Courage escrita por Luna Bergamo


Capítulo 5
Capítulo 5


Notas iniciais do capítulo

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Finn

Focado nos estudos de teatro e no trabalho, vi os próximos meses se passarem com rapidez. Eu vivia uma época produtiva, - recebi convites para várias audições e até fui aprovado para interpretar um figurante em uma produção off-Broadway -, mas eu conseguia manter o equilíbrio de minhas prioridades. Viajei algumas vezes para visitar os meus pais em Ohio e mantive com Rachel a nossa tradição de passeios nas noites de sábado na cidade.

Durante esse tempo, Rachel se tornou uma amiga muito querida. Eu amava passar as horas ao seu lado, apenas conversando sobre a vida. Ela não costumava falar muito, mas sempre me ouvia com atenção quando eu falava sobre o trabalho e a minha carreira no teatro. Rachel também era bastante engraçada quando queria. Ela gostava de tirar sarro de mim quando íamos para algum lugar com música e eu acabava mostrando a ela a minha péssima capacidade para dançar. Às vezes, Rachel pedia para D. Clotilde colocar alguma música para tocar na antiga vitrola da pensão e ela então dançava ao redor da sala, de mãos dadas comigo, enquanto tentava insistentemente me ensinar alguns passos de dança.

Rachel também possuía um coração de ouro. Não era incomum vê-la ajudando os hóspedes mais idosos da pensão em suas necessidades e mesmo que ganhasse apenas o salário do restaurante, Rachel sempre presenteava todo mundo nos aniversários. Percebi com a sua convivência de que não havia conhecido muitas pessoas como ela durante a minha vida. Rachel era uma pessoa especial , assim como a sua falecida mãe, e também encantava qualquer pessoa que estivesse ao seu redor. D. Clotilde e os outros hóspedes da pensão adoravam-na imensamente. E eu também.

Quando chegou o Dia de Ação de Graças, meus pais aceitaram o convite de D. Clotilde e viajaram para Nova York para passarem o feriado na pensão. Fizemos um jantar suntuoso, muito melhor que qualquer um que o senhor George servia em seu restaurante, e nosso peru ficou tão grande que mal coube no forno. Rachel enfeitou a pensão toda com decorativos artesanais para a festa do feriado. Ela fez uma linda coroa de flores com um enorme laço de Ação de Graças colado e também produziu a peça central da mesa, que ficou tão bonita que D. Clotilde pediu que produzisse mais daquele tipo para que colocasse na pensão nos próximos dias.

O jantar decorreu com bastante animação. Todo mundo tinha histórias engraçadas para contar, principalmente o meu pai, que não perdia uma chance de contar a alguém o que costumava aprontar durante o seu tempo de colégio. Rachel, como sempre, era a mais calada do grupo, mas vi como os seus olhos brilhavam naquela noite. Talvez ela não tivesse passado um feriado assim há muito tempo.

Depois do jantar, D. Clotilde colocou algumas músicas para tocar em sua vitrola. Meu pai e minha mãe começaram a dançar e chamei Rachel para se juntar a mim na pista de dança improvisada.

–Você parece mais feliz. – eu disse, sorrindo também para ela. A música que estava tocando era bem lenta, parecia uma canção de ninar. Ela enlaçou os braços ao redor do meu pescoço e eu a toquei na cintura, enquanto balançávamos os nossos corpos suavemente.

–Faz muito tempo que não passo um feriado assim.

–Eu também. – eu disse, olhando discretamente para meus pais dançando. – Mamãe e papai costumam ficar tristes nos feriados. A falta que Kurt faz sempre aumenta nessa época. Nunca os vi tão felizes como hoje.

Rachel sorriu triste.

–Seus pais são incríveis, Finn.

–Sim. Eu tenho sorte.

Os olhos dela se encheram de lágrimas e ela encostou a cabeça em meu peito. Seu corpo começou a tremer e acariciei seu cabelo, sabendo que ela havia se lembrado da mãe e estava chorando. – Está tudo bem, Rachel.

