Retrato das coisas que se acham na minha cabeça escrita por Ped5ro
A aparência daquelas palavras não era das melhores, eu sempre me enrolo pra falar coisas importantes, meu coração sempre dispara e meus olhos ardem, meu cérebro pulsa forte dentro do crânio e então fico tonto. Por isso me sentei e sorri sem jeito. Culpei a mim mesmo por aquilo, eu que tinha começado e agora ia terminar, eu não sabia como, mas fiquei imaginando da pior maneira possível. Só queria que não tivesse tanta gente ouvindo cada palavra.
— Qual é o problema? Você mesmo disse que é estúpido, que não tem importância. – ele falou de pé na minha frente.
— Eu digo muita coisa. E mesmo assim, pode ser só coisa da minha cabeça, não vale a pena. – respondi olhando pra cima.
— Todo mundo passa por isso, todo mundo gosta de alguém, não tem problema falar. – falou uma menina de cabelos longos e finos.
— Claro que tem, tem todos os problemas. Vai estragar tudo... Olha, eu sou confuso, não adianta, é sempre assim. Eu não sou comum, não acontecem coisas comuns comigo, apenas isso. – eu disse olhando ele, sempre com o mesmo olhar de curiosa compreensão, daquele ponto de vista agudamente estranho. Mas era mentira, digo, a última parte, eu era confuso, mas a verdade era que, eu era comum, muito comum. Comum demais para as coisas que me aconteciam, por isso não me achava comum algumas vezes, com o tempo eu aprendi a diferenciar uma coisa da outra. Outro fato curioso, porém não tão bom de se observar, é que eu era um só e por isso, ninguém jamais sentiria aquilo do mesmo jeito que eu, com a mesma intensidade, ninguém compreenderia da mesma forma como compreendo o tamanho disso e todo o resto. Sentimos de formas parecidas, mas não iguais, e por não serem iguais, nos tornamos incompreensíveis uns aos outros. Sentimentos podem ter o mesmo nome, podem ser banais ou triviais ou, até, essenciais, podem ser isso tudo, mas não iguais. Como eu disse um pouco antes, sou confuso, não digo que compreendo o que sinto, porque não é assim, mas eu sei que ele não entenderia, porque eu não entendia muito bem, ainda continuo sem entender, só podia visualizar a confusão que isso iria gerar na cabeça dele. Era o que acontecia na minha.
— Você diz como se a gente conhecesse quem é, a gente conhece? É alguém daqui? – ele começou a falar mais animado, tomando meu silêncio como uma afirmativa para todas as perguntas.
— Oh meu d... Você precisa dizer quem é, por favor? Talvez eu possa te ajudar. – ele falou agora sentando do meu lado. Comecei a rir sofridamente, meu coração parecia pequeno demais, tamanha era a velocidade e a pressão do sangue nas minhas orelhas. Meus olhos ardiam.
— É, a gente pode te ajudar. – disse alguém detrás da menina de cabelos longos e finos. Não sabia quem era, eu olhava fixamente o chão. Sentia eles me encurralando contra a parede, metaforicamente falando. Ninguém podia me ajudar, nem eu mesmo podia. Pelo menos, naquele instante, eu queria poder ficar perdido, queria saber o ele pensava sobre mim, passava tanto tempo tentando compreender a mim, que me esqueci dele, logo ele que era a parte mais importante daquilo. Logo eu, então ele.
— Não brinquem comigo. Eu preciso ir. – falei me levantando, então ele se levantou também.
— Pra onde? – perguntou.
— Pra minha casa, eu moro lá. – sorri, não conseguia evitar olhar bem no olho dele e imaginar mil coisas, quase poder ver os neurônios e suas sinapses em milhões e bilhões. Me virei, mas ele me puxou pelo braço.
— Só a primeira letra do nome. Só isso, por favor. – ele implorou, então olhei a volta, todos me encaravam, esperando eu dizer algo com o que poderiam se divertir o resto do dia.
— Okay! Eu vou dizer... Vou falar quem é, mas antes... – apertei o botão do elevador, não queria ficar muito tempo ali esperando depois de dizer tudo que tinha pra ser dito. – Pronto. Queria também pedir desculpas...
— Por que? – ele perguntou, sempre a curiosa compreensão nos olhos.
— Você vai entender... Não foi culpa minha, nem de ninguém, espero que isso passe o mais rápido possível...
— Para de enrolar e diz logo. – alguém disse, e ouvi um pequeno burburinho que assentiu.
— É, diz logo quem é! – ele falou. Queria que ele soubesse que aquilo era terrível, imaginei que fosse acontecer em outras circunstâncias, queria que acontecessem coisas boas depois. Mas não era assim que funcionava.
— É você. – coloquei as mãos no bolso do casaco, estavam geladas. Ele arqueou as sobrancelhas, e de repente ali estava, a olhar de incompreensão, do jeito que eu havia imaginado. – Eu gosto de você, digo... realmente gosto, não sei o que isso pode ser exatamente... Mas assim é mais simples, eu gosto mesmo de você. – me engasguei, como sempre acontece em eventos importantes.
Ouvi, convenientemente, o apito do elevador. Ele permaneceu mudo, mas agora sua expressão tinha se atenuado, só parecia olhar pra mim, para meus neurônios e sinapses, pois meus sonhos, anseios, minhas esperanças... Estava tudo escondido, ou perdido, não sei, nunca tentei encontrar.
— Descendo? – falou o ascensorista.
— Eu sei – respondi e as portas se fecharam. Então o elevador começou a se mover para baixo, sem pausas, parecia eterno, parecia que íamos atravessar o subsolo. Aquela sensação de que minha cabeça iria desgrudar do pescoço, a tontura, fechei os olhos porque ardiam e, agora, estavam marejados.
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