Silver Snow ESPECIAL DE NATAL DO TAP escrita por Matheus Henrique Martins


Capítulo 5
Apelando O Favor




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Mais tarde naquele mesmo dia, estou em frente ao meu espelho de borda dourada no centro do meu quarto. Consigo ouvir as risadas de Roger vindo do próprio quarto dele.

Provavelmente rindo de algum programa de TV patético. Olho mais uma vez o meu reflexo decente. Agora uso blusa listrada azul escura e calça jeans apertada. Acho que estou normal o bastante para encontrar Henrique.

Penso nisso por um momento e o flash de Rael desviando o olhar para mim no corredor faz meu estomago revirar. Por que ele tem que ser tão idiota sempre?

– Vai sair filho? – minha mãe irrompe dentro do quarto segurando o cesto de roupas. Seu cabelo loiro esta preso em um coque acima da cabeça e ela tem uma expressão um pouco cansada.

– Vou sim – murcho na frente do espelho, na espera de que ela logo me diga que eu não vou a lugar nenhum e comece a rir de mim.

Ela sorri e fica atrás do meu reflexo, me olhando de um jeito um pouco estranho.

– E aonde seu namorado vai te levar hoje?

Desvio o olhar dela e fecho a cara.

– Não vou sair com Rael hoje – respondo.

– Não? – ela franze a testa. – Vocês terminaram?

– Não – digo isso em um tom vago. – Só brigamos.

Sua expressão fica condescendente.

– Ah – ela sorri de um jeito cansado. – As brigas. Eu sei bem como é.

Viro-me de frente para ela.

– Ok, desisto. Pode jogar quanto você quiser, não vai adiantar.

– Por que diz isso? – ela questiona.

– Não são apenas as brigas– tento explicar. – Ele é muito ciumento.

Os lábios dela forma uma linha rígida.

– Eu não posso falar com uma alma viva na esquina ou na escola que ele começa a pirar e fazer showzinho de drama.

– Ciúmes é uma coisa poderosa – ela começa a dizer. – Lembro até hoje que seu pai sempre teve muito.

– De você?

– De você – ela responde.

Meu rosto esquenta e sinto um leve arrepio no alto da minha espinha. Do que ela esta falando?

– De mim? Mas por quê?

Ela me olha de um jeito interrogativo.

– Se lembra de Kayla e Brand Johnson?

Penso um pouco e um flash de dois adultos dizendo o quanto sou fofo e apertando minhas bochechas enche minha mente.

– Lembro sim Eles meio que são parentes distantes, não é? Não costumavam vir muitas vezes, certo?

– Só apareceram duas vezes, sim – ela assentiu.

– O que têm eles?

– Seu pai não ia muito com a cara deles. Os Johnson’s eram muito apegados a você. Diziam que você era uma criança muito linda e até mesmo brincavam que queria te levar para a casa de veraneio deles, para brincar com a filha mais nova deles.

Mudo o peso do meu pé.

– E qual era o problema com isso? – questionei. – Eles só estavam brincando.

Ela me encara de um jeito preocupado.

– Eles só estavam brincando, certo?

– Acha que seu pai se importava com isso? – ela riu sem nenhum humor. – O ciúme só nós cega, Rafael. Ele é um sentimento poderoso e distorce as coisas para nos deixar nervosos... – ela se interrompe, suspirando alto.

– Por isso os Johnson’s não nos visitam mais? Por que o papai sentiu ciúmes de uns estranhos?

Mamãe ri um pouco nervosa.

– Pra você ver até onde o ciúme pode ir. É por isso que Rael esta passando agora, filho. O ciúme o esta deixando louco e fazendo com que ele veja coisas que nem sequer existem. Ele esta com medo. Ele se sente ameaçado.

– Mas por que ele se sente assim se eu não vou fazer nada para magoar ele? Nunca fiz, aliás.

