Mardy Bum escrita por Hiero


Capítulo 1
And you’ve got the face on! - Único


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem! Tive de fazer outra fic porque marquei a "One for the Road" como concluída etc. Dedico a todos vocês que leram o "capítulo 1" da história dos dois. Muitíssimo obrigada!
O título do capítulo vem da própria “Mardy Bum”.



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Começar um relacionamento com a Arabella foi a coisa, ao mesmo tempo, mais inteligente e mais estúpida que eu já fiz em toda a minha vida. O temperamento daquela garota é a coisa mais frágil do mundo. Com qualquer coisinha errada que eu fizer, ele vai quebrar. E ela vai resolver atirar os cacos que sobrarem disso em mim.

Talvez eu deva dar um exemplo mencionando a vez em que eu me atrasei. Pode parecer algo que todo mundo já presenciou com a namorada, e é. Pelo menos é o que meus amigos comprometidos me disseram quando assumi estar namorando a Arabella para eles.

...

Era uma tarde um tanto cinzenta, e ela tinha me convidado para ver uns filmes de faroeste, porque segundo a própria, era o que ela fazia para “tingir a solidão”. Eu sentira um sarcasmo na voz dela, mas não tinha ligado para isso, porque era dela que estávamos falando. Pegara minha jaqueta e saíra correndo para a estação de metrô, mas aquela porra estava tão cheia que acabei perdendo o desgraçado — tanto de vista quanto o horário do embarque. Daí, eu resolvi ir atrás de um táxi, porque é o que carinhas da classe média alta fazem quando perdem o metrô.

Eu nunca me arrependi tão amargamente quanto naquele momento.

Talvez porque minha casa é muito perto de uma estação e eu ia a pé mesmo, eu não tinha precisado encarar o trânsito antes. E só quando eu me vi num táxi é que percebera como a cidade toda parecia ter simplesmente parado de repente. Os carros se moviam tão devagar quanto pecinhas de Tetris. E, além disso, a bateria do meu querido celular tinha acabado. Eu não deveria ter jogado tanto Candy Crush, era esse meu pensamento. Sentia que iria ter meu pescoço arrancado pela coitada da Arabella, que já deveria estar plantada no apartamento dela há horas. E foi o que quase aconteceu.

Quando finalmente o táxi chegou no prédio dela, além dos quase quarenta dólares que eu tive de pagar pela corrida, já eram cinco da tarde, e ela tinha me ligado muito antes. Não sei dar horários, mas eu sei de algo: eu tinha me ferrado.

Apertei apressadamente o botão do oitavo andar no elevador e esperei. Claro que algum idiota deveria ter chamado aquele troço em todos os andares, porque não era possível. Era Alex Hill contra o mundo, mas nem de longe a minha Ramona era fofinha como a do Scott.

Quando eu bati à porta, recebi um grito como resposta:

— ONDE DIABOS VOCÊ ESTAVA? — Oh, senhorita Arabella, que bela recepção. Você é uma verdadeira lady inglesa. Não é à toa que é até imigrante de lá, querida.

— Eu sei que tô atrasado, cacete! Vai pelo menos deixar eu entrar para contar a história? — berrei em resposta. Eu já estava sem paciência, também. — Ou vou ter de arrombar a merda dessa porta?

— Entra. Só entra. E não fala mais nada.

Eu entrei, e ela fechou a porta assim que me sentei.

— Pronto, queridinho. Pode começar a pensar em uma desculpa.

— Seria convincente para você dizer que perdi o metrô e depois o trânsito estava uma coisa horrível? Os meus ouvidos estão zumbindo até agora com todas essas buzinas!

— Ah, coitadinho de você — satirizou. — Não teve tempo de pensar em nada melhor? — E então ela fez aquela cara. A sua cara clássica de desapontamento silencioso, que eu conhecera bem antes de começarmos a namorar. Mas esse tempo todo não me ajudou a suportar aquela visão dela chateada. E, principalmente, comigo.

— Vai apelar pra essa cara agora? Pelo amor de Deus, Arabella. Você sabe que não vai conseguir tudo o que quer só com essa cara. — Tentei parecer indiferente, mas minha vontade era de chorar. Reafirmando, eu odiava vê-la assim.

Ela abriu um sorriso tímido.

— É, pode até ser, mas ainda não acredito na sua história, babaca. Se você ao menos aparecesse montado num pônei voador cor-de-rosa... — O sorrisinho de canto de boca dela se abriu e se transformou numa risada. Uma risada verdadeira, do jeito que eu gostava. Era assim que eu queria que ela fosse. Para sempre.

— Ah, mimadinha, você é legal quando quer. Esse é o seu lado que eu dou mais preferência.

— Mimada é a mãe, filho da puta. — Apesar das palavras, ela riu e me deu um tapa nas costas. Forte.

— Ai! — deixei escapar. — Você é má, garota. Essa doeu.

— Era pra doer mesmo.

E foi nesse clima que acabou mais um episódio da nossa trama.

