O Esboço dos Anjos escrita por Arquivo


Capítulo 8
Mentes Fragmentadas




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Quanto mais eu mergulhava no interior de seu pequeno corpo, mais eu morria por dentro. Suas pernas cruzadas atrás de mim proibindo-me de afastar minha bacia dela, suas unhas estavam cravadas na pele nua de minhas costas e sua boca tentava devorar a minha. Ela estava completamente envolvida com aquele momento, uma vez que o objetivo era o seu orgasmo, eu estava mais uma vez penetrando uma mulher que me tinha na palma de sua mão como um brinquedo. Joyce era uma mulher monstruosamente experiente, me ensinou a controlar o ápice de meus momentos para que o momento da relação não acabasse muito rápido, mas é claro que aprendi do pior jeito. Minha psiquiatra tinha muitos brinquedos não humanos que ela gostava de usar para me maltratar, um de seus favoritos era o que evitava que minha ejaculação fosse liberada, assim ela teria mais tempo para seu prazer.

Já estávamos envolvidos naquele momento a quase 15 minutos, um pouco antes daquilo tudo começar, Ophelia fez algo no computador central. Ela disse que agora Flinn, Katzea e Nile estavam em um sono bem profundo, aquilo me fez perceber que eu estava subestimando Ophelia, ela era tão boa quanto Nile, por isso o achava chato. Não havia nada que ele falasse ou ensinasse que ela já não soubesse. Eu somente não compreendia o por que de ela não exibir tanto conhecimento sobre nós.

–Louis... mais forte...

–Estamos no chão... mais forte que isso vai te machucar.

Ela negou balançando sua cabeça e então me abraçou com mais força. Eu então fiz sua vontade, no decorrer de segundos comecei a sentir meu pênis ser apertado cada vez mais.

–Eu estou quase...! – Consegui agarrar sua coxa, subindo com força sua perna e pressionando-a para baixo uma última vez.

Ela então liberou seus pequenos gemidos, aquela não era sua primeira vez fazendo sexo, mas o jeito como ela se tremia e se agarrava a mim... demonstrava que provavelmente aquele fora seu primeiro orgasmo. Joyce uma vez falou para mim que mulheres conhecem a experiência do orgasmo certo tempo depois que os homens, mas tem o privilégio de aproveitarem melhor o seu. Eu nunca tive uma relação prazerosa, esse fato me deixava mais furioso do que constrangido. Qualquer pessoa normal pode ter um orgasmo, mas dependendo do que causou isso, pode ou não ser bom.

–Desse jeito você vai arrancar fora minha pele. – Sussurrei em seu ouvido.

Ela relaxou suas mãos, mas sua respiração continuava ofegante. Deitado ao seu lado, eu me perguntava o que tinha acabado de fazer, eu destruí tudo o que minha mãe havia me ensinado. Ofender meu próprio corpo, julgar os outros, me entregar ao meu inimigo. Não era preciso de uma lavagem cerebral para que eu tivesse me tornado outro alguém.

Por que será que quanto mais eu me lembrava de casa, mais minha cabeça doía como se houvesse um buraco nas paisagens de minhas lembranças. Era a mesma sensação de devaneio misturado a um déjà vu.

–Caio... era seu irmão. – Ela disse um tanto ofegante.

–O que? – Virei meu rosto para ela rapidamente.

–Ele era um filho que sua mãe tinha antes de ter você, papai apagou a lembrança que você tinha dele. Que nem ele fez com a da mãe do Nile, tudo que ele sabe sobre a mãe agora é que ela é uma mulher que mora em Seattle. Ele não se lembra de que ela amava ele incondicionalmente.

–“Amava”? – O modo como aquela palavra soou era um tanto triste.

–Ela morreu depois que ele foi embora, parece que o coração dela não aguentou a separação.

–O que aconteceu com o meu irmão, por que nosso pai me fez esquecer ele?

Ela se levantou e foi até o computador, eu a acompanhei enquanto apanhava as roupas que estavam no chão. Acredito que Ophelia só não tenha rasgado meu calção de dormir por que eu estava tentando segura-la.

–Antes de te mostrar o por que, vamos fazer algo que eu esperei muito tempo para testar.

Na grande tela apareceu um programa completamente vermelho, mas com diferentes tons para que o usuário não se perdesse. Ela manuseava tão rapidamente o computador central que se fossem nos comparar, eu provavelmente seria uma senhora de 70 anos mexendo em um laptop. Logo apareceram varia janelas com vídeos estranhos como se as câmeras estivessem juntas as pessoas, as gravações estavam de cabeça para baixo, era o que deixava tudo mais estranhos.

–O que é isso?

–Isso são imagens das lembranças oculares da nossa cabeça. Mas são só um adereço à verdadeira memoria.

–Aquele filho da...

–É... ele gravava tudo, até mesmo o que estávamos vendo.

–Foi assim que Flinn me viu sendo beijado pela Katzea.

Ophelia se virou para mim, ela parecia extremamente chateada, puxou com força sua camisa que estava em minhas mãos e a vestiu.

–Podemos não falar sobre isso! O combinado era ME amar.

–Já é de dia e a luz já bate na praia, minha cara Lia.

–Humpf! Mas você pediu uma coisa a mais, eu também vou pedir! – Ela pisou com força o chão.

–Certo, certo...

Ela sorriu como a miserável que ela é e saltitou até me abraçar.

–Okay. Até onde você quer que eu apague a memória deles?

–O que?! Não, ninguém vai apagar memoria de ninguém!

–Você acha mesmo que ela vai acreditar na verdade, logo depois de você correr atrás de mim por dois andares consecutivos, então trancar a porta de emergência do laboratório e por fim tê-la colocado em sono profundo enquanto secretamente fazia alguma coisa aqui...?

Trocamos olhares por um breve momento, o silêncio mortificante me fez perceber que eu havia caído em uma teia de aranha do tamanho de uma ilha.

–Você sabia...

–Sim. Eu sabia que as coisas iriam dar no que deram.

–Você é maligna.

–Homens, se uma mulher for inteligente é sempre maligna pra vocês! – Ela se aproximou do computador e abriu um dos vídeos, era Katzea e eu no banheiro. – Vou apagar as memórias de todos até a hora de dormir, O.K?

–Você diz até a nossa?

–Claro que não! Foi um dos melhores sexos da minha vida, você e eu ficamos fora desse plano.

–Você só tem 18 anos. – Quantos parceiros sexuais uma pessoa pode ter nesse período de tempo?

–E dai? – Ela selecionou os nomes de Flinn e Katzea, então começou a apagar arquivos.

Uma a uma as passagens de memórias foram sendo eliminadas até a total escuridão do sono, a última memória que Katzea teve estava sendo reproduzida na grande tela. Não que Ophelia estava a apagando, só estava assistindo de propósito, pois éramos eu e ela nos beijando.

–Ela é tão inocente, incrível não é? Mal dá pra acreditar que sabe mais de 3 tipos de luta diferentes. Admiro-me que conseguiu passar por ela.

–Eu também. – Talvez ela tenha tentado fazer a técnica dos cinco pontos que explodem o coração, mas eu acabei correndo rápido demais para perceber, ou pelo menos para deixa-la dar o último golpe.

Quando tudo acabou, Ophelia se virou para mim e abriu um doce sorriso.

–Eu prometo ajuda-lo a impedir que nosso pai apague nossas memórias, mas não posso acabar com nosso projeto. Somos muito mais que os outros, Louis. Seremos físicos, matemáticos, sábios, podemos ser tudo se quisermos. Só precisamos convencê-lo de que não trairemos o experimento.

–Ele diz que é nosso pai, mas não dá pra sentir isso. Quando esse projeto acabar, não valerá a pena se não formos mais nós mesmos dentro destes corpos. Meu avô me disse uma vez que a alma do ser humano, sua essência, vive na lembrança do passado, na emoção do presente e na promessa do futuro, que os três estão juntos e que sem um os outros não existem. Então sem nosso passado de Louis ou Ophelia, não existiremos mais. Ele diz que seremos grandes, diz que nos ama, mas ele está nos destruindo aos poucos. É por isso que eu não posso me permitir gostar dele.

–Eu... acho que compreendo.

Ela procurava algo no chão, eu olhei para minhas mãos e vi que sua calcinha estava no bolo de minhas roupas. Eu assobiei e ela olhou envergonhada para mim; após nos vestirmos fomos até a porta, eu apertei o botão de emergência e então a porta se destrancou, exibindo a cena mais engraçada que já vi. Katzea e Flinn de pé e dormindo ao mesmo tempo, como sonâmbulos.

–O que vamos fazer com eles?

–Você carrega o grandão e eu a grandona.

Foi uma tortura carregar Flinn até seu quarto, era como carregar um cadáver que havia engolido tijolos. Ophelia e Katzea tinham mais ou menos o mesmo peso e tamanho, ela estava na melhor.

Quando cheguei ao quarto de Flinn, me deparei com uma incrível bagunça que era digna de um pré-adolescente de 12 anos. Eu o deitei em sua cama e sai do quarto, me deparando com Ophelia encostada na parede do corredor me observando com uma cara maliciosa.

–Hora de falarmos sobre o Caio.

Ela caminhou até seu quarto, no fim do corredor, olhando para trás antes de entrar. Ela moveu suas mãos, me chamando e eu fui até ela, que ainda esperava por mim na porta como se estivesse pronta para mais uma de suas promiscuidades. Assim que fechei a porta atrás de mim, mas só depois mesmo, percebi que seu quarto parecia com o de um enfermeiro que decidiu virar rockeiro e então fracassou. Era repleto de pôsteres de bandas como, por exemplo: My Chemical Romance, Iron Maiden e minha adorada e favorita de todas as bandas, The Killers. Então vinha a extrema lotação em seus moveis de lenços higiênicos, remédios e por fim no teto havia um ar condicionado diferente que parecia um robô.

–Seu quarto é bem... diferente.

–Ele é bem estranho, pode jogar na cara. Não existem muitas meninas nesse mundo que tomam uma dúzia de remédios de manhã, tarde e noite.

–O que houve com você?

–Irresponsabilidade... – Seu olhar se tornou distante.

–De que tipo?

Ela se sentou em sua cama, que parecia uma mistura de maca com cama.

–Quando eu estava na 9ª serie... tive meu primeiro namorado e ele era, como posso dizer, um babaca que parecia tão destemido e maneiro naquela época, ele era incrível e eu parecia um hamster do lado dele... eu era fofa demais pra ele.

Ela se deitou e fechou seus olhos como se fosse dormir, demorou cerca de um minuto até ela os abrir e então olhou bem para mim com seus olhos vermelhos.

–O que ele fez?

–O pai dele era rico, milionário na verdade, tinha uma fabrica de vasilhas, cadeiras, mesinhas, tudo que você podia imaginar. Tudo feito de plástico. Ele me levou lá anoite, quando tudo estava fechado e parcialmente desligado pra me mostrar como as coisas funcionavam e como ele podia mexer nos botões o suficiente para escrever nossos nomes nos copos e vasilhas e me dar. Eu achei aquilo legal no começo... mas as coisas começaram a avançar muito rápido, quero dizer, ele queria avançar nosso relacionamento muito rápido... eu só tinha 14 anos...

–Sinto muito por você... mas você não sentiu muito por mim não é, você não faz ideia do quanto eu me sacrifiquei me entregando a você.

–É, eu sei... eu sou uma miserável... – Ela cobriu seu rosto com ambas as mãos e em segui limpou uma lágrima. – Eu acabei fazendo as vontades dele, só que eu percebi que tinha algo de errado. Notei que ele olhava muito pra esquerda, como se estivesse checando alguma coisa... foi quando eu vi! – Ela se levantou da cama e possuía uma expressão de ódio no rosto. – Eu vi a luz vermelha de uma câmera escondida atrás de algumas fôrmas! Eu fiquei enojada e o mandei desligar, mas ele não parava de se mover aquela coisa dentro de mim e continuava negando que não tinha câmera nenhuma. Eu soquei o rosto dele e ele parou, enquanto ele me mal dizia eu apanhei minha saia e comecei a me vestir, ele ficou irado... se levantou e me empurrou dizendo que eu era medrosa.

–Canalha.

–Não, eu é que fui idiota... não existem canalhas sem alvos. Eu fiquei com tanta raiva... olhei pra ambos os lados e a minha esquerda achei um cano de ferro. Tive tanta vontade de bater nele, que não notei que aquele cano estava ligado á circulação de gases da fabrica, também me esqueci de que o copo e a vasilha que botamos para a maquina derreter o plástico e moldar estavam ainda em produção... – Ela respirou fundo. – Todos os poluentes do plástico queimado se escapuliram por aquele cano e na direção do meu rosto... meus pulmões nunca mais foram os mesmos. Não é câncer... mas gosta de imitar.

–Ele ajudou você?

–Sim, sim. Aquele idiota só desligou as máquinas e chamou a ambulância... acho que ele nem encostou em mim depois que eu cai no chão. Na verdade os paramédicos o viram do lado de fora porque o salão inteiro estava poluído. Acho que bombeiros vieram, não me lembro muito bem se bombeiros vieram me visitar... ah sim, vieram sim! Logo depois de um tempo a minha mãe autorizou o papai a me levar embora para a ilha, eu fui a segunda dos irmãos a chegar. Mas só sai do quarto uns meses antes de conhecer a Katzea, ou seja, um ano.

–É, parece que o acidente foi horrível mesmo.

–Eu acho o seu pior.

–O meu?

–Sim... sabe o irmão que eu mencionei que você tinha, o Caio?

–Sei.

–Você matou ele. Matou Caio Soares.

Não precisou muito tempo, foi imediato. Ela falou aquelas três palavras e minha cabeça explodiu em vibrações dolorosas como se navalhas arranhassem meu crâneo de dentro para fora. Eu vi aquela lembrança passar diante dos meus olhos, como se eu estivesse sendo controlado... meu irmão... ele estava no chão enquanto eu esmagava sua cabeça batendo nele com uma panela de ferro grosso. Eu me senti um inquilino em meus próprios olhos... e aquela voz... aquela voz que não parava de soar: “Desgraçado! Desgraçado! Desgraçado!”, eu queria parar mas as lembranças apareciam cada vez mais. Drogas, fumo, bebida, violência... vício... Minha mãe chorava tanto...

–Aargh!! – Eu gritei e Ophelia correu até mim, segurando meu tronco, pois eu estava a caminho de me encontrar com o chão.

Queria que aquilo parasse, mas tudo ficava cada vez mais doloroso e escuro... eu só queria algo para tirar aquela dor dali, eu queria escapar para longe daquele sentimento. Era como um computador cheio de informação corrompida implorando para seu usuário apagar para gerar espaço.

Leve-me embora...

Leve-me embora...

Leve-me embora...

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Aquilo parecia minha voz, mas era como uma gravação computadorizada. Eu fechei meus olhos com tanta dor que desejei nunca mais abri-los, mas algo estava se aproximando, eu escutava passos vindos da minha frente, então alguém tocou minha mão e eu abri meus olhos. Tudo tão branco, mas o cheiro, sim... o cheiro era familiar, era o cheiro da minha casa.

–Ei, idiota.

–Caio...?

Ele estava usando uma camisa azul um pouco suja e desbotada, com um calção longo e caído jeans.

–Que é? – Ele tinha um skate embaixo de seu braço magrelo.

–Onde estamos, cadê a mamãe?

O fundo branco começou a desenhar sua própria paisagem, uma rua com algumas lojas pequenas porem tudo vazio, deserto. Eu só podia estar sonhando.

–Eu sei lá, vim aqui por que você disse que queria aprender a andar de skate.

Olhei para nossos reflexos na vitrine de uma loja... por que estávamos tão jovens? Eu deveria ter uns 7 anos, mas ainda me lembrava de estar na ilha alguns minutos atrás.

–Eu... – Senti meu rosto esquentar. Afastei-me da vitrine e o abracei com força. – Caio... me perdoa... me perdoa...

–Que nojo, catarrento, pra que isso tudo?

–É que faz tanto tempo que não te vejo, faz tanto tempo que eu queria te falar isso.

Ele colocou as mãos e meus ombros e separou nosso abraço. Olhava para mim como se quisesse dizer algo, mas as palavras não saíam de sua boca.

–... – Soltou-me e andou um pouco para longe. – Sorte sua que não tem ninguém da escola por perto. Se me vissem sendo abraçado pelo meu irmãozinho eu te trancava num barril e te jogava no rio!

–Eu não entendo... Há pouco tempo eu estava na ilha...

–Você ainda tá na ilha, só porque eu disse que vim te ensinar a andar de skate não quer dizer que você saiu de lá.

–Entendo, é um sonho.

–Sim. – Ele colocou o skate no chão e começo a andar nele, fazendo círculos envolta de mim e fingindo que ia me atropelar, como sempre fazia quando éramos crianças.

–Mas eu já sei andar de skate... por que isso está acontecendo então?

–Você pediu para seu cérebro te levar embora para um lugar melhor e feliz, seguro das coisas ruins que eu fiz com você. Então ele te trouxe pra cá, pra quando eu te ensinei a andar de skate.

–Então foi como um mecanismo de defesa...?

–Isso, mané. Mas acho que é melhor voltar logo pra realidade, antes que você preocupe alguém.

Mas eu queria ficar ali com ele, andando de skate e conversando, como se ele estivesse vivo. Não me recordava de um momento de felicidade tão bom quanto aquele.

–Será que não posso andar de skate com você só mais um pouco?

–Claro que sim.

Ele me estendeu sua mão, éramos crianças naquele “sonho”, ele me colocou encima do skate e começou a andar enquanto me segurava para não cair. Nós dois juntos encima do mesmo skate era a minha melhor lembrança dele... foi um breve momento, mas eterno em seus próprios segundos.


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