– Essa é a questão – ela exclama os olhos, azuis brilhando de inteligência. – Ele não sabe e a duvida disso esta acabando com ele.

Fico sem palavras absorvendo o que ela diz e na deixa escutamos uma buzina do lado de fora.

– Quem será? – minha mãe olha pela janela, confusa.

– Meu Deus – levo minha mão à boca. – Ele veio mesmo.

– Quem?

Não responde e desço as escadas correndo. Na frente de casa o Mustang preto de Henrique esta estacionado no meio-fio. Quando me percebe na varanda, seus olhos escuram me encaram e ele suspira por um segundo.

Balanço a cabeça enquanto vou andando até seu carro.

– Não acredito que você veio mesmo me buscar – cruzo os braços. – Você ficou louco, Henrique?

– Não – seu tom é honesto. – E eu disse que ia passar na sua casa.

– Sim, mas não disse que ia me levar! – exclamo.

Ele balança a cabeça e então sorri de leve.

– Não ia dar no mesmo? – questiona. – Olha, entra no carro. Chegaremos mais rápido no Dropcoff.

– Disso eu tenho certeza – ironizo. – Com um carro desses – assovio.

– Valeu – ele toca no volante. – Meu pai me deixa usar pra coisas importantes.

Franzo a testa.

– E ir comigo até o Dropcoff pra discutir sobre a surpresa para sua namorada é importante?

Ele dá de ombros.

– Depende – ele me avalia. – É isso mesmo que quer fazer hoje?

Fico confuso com sua pergunta e ele ergue uma sobrancelha escura em resposta.

– O que mais eu faria?

Ele não responde e ficamos um tempão nos olhando até que ele rompe o silencio.

– Apenas entra no carro – ele pede em um tom gentil. – Prometo que não vai doer fazer isso.

Estou prestes a dizer que sim, mas então penso no que Rael iria pensar disso. Como minha mãe disse, o ciúme faz com que ele pense em coisas que não existem. Entrar no carro do motivo da nossa briga patética com certeza aumentaria isso.

Mas então me lembro de que ele já não confia em mim de qualquer forma e entro pela outro lado, no banco do carona.

– Eu não posso voltar muito tarde – vou logo dizendo. – Então melhor que sejamos rápido.

– Não se preocupe – ele sorri pra mim. – Pode confiar em mim nisso.

Suas palavras fazem com que eu fique embasbacado, mas tento disfarçar o máximo que posso.

– O que esta esperando? – questiono enquanto ele ainda esta me olhando. – Dirija!

* * *

Quando chegamos ao Dropcoff, procuramos uma cabine de quatro lugares e esperamos pela garçonete confortáveis nos bancos macios. O lugar hoje não está tão cheio hoje, mas também não está vazio. Uma moça acima do peso esta no balcão, comendo um bolo vegetariano. Em uma cabine próxima, duas garotas que parecem ter saído da academia tiram fotos e fofocam. Na cabine em frente a nossa, um idoso solitário fala ao telefone, baixinho.

Vou me adaptando ao lugar pouco a pouco e procuro algo para olhar. A decoração do lugar é vermelha, mas não é isso que me chama atenção. Henrique esta na minha frente, tirando a jaqueta preta e a acomodando no banco ao seu lado. Por baixo jaqueta, sua camiseta tem a mesma cor do local.

– Gosta disso? – ele me pergunta de repente.

Pisco surpreso e ergo o olhar para o seu rosto que me encara de volta.

– Desculpa – chacoalho a cabeça. – Não entendi a pergunta.

– Gosta da cor? – ele aponta para a camiseta.

– Acho legal – faço que sim e faço um gesto para interpretar a cafeteria inteira. – Você definitivamente esta no tema.

Ele ri e faço o possível para acompanhar seu humor.

– Então – ele cruza as mãos no meio da mesa. – Qual é o seu plano?

