Avalanche escrita por Aarvyk


Capítulo 4
Equilíbrio


Notas iniciais do capítulo

Boa Leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/568723/chapter/4

 Encontrei meu gêmeo no baile das três realezas, vastas mesas de comida eram postas ao longo do grande salão que o Palácio de Buckingham possuía. Os preparativos foram todos feitos por Cameron, escolhendo cores entre prata e vermelho para a maioria dos talheres e tecidos que envolviam aquele cenário de luxúria. Dançarinas russas faziam um show musical em um palanque, os sons eram adequados ao ambiente, e a única coisa que me irritava eram as risadas escancaradas dos irmãos de Igor ao longe, a realeza russa era composta de outros quatro príncipes mais novos. Todos irritantes.

  Enquanto eu caminhava com mesmo vestido e calça do encontro com Igor, pude notar as mãos pálidas de Cameron em meu braço. Não o via há menos de um dia, mas já sentia sua falta de uma forma tão imensa que meu coração palpitava só de vê-lo, mesmo que seu semblante estivesse preocupado demais para estar bem.

   — Sorria – sussurrou discretamente, me direcionando para à direita. Uma disparada de flashs me deixou cega por vários instantes, havia apenas alguns fotógrafos, mas era o suficiente para eu me sentir desconfortável. Jamais iria me acostumar com os holofotes. Cam continuou andando, me levando para um canto mais afastado da sala. – Como você está?

  Não nos víamos desde que eu havia levado aquela maldita surra de nosso pai. Mal conseguia imaginar o quão nervoso ele estivera nas últimas horas.

   — Estou bem. Não se preocupe comigo. – falei, tão emocionada por estarmos juntos. – E como você está?

    Antes que ele pudesse sequer abrir seus lábios, pelo canto dos olhos, notei um breve movimento de cores vivas. Minhas íris automaticamente se concentraram em desvendar do que se tratava. À nossa esquerda, havia uma linda garota com um vestido azul, quase branco, os cabelos encaracolados e castanho-claro brilhavam sob a luz, junto as joias prateadas afiveladas em suas mechas. Ela ergueu o rosto de um lado para o outro, parecia buscar alguém dentre tantas pessoas naquele salão gigante, até que me encarou e sorriu, apressando-se em correr em minha direção mesmo que comprometesse sua elegância.

    — Cameron – disse enquanto ria, os olhos azuis agitados. As sardas de seu rosto lhe davam um ar pueril que chegava a me lembrar Edwin.

   A garota pegou no meu braço de meu irmão animada, fazendo com que nos desgrudássemos de um instante para o outro. Meus sentimentos ficaram frios, a mudança de humor era visível. Como ela se atrevia?

  Meu gêmeo notou que eu estava prestes a acabar com aquele riso infantil. E, sábio como sempre, desgrudou-se dela por um instante, olhando-a com uma certa paciência e gentileza que não entendi. Cam pigarreou, a postura ficou formal como a de um verdadeiro rei.

   — Princesa Kaya Schreave, essa é minha irmã gêmea, Princesa Avery Black – disse, as mãos articulando para que nos cumprimentássemos.

    Foi então que um estalo se deu em meu cérebro. Era óbvio. Aquela era a noiva de Cameron, ao desmaiar, eu mal me lembrava das poucas palavras que meu pai ditara. No entanto, eu não podia deixar de analisar que aquela garota a minha frente parecia estar feliz e radiante, mesmo com um casamento arranjado com alguém que ela mal conhecia. Ou será que se conheciam?

    Tossi em seco, me esquivando do caloroso cumprimento de Kaya Schreave, fingindo um mal estar que em partes era tão real quanto meus sentimentos de matá-la. Raras vezes eu havia visto meu irmão com uma presença feminina grudada em seus braços, não que eu me importasse, mas aquele era o nosso momento.

     — Kaya, minha irmã não está bem hoje – meu gêmeo se adiantou, os olhos esverdeados iguais aos meus estavam tão atentos e temerosos que quase soltei um riso de desespero. – Posso te encontrar depois, o que acha? Na mesa de doces russos que você se interessou! Preciso conversar com Avery por alguns minutos e talvez demore.

    A princesa continuava sorrindo, os olhos tão emocionados que eu só conseguia ter vontade de degolá-la. Quando caminhou o suficiente para nos deixar a sós e em paz mais uma vez, eu só consegui puxar Cameron de novo para o meu lado e continuar caminhando, em direção a um corredor da ala lesta que tinha um cômodo usado pelos criados.

    Mal entramos no pequeno quarto de vassouras e rodos quando meu irmão me olhou desesperado para se explicar.

     — Eu juro que iria falar com você quando...

    — Quando? – gritei, o interrompendo. Minha mão se chocou em um golpe com a parede bege ao meu lado, minhas costas arderam ao me mover com tanta fúria. – Senti que você estava distante nos últimos meses, achei que nossa ligação fosse mais do que isso. Pelo visto, vejo que teve muito tempo tramando seu lugar como rei.