...

Mas eu sinto que esse não foi um bom exemplo para representar o quanto eu gosto da filha-da-putice da Arabella, não. Melhor seria eu dizer o que aconteceu bem lá no início, quando a situação desagradável partiu dela, e não de mim: ela estava casualmente andando comigo no parque e simplesmente aconteceu essa historinha aqui:

...

OK, era outra tarde, mas essa era mais chuvosa do que cinzenta. E a gente, reafirmando, estava andando no parque como um casal comum de jovens adultos faria, e ela estava lá, feliz e contente, tomando um sorvete. A Arabella é dessas coisas de tomar sorvete na chuva, sim. E ela encheu o saco do sorveteiro para ele vender aquela merda para ela em uma tarde chuvosa. (Primeiramente, segundo ela, “essa espelunca nem deveria estar aberta nesse clima, cara”) Eu era quem fazia o papel do cavalheiro segurando o guarda-chuva para ela, né?

Mas daí, o problema se desenrolou.

Tinha simplesmente uma poça de água gigante e alguma criança retardada estava lá pulando que nem, é, uma criança retardada. Colocando a cereja no bolo da desgraça, você tem uma Arabella que não olha por onde anda. E se consuma o desastre.

O que aconteceu, em poucas palavras, foi: nossa amiga estava toda concentrada na delícia gelada que segurava, a criança retardada estava bem na frente dela, eu tentei avisar e ela não viu, trombou com a criança e, bônus, a poça fez ela cair no meio do parque. Com força. O sorvete, aquele filho da putinha, ainda sujou a camiseta dela.

Me ajoelhei ao seu lado.

— Ah, merda — ela disse entredentes, tentando parecer que não estava nem aí para sua condição, mas o seu olhar não escondia o que sentia. Ela parecia prestes a chorar. — Acho que eu quebrei alguma coisa. — O seu braço esquerdo estava ali, num ângulo improvável, praticamente estirado no chão. Não era uma fratura exposta. Então, o mais adequado seria fazer uma radiografia correndo e a gente iria saber o que diabos aconteceu.

— Percebi — ri.

— Não tem graça, sabia? — Ela tentou me dar um tapa com o outro braço, mas eu me levantei na mesma hora. — Ah, cara. Você deprime a sua namoradinha. Deixa ela te estapear, vai.

— Tá louca? Isso é violência doméstica. Direitos já!

Ela riu, mas percebi a dor na risada dela.

— Por quanto tempo você vai me deixar caída aqui, filho da puta? Faz alguma coisa! — A risada se transformou numa cara emburrada de repente. Típica atitude dela. Aquela cara era quase como olhar para o cano de uma arma que iria disparar, mas graças a Deus, o tiro não mirava na minha testa, dessa vez.

— Meu Deus, calma.

— Fácil pra você falar, né, seu desmiolado? Não é você que está aqui, no meio de um parque na chuva, com um braço quebrado, tentando articular um diálogo com o seu namorado e quase chorando.

— OK, você tem um ponto, tá certo. Você pelo menos tem alguma consciência de quais hospitais o seu plano de saúde cobre? Hein?

— Me leva a qualquer lugar.

— Não é assim que as coisas vão se resolver. Só responde, mimadinha.

— Porra, cê gosta dessa palavra, hein? OK, deve ter aquele da Seventh Avenue. Manhattan, você sabe.

— Me dá um nome.

— Se vira! — Eu encarei, sério, aqueles olhos verdes pontilhados pelas lágrimas. — OK, então, sr. Exigência. Tenta o Metodista, vai. Já fui lá uma vez na vida e, hm, deu certo. Só vai logo.

Me irritava muito que ela não mudasse a pose mesmo naquela situação, mas eu sabia que tinha praticamente me inscrito para aquilo. Eu peguei o outro braço dela com cuidado e foi meio assim, ouvindo o choro baixinho dela e suas exclamações de dor, que caminhamos até o carro. Minha maior vontade era de morrer vendo ela assim. Ué, ela podia ser tudo aquilo, mas ainda era a Arabella. A minha namorada. A melhor — e a pior — garota do mundo. Era essa a vida que eu tinha escolhido.

Mas a história não acaba aqui.

[...]

Lá no hospital, eu fui obrigado a assistir todo o processo das radiografias, e graças a Deus, nenhuma merda maior tinha acontecido. Só que tem a clássica historinha do gesso por eu-não-sei-quantas semanas. E daí que foi o negócio. Sem ninguém na casa dela, sobrei.

Fiquei um tempo lá e você pode achar que foi a maior conquista do mundo ficar na casa da sua namorada sem ninguém mais, mas tenta ficar na casa da sua namorada com um braço quebrado e vê se você vai gostar disso, amigo. Além do mau humor habitual dela, eu virei a sombra daquela garota.

E quem disse que aquilo me incomodava?


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Notas finais do capítulo

O que acharam?

Quem pegar todas as referências, novamente, vai ganhar um doce, um abraço e todo meu amor.