Fico aliviado por ele perguntar isso e me lanço no assunto. Vamos finalmente falar sobre a surpresa de natal que ele esta planejando para a namorada, que é uma vadia, mas prefiro falar disso a que qualquer outra coisa.

– Eu estive pensando em uma coisa – começo a dizer. – O que acha de se vestir de Papai Noel e entrar pela chaminé da casa dela?

Henrique faz uma careta.

– Primeiramente, ela não tem uma chaminé. E segundamente, ela não acredita no Natal.

Dou de ombros.

– E daí? Apenas entre na casa dela, pode até se esgueirar no quarto dela, se for preciso. O importante é que ela fique surpresa. E, aliás, quase ninguém acredita no Natal.

– Eu acredito – ele defende, se recostando no banco. – Você não?

Abro a boca para responder, mas então balanço a cabeça.

– O que foi? Vai me dizer que não acredita?

– Não é isso. É que, sinceramente Henrique, sem querer ser rude, mas devíamos falar apenas da surpresa para a Taffara. É sobre isso que viemos falar, lembra?

– Claro que sim – ele dá de ombros e cruza os braços na mesa, se inclinando para frente. – Mas você não respondeu minha pergunta.

Faço uma cara de paisagem para ele. Foi desafio o que eu detectei no tom dele?

– Tudo bem, você ganhou – suspiro. – Eu não acredito. Agora vamos falar sobre a surpresa...

– Como não pode acreditar nisso? – ele exclama. – Natal é a época mais feliz do ano. Como pode não acreditar no clima eufórico com tantas donas de casa em fazer a ceia e os enfeites luminosos por toda a cidade?

– Sabe no que eu não acredito?

– No que?

– Em que você esta falando no Natal! – exclamo. – Logo você, o jogador de futebol do time titular e o garoto mais popular da escola inteira.

– O que isso deveria significar? – ele me olha com atenção.

Estou prestes a responder, quando a garçonete nos interrompe parando na frente da mesa. Ela nos entrega o cardápio e eu recuso, pedindo apenas um café. Henrique me olha surpreso e pede um Sundae de Framboesa.

Ela se afasta depois de anotar nossos pedidos e nos olhamos ao mesmo tempo.

– Você pediu um Sundae de Framboesa?

– Você pediu um café? – ele imita meu tom de condenação.

– Café é perfeito em uma hora dessas – defendo. – Quem é que pede um Sundae de Framboesa à noite?

– Eu – ele aponta para o próprio peito. – E pediria até mesmo se estivesse de madrugada.

Balanço a cabeça, muito surpreso pra dizer alguma coisa.

– Não me olha assim – ele mostra a língua para mim. – Você vai pedir logo depois, acredite em mim.

– Duvido – reviro os olhos. – Isso só comprova minha teoria.

– Que teoria?

– Você é louco e é um jogador de futebol popular que não dá a mínima para nada – respondo, mas então recuo. – Sem ofensas, claro.

– Eu dou a mínima sim – ele nega. – Olha só, estou em uma cafeteria na quarta-feira à noite falando sobre fazer uma surpresa para minha namorada na semana que vem.

– E você falou disso – concordo. – Por três segundos.

Ele bufa.

– Você fala como se soubesse algo de mim, Capoci.

– Eu sei do que eu estou falando. Você é um jogador de futebol popular que não liga pra nada e faz o que dá na telha.

– Não faço não – ele me olha nos olhos. – Se fosse assim, eu já teria feito.

– Feito o que?

A garçonete chega com o Sundae de Henrique e meu café. Depois disso, sai rebolando e Henrique a acompanha com o olhar.

– Ela é uma delicia, não é? – ele pergunta.

Faço cara de paisagem mais uma vez.

– Nossa, desculpa – ele bate na própria testa. – Você não...

– Não, não gosto - suspiro. – Já disse antes, Henrique. É só dizer Gay, ainda não é um palavrão.

