Teremos um belo futuro. escrita por Fehliz


Capítulo 1
One-shot


Notas iniciais do capítulo

Um conto sentimental. Mais pra ser escrito que pra ser lido, sem revisão. Espero que meus sentimentos cheguem a vocês =D



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Estávamos sentados no meio-fio em frente a escola depois de muito tempo separados. A causa dessa separação ainda é sujeita a dúvida, mas o motivo mais provável é que os laços de infância não tenham sobrevivido às mudanças que o tempo trás. É difícil dizer se elas são bênçãos ou maldições.

O vento soprou os cabelos curtos da jovem mulher ao meu lado que eu não conhecia como antigamente.

– Esperando seus pais virem te buscar? – perguntou ela. A voz era calma, mas eu sabia que existia um tom brincalhão cuja falta de intimidade ocultou. Perguntei-me se ela realmente desejava iniciar uma conversa ou simplesmente quebrar o clima desconfortável que pairava no ar.

– Desse jeito vou esperar uma eternidade

– Imagino que eles finalmente acabaram com a sua revolta de não poder voltar pra casa sozinho.

– Pelos anos de convivência com os meus pais, é muito mais provável que eles tenham cansado de vir me buscar do que cedido aos meus caprichos. – Ela soltou um há e ficamos em silêncio.

Conhecemo-nos numa situação semelhante. Eu e ela sentados no meio-fio, muito além do horário escolar, esperando nossos pais – sem nenhuma noção de planejamento temporal e pontualidade – nos buscarem depois de todos os colegas terem ido embora. O surgimento de uma amizade foi inevitável.

– E você? – Perguntei depois de uma repentina (e bem vinda!) ideia para continuar a conversa. Quando isso deixou de ser fácil?

– Só assistindo o tempo passar – falou séria e eu a encarei tentando adivinhar o que ela queria dizer. Quero dizer, ela estava triste? Sentindo-se frustrada? Assistir o tempo passar... não pude deixar de pensar que talvez estivesse me dizendo como estava nostálgica, saudosista. Eu estava, afinal. – Estou brincando – disse ela, provavelmente depois de notar a minha confusão e eu me senti estúpido – Combinei de esperar a minha mãe aqui pra ir olhar vestidos de formatura com ela. Ela está atrasada, é claro. – acrescentou

– Sabe como é, velhos hábitos não mudam. – comentei com um sorriso

– É – disse olhando para o chão – alguns não mudam – E eu senti uma dor no peito.

Quis pedir desculpas, mas senti que não devia. Olhei-a e torci que as minhas angústias de alguma forma tornassem-se físicas e palpáveis. Não sei se deu certo, mas ela virou-se e deu um sorriso triste.

–Engraçado como as coisas mudam né? – disse e xinguei-me mentalmente pela péssima escolha de palavras. Engraçado?! Trágico é muito mais apropriado! Triste, terrível, qualquer outra junção silábica... Suspirei com a minha própria estupidez.

– É... Mas mudar é preciso. – disse. – Quero dizer, apegar-se ao passado é.... um desperdício, não? – E abraçou os próprios joelhos com mais força.

Novamente, não sabia como me posicionar diante disso, olhei pros meus tênis em busca de alguma resposta escrita em meus cadarços. Não ousei olhá-la em quanto pensava cautelosamente em uma resposta.

– Sei lá – foi o melhor que eu consegui articular. Talvez me falte vocabulário, ou vocação, mas as ideias não correspondiam ao meu falar simples.

Não sei se o meu tom de discordância foi perceptivo o suficiente, mas ela me olhou com curiosidade. Talvez a minha opinião estivesse sendo requisitada por aqueles olhos mudos. Telepatia, sem querer, como eu senti sua falta! Senti-me animado para começar uma conversa de verdade.

– Quero dizer, existe beleza no passado, não acha? – Olhei-a esperando algum tipo de reação positiva. Ela voltou a cabeça para frente e deu de ombros. – Ah, para com isso! Pessoas pagam fortunas pra visitar ruínas e monumentos por um motivo! – Disse com tom de risada.

– Não é o passado delas, por isso parece tão bonito. – disse ela didaticamente – Sentimento brilhantemente exemplificado em Meia noite em Paris – Ela brincou e rimos. Gargalhamos, na verdade.

– E quanto a fotos de infância? – disse – Elas não aquecem o seu peito?

– É claro que aquecem! – e figurativamente levou uma das mãos ao peito – São memórias felizes.

– Nostalgia... – disse com ligeira melancolia.

– Nostalgia é um sentimento morno. Dizem que é triste, mas eu discordo. Só é triste se você está triste, se o seu agora é triste. – Suspirou – As pessoas não sabem o que pensar sobre o tempo passando, e sobre as mudanças que ele trás.

– É difícil dizer se são bênçãos ou maldições...

Ela me olhou compreensivamente.

– Não cabe a mim dizer.

Ficamos em silêncio mais um pouco, e eu pensei no que ela queria dizer sobre isso até ser interrompido por mais um esforço por conversa da parte dela.

– Nós parecemos dois velhos falando sobre o passado. Somos jovens, vamos falar sobre o futuro! – disse rindo – Já pensou alugou um terno pra formatura?

– Estou pensando em ir assim, o que acha? – E apontei pra minha camisa de uniforme e jaqueta maneira.

– É coerente, pode ser uma metáfora. – Levantou as mãos e fingiu visualizar uma manchete – O uniforme significa a obrigação que a sociedade impõe em se formar no ensino médio e a jaqueta a individualidade que sobrepõe os desejos do sistema.

– Você é uma poeta!

– Muito obrigada.

Olhei-a mais longamente dessa vez. Notei pequenas diferenças que nunca tinha reparado. Uma cicatriz na sobrancelha, maquiagem nos olhos, o início de uma tatuagem por baixo da manga da camisa. Quis saber tudo sobre ela.

– Quando foi que você ficou tão profunda? – perguntei genuinamente

– Quando você não estava olhando – falou com uma voz afetada – Quão clichê foi isso! – E riu sozinha.

– Eu estou falando sério – Encarei-a e ela ajeitou o corpo.

– Nós não somos mais crianças, é só. Naturalmente, crescemos com as experiências. – disse – Talvez o fato de não conhecermos a experiência um do outro torne o conhecimento alheio interessante.

– É uma boa teoria.

Olhei-a nos olhos

– Sinto muito por não conhecer suas experiências. – disse com honestidade e olhamo-nos por alguns segundos, ela parecia investigar a minha alma. Desviou os olhos e deu de ombros.

– Isso está no passado. – Um peso saiu de meus ombros e eu olhei o chão novamente com um sorriso bobo – E vamos combinar, eu estou muito mais interessante agora!

Continuamos conversando por alguns minutos sobre banalidades que pareciam muito mais espetaculares naquele pequeno casulo. Até que o telefone dela tocou uma música calma e ela mostrou o visor: Mãe.

– Trânsito, sei. – disse ela ao celular revirando os olhos, bem humorada.

Ela pegou o meu número e combinamos de nos falarmos mais tarde. Tudo parecia como era antes. A amizade inevitável de dois colegas com pais irremediavelmente impontuais. E eu entendi o que ela quis dizer com desperdício, quando falávamos de passado.

O carro da mãe dela dobrou a esquina e nos despedimos. E depois de se levantar e limpar a poeira de sua calça ela disse: – Teremos um belo futuro, pode anotar.


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Notas finais do capítulo

Tentei ser literária. Espero que tenham sido tocados.



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