Esperou o fim das aulas ansiosamente, parecia que o tempo havia congelado, já estava ficando impaciente quando o sinal tocou e ela levantou eufórica. Saiu andando apressada até a porta da escola, onde combinou de se encontrar com Jude para então decidir aonde iriam.

- Jude! – gritou ao ver os cabelos loiros do amigo entre a multidão que estava saindo.

- Oi Jen. – ele falou desanimado. – Você quer mesmo fazer isso? – ele perguntou tentando desencorajá-la.

- Mais do que nunca. Onde podemos conversar sozinhos? – ela perguntou olhando em volta. – Na minha casa, pode ser?

- Na minha casa é mais seguro. – ele disse com a voz cansada.

– Mas e a sua família? – hesitou. Jennifer percebeu que não sabia nada de Jude, nem o seu sobrenome, ela pensou que talvez a relação dos dois estivesse realmente muito precipitada, devido ao fato de que ela já se importava tanto com ele.

Jude riu.

- Na minha casa. Vamos, é aqui perto, dá pra ir a pé. – ele falou por fim.

Os dois caminharam juntos em silêncio, Jennifer ainda estava desconfortável por ter perguntado pela sua família, era óbvio que alguém como ele era sozinho, pelo menos era a impressão que ela.

Jude parou em uma rua estreita e escura e suspirou.

– Você quer mesmo fazer isso?

- Já disse que sim Jude!

- Depois daqui não tem como voltar atrás. – ele falou agora olhando-a.

Ela não entendeu o que ele quis dizer com aquilo mas acenou com a cabeça mesmo assim. Olhou para frente e tentou localizar o fim da rua, sem sucesso, voltou o olhar pra ele, esperando que fosse na frente.

Jude, sem alternativas, colocou-se a frente e andou calmamente até o fim da pequena rua. Finalmente chegaram no destino, um pequeno prédio baixo, velho e com a pintura falha, Jennifer nunca o veria de longe.

O loiro forçou a porta e entrou. O interior do pequeno prédio era totalmente diferente do que Jennifer esperava, parecia novo e tudo era perfeitamente limpo. Apesar da beleza, o saguão estava vazio, só havia um senhor dormindo profundamente em uma poltrona

- Ela está comigo. – Jude murmurou para o senhor.

- Olá Sr. Shifter e Srta. Regnard. – o velho disse sem abrir os olhos.

– Como é que ele… - Jennifer começou sobressaindo-se.

- Vamos subir. Se começarmos com as perguntas agora, não paramos nunca. – ele disse sorrindo.

Os dois entraram no elevador, Jennifer estava inquieta, finalmente saberia tudo sobre o seu passado e toda a verdade sobre as coisas que supostamente a perseguem.

Jude abriu a porta de seu apartamente e esperou que Jennifer sentar-se para começar seu discurso. Seria uma tarde longa.

– Vou começar do começo… - ele falou se posicionado na frente dela.

- Não, eu já sei do começo. Meu… avô me falou. – ela falou ansiosa. Queria que a história fosse para a parte interessante.

- Não me interrompa Jen. Você precisa saber do começo para entender o final de uma história, certo?

Ela fez que sim com a cabeça e relaxou no sofá. Deu uma olhada rápida no apartamento de Jude, era incrivelmente grande e iluminado, não entendia como um apartamento desse se localizava em um prédio como aquele, tentou se lembrar de perguntar isso a ele depois.

- É… Sabe, os clãs dos quais o Sr. Regnard disse… Então. Bom, não sou um bom contador de histórias como ele mas… Como ele disse, Os Cavaleiros se tornaram dez vezes mais numerosos do que os Lendários e aos poucos os não-humanos foram se extinguindo. Os que sobraram, os mais raros e poderosos, se escondem até hoje tentando sobreviver. Isso você entendeu?

- Sim. – ela disse convicta.

- Certo… Hm. Ok, dezesseis anos atrás, um casal de pensantes teve uma filha, que na visão dos Cavaleiros seria uma grande ameaça para eles e que poderia criar uma revolução e fazer com que os Lendários voltassem a ser a potência que eram. Já que pensantes eram uma raça muito rara e muito poderosa.

“Claro que aquilo não seria possível, como uma menina nasceria com tanto poder a ponto de criar uma revolução? Mas os Cavaleiros não pensavam assim, qualquer tipo de ameaça eles teriam que eliminar. E assim fizeram, ou melhor, tentaram.