Ela se acalmou depois de um tempo e olhou no fundo dos meus olhos.

–Nesse dia de Ação de Graças, sabe qual é a coisa pela qual eu sou mais grata?

–Não.

–Você.

Sorri timidamente para ela. Não estava esperando ouvir isso.

–Também sou grato a você.

Se o disco não tivesse começado a chiar, eu e Rachel iríamos dançar a noite toda. Olhei para ela quando nos afastamos, observando-a conversar com a senhora Walters no sofá. E pela primeira vez, achei Rachel imensamente linda. Como as montanhas, o sol e o mar.

–Ela é uma moça muito bonita. Mas a alma dela é ainda mais bela. – D. Clotilde se aproximou de mim, observando Rachel comigo. – Sempre achei que vocês dois formam um bom par.

–Não fale bobagens, D. Clotilde. Eu e Rachel somos apenas amigos.

–Não foi isso que pareceu quando vocês estavam dançando.

–Estávamos apenas dançando.

–Mas havia mais alguma coisa, não acha? Parecia que vocês estavam em um mundo diferente do nosso.

Até então, eu nunca havia me apaixonado por alguém, e achei que o que D. Clotilde estava falando era uma bobagem.

–Em meus setenta anos de vida, eu nunca tive a sorte de viver um amor. Mas mesmo assim aprendi a reconhecer quando algo especial acontece perto de mim.

Olhei para ela sem dizer nada.

–Você ainda é muito novo para entender isso. Mas tente me escutar, tudo bem?

Dei uma risada.

–Isso é uma bobagem. – eu disse.

______________________________________________

Na hora de dormir, ofereci meu quarto para meus pais passarem a noite e fui dormir na sala de estar. O sofá era muito pequeno para mim, então me deitei ao tapete fofo e cobri-me com o pesado cobertor, enquanto aproveitava a temperatura maravilhosa que o aquecedor proporcionava no cômodo. Já estava começando a dormir quando ouvi passos em direção à cozinha.

–Oi, você. Veio assaltar a geladeira? Acho que sobrou um pouco do pavê. – eu disse, provocando um susto em Rachel. Ela falou um palavrão baixinho, colocando a mão ao peito, e soltou uma risada logo em seguida.

–Claro que não. Estou tão cheia que não consigo dormir. Só vim pegar um pouco de água. – ela respondeu, aproximando-se de mim. – O que está fazendo deitado aí?

–Ofereci o quarto para os meus pais. E sou muito grande para dormir no sofá.

–Entendo. Quer que eu venha dormir com você?

–Se não se importar em dormir no tapete.

–Claro que não. – ela disse, antes de sair para pegar as coisas no quarto.

Rachel voltou com um travesseiro e um cobertor. Deitou-se ao meu lado, um pouco distante de mim.

–Essa pensão me dá calafrios às vezes. Você também escuta esses estalos estranhos? – ela disse, com o olhar fixo no teto.

–Sim. Você sabe da história desse lugar, não sabe?

–Não.

–Um homem chamado James Capshaw e sua esposa e filhos moravam aqui antes de D. Clotilde transformar essa casa em uma pensão, há quase quarenta anos. Eles eram donos de uma das maiores fábricas de chocolate do país, então eram muito ricos. Mas depois de um tempo, a companhia faliu e a família ficou devendo dinheiro para muita gente. Até que certa noite, quando toda a família dormia, um homem misterioso carregando uma foice arrombou a casa e matou a todos. Até hoje ninguém sabe quem fez isso, mas há suposições de que o criminoso foi um empresário que a família pediu empréstimo, que acabou falido depois que a fábrica da família Capshaw quebrou. Mas ninguém conseguiu provas até hoje. E se você prestar muita atenção, Rachel, vai ouvir algumas vozes pedindo socorro, ecoando pelos cômodos da pensão.

Rachel se sentou agarrada ao cobertor, enquanto olhava para mim com uma expressão de medo no rosto.

