom escravo por um preço que ninguém seria capaz de pagar em nenhum outro reino. Sem ofensas.

– Não gostaria de comprar escravos. – Respondeu Leo – Ter um escravo comprado só comprova que você é fraco o suficiente para não conseguir fazer as coisas por si mesmo e que não foi capaz de defendê-lo.

– Espere um pouco. – Kurt parecia confuso – Você não estava em Ahlen em busca de escravos?

– Há muita diferença entre conseguir um escravo na guerra, que tenha sido um inimigo derrotado com honra, ou algum fraco que você protegeu e em troca ele lhe ofereceu servidão e simplesmente comprar um escravo. – Explicou o minotauro.

– Entendo. – Disse Kurt e se voltou para o taverneiro – Daremos um fim na história desse sequestrador maldito e libertaremos os escravos que ainda não foram vendidos.

Eles já estavam saindo do local onde estavam e se dirigindo de volta ao salão principal quando ouviram uma confusão vinda do local para onde eles estavam indo. Quatro soldados da capital batiam em alguns bêbados perguntando se eles tinham visto algum mago humano passar por ali correndo com outros guardas atrás dele. Enquanto isso, o taverneiro abria um baú e sacava um saco de ouro e uma lâmina bastarda.

– Tomem, isto é tudo que eu posso oferecer pela cabeça daquela prostituta do fogo. Aí tem mil tibares. – Disse o taverneiro erguendo a espada e indo “apartar” a confusão no salão principal – Saiam por aquela porta, ela dá para um beco que passa atrás da estalagem. Saiam por ali e continuem sua busca.

Os aventureiros saíram da taverna pelos fundos e toparam com Ryer voltando correndo dentro de sua armadura de metal e com sua mochila nas costas. Ele estava todo suado e pedia para que ninguém fizesse barulho. Logo os outros dois entenderam que ele era o mago que os soldados estavam procurando e que estava fugindo da guarda real. O idiota havia tentado invadir áreas restritas do palácio e fora pego pelos soldados que faziam a patrulha do castelo.

– Idiota! – Kurt estava irado, mas mantinha-se sussurrando, para não correr o risco de chamar a atenção de qualquer um que passasse por perto – Você quer morrer?

– Os malditos dos guardas disseram que não tinham nenhuma informação sobre o dominador de chamas. – Falou Ryer, ignorando o comentário do irmão – Tudo que eles falaram é que o cara esteve aqui e foi embora há quatro dias, mas tenho certeza de que eles sabiam mais.

– Ótimo, então agora temos a única informação que faltava. – Disse Leo.

– Quatro dias? Estamos perto, partimos ainda hoje! – Kurt se animou, entrando em sintonia com Leo.

– Mas como vamos partir se não sabemos pra que lado ele foi? – Perguntou Ryer, percebendo a situação e ficando quase com ciúme.

– Irmão, existe algo que você deve aprender um dia: um irmão de tavernas muitas vezes vale mais do que um irmão de sangue. – Disse Kurt. – Não se ofenda e nem me leve a mal, mas é a verdade.

O mago compreendeu de imediato o que havia ocorrido.

– Conseguimos mil tibares e uma direção para seguir. – Era Leo. – Vamos seguir para Tapista.

– Tapista, o reino dos minotauros? – Ryer fora pego de surpresa. – Tudo bem pra você, Leo?

– Sem problemas, somente os fracos serão pegos pelos escravos do dominador. – Respondeu Leo. – Além do mais, parece que ele vai pra lá pra vender os escravos e não pra escravizar mais pessoas.

– Entendo. – Ryer se tocou de uma coisa – Espere, se ele vai pra Tapista, o caminho mais rápido, saindo daqui, é passando pelo reino das Montanhas Uivantes e se ele for realmente quem nós achamos que é, então...

Ryer não foi capaz de completar a sua frase. Sua mente havia lhe guiado por uma linha de raciocínio que atravessava o sofrimento e acontecimentos tão horríveis que ele se arrependeu ter pensado naquilo. Ele mal conseguiu conter as lágrimas que começavam a lhe brotar nos olhos.

Com sua mente sendo sugada pelas coisas que seu inimigo poderia fazer com seus pais. Lembrou do quanto amava seus pais e de todos os momentos bons que haviam passado juntos nas Uivantes. Com todas as forças que tinha, se amaldiçoou por ter uma memória tão boa e implorou para que Wynlla, a Deusa da Magia, lhe tornasse uma pessoa mais distraída.

Quando, por fim, sua mente lhe deu trégua, ele caiu de joelhos no chão, em estado de choque, perplexo o suficiente para esquecer que deveria respirar para se manter vivo. A voz do irmão seca do irmão o trouxe novamente para a realidade.

– Sim, – Completou Kurt, desviando o olhar de todo o sofrimento do irmão. – ele vai passar na nossa casa.


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