    O encontro com Igor Pyetov. Eu me lembrava bem das palavras: alguém está negociando pela sua vida. De repente, a tristeza que vi nos olhos de Cam ao saber de seu noivado eram tão falsas quanto nossa ligação de sangue. Era óbvio, mais uma vez eu estava sendo uma imbecil, perdida em tentar fazer o mínimo pelo meu país e meu exército. Não conseguia acreditar que havia deixado detalhes tão obsoletos me escaparem.

      — Não é o que está pensando...

     — Você me traiu, irmão. – Aquelas palavras eram as únicas que eu conseguia proferir.

      Meus olhos soltavam lágrimas que ardiam como o fogo.

     Dei passos para trás, sem conseguir encarar o rosto de alguém que era parecido comigo em cada detalhe. Éramos gêmeos de bolsas uterinas diferentes, mas tão parecidos quanto dois sóis.

      — Illéa está à beira de uma guerra civil! – vociferou, rendendo-se a sua própria raiva, por um segundo vi que agia como um rei, um rei como meu avô tinha sido: grandioso. – Kaya me mandou uma carta... – seu tom de voz tornou-se mais gentil ao falar da princesa. – Ela é muito ingênua, Avery.

    — Como assim uma carta? – perguntei, as sobrancelhas arqueadas como de costume quando eu não sabia algo e estava sedenta por respostas.

     Cameron suspirou. Ele ainda estava ali, ainda tinha que ser o meu gêmeo. O modo como soltava o ar dos pulmões ainda era o mesmo, assim como o movimento dos ombros quando iria ser sincero do fundo de seu coração. Tentei acreditar nisso, ao menos.

      — A organização ao sul de Illéa está se tornando cada vez mais forte, se eles não fizerem um novo aliado com poder bélico em pouco tempo a população civil vai ser morta – explicou, mostrando-me que a situação do país de rei Maxon e rainha America era tão perigosa quanto a que eu imaginava. Eu estava realmente em um ninho de ratos. – Kaya me escreveu uma carta há poucos meses, pedia que eu a aceitasse como esposa em troca de armamento para o seu país. Ela fez isso sem a permissão do próprio rei Maxon, Avery. Consegue imaginar uma atitude assim?

      Meus sentimentos haviam se dissipado quase por completo. Eu não conseguia acreditar no que ouvia.

       — Você sugeriu a ideia ao nosso pai, não é? Os dois casamentos. – minhas costas começaram a doer, meu psicológico estava destruído. De um segundo para outro, o destino me jogava para um canto remoto do mapa, desarmada e sem mais aliados, com uma guerra e um príncipe que não faziam parte das minhas responsabilidades.

      Cameron se virou, indo em direção a porta de mogno antigo.

     — Não foi pela coroa – disse, olhando uma última vez em meus olhos. De um verde claro melancólico para um verde escuro extasiado em dor.

     Quando escutei o bater da porta, eu soube que nunca estivera tão sozinha. Gritei, rugindo tudo o que eu sentia para aquele minúsculo cômodo patético. Eu simplesmente odiava essa maldita avalanche de problemas que minha vida sempre teimava em ser. A compaixão de Cameron por Kaya era mais do que o necessário para que tudo se resolvesse, o meu casamento não traria nada de bom.

     Não tinha mais a minha mãe, não tinha mais o meu fiel soldado Thomas Schmidt. Sequer tinha meu próprio irmão ao meu lado. Ser Avery Black era uma piada de muito mal gosto em alguns minutos.

       Passei horas sozinha, sentindo a dor emanando por meu corpo, me dopando mais ainda com analgésicos que eu carregava nos bolsos de minha calça. A raiva se cultivava por qual fosse o deus que estivesse sob a minha cabeça.

     Saí daquele maldito quarto de limpeza o mais rápido que consegui quando me senti estável. Apoiei-me nas paredes, obstinada a chegar em meu quarto o mais rápido que desse. Infelizmente, teria que passar pelo salão de festas, àquele ponto, talvez somente os russos estivessem brindando. A única sorte que tinha era o fato de Desmond II sempre me evitar em tais ocasiões, poupando-me do trabalho de ter que suportar suas menções a minha pessoa, que nunca eram verdadeiras ou com um pingo de noção.

     Quando eu estava quase no fim do corredor que se conectava ao salão de festas, me deparei com alguém que andava distraidamente em minha direção. Uma figura alta e com leves músculos aparentes. Era um garoto jovem, os cabelos dourados eram fios rebeldes que iam em qualquer direção e seu olhar cor de mel parecia perdido em pensamentos além desse mundo. Ele estava quase passando por mim sem notar minha presença, até que virou levemente seu rosto bronzeado na direção de minha sombra.

       Meu coração pareceu colapsar.

      O modo como me olhava o evidenciou, suas íris ficaram estagnadas em um transe quando encontraram meu rosto choroso e débil; os lábios arroxeados por vinho haviam se aberto em uma pequena circunferência de surpresa. Eu nunca tinha visto fotos ou entrevistas, sequer tinha pesquisado sobre as realezas que não precisavam de minha atenção em qualquer mídia que fosse. No entanto, eu sabia do fundo de minha alma quem ele era no instante em que teve aquela reação.

    O dono daqueles olhos inocentes e sentimentais só podia ser Alexander Schreave.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Como vocês estão? O que acham que vai acontecer?