–Você não está falando sério. Por que D. Clotilde iria comprar uma casa onde aconteceu um crime desse tipo?

–Talvez ela fosse a única disponível na época.

–Não acredito em você.

–Tudo bem. Mas é a verdade. – eu disse, virando as costas a ela e tentando não cair na gargalhada. Percebi que Rachel ainda estava sentada, olhando para mim, e voltei-me a ela de novo. – Você não vai dormir?

–Vou. – ela se deitou entre os cobertores e ficou encarando o teto com o mesmo ar de apreensão.

–Você está com medo, não está?

–Não.

–Uhum.

–Eu não estou com medo, Finn.

–Tudo bem, Rachel. Boa noite.

Fechei os olhos enquanto reprimia uma risada. De repente, senti Rachel bater com o travesseiro em meu rosto.

–Você está rindo de mim!

–Não estou!

–Sim. Está sim. – ela falou, irritada. – Você estava mentindo, não estava?

Sem conseguir aguentar, fiz que sim com a cabeça e caí na gargalhada. Rachel continuou a bater com o travesseiro em mim até se cansar e depois começou a rir junto comigo.

–Meu Deus, Finn! Isso não tem graça!

–Sim, tem sim. Você está rindo também. – eu disse, enxugando o canto dos olhos. – Você devia ter visto a sua cara.

–Claro, eu fiquei com medo de verdade!

–Aposto que não vai conseguir mais dormir.

–Não vou, não. Agora vou ficar com essa história na cabeça o tempo todo.

–Ah, calma. Estou aqui com você.

Ela sorriu para mim e colocou a coberta e o travesseiro para mais perto de onde eu estava. Deitou o corpo ao meu lado e admirei quando seu enorme cabelo castanho cascateou pela a fronha do travesseiro.

Rachel ainda sorria ao olhar para mim.

–Eu queria falar com você algo e só fui me lembrar de lhe contar quando me retirei para dormir mais cedo.

–O que?

–Acho que vou voltar a estudar. Pelo menos tentar me graduar no colégio.

Sorri de orelha a orelha.

–É sério? Isso é incrível, Rachel. Mas como vai fazer isso?

–Uma colega do trabalho fez um curso supletivo há alguns anos e acabou me indicando. Ela disse que é muito bom e até conseguiu ser aceita em uma faculdade no ano seguinte após conseguir o diploma escolar. Vou começar no ano que vem, se tudo der certo.

–Fico feliz que você tomou essa escolha.

–É, eu também. – Rachel olhou para mim emocionada e então retornou a encarar o teto. Ela ficou quieta por um tempo e quando voltou a falar, sua voz estava embargada: - Finn, você já amou alguém?

–Que tipo de amor você está falando? Como o meu pai ama a minha mãe?

–Sim.

–Não. E você?

–Eu também não. Por um tempo, pensei que amava Brody. Louco, não é? – ela disse com os olhos cheios de lágrimas. Não queria que Rachel continuasse a falar sobre aquilo, pois ouvir o quanto ela sofreu nas mãos daquele homem sempre me incomodava profundamente. Mas não a impedi de continuar falando. –Eu achava que ele era diferente dos outros homens com os que eu convivia no bordel. Ele dizia que me amava e prometeu que um dia me tiraria do bordel para nos casarmos. Eu era tão boba... e desesperada para ser amada por alguém.

–E também muito nova. Sofreu coisas que nenhuma criança ou adolescente deve sofrer.

–Sim. – ela disse, com as lágrimas banhando o rosto. – Às vezes acho que eu não deveria ter nascido. Mamãe sofreu tanto tentando me sustentar.

–Você não pode falar isso, Rachel. Sua mãe a amava.

–Eu sei.

Rachel não disse mais nada e busquei a sua mão entre as nossas cobertas.

–Você ainda vai ser muito feliz, Rachel.

Ela olhou para mim.

–Eu sei disso, Finn.


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Notas finais do capítulo

:)



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