A Sacada escrita por Franiquito


Capítulo 1
A sacada




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/57029/chapter/1

- A-hã.

- Quê?! - ele se exasperou - Como assim "A-hã"?

- Como assim "Como assim 'A-hã'"? A-hã. - ela maneou a cabeça - "A-hã" de "não", oras.

- Ah, por que raios não?

- 'Cê tá brincando, né? Olha para isso! - fez um gesto amplo com as mãos - A gente mal cabe aqui!

- Mas... - ele voltou a sorrir - E a vista?

Ela suspirou, encarando a praça a sua frente.

- É, a vista para a pracinha é linda mesmo. Mas não quero nem ver isso aí fim de tarde... Cheio de crianças. Vai ser uma gritaria infernal!

- Mas eu pensei-

- Pensou errado. - ela rolou os olhos e suspirou - Pela décima vez consecutiva.

O agente imobiliário resolveu se manisfestar.

- Então... Não vão ficar com a casa?

- Não. Eu sinto...

- Se você aumentasse essa sacada alguns metros talvez conseguisse alguém...

Deu meia volta e se retirou, deixando a frase no ar. A única reação dele ante a cara do agente foi um balançar de ombros.

Ele a alcançou no carro.

- Poxa, Gabriel... - ela resmungou dentro do carro já em movimento - Eu te dou toda a confiança existente em mim, e você faz isso?

Maneou a cabeça entre suspiros aborrecidos.

- A culpa não é minha - ele resmungou de volta - se você desperdiça uma chance de comprar uma casa só porque não se agradou da sacada....

- Como assim "só porque", Gabriel? - ela sentou de lado no banco, afim de encará-lo - A sacada é cômodo mais importante da casa!

- Ah, é? - ele provocou, irônico.

- Claro que é! O que é uma casa sem uma sacada? Nada. O que é uma pessoa com uma casa sem uma sacada? Um infeliz! - e jogou-se no banco, cruzando os braços.

- Quanto exagero. Eu vivi minha vida toda em casas sem sacadas, e estou muito bem.

Ela soltou uma risada.

- Ah, não está não! Sabe aquele seu medo de altura? Foi causado pela falta de uma sacada! Se você morasse numa casa que tivesse sacada não teria medo de altura, pois estaria acostumado com a altura. Como você não teve uma sacada para se pendurar e brincar quando criança, ficou com essa foia ridícula.

- Não é ridícula.

- Ei... Espera aí... - ela voltou-se agressivamente para ele - É por isso que ainda não achei uma sacada decente! Você fez questão de escolher as casas com as sacadas mais horrorosas pra não ter que... VOCÊ É UM CRETINO! - e pôs-se a esmurrar o noivo.

- Ô, sua louca! PÁRA COM ISSO!

O carro desviou bruscamente para a esquerda, e para a direita. A batalha dentro do automóvel continuava, sem indícios de um fim. Gabriel enterrou o pé no freio. O carro parou bruscamente, chacoalhando os passageiros.

- Agora, escuta aqui. sua doida varrida! Eu não tenho dinheiro pra comprar uma mansão com uma sacada gigante, que percorra os quantro cantos da casa. Então, ou você se conforma com alguma das nossas opções, ou fica com uma casa sem sacada.

- Eu não vou morar num lugar sem sacada! - gritou Helena ofegante - Onde é que eu vou ler? Escrever? Espiar a vida alheia? Observar a natureza? Fofocar com as amigas? Sem sacada eu não fico!

Gabriel mordeu a língua, procurando se acalmar. Helena o imitou.

- Ótimo. - disse ele, já recuperado - Vamos tentar outra vez. - ele voltou a dirigir - Sem cena dessa vez.

O resto do caminho foi tranqüilo. A outra casa não agradou Helena, que alegou que "sacada no quarto andar não era sacada, e sim precipício". Estavam a caminho da 12ª casa quando a loucura baixou de novo em Helena.

- Pára o carro! Pára, poxa!

- O que é? - resmungou ele.

Ela não respondeu. Estava com a cara e as mãos colados no vidro, uma expressão iluminada e um sorriso bobo no rosto.

- É ela. - murmurou.

- Quem?

- Ela. Minha sacada dos sonhos!

Ele rolou os olhos e espiou a casa. Era grande e clara, com uma porta de duas folhas enorme e janelas adequadas. Localizava-se para dentro do terreno. O primeiro andar possui uma sacada, que ia de leste a oeste, e servia de varanda para o térreo. Uma bela casa e uma bela cifra.

- Sinto muito, mas não é a casa que eu pretendia visitar.

- A vida é cheia de imprevistos, meu bem.

- Não está à venda, Helena.

- E...? - ela voltou-se para ele.

- Como "E"? Como é que eu vou comprar uma casa que não está à venda?

- Fazendo uma proposta não mais que generosa ao dono.

- Minha filha, caia na real! Dá uma olhada nessa casa! Esse cara tem muito mais dinheiro do que eu! Como é que você quer que eu cubra o valor da residência se não tenho nem a metade?

- Que horror, estou noiva de um pobretão medroso. - rolou os olhos - Que sina.

- Pois é, é o que você tem: - retrucou mal-humorado - um noivo pé-rapado e uma casa sem sacada!

Ela suspirou, ajeitando-se no assento.

- Tá sabendo, então? Sabia que o fofoqueiro do Juliano já ia falar...

- O quê?

- A louca da mamãe sugeriu que a gente fosse morar na chácara dela, tem cabimento? E falou na frente de todo mundo lá de casa... Tô acendendo um incenso por dia...

Ao voltar seu olhar para o noivo encontrou um sujeito dividido entre a raiva e o choro.

- Não vá me dizer - ele falava pausadamente - que você jogou essa opotunidade fora, HELENA?!

- E lá tenho eu cara de quem mora no meio do nada? HÁ! Ruana do jeio que sou... Aliás, a casa é grande demais pra duas pessoas. Também não tem um banheiro decente, nem energia elétrica. Imagina só eu com um lampiãozinho na mão...

- Helena, você é louca? Uma casa linda daquelas, espaçosa, confortável e de graça!! Como é que você faz isso???

- Ah - deu de ombros -, não tinha sacada mesmo...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Estes textos (dessa série que estou postando) são ultra velhos, mas eu gosto deles. E vocês, o que acharam? =B



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Sacada" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.