Quando digo isso, as duas garotas da academia se viram para me olhar. Apenas ignoro, mas Henrique as olha de volta.

– Querem um pouco? – ele oferece o Sundae.

Uma delas faz que não educadamente com um sorriso.

– Então parem de olhar, droga – ele retruca.

Olho para ele com surpresa, mas ele apenas se ajeita no banco e começa a provar seu Sundae.

– Valeu, mas eu não precisava disso – comento em um tom baixo.

– Eu não disse que precisava – ele fala com a colher perto da boca. – Só fiz.

Estou prestes a dizer algo mais, porém ele geme de prazer e aponta para o Sundae.

– Cara, isso é tão bom.

Toco as laterais da minha xicara e beberico o café quentinho.

– Imagino que sim. Taffara gosta de Sundaes?

Ele para de mastigar e me olha de baixo.

– A Taffara? – ele pergunta. – Ela não come sorvetes. Acha que engorda.

Por que não estou surpreso?, uma voz dentro de mim canta.

– Então acho que ela não vai assar cookies para o Papai Noel, imagino.

– Acho que o máximo que ela vai fazer é levar uma bebida.

– Levar? Aonde?

– A minha casa – ele responde naturalmente. – Sabe, como é natal, nós combinamos de fazer, depois que entregarmos os presentes.

Não preciso perguntar a ele o que eles vão fazer.

– A sua surpresa vai ser antes, não é?

– Não – ele me olha nos olhos. – Minha surpresa vai substituir o que ela quer fazer.

Fico embasbacado enquanto ele continua provando o Sundae com um olhar admirado.

– Como assim substituir?

– Exatamente o que quer dizer – ele ergue o olhar. – Estou planejando essa surpresa pra distrair ela dessa coisa toda de sexo – ele explica simplesmente.

– E você não quer fazer? – pergunto com cuidado.

Ele me encara confuso.

– Fazer o que? – ele zomba.

– Sexo – digo e dessa vez todos olham.

– Não, não quero – ele responde.

– Por que não? – dou uma risada nervosa. – Ela é a sua namorada e quer fazer sexo com você.

– Tá, e isso significa que eu tenho que querer também?

– Obviamente – digo.

– Bom, eu não quero transar com ela – ele me olha nos olhos. – Não com ela.

Fico ainda mais confuso do que antes e não consigo tomar vontade para tomar o café.

– Não estou entendendo – me lanço para frente. – Achei que essa reunião era pra fazer uma surpresa a sua namorada. Que você deveria gostar.

– E é – ele fica confuso também. – Quem disse que eu não gosto dela?

– Você acaba de me dizer – eu o lembro. – Você não quer transar com ela.

Ele me olha em silêncio por alguns segundos antes de responder.

– Relaxa, Capoci – ele pede e eu noto que minhas mãos estão tremendo em cima da mesa. Recolho-as devagar. – Eu não estou traindo minha namorada. Só não quero transar com ela.

Suspiro aliviado.

– Desculpa, é que uma coisa inacreditável de se ver.

– O que?

– Um cara não querendo – me interrompo. – Fazer com a própria namorada.

Ele simplesmente dá de ombros.

– Não tem nada demais nisso – ele sorri. – Não precisa ficar surpreso.

Faço que sim com a cabeça e encaro o centro da mesa.

– Quer um pouco? – ele me pergunta, apontando o Sundae.

Abro a boca para dizer não, mas então olho primeiro sua expressão inocente e sorridente, depois o Sundae delicioso pela metade.

– Quer saber? – sorrio de volta. – Quero sim, só vou pedir uma colher à garçonete.

Faço menção de levantar, mas ele me impede me puxando pelo braço.

– Pode pegar a minha – ele me oferece a colher.

Seu olhar ainda é inocente e tento ao máximo não ver maldade no gesto. Pego o copo do Sundae e começo a provar.

– E então – ele volta a falar enquanto eu como. – Sobre aquela surpresa...


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