E isso nos leva a você. Você, Jenny… É a filha de Suzannah e Phillipe Regnard, os últimos pensantes da terra. E eu… Bem, eu sou o último metamorfo da terra. Por isso me escolheram para te proteger… Não sei se estou sendo claro, obviamente você ainda tem perguntas mas…”

Jude pausou, talvez estivesse indo rápido demais. Ele sorriu e esperou alguma reação da amiga.

- Você é realmente péssimo para contar histórias. – foi a única coisa que ouviu de Jen. Ela já havia ouvido tantas coisas improváveis que não se impressionava mais tão fácil. – E o que você falou não tem sentido nenhum e…

- Aqui vamos nós de novo. Jen, acredite você ou não, tudo o que eu estou falando é verdade. – Jude falou como se tivesse decorado aquelas palavras.

- Não é isso o que eu quero dizer. Veja bem, se eu fosse filha de dois pensantes –que depois você vai me explicar o que é.- eu seria uma, certo? E eu nunca fiz nada de notável, quer dizer, eu tiro notas medianas na escola! Por que eles estão atrás de mim? Eu não sei fazer nada, acho que eles já devem ter percebido que eu não sou uma ameaça. E outra, se eles estão atrás de mim, por que pegariam meus pais e depois meu avô? Não faz sentido Jude, desculpe.

Jude estava surpreso, Jennifer realmente conseguia ser imprevisível.

– Eu… Bom Jenny, você é uma pensante. Isso quer dizer que você tem a capacidade de usar uma porcentagem maior do seu cérebro. – foi a primeira coisa que ele conseguiu falar depois da declaração da amiga. – E sobre o resto…

- É Jen. E, como eu disse, eu não sou nenhum tipo de gênio, acho que eu não sou uma pensante. E que raios de nome é esse afinal? Pensante. E a útlima do mundo? Você só pode estar brincando. – ela perguntou histérica, era óbvio que a história de Jude finalmente começou a ter efeito nela.

- Escuta… Senta, vou pegar uma água pra você. – ele pediu quando viu que ela havia se levantado. Em segundos ele já estava de volta com um copo d’água. Jennifer bebeu rapidamente e o olhou ainda exaltada.
 
– Desculpa, continua. Prometo que não vou te interromper de novo. – ela falou depois de se acalmar um pouco mais.

- É… Tem certeza? Tá bom, continuando. Os seus país eram Lendários, na verdade, toda a sua família era. Ela é uma das poucas que continuou fiél mesmo depois do ataque dos Cavaleiros e a quase extinção dos não humanos. Essas famílias que continuaram no clã não queriam guerra e muito menos a extinção, por isso, aos poucos foram recrutando de volta outros membros. E os Lendários, apesar de poucos, voltaram a viver juntos, tentando sobreviver.

“Mas, alguns outros não-humanos com medo de serem extintos se juntaram aos Cavaleiros como reforço. Na verdade, os não humanos mais ignorantes, vamos dizer assim. Como espectros, que não tem pensamento próprio.

Enfim, acabou que os Cavaleiros se tornaram muito mais fortes e numerosos, Assim, as famílias do outro clã não tinham outra opção a não ser se proteger. Para isso elas contrataram raças muito raras e poderosas que só podem ser encontradas com muito dificuldade. – Jude sorriu orgulhoso. – Então seus país me contrataram para te proteger quando você nasceu e foi o que eu vim fazendo todos esses anos, mas ai quando descobriram sua localização, eu decidi que teria que ficar ao seu lado o tempo todo, sabe, fisicamente. Por você ser uma membro de uma família tão poderosa como os Regnard eu tinha que ser cauteloso, mas não funcionou muito bem… Você me descobriu e aqui estamos nós.”

Jennifer piscou várias vezes, aquela explicação não respondia às perguntas anteriores. O que aquilo tinha a ver com o fato do seu avô ser sequestrado e seus pais mortos afinal? Ela abriu a boca para perguntar mas Jude continuou.

