Eu já conheci muita gente estranha na minha vida, até mesmo eu me considero uma pessoa estranha por às vezes fazer coisas idiotas involuntariamente. Mas Gaah conseguiu ser ainda mais estranho.

– Oi! Você veio mesmo! – Ele disse assim que me viu na lanchonete. Estava sentado em uma mesa brincando com alguns canudinhos coloridos. Ele vestia um casaco marrom por cima de uma camisa azul e uma bermuda jeans, que o deixavam ainda mais bonito do que era.

– É claro que eu vim, você vai me dar comida não é mesmo?

– Sim, sim...- ele riu. – Então, vamos?

– Vamos para onde?

– Para a minha casa, oras! Fica do outro lado da rua.

– Mas a gente não vai fazer o trabalho aqui?

– É claro que não! Tem muita gente, a Lisa fica assustada.

– L-Lisa?

– Sim, Lisa vai nos ajudar com o trabalho!

Na minha imaginação, Lisa poderia ser qualquer coisa do mundo, a mãe, uma irmã, uma tia, uma prima... menos o que ela realmente era.

Atravessamos a rua e entramos na casa dele. Era uma casinha bonitinha e parecida com a minha, tinha dois andares, sala de estar, sala de jantar.... Subimos as escadas e Gaah me guiou até o quarto dele.

– Desculpa pela bagunça, não tive tempo de arrumar... – Ele sorriu envergonhado e de fato tinha motivo.

Parecia que a Segunda Guerra Mundial tinha acontecido ali. Haviam roupas por todo lado, revistas e mangás por cima da escrivaninha, o notebook estava caído do lado da cama... estava uma nojeira só. Em um canto, ficava um tipo de recipiente de vidro que a principio achei que fosse um aquário...

– O que é aquilo? – Apontei para lá.

– Aquilo onde.... Ah sim, a Lisa fica lá dentro... – Ele andou em direção ao aquário e colocou a mão lá dentro.

– Lisa é uma... - Eu engoli seco ao ver aquilo, minha primeira reação seria gritar se eu não tivesse ficado paralisada.

– Jade, essa é a Monalisa, minha cobra de estimação! Lisa, está é Jade, uma garota chata e irritante que eu conheçi...

Monalisa não dava a mínima pra mim. Ela se enroscava no braço de Gaah e aquilo me incomodava, parecia que a qualquer hora ela podia mordê-lo ou enfoca-lo até a morte...

– V-você não tem medo dela te m-morder?

– Ela não vai me morder! Está comigo desde o ano passado! Além disso, ela não é venenosa...! Pode pegar se quiser...

– N-n-não, valeu, não sou vida loka como você... – Eu me afastei e Gaah riu. – Será que nós podemos fazer o trabalho ou você quer mostrar, sei lá, seu TIGRE de estimação?

– Tigre...Eu já tive um tigre...

– Sério???

– Claro que não, só queria te impressionar!

– Idiota.

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Resolvemos começar a pesquisa no computador da sala de estar, já que o notebook de Gaah estava sem bateria e naquela bagunça nunca iriamos encontrar o carregador (além disso eu não conseguiria me concentrar no trabalho sabendo que no quarto tinha uma cobra me observando). Passamos algum tempo sentados olhando para tela sem muito entusiasmo, até que o loirinho perguntou como quem não quer nada:

– Por que você estava me olhando hoje na hora da aula? ! – Por acaso estava me vigiando?

Meu coração começou a bater mais rápido. Ele tinha percebido? Ai meu Deus!!!

– O QUE? Claro que não! Não estava olhando para você, estava olhando para... para uma amiga minha que estava sentada perto de você...

– Mas não tinha ninguém perto de mim...

– Gaah, cala a boca e termina logo de pesquisar essa droga?

– Estressada como sempre, né, princesa?

– Já falei que não quero que me chame de princesa!

– Me obriga então! – ele me encarou.

– Você é um abusado!

– Você é uma mimada!

– VOCÊ É UM LOUCO QUE CRIA COBRAS!

– E VOCÊ É UMA DESEQUILIBRADA....!!

Nós já íamos começar a brigar de novo quando um rapaz alto vestindo paletó nos interrompe:

– Ei o que discussão é essa?! – Ele fala grosso e me assusta. – Gaah, quem é essa garota?

– É a Jade, ela veio fazer um trabalho aqui e...

– Eu não quero saber! Parem com esse barulho que preciso dormir, mais tarde tenho uma reunião com uma empresa importante e não posso me atrasar!

O rapaz nos olhou torto e subiu as escadas.

– Quem é ele?- perguntei.

– Meu irmão, Dan. Ele é um idiota, não liga para ele... – a expressão de zombador de Gaah se transformou em uma expressão fria, irritada e um pouco triste. Mais ou menos igual a que ele estava quando o encontrei pela primeira vez.

– Era por causa dele que você estava tão irritado no dia que nos conhecemos na escola?

– Sim... ele odeia falar dos nossos pais, por isso quando toquei no assunto naquele dia ele descontou toda a raiva dele em mim e eu descontei em você... Desculpe Jade.

– Tudo bem... você já me deu um lanche grátis da lanchonete lembra?

– Lembro sim. – Ele sorriu por um segundo – você não tem noção do quanto é complicado viver com ele...

– Acho que tenho sim, minha mãe as vezes é uma mala...

– Pelo menos você tem mãe! Nossos pais morreram em um acidente de carro e desde então somos só nos dois e o nosso tio. Por isso passo tanto tempo na lanchonete, eu odeio ficar aqui com ele...

– Sinto muito.

– Não sinta.

Ele ficou um tempo de cabeça baixa e eu resolvi não incomodar. Toda a raiva que eu carregava dele estava se dissipando depois do que ele me disse. Eu sei que não conheço Gaah a muito tempo, mas não imaginava que ele passasse por problemas familiares tão grandes. Fiquei até me sentindo culpada por discutir tanto.

– Vamos voltar para o trabalho? - Ele disse por fim. Eu assenti com a cabeça.