O diário de Magê escrita por Woodsday


Capítulo 1
Querido diário, ninguém merece!


Notas iniciais do capítulo

!



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“Querido Diário,

Maria Eugênia Albuquerque, dezesseis anos – dezessete daqui quatro meses – filha de Suzanna e Charles Albuquerque, leitora compulsiva, escritora sem futuro, futura atriz de novela mexicana – porque talento é o que não lhe falta, nem beleza, a propósito. Irmã de Gabriel Albuquerque, melhor amiga de Cecília Barden e futura namorada de Joe Valentin – o garoto mais lindo e popular do colégio. Pois é, essa sou eu. Não muito engraçada, não muito popular, não tão bonita assim, mas, a única Magê de todo o universo. Seja bem vindo ao meu mundo.”



– Maria Eugênia, nós temos que conversar. – Mamãe sentou-se a minha frente, ao lado do papai.

Eu estreitei os olhos, desconfiada.

Primeiro porque “Nós temos que conversar” era a coisa mais assustadora que eu podia ouvir dos meus pais. Quando Suzanna engravidou de Gabe, foi essa frase. Quando decidiram mudar para uma casa maior e deixar para trás meu quarto do Nemo, foi essa frase. Quando decidiram que iriam destruir minha vida me mudando para um colégio particular (que não destruiu minha vida) foi essa frase. E quando vovô morreu de infarto porque tava de lero-lero com a vovó, bem, foi essa frase.

Ou seja. Essa não era uma boa frase.

Não mesmo.

E depois de meia hora de conversas e sorrisos animados, meus lindos olhos castanhos sem graça quase saltando das órbitas, finalmente, eu pude dizer alguma coisa coerente. E ela foi:

– Vocês estão loucos?

– Você vai, Maria Eugênia. - Suzanna não me deixou brecha para discussões, mas eu era um gata e passava até pelas mais finas brechinhas da vida.

– Vocês não podem! – Eu gemi encarando meus pais, tudo bem, eu estava sendo dramática, mas Suzanna queria que eu me mudasse para um colégio interno, isso era a coisa mais horrível que ela podia fazer comigo. – Como pode ser tão sem coração? – Eu choraminguei e minha mãe revirou os olhos. – Vocês não me amam? É isso? – Encarei meu pai e ele sorriu daquele jeito que me fazia querer bater nele. Porque era o sorriso que dizia “querida, eu te amo, faço tudo por você”. – Enjoaram de mim? – Me levantei jogando a mochila por cima do ombro e os encarei tristemente. – Puxa, eu esperava mais de vocês...

– Oras Maria Eugênia! – Mamãe resmungou recolhendo as coisas do café. – Não seja ridícula.

– Não seja uma tirana, mamãe. – Retruquei levando a mão até o coração, fazendo uma cena, quem sabe eles se apiedavam e me davam a chance de terminar o ensino médio em São Francisco – Como pode agir como se minha vida dependesse somente da sua, uh?

– É porque ela depende, Maria Eugênia. - Sua resposta foi categórica e até que fazia sentido. Mas, eu me manteria firme diante da inimiga - minha mãe.

– Para de chamar assim. – Sibilei. – E ela não depende não, é por isso que eu não vou. Se vocês não me querem, posso morar com a vovó e trabalhar no bingo da igreja.

– Você nunca foi a igreja, Magê. – Papai se aproximou pousando a mão em meu ombro e eu suspirei rendida. – Vai ser bom para você, querida. – Ele se abaixou dando em um beijo carinhoso em minha testa. – Acredite em seu velho.

– Vai ser horrível! – Choraminguei outra vez. – Vocês não entendem, é sério. É difícil fazer amigos, é difícil ser respeitada e vocês estão me tirando tudo isso e ainda querem me mandar pra aquela cidade terrivelmente fria e sombria. Oh Deus! Já sinto a depressão se arrastando em minha direção. – Levei a mão até minha testa. – Estou passando mal, mamãe. Oh não! Estou desfalecendo! – Me apoiei na cadeira espiando de rabo de olho, Suzanna parecendo mais irritada do que quando o café começou, suspirei desistindo do teatro e endireitando minha postura. Se eu ficasse de blábláblá era capaz dela me mandar pra china.

– Acabou? – Perguntou autoritária.

– Na verdade, não. – Suspirei tristemente. – Mas, sei que não irão me ouvir, então vou retirar minha insignificante pessoa deste local e seguir com as minha tarefas diárias de boa filha.

Mamãe suspirou parecendo ainda mais irritada e eu funguei parecendo terrivelmente triste. Eu também tinha pose, afinal.

– Vai ser bom para você, querida. Como seu pai disse e vai ser uma experiência incrível. – Ela tentou ser doce, apesar de eu ter toda a certeza do mundo que ela queria era me chutar da sua frente, porque eu a tinha irritado mesmo.

– Não quero. – Resmunguei birrenta. – Ei, porque vocês não mandam o Gabe pra lá? Hein mãe? Não vai perder o investimento e ainda iremos nos livrar do entulho! – Eu abri um sorriso trinta e dois dentes e cruzei os braços encarando vitoriosamente mamãe. Ela não parecia muito contente, mas assim que eu lhe mostrasse as vantagens extras do meu plano, ela iria super concordar.

Eu era demais!

– Cala a boca, sua idiota! – Gabe surgiu atrás de mim.

Bufei. – Cala a boca, você. Mané.

Gabe fechou a cara me encarando irritado e eu dei de ombros. Para uma criança de doze anos, ele era um problema e tanto. Eu hein.

– Calem-se os dois! – Suzanna nos encarou parecendo cansada. – Gabriel, vá pegar sua mochila e você, Maria Eugênia, é bom se despedir dos meus amigos e o que mais tiver que fazer, amanhã você embarca para Londres, me ouviu bem?

– Você não me deu opção, mamãe. – Resmunguei dando-lhe as costas e caminhando em direção ao carro.

Qual era o problema dos pais? Qual era o problema dos meus pais?

Primeiro eles me chamam de Maria Eugênia. Tem nome mais feio que Maria Eugênia? Talvez Raimunda, mas, ao menos era ela boa de bunda. Ok, nem tanto. Eu odeio meu nome. E agora eles querem me mandar para o outro lado do mundo.

Meu Deus.

Com um nome feio em um colégio estranho. Porque eu tinha pais tão insensíveis? Qual era o problema em me deixar ser feliz e curtir a coisa difícil que é ser uma adolescente nos dias atuais?

Eu tinha a vida perfeita aqui em San Francisco, tudo bem, tudo bem, meu irmão era uma criança chata e muito irritante e na maioria das vezes, eu queria jogar ele no contêiner de lixo, pra quem sabe, ele ir pra reciclagem e nunca mais voltar, mas, eu gostava dele, ele era bom em me trazer bolachas e achocolatado. Quem ia fazer isso agora?

E como diabos eles decidiam me mandar só com passagem de ida para a Inglaterra sem mais nem menos?

Como podia existir seres tão sem coração assim no mundo? Eu não conseguia entender essa lógica terrível!

Oh meu Deus, eu estava sendo despachada.



“Querido diário,

Eu odeio a minha vida!

Ninguém merece!

Com muita raiva e rancor, Magê ♥”


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Notas finais do capítulo

Oi gente, e ai?