- É… O que mesmo você tinha perguntado? Sobre seus pais… Então, como você já deve ter imaginado, os Cavaleiros foram de fato atrás de você e seus pais se sacrificaram para fazer uma barreira na qual eles seriam incapazes de te alcançar mentalmente ou quando você estivesse inconsciente, ou seja, dormindo. Aparentemente os pensantes podem fazer isso. Quero dizer, se sacrificar para fazer uma barreira assim. O que é bem legal se você for pensar…

“É… Então. Sobre o seu avô, eles o pegaram de isca pra você ir atrás dele. Não se preocupe sobre isso, eu vou resgatá-lo… Acho que é isso. Alguma pergunta?”

Jude terminou e sorriu. Ele não sabia quantas perguntas Jennifer tinha em mente. Achava que tinha explicado tudo claramente. Depois de ver a expressão confusa na face de Jennifer seu sorriso sumiu, aquilo demoraria mais do que imaginava.

- Sim, várias! Como assim, Jude? De verdade…. O QUE? Me alcançar mentalmente? E por que raios os não humanos iriam se juntar com os Cavaleiros se eles queriam extigui-los? E o que é um metamorfo afinal? E COMO ASSIM ISCA? – ela perguntava. Jennifer precisava saber de tudo, era como se a vida dela dependesse daquelas respostas. Sua mente nunca esteve tão confusa em toda a sua vida, era como se outro mundo fosse criado e ela tivesse que aprender tudo sobre ele.

- Ah… Ok… É que alguns seres são capazes de te controlar pela mente, ou pelos sonhos. – ele a olhou sugestivamente. – Por que você acha que eu apareço no seus sonhos de vez em quando? Só pra checar se não tem ninguém que conseguiu ultrapassar a barreira. Já que eu consegui, imaginei que mais alguém conseguiria.

“Já te disse que os não humanos que se juntaram aos Cavaleiros são ingênuos e são facilmente manipuláveis, foi fácil para eles oferecer alguma coisa em troca de serviço.

“E um metamorfo… Eu sou… Eu basicamente posso me transformar em qualquer ser vivo. Inclusive os não humanos.” – ele completou dando um sorrisinho modesto.

Jennifer arregalou os olhos, de todas as informações que havia recebido naquele dia, aquela era a mais impressionante e mais absurda. Como aquilo era possível? Finalmente ela entendeu o significado de raças poderosas e raras.

– O-o que? Você… Uau. – ela gaguejou perplexa. Depois daquilo todas as outras milhares de perguntas desapareceram, ela entendeu completamente tudo apenas olhando para os olhos azuis do amigo, conseguiu ver ali o sofrimento de vários seres inimagináveis. Conseguiu ver o poder de várias gerações e um mundo totalmente novo que ela nunca nem pensaria que existia. E também viu tudo aquilo ser destruido por humanos egoístas que só queriam poder. Era muita informação para ela engolir, ela não entendia. Involuntarimente começou a chorar.

– Por que os humanos queriam matar vocês Jude? Por quê? Eles… Eles não entendem? Vocês não tiveram escolha em nascer assim e… - ela soluçou.

- Ei! Por que está chorando?! – Jude perguntou surpreso. Jennifer era mesmo imprevisível. Sem hesitar, ele a abraçou. – Vai ficar tudo bem, quer dizer, nós, os não humanos, estamos bem por enquanto.

- Eu não entendo, essa guerra idiota entre Cavaleiros e Lendários custou a vida dos meus pais, até onde isso vai?! Eu não sei fazer nada, não sou uma pensante, eles tem que saber disso e deixarem meu avô em paz! E deixarem todos os outros seres que não fizeram nada também! – Jennifer falava histérica com as lágrimas rolando descontroladamente pelo seu rosto. – E você? Com as suas transformações você pode fazer o que bem entender, porque não vai lá e descobre o que eles querem?! Como essas pessoas podem fazer isso apenas por medo de ameaças?! Acho que eles já perceberam, depois de dezesseis anos, que eu não sou ameaça alguma! Como alguém como eu poderia usar uma capacidade maior do cérebro? Eu acho que eu nem uso o que as pessoas normalmente usam! Isso tudo é um absurdo!

- Jenny… Eu…

- É JEN! – ela gritou e saiu correndo porta a fora.

Jude sabia que ela não aceitaria todas aquelas informações tão facilmente então deixou-a sair para que pudesse organizar os pensamentos. Suspirou e deixou seu corpo cair na poltrona mais perto. Ele ainda tinha tanto para falar com ela, mas pensou que talvez fosse melhor que ela descobrisse sozinha, afinal, ela era de fato uma pensante e cedo ou tarde sua inteligência absurda